Você está na página 1de 15

DEMEC/UFRGS

ENG03343 – PROCESSOS DE FABRICAÇÃO POR USINAGEM

FRESAMENTO – 1ª PARTE

Professor Heraldo Amorim


Porto Alegre, julho de 2003
1. Fresamento
Caracterizado, segundo Diniz (1999), por:
• Ferramenta provida de arestas cortantes dispostas em torno de um
eixo;
• Movimento de corte proporcionado pela rotação da fresa ao redor
Inverso do
torneamento de seu eixo;
• Movimento de avanço realizado pela própria peça.

Processo de fabricação por vezes lento, o fresamento apresenta como vantagem principal
a versatilidade. Este processo pode gerar superfícies não planas e não de revolução, ao contrário
de alguns outros processos de usinagem (p. ex., o processo de torneamento gera apenas
superfícies de revolução).
Diniz, 1999, compara o frsamento com alguns outros processos de fabricação usados para
a geração de superfícies não planas e não de revolução (Tabela 1).

Tabela 1 – Comparação entre fresamento e outras operações de usinagem.


Fresamento Aplainamento
Mais barato Máquina e manutenção mais baratas.
Ferramenta mais fácil de afiar
Fresamento Brochamento externo
No brochamento, a usinagem torna-se Mais econômico para grandes lotes;
impossível quando a superfície usinada Maior produtividade.
intersecciona outra.
Fresamento Retificação
Maior capacidade de remoção de cavaco. Melhor tolerância e acabamento superficial;
Maior facilidade de usinar peças tratadas
termicamente.

1.1 Tipos de fresamento

As operações de fresamento (Figura 1) dividem-se basicamente em:


• Fresamento tangencial ou periférico
• Fresamento frontal ou de topo
Fresamento tangencial – dentes ativos encontram-se na periferia (superfície cilíndrica) da
ferramenta, e o eixo da ferramenta é paralelo à superfície a ser usinada. As ferramentas usadas
no fresamento tangencial são chamadas fresas cilíndricas ou tangenciais.
Fresamento frontal – dentes ativos estão na superfície frontal da ferramenta, cujo eixo é
perpendicular à superfície a ser usinada. As ferramentas usadas no fresamento frontal são
chamadas fresas frontais ou de topo.

Figura 1 – Operações de fresamento. Fonte: Stemmer.

1.2 Parâmetros de processo no fresamento


Alguns parâmetros de processo relativos ao fresamento são similares aos estudados no
processo de torneamento, mudando apenas a forma de representá-los. Desse modo, a velocidade
de corte, o avanço e a velocidade de avanço dispensam maior atenção. Deve-se apenas atentar
para o fato que, uma vez que no fresamento a rotação é observada no eixo da ferramenta, a
velocidade de corte é observada na periferia desta (Figura 2).

Figura 2 – Direção dos movimentos de corte e de avanço. Fonte: Diniz.

Outros parâmetros de processo para o fresamento (Figura 3) são:

• Avanço por dente (f z) – percurso percorrido por um dente em uma revolução da


ferramenta. Representa a distância entre duas superfícies consecutivas na direção
de avanço (equação 1).
• Ângulo da direção de avanço (ϕ) – ângulo entre as direções de corte e de avanço.
Varia continuamente durante o processo.

• Ângulo da direção efetiva (η) – ângulo ente a direção de corte e a direção efetiva.
Varia continuamente durante o processo (equação 2).

• Avanço de corte (f c) – distância entre superfícies consecutivas em usinagem


medida no plano de trabalho e perpendicular à direção de corte (equação 3).

f
fZ = , (1.)
Z
Onde Z é o número de dentes da fresa.

sen ϕ
tgη = (2.)
Vc
+ cos ϕ
Vf

f c = f Z . sen ϕ , (3.)

Figura 3 – Grandezas de avanço. Fonte: Diniz.

