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Livros do autor publicados por esta edi +44 cartas do mundo liquide moderna «Amor liquide + Aprendendo a pensar com a sociologia + Marte da vida iman sobre Bauman + Confianga e medio na cidade 1do liquide moderno + Em busca da politica nceito de cultura +A dtica &posstvel num mundo de consumidorest + Bnsaios alo: as consequéncias hummanas lentidade io é um didrio adores e intérpretes da pés-modernidade + Medo liquide + Modernidade e ambivaléncia + Modernidade ¢ Holocausto + Modernidade liquida + Sobre educasao e juventude + Tempos liquidos «Vida a crédito Zygmunt Bauman e Tim May APRENDENDO A PENSAR COM A SOCIOLOGIA Tradugao: Alexandre Werneck « ZAHAR ‘Traduglo autorzad pointe Bo, ‘de Oxford, Ingh Copyright © 1990, 2002, 2ygmunt Bauman e Tim May ortuguesa ©2010: Lida, 51-061 Rio de Janeiro, RJ 529-4787 ceditora@abaccom.br | www zahar.com.br “Todos o ezetos reservados, ‘Aseprodugio no autorizada desta publicagio, no todo couem parte, constitu violagio de direitos autorais. (Lei 9610/98) ‘Graf atualzada respltando o novo Acordo Ortogréfico da Lingua Portuguesa Fotos da cap: © Mento faognal 6 Antony Sharpx Cusogato na foxte at dos Ered Lion I ‘Bauman, Zygmunt, 1925> BSfla—_Aprendendo a pens tradugio Alexandre ‘om a sociologia/2ygmunt Bauman e Tim May; neck, ~ Rio de Janeiro: Zaha, 2010. “Tradugio de: Thinking sociologiealy Incl indice ISBN 978.85-378-0197-0 1, Sociologia 1. May, Tin, 1957~ I Tul. pp:301 9.6542 cDU:316 eee . Sumario . Prefécio 8 segunda edicéo, 7 Introdugéo: A sociologia como clsciplina, 11 deste lvto, 28 | Questdes para rfletir, 29 | SugestBes de litua, 27 Parte | Agao, identidade e entendimento na vida cot 1, Alguém com 08 ovtros, 33 Escolha, iberdade e convivéncia com os outros, 34|Alguém com outro: pperspectivas sociolégica, 40 Soializagio, import eso, 47 | Questies para relat, 49 | Sugestbes d 2, Observagéo e sustentagio de nossas vidas, 51 Furdamentando nossee vide: interagBo, entendimentoe distancia socal, 51 | Observande @ vivendo @ vida: fo (Quests pare refer 72 | Sugestées de litre, 73 3, Lagos: para falar em “nés", 75 Comunidades: forjar © consenso e lidar com o confit, 5 1 Céloulo, Parte! Viver nossa: 4. Decisdes e ages: poder, escolha e dever mor matvagso para agi, S. Alguém com os outros ‘Nao é rara em nossa vida a experitncia de nos ressentirmos do fato de sermos objeto de coercéo por citcunstincias sobre as quais percebemos nao ter controle. Em alguns momentos, Porém, afirmamos nossa liberdade em relagao a esse controle coma recusa de nos conformar as expectativas alheias, resistin. do a0 que consideramos indevida usurpaio de nossa liberdade, © — como se evidencia tanto ao longo da histéria quanto na atualidade ~ nos revoltamos contra 2 opressio. Ter a sensag0 de ser livre e concomitantemente néo ser, entretanto, é parte Comum de nossas experiéncias cotidianas —é também uma das quest6es que mais confuséo provocam, desencadeando sensa. es de ambivaléncia e frustracdo, tanto quanto de criativida. dee inovagao. Assinalamos na Introduso que vivemos em interacdo com outros individuos. © modo como isso se relaciona cdma ideia de liberdade na sociedade tornou-se objeto de farta produgao sociolégica. Em um nivel, somos livres para escolher e acom. Panhar nossas escolhas até o fim. Vocé pode levantar-se agora © preparar uma xicara de café antes de prosseguir a leitura des. te capitulo. Pode também optar por abandonar o projet de aprender a pensar com a sociologia e embarcar ém