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Cada passo que eu dava para longe dela se tornava mais e mais difícil. Era como se eu
estivesse correndo em cima de concreto molhado, e quanto mais eu avançava, mais espesso
ele ficava. Como eu queria voltar – subir a janela de seu quarto e implorar por perdão. Não
era justo, e eu sabia que o tempo não significaria nada se eu estivesse indo em sua direção.
Eu desejava muito ouvir sua voz, até mesmo seus gritos de raiva. A punição seria o paraíso se
eu pudesse estar com ela novamente.
Mas a minha punição não era nada comparada com o que ela havia passado nesses
últimos oito meses. Não, eu tinha que continuar seguindo em frente. Para longe... Esquecê-
la… Só mais um passo…
As luzes da cidade apareceram em minha frente, mas eu não tinha a mínima idéia de
onde estava. O vago som dos carros anunciava algum tipo de civilização e eu segui
desanimado nessa direção. Ela iria ficar segura... Eu estava longe dela. O que eu iria fazer
sem ela?
A última visão de Alice tinha apontado o caminho para um lugar remoto de Montana.
A caçada iria me levar para mais longe ainda, e com um pouco de sorte também diminuiria a
dor cortante em meu peito devido à ausência de Bella.
A rodovia entrou em meu campo de visão, suas placas verdes e brancas anunciando e
cidade de Olympia à frente. Eu havia demorado muito mais do que o normal para correr até
aqui; o sol já havia se posto, e a noite escura e sem lua havia descido sobre a cidade. Os vôos
para Billings já tinham ido embora há muito tempo. Eu teria que ser mais criativo com meu
transporte.
“Mas vocês não conseguem.” Sua voz flutuava por meus pensamentos, me
provocando com o duplo sentido de suas palavras.
Eu vou conseguir, eu jurei para mim mesmo silenciosamente. Ela iria ficar segura e
eventualmente – feliz.
O jeito indiscreto do carro não importava. Se fosse para rastrear Victoria, eu teria que
agir do jeito dela. Nômades viajavam quase exclusivamente à noite, se escondendo durante
o dia. No escuro, o carro não era chamativo, e eu precisava de rapidez. Meu último ato de
extravagância.
Os três homens pararam de secar a moça e me encararam. O mais alto tinha a minha
altura, e olhou para seus parceiros. O que esse pirralho quer? Seu pensamento ecoou na
mente dos outros.
Feliz com a interrupção, a mulher sorriu para mim. “Eu vou chamá-lo.”
O mais alto levantou sua mão, interrompendo-a. Eu peguei seu nome – Stan – das
mentes dos outros. “Ele está com um cliente. O que você quer?” Um copo de leite? Sua
mamãe?
“Eu preciso desse,” eu disse apontando para o carro de alto desempenho atrás de
mim.
“Sei. E você simplesmente achou sessenta mil no meio dos seus livros da escola.” Stan
olhou de volta para seus amigos e todos eles riram.
Eu não tinha tempo para essa bobagem. “Por favor, interrompa o gerente de vendas e
mostre meu cartão para ele,” eu disse para a recepcionista, ignorando-o. Seus olhos se
fixaram em mim enquanto ela concordava com a cabeça, estendendo sua mão flácida para
mim.
“Você realmente não deveria fazer isso com as pessoas,” a memória de Bella
sussurrou.
Eu tirei um cartão de crédito preto do meu bolso de trás e comecei a passar para ela
em um gesto dolorosamente lento e humano. Com muito controle eu deixei o tagarela tirar
o cartão dos meus dedos.
O que diabos é isso? O cartão de crédito do papai? “O que é isso?” Ele olhou para o
cartão. “Um American Express preto? Você é bobo mesmo. Do que isso é feito? Uma garrafa
de refrigerante vazia?” Onde ele conseguiria isso, em uma loja de brinquedos?
Stan grunhiu. “Você vai deixar ele entrar no carro por causa daquilo?” Ele apontou
com o dedão para trás por cima de seus ombros para o homem desaparecendo na sala dos
fundos.
“Um cartão ‘Centurion’, sei”, Stan resmungou. “Você tem o que, garoto, dezoito,
dezenove? Eu acho que não.”
Cala a boca, Stan, Andrew pensou. Nos fundos, uma cópia do extrato do meu cartão
de credito tinha acabado de ser impressa, e o gerente de vendas estava pegando o queixo
dele do chão. Talvez as coisas fossem um pouco mais rápidas agora.