Uma diferença importante entre os processos de torneamento e fresamento é que no


último, os ângulos da direção efetiva e da direção de avanço, que no torneamento são constantes,
variam continuamente durante a operação de fresamento.
1.2.1 Grandezas de penetração

Uma diferença forte entre as operações de torneamento e fresamento é que esta possui
três parâmetros de penetração (Figura 4). São eles:

• Profundidade ou largura de usinagem (ap ) – profundidade ou largura de


penetração da ferramenta na direção perpendicular ao plano de trabalho.

• Penetração de trabalho (ae) – penetração da ferramenta medida no plano de


trabalho e perpendicular à direção de avanço. Apesar de não ser usada no
processo de torneamento, é muito importante no fresamento e na retificação
plana.

• Penetração de avanço (af) – penetração da ferramenta na direção de avanço.

(a) (b)

Figura 4 – Grandezas de penetração para o fresamento tangencial (a) e frontal (b). Fonte: Diniz.

1.3 Geometria da ferramenta

Planos do sistema de referência (Figura 5) – basicamente os mesmos observados no


torneamento, mudando apenas a representação.
Geometria de ferramenta – apesar das diferenças entre os dois processos, a ferramenta de
fresamento possui geometria semelhante à de torneamento (Figura 6). Assim, tanto os elementos
da parte cortante (Figura 7) quanto os ângulos da ferramenta (Figura 8) são representados de
forma semelhante ao estudado neste.
Figura 5 – Sistema de referência da ferramenta. Fonte: Diniz.

Figura 6 – Semelhança entre ferramentas de torneamento e fresamento. Fonte: Stemmer.

Figura 7 – Arestas de corte e superfícies da parte de corte em uma fresa frontal. Fonte: Diniz.
Figura 8 – Ângulos da ferramenta em uma fresa de faceamento. Fonte: Diniz.

1.4 Fresamento tangencial

Pode ser concordante ou discordante, dependendo do sentido de rotação da ferramenta.


Discordante (Figura 9) – ângulo da direção de avanço (ϕ) cresce desde zero até um valor
máximo. O sentido do movimento de avanço é contrário ao movimento rotatório da fresa.
Da mesma maneira que ϕ, a espessura de corte aumenta de zero até um máximo.
No início do corte, a fresa toca a peça e a força para baixo, causando uma força que tende
a afasta-las. Logo após, porém, a força de corte aponta para cima, o que faz com que a fresa puxe
a peça ao seu encontro. Esta variação de intensidade e do sentido da força de corte produz
vibrações que prejudicam a tolerância e o acabamento superficial da superfície fabricada.
Figura 9 – Fresamento tangencial discordante. Fonte: Diniz.

Ψ (ângulo de contato do dente) – Ângulo entre uma linha radial da fresa que passa pelo
ponto de contato aresta-peça e uma linha que passa pelo ponto onde a espessura do cavaco é
zero.
hD – espessura do cavaco.

Concordante (Figura 10) – ângulo da direção de avanço (ϕ) inicia o corte em seu valor
máximo, decrescendo até zero. O sentido do movimento de avanço é o mesmo do movimento
rotatório da fresa.
Componente vertical de força de usinagem possui sempre o mesmo sentido, o que
elimina os efeitos negativos observados no fresamento discordante.
Contato da fresa com a peça inicia em b (hDmáx.) e se desloca até o ponto de menor
espessura do cavaco.
Um inconveniente do fresamento tangencial concordante é que a força de avanço ocorre
no mesmo sentido do deslocamento. Para que a mesa ande em um sentido, a porca do sistema e
avanço deve suportar esforços no outro. Como a Fres sobre a fresa varia em módulo, a força
resultante sobre o fuso irá variar em módulo e direção, podendo causar vibração. Este problema
pode ser corrigido através de manutenção a fim de tirar folgas da máquina e do uso de fusos de
esferas, onde não existe folga.
Outro problema do fresamento concordante é que o corte inicia sempre com a espessura
máxima de corte. Se a superfície possui camada superficial endurecida (óxido ou sujeira), o
contato inicial ferramenta-peça será em condições desfavoráveis, o que causará a queda da vida
da ferramenta.
Figura 10 – Fresamento tangencial concordante. Fonte: Diniz.

