Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
casa velha
0
do mal incurável
sabendo-se
que a dor é
coisa alguma
entristece-se o doente:
1
dedos
2
incêndio
a vida
é uma casa esquecida com teto de palha
que, sem razão, incendeia
o silêncio
era um livro esquecido
nos restos da casa carbonizados
3
adiante
[ blavino n°6 ]
hoje
eu e você
nos dividimos
seus horizontes
são muito amplos
corres mais que antes
e de hoje em diante
colhas os frutos
bons, somente
reencontros,
eu e você?
adiante
4
imprescindível
[ blavino n°7 ]
fim
destino
desígnio
impassivo
eu imploro
um objetivo
imprescindível
seja sinistro
seja destro
submisso
indeciso
preciso
fim
5
outra pena
6
manchete
o velho
morreu
e era só
7
asseio
8
paladar
diga
que sabor tens
quanto de doçura
quanto de amargor
fala
porque creio
creio em tudo
em cada palavra
teu sabor
feito só de palavras
e de crenças
9
corre insetinho
corre insetinho corre da grande sorte que tens
corre porque te pego corre porque ser ínfimo
corre porque com um dedo corre num mundo de tantos e tão grandes
corre eu te esmago corre é uma bênção
corre para qualquer canto corre ver tudo em detalhe
corre para qualquer fresta corre e agradece
corre e suma das vistas corre tua fortuna
corre e observa corre porque és leve
corre tranquilamente corre não trazes pesos
corre porque és mínimo corre não levas penas
corre pequenininho corre vai ser feliz
corre porque sou eu corre insetinho
corre que sou tão grande corre de mim
corre que em mim não caibo corre porque te pego
corre porque nem sabes corre porque com um dedo
corre eu te esmago
10
corrente
é arriscado romper a corrente
as certezas
desabam
no
solo
e os
elos
saltam
cada
um
para
um
lado
11
gás
12
rubricas
13
virgem
14
esse pouco que sobra de um dia
15
exéquias para a noite
16
o embrulho
igual a qualquer pacote não haverá mais pacote, nem nó nem barbante
iguais o papel e a corda nem ânsia de saber o que se esconde nele
igual a todo nó cego nem o contentamento para ir adiando
17
giz
[ cocolitóforo ]
18
a pérola
concha concha concha concha concha concha concha concha
concha concha concha concha concha concha concha concha
concha concha concha concha concha concha concha concha
concha concha concha concha concha concha concha concha
concha concha concha concha concha concha concha concha
concha concha concha concha concha concha concha concha
concha concha concha concha concha concha concha concha
concha concha concha concha concha concha concha concha
concha concha concha concha concha concha concha concha
concha concha concha concha apérola concha concha concha
concha concha concha concha concha concha concha concha
concha concha concha concha concha concha concha concha
concha concha concha concha concha concha concha concha
concha concha concha concha concha concha concha concha
concha concha concha concha concha concha concha concha
concha concha concha concha concha concha concha concha
concha concha concha concha concha concha concha concha
concha concha concha concha concha concha concha concha
concha concha concha concha concha concha concha concha
19
enterro dos ossos
o que ainda estou vestindo tudo bem se não foi tudo bem
que você já não tenha tirado eu sei você não vai me responder
não sobraram nem os meus nossa cruel cumplicidade
versos, pra mim é deliciosa de se ver
nenhum caderno, nenhum retrato
moram nos cantos de nossa casa
pelos cantos da minha casa todos os rumos da nossa vida
em todos os cantos da minha vida nasce a quarta-feira de cinzas
carnavais descosturados estamos agora desmascarados
e o que restou do meu passado fantasiados de novas desculpas
de sexo, razão e precipícios
de música, sons
e versos enterrados
20
enxurrada
21
rio e vivo
22
... donde há de vir
23
morcegos
24
casa velha
25
córrego por onde escorre o tempo
26
ó, lirismo
27
pequena injúria
[ a mãe de meus poemas ]
28
negócio
29
um barco deixou aqui uma caixa
30
covardia
31
amor vendido
32
crise
33
metáfora
o poema, dizem
é uma fotografia
de uma escultura de gelo
o poeta, dizem,
inerte e atemporal,
é uma estátua de bronze
34
óculos
35
escuro particular
por mais cedo que parecessem as em um fogo vibrante ou um vampiro
horas da noite pouco a pouco refugio-me nas certezas mais
e imprescindível fosse o ouvir do cálido e bravo ferrenhas
cantar dos galos até brilhar do meu sono diurno
no campo como um disco de ouro e mundano
que era longe e deserto no céu esquecendo que lá
de notívagos onde todos os que acordavam no mundo
minhas mais dúbias desilusões cedo o que esqueci aquece
partiam de dentro de um os galos que os acordavam alegra
horizonte certo e e eu e às vezes mata de fome
decidido que nunca e de sede
para raiar nunca durmo quem ainda acredita em
primeiro tímidas e arroxeadas todos pudéssemos ver utopias e
depois de um alaranjado saudosismos
um tanto doentio lá estavam as fantasias
para só então saltarem por cima de minha juventude bom dia
das casas raiando dia
das colinas fico-me bem comigo
das árvores e eu e meu escuro particular
do mundo inteiro que nem de longe posso vê-las
que eram aqueles ou tocá-las
campos como um diabo
36
o pão do poeta
37
presença
38
ausência
[ o vazio ]
39
40
41
42
43
44
dedico esta obra
45
Sobre o autor
Inconformado com a própria inaptidão para dizer algo sem ser através de subterfúgios,
Volmar Camargo Junior abdicou de parte de suas horas diárias de sono, tentando
domar a sintaxe e adestrar a semântica. Depois de perambular pelo Rio Grande do Sul,
acampou-se na brumosa, fria, úmida, às vezes assustadora – mas cercada por um
cenário natural de extrema beleza – Canela, na Serra Gaúcha. Amargo e frio, cálido e
doce, descendente de judeus poloneses, ciganos uruguaios, indígenas missioneiros,
pêlos-duros do Planalto Médio, é brasileiro, gaúcho, e, quando ninguém está vendo,
torcedor do Grêmio Foot-Ball Porto Alegrense. Autor dos blogs Um resto de café
frio e O Gorjeador Maluco. É colaborador fixo da Revista Eletrônica SAMIZDAT.
46
Este trabalho está licenciado sob uma Licença Creative Commons Atribuição-Uso Não-Comercial-Vedada a Criação
de Obras Derivadas 2.5 Brasil. Para ver uma cópia desta licença, visite http://creativecommons.org/licenses/by-nc-
nd/2.5/br/ ou envie uma carta para Creative Commons, 171 Second Street, Suite 300, San Francisco, California 94105,
USA.
47
Índice
48