Stan olhou para seu chefe. “Você não está falando sério...”, mas Fred o calou com um
único dedo. Eu devo despedir ele na frente do cliente ou não?
“Sim. Eu estou com pressa e gostaria dele abastecido e pronto assim que possível.”
Fred sorriu, sabendo que sua secretária estava digitando feito uma louca nos fundos.
“Eu já comecei a papelada, Sr. Nicholls. Quarenta e cinco minutos é muito tempo? Você é
bem vindo para esperar em meu escritório, a não ser que você queira inspecionar o carro
mais de perto. Ele está perfeito, eu garanto.”
“No seu escritório seria bom.” Eu olhei para Stan, que estava de queixo caído, e dei um
sorrisinho convencido. Ele estaria se juntando ao grupo dos desempregados em mais ou
menos trinta segundos.
“Não, obrigada.”
“Eu já volto,” o gerente disse enquanto ele saía do escritório e fechava a porta. Antes
de ir falar com a secretária para pedir que ela acelerasse o trabalho, ele despediu Stan, e deu
um aumento para os dois outros vendedores. Os pensamentos dos humanos não eram
suficientes para me distrair, e quando a recepcionista começou a desenhar no bloco de
notas, sua mão se transformou na de Bella em minha mente, girando e girando pela folha de
papel. Amanhã, Bella estaria na escola, desenhando os mesmos círculos e diamantes, tão
entediada quanto eu com os assuntos mundanos. A urgência de estar junto com ela fez com
eu me levantasse.
Trinta e oito minutos depois eu estava dirigindo meu novo carro. Fred se ofereceu para
me levar num teste-drive, mas eu lhe dei uma nota de cem dólares e desapareci. Eu pisei
fundo e alcancei a estrada, quando o velocímetro atingiu 150 eu sorri de verdade.
Velocidade era o último prazer o qual eu iria me permitir, e esta máquina não me
desapontou. Uma vez fora da cidade eu desliguei os faróis e forcei os limites do carro. Nessa
velocidade eu chegaria facilmente à Bighorn Cânion antes de amanhecer.
“Ele dirige feito um louco.” Cada pensamento, cada ação, me levava de volta para ela,
me tentando.
“Não,” ela sussurrava em minha mente, implorando para que eu voltasse. A ferida
aberta no meu peito se moveu para as minhas costas, como se garras estivessem me
rasgando, tentando me puxar de volta para ela. Não... eu sou mais forte que isto. Ela vai
estar segura. A salvo de Victoria.
Eu olhei para o rádio, quase não prestando atenção no painel, e pensei na lista de
estações que eu conhecia. Música me traria a lembrança dela ainda mais forte, mas o que
mais eu poderia ouvir? Esportes? Não a essa hora da noite. Programas de bate papo? Não,
isso era uma versão do que eu conseguia ouvir das mentes humanas o tempo todo. Música
country ou western? Não, canções demais sobre perder o amor da sua vida. Então eu
encontrei a rádio que seria perfeita. Obrigado, Emmett.
Seus pensamentos haviam sido errantes e violentos; ela não dava valor algum a
ninguém exceto ao seu próprio divertimento. Quando ela, James e Laurent nos encontraram
jogando baseball, a idéia de diversão passava longe dos pensamentos dela.
Qual era o sentido de procurar um bando de vampiros? Eles não tem nada para nos
oferecer. Com certeza nenhum deles é páreo para James, ela pensou. Ela vivia para
perseguir, revelando em ambos a presa e o caçador nos jogos que ela jogava com seus
companheiros. James havia sido seu padrão de medida para tudo enquanto ela nos
observava de perto; logo que ela se recuperou do choque.
Ela considerou Bella como a mais fraca entre as mulheres, mesmo antes de perceber
que ela era humana. O medo estivera estampado nos olhos de Bella naquela noite. A estrada
passava borrada enquanto seus grandes e tímidos olhos obstruíssem minha visão
momentaneamente. Então seus olhos se fecharam, mostrando aquele último momento...
“Não, eu não vou voltar!” eu gritei para mim mesmo. Ainda não haviam passado nem
vinte e quatro horas. Se controle!