1.5 Forma do Cavaco


No fresamento tangencial:
- Forma de vírgula, com a espessura de corte variando de zero a um valor máximo
(discordante) ou do valor máximo a zero (concordante).
O ângulo de contato do dente com a peça (ψ 0 ) é dado por

D − 2 ae 2a
cos ψ = =1 − e (4.)
D D
1/2
 a e  ae  2 
h D = f z . sen ψ0 = 2. f z . −    (5.)
D  D 
 

Fresamento frontal:
Pode-se classificar o fresamento frontal (Figura 11) em:
• Simétrico: deslocamento da fresa sobre o eixo de simetria da peça. Melhor
contato de cada aresta com peça, maior vida da ferramenta.
a) fresamento de rasgo ou canal com fresa de topo:
ae = D Ψo = 180 º h D máx = f Z h D min = 0
b) fresamento comum com fresa de facear:

sen  Ψ0 2  = e
a
ae < D h D min > 0 e h D máx = f z
  D
• Assimétrico com fresa de facear – Corte não se dá sobre o eixo de simetria da
peça. Se toda a superfície está sendo fresada, a e < D , h D min > 0 , h D máx = f z
Vantagens – maior número de dentes em contato simultaneamente, o que resulta
em um corte mais suave, com menor força por dente, e menor tendência a
vibrações.

Figura 11 – tipos de fresamento frontal. Fonte: Diniz.

1.6 Comparação entre corte simétrico e assimétrico:

Corte Simétrico – Menor desgaste, maior vida da ferramenta.


hDmin em corte simétrico simétrico > hDmin para assimétrico (em faceamento).
Maior impacto na entrada do dente, devido ao contato inicial se dar com uma espessura
de cavaco maior do que o observado para o fresamento frontal assimétrico.

Corte Assimétrico – Maior tendência ao desgaste, menor para o lascamento. Corte mais
suave, devido ao maior número de dentes em corte simultâneo (maior ângulo de contato).
Usando J (Figura 11 c) pequeno, hD na entrada diminui, o que resulta em menor impacto
na entrada da ferramenta (menor energia de choque).
Segundo Diniz et. al., usando corte assimétrico com J pequeno, obteve-se uma vida de
ferramenta 24% maior do que com corte simétrico (na usinagem de aço ABNT 1045 com
ferramenta de metal duro P25). Obviamente, este resultado depende do aço usinado e da
ferramenta utilizada. Se a ferramenta fosse mais tenaz, talvez o corte simétrico propiciasse maior
vida de ferramenta.
Convém chamar a atenção para a questão da vida da ferramenta: apesar do corte
simétrico causar menor desgaste de ferramenta, o corte assimétrico permite melhores condições
de trabalho, incluindo menores vibrações, esforços por dente e impacto na entrada da aresta na
peça. Assim, antes de afirmar que um ou outro propicia maior vida de ferramenta, deve-ser
conhecer o material a ser usinado e o da fresa, bem como as condições de trabalho enfrentadas
por estas. Ou seja, não adianta uma determinada fresa apresentar menor desgaste sob fresamento
simétrico se o seu fim de vida ocorrer de forma catastrófica (lascamento, quebra).

1.7 Fresamento tangencial com fresas helicoidais

No fresamento tangencial com fresas de dentes retos, a força de corte, bem como a seção
do cavaco, aumenta rapidamente com o ângulo ϕ, caindo bruscamente a zero quando ϕ = ϕ0
(Figura )

Figura 12 – Variação da seção do cavaco durante o processo de fresamento. Fonte: Diniz.