Finalmente ela me observou com atenção. Ele e a mais fraca estão juntos. Sem
cicatrizes, mas tem alguma coisa nele. Esguio, mas provavelmente rápido. Ela relembrou o
espaço que eles haviam andado até nos encontrar no campo de baseball, preparando em
sua mente uma rota de fuga, se fosse necessário.
Quando o vento traiu a verdadeira natureza frágil de Bella, Victoria ficou tão eufórica
quanto James, mas a partir daquele ponto eu parei de ouvi-la. Sem uma palavra de James,
ele já sabia que ela iria atrás do resto da minha família enquanto ele seguiria Bella. Eles já
haviam usado esta estratégia antes, James como ponto de lança, ela como contenção. Ele a
valorizava como caçadora, e gostava de ver como ela se saciava com violência – tanto
quanto ele desejava praticá-la também.
Como ficariam as coisas agora que ela estava sozinha? Ela havia vigiado Forks
facilmente; era claro que ela era capaz de interagir com os humanos sem se entregar. Ela
continuaria procurando por desafios ou ficaria com os alvos mais fáceis? James era o
rastreador; ela se submetia a liderança dele quando eles caçavam. Depois de observar a
visão de Alice da próxima refeição de Victoria, parecia que a rota mais fácil seria a mais
provável.
Meus próprios dias como nômade passaram rapidamente pela minha cabeça à medida
que eu tentava me colocar no lugar de Victoria. Exposição era sempre um problema; mas
mesmo no mundo de hoje era fácil encontrar humanos descartáveis. Aqui no deserto,
caçadores e mochileiros seriam seu alvo, mas ela não ficaria na mesma área por muito
tempo. Ela iria para o norte, possivelmente caçando perto das cidades, ou se moveria para o
sul, em direção as áreas mais populosas e pobres?
Nos meus tempos de vingador, eu caçava perto das grandes cidades, preferindo o
norte onde eu dificilmente encontrava outros imortais. As cidades atraíam os criminosos,
aqueles os quais eu não iria apenas matar, mas punir. Cada uma das minhas vítimas mereceu
o seu destino, mas homicídios justificáveis ainda são homicídios. Bella merecia algo muito
melhor do que eu.
Victoria. Com certeza o tempo iria enfraquecer minhas lembranças de Bella... Pare...
Victoria não seria tão criteriosa com suas vítimas como eu havia sido. A cena do crime
que eu visitaria primeiro era a visão de um abate cruel, de acordo com o relato dos
repórteres. O mochileiro havia sido duramente espancado e abatido. Victoria teve que
disfarçar sua refeição, mas eu sabia que ela saboreara a tortura tanto quanto o banquete.
Com sorte ainda haveria algum vestígio do seu cheiro e eu poderia confirmar minha teoria.
Se eu pudesse identificar seu padrão de caçada, então ela seria mais fácil de rastrear e de
prever.
O corpo havia sido encontrado perto de um dos acampamentos fazia uma semana,
mas não havia chovido ou nevado, portanto havia uma chance de encontrar algum vestígio
de Victoria. Com apenas uma hora até o amanhecer, eu não podia perder tempo.
Chegando á área de camping, eu estacionei fora do local demarcado. De acordo com o
aviso no portão o camping principal estava programado para reabrir no final de semana. Eu
detectei traços de sangue, mas a natureza fora muito eficiente em limpar suas sobras.
Seguindo a trilha que, sem dúvida alguma, havia sido feita pelos policiais humanos eu
encontrei a cena do crime. Não havia nenhuma fita para isolar o lugar; não havia sido
cometido nenhum crime, pelo menos aos olhos humanos. Uma simples estaca amarela
marcava o lugar dos restos no meio de um pequeno barranco.
A raiva me impediu de examinar o passado enquanto eu dava mais uma volta ao redor
do lugar. Seu cheiro havia desaparecido; somente a força de seu veneno deixara algum
traço. Mas eu sabia para onde ela se dirigiria quem ela estaria caçando a seguir. À medida
que eu voltava para o meu carro, eu também percebi que eu não conseguiria chegar a
tempo de salvar o indefeso campista.
Enquanto eu corria, uma nova prioridade tomou conta de mim. Eu posso não chegar a
tempo para salvar a humana, mas Victoria podia estar esperando o próximo...
Oh, Glenda, Eu sinto muito. Eu não deveria ter deixado você sozinha... Meu Deus, por
quê? Ela merecia viver, por que você não me levou? O que eu vou fazer agora... Eu deveria
ter ficado, eu deveria ter protegido você... Não sobrou mais nada pra mim.