Já no fresamento tangencial com fresas helicoidais não ocorre tanta variação na força de
corte quanto no fresamento com dentes retos. Nesta operação, a área da seção do cavaco cresce
de zero a um valor máximo, mas mantém este valor por alguns instantes, e não volta
necessariamente a zero. A Figura 13 mostra a variação da área da seção do cavaco para o
fresamento tangencial com fresa helicoidal de 4 dentes, e a Figura 14 mostra a área de contato
ferramenta-peça.

Figura 13 – Variação da seção do cavaco durante o processo de fresamento com fresa helicoidal
de 4 dentes. Fonte: Diniz.

Figura 14 – Área de contato ferramenta-peça no fresamento com fresa helicoidal. Fonte: Diniz.

Caso a fresa tivesse 8 dentes, a superposição seria maior, com um corte mais uniforme.
Quanto maior o número de arestas, mais a área tende a ser constante. Pode-se obter
forças resultantes aproximadamente iguais a uma reta. Isto acontece quando a largura da peça é
igual a um múltiplo inteiro do passo da fresa.
Condições de usinagem em fresas helicoidais são melhores (menor oscilação da força de
usinagem, menor força máxima, melhor acabamento superficial dos componentes produzidos),
sendo seu uso preferido sempre que possível.

1.7.1 Considerações a respeito das fresas helicoidais

Na usinagem com fresas helicoidais observa-se uma força de corte média resultante
maior do que a observada para dentes retos, o que implica em maior potência. Além disso, a
inclinação dos dentes gera uma força na direção axial, sujeitando o eixo-árvore a esforços. Por
isso não se usa fresas com ângulo de inclinação maior de 45%.
A solução mais comumente adotada para o problema da força axial é a montagem de 2
fresas com hélice invertida (Figura 15).

Figura 15 – Montagem em par de fresas helicoidais. Fonte: Stemmer.

à Fresas com dentes curtos possuem dentes retos, pois não compensa usar helicoidais.

1.8 Desgaste da ferramenta em fresamento

Além dos fenômenos já estudados (atrito, adesão), a fresa está sujeita a choques
mecânicos e térmicos, podendo apresentar fadiga de origem mecânica (marcas paralelas à aresta
de corte) ou térmica (marcas perpendiculares à aresta – forma de pente), dependendo do
mecanismo predominante.

1.9 Cálculo da Potência de Corte

Sabe-se que, na operação de fresamento, a força de corte (e, por conseqüência, a


potência) varia continuamente durante o corte. Desse modo, torna-se necessária a determinação
de um parâmetro de potência, a partir do qual a máquina será dimensionada. Para a grande
maioria das aplicações, este dimensionamento pode ser feito através da potência média, com boa
aproximação se o número de dentes cortando simultaneamente é alto.
De forma análoga ao torneamento, utiliza-se a equação de Kienzle (agora com constantes
especialmente determinadas para o caso do fresamento) para a determinação de Ksm (pressão
específica de corte média):

K s1
K sm = , (6.)
hm − Z

onde hm é a espessura média do cavaco.


Para o cálculo da potência de corte, usa-se a equação 7:

K sm .ae . a p . V f
Ncm = [ kW ] (7.)
60.106

O cálculo de hm pode ser realizado pela equação 8:

1
hm = . f z . sen xr .(cos ϕ1 − cos ϕ2 ) , (8.)
ϕ1 − ϕ2

Onde:
ϕ1 – ângulo entre o ponto de entrada do dente e a vertical;
ϕ2 – ângulo entre o ponto de saída do dente e a vertical;
ϕ0 – ângulo de contato dente-peça.
A equação (8) pode ser utilizada para operações de fresamento frontal. Para o fresamento
tangencial com entes retos, assume-se ϕ1 = 0, ϕ2 = ϕ0 e χr = 90°.
Assim, de (8), sobra:

1 1  2a  V
hm = . f z .(11 − cos ϕ0 ) = .  e . f , (9.)
ϕ0 ϕ0  D  2.n

Você também pode gostar