Ele não tinha a menor ideia do que havia tirado a vida de sua mulher, se ele tivesse
ficado agora estaria morto ao lado dela. Mas sua palavras entravam em meus ouvidos como
gelo, alimentando a dor no meu coração.
E se Bella se machucar, agora que eu fui embora? E seu eu pudesse salvá-la? Ela é tão
frágil...
“E seu eu a matasse?” Eu gritei para mim mesmo, relembrando o seu sangue nos meus
lábios. O conceito parecia impossível – eu a amava tanto – mas eu me lembrei da minha
primeira reação quando ela cortou seu dedo. Não foi salvar, foi atacar. Eu era apenas um
monstro, como Victoria – pior ainda porque eu disfarçava meu lado predador muito bem.
Victoria. Foco na caçada. Como eu gostaria de poder achar à nômade – matá-la seria
como extirpar a pior parte de mim. Eu deixei o animal dentro de mim me conduzir, seu
cheiro me guiando como um farol. Haviam passado apenas algumas horas desde o momento
em que ela estivera aqui, ela não poderia ter ido longe. Meus pés me guiaram rapidamente
através das árvores, levando-me ao lugar onde eu poderia liberar todo o ódio que eu
guardava por mim mesmo.
O espaço entre as árvores ficou maior, e o cheiro de Victoria diminuiu. Ela tinha
seguido em linha reta pela floresta, evitando as árvores grandes que guardariam seu cheiro à
medida que ela passasse entre elas. Eu distingui um último rastro forte enquanto seguia sua
trilha por um caminho isolado de bordos novos. O murmúrio de uma mente humana
distante quebrou minha concentração.
Deslizando até parar, eu deixei uma vala na terra endurecida antes de me esconder
debaixo da copa das últimas árvores. A mente que eu ouvi era a do piloto, e ele estava se
dirigindo para esse local. Reflexivamente eu olhei para cima, procurando o helicóptero no
céu.
“O que foi aquilo?” o co-piloto perguntou, e eu sabia que ele havia me visto.
“Eu não sei, um flash de alguma coisa. Está no caminho, fique com os olhos bem
abertos.”
Droga. Eu me escondi num grupo de árvores novas, me recriminando por ser tão
descuidado. Os dois homens esquadrinhavam o chão abaixo deles enquanto voavam baixo,
mas sem dizer nada. O pensamento do piloto se voltou para a missão deles, dar uma olhada
no último ataque de Victoria. ”Marque essas coordenadas no GPS, e depois que nós
olharmos a cena do crime nós voltaremos.”
O helicóptero se dirigiu para o lado que eu tinha acabado de vir, e eu examinei minha
situação.
Para muita gente, a visão seria espetacular. Na minha frente não havia literalmente
nada. Nenhuma árvore, um pouco de grama, apenas terra plana e batida, iluminada pela luz
do sol até o horizonte. Para mim era apenas um final de rastro comum e um forte lembrete
do vazio da minha existência.
Estava nublado quando Victoria atravessou essa área, então nada a deteve. Agora que
o sol havia aparecido, a terra estéril e sem cheiro algum na minha frente podia muito bem
ser uma parede impenetrável.
Meus olhos escrutinaram a terra marrom, procurando por algum vestígio, algum brilho
ou flash que poderia me mostrar onde ela estava, mas não havia nada. Nada exceto marrom.
Victoria iria viver outro dia. Minha caçada não seria tão fácil quanto eu havia previsto,
mas ao menos iria me ocupar por um pouco mais de tempo. Sem as visões de Alice para me
ajudar, eu tinha muita leitura e pesquisa à minha frente, me provendo mais distração... eu
esperava.
Enquanto eu corria para o carro, o choro daquele homem ecoava na minha cabeça.
Embora eu tentasse repelir seus soluços, eles persistiam, gritando mais alto, girando e
mudando na minha mente. O som se tornou meu próprio luto á medida em que eu me
imaginava chorando sobre o corpo sem vida de Bella, meu hipotético sofrimento era
ofuscado pela culpa. Vendo a marca em sua jugular, sabendo que era eu quem havia tirado
sua vida, em um só golpe eu me tornava o assassino e a vítima.
Eu apenas orei para que pudesse existir um fim para mim também. Do pó para o pó,
apesar de tudo...