outra drea de estudo, ou mesmo abrir mao de estudar, ndo importa que assunto seja. Continuar a ler € uma das alternativas de cursos 3 Ea Agfo, dentidade ¢ entendimanto ne vida cotidiana de aco que atualmente Ihe estdo disponiveis. Sua habilidade para tomar decis6es conscientes 6, nesse sentido, um exercicio de sua liberdade, Escolha, liberdade e convivéncia com os outros Nossas escolhas, evidentemente, nem sempre sfo produto de decisSes conscientes, Como jé dissemos, muitas de nossas ages decorrem do habito e, como tal, nfo so alvo de escolha ampla € deliberada. Apesar disso, sempre hé quem nos relembre que nos- sas decisbes nos tornam responsiveis por qualquer resultado que produzam. £ comum ouvirmos: “Ninguém o obrigou a fazer isso. ‘Voce s6 pode culpar asi mesmo!” ‘De modo similar, se quebramos regras feitas para guiar a conduta das pessoas, podemos set punidos. Pretende-se que 0 ato de punicdo seja uma espécie de confirmagao da ideia de que somos responiséveis por nossas agdes. Nesse sentido, a5 regras orientam, além de nossas ages, também a coordenagao dessas ages com as de outras pessoas que podem, por sua ver, ante- cipar nossa provavel atitude nas diversas situagGes. Sem isso, a comunicagio e a compreensio de mensagens na vida cotidiana se tornam inconcebiveis. Em geral nos consideramos autores de nossos destinos ¢, portanto, dotados de poder para agir, determinar nossa conduta © controlar nossa vida. Teriamos, assim, a habilidade de moni- torar nossas agbes ¢ a capacidade de determinar seus resultados. Ser4 assim mesmo, porém, que a vida opera? Ha quem diga, por exemplo, que estar sem emprego € culpa pura ¢ exclusiva do desempregado, que se cle tivesse se esforcado 0 suficiente estaria ganhando a vida, Por outro lado, as pessoas podem reciclar-se € procurar emprego. Mas se, na regido em que vivem, houver uma taxa elevada de reducdo de postos de trabalho e elas néo tiverem como se mudar, apesar da constante procura, ndo ido ter oferta de vagas. Hé muitas situagbes equivalentes, nas quais nossa liber- dade para agir ¢ limitada por circunstancias sobre as quais néo Alguém com 0s outros 3 temos controle. Nesse sentido, portanto, uma coisa ¢ ter a habi- lidade de alterar ou modificar nossas competéncias, outra muito diferente é ser capaz de alcangar as metas que buscamos. Como isso se manifesta? Em primeiro lugar, podemos observar que situagbes de cescassez, como aquelas em que somos julgados pelos outros, limi- tam nossas potencialidades. Nem todas as pessoas que buscam ‘os mesmos objetivos conseguem conquisté-los, porque o mime- 10 de recompensas disponiveis € limitado, Nesse caso, compe- timos uns com 0s outros, e o resultado pode depender apenas parcialmente de nossos esforcos. ‘Ao buscar uma vaga na universidade, podemos descobrir que a concorréncia é de 20 candidatos por vaga disponivel, € que a maioria deles possui as qualificagées necessérias. Além disso, a faculdade talvez favoreca candidatos com determinada experiéncia social. Nossas ages, assim, tornam-se dependentes do julgamento de pessoas, uma avaliagdo sobre a qual exerce- ‘mos controle limitado. Essas pessoas estabelecem as regras do jogo e s20, ao mesmo tempo, os érbitros de seu cumprimento. Estio posicionadas por suas instituigbes para exercer um critério ¢, quando o fazem, estabelecem os limites de nossa liberdade, Fatores como esses, sobre os quais temos pouca ou nenhu- ‘ma ingeréncia, influenciam muito 0s resultados de nossos esfor- os, Nos nos tornamos dependentes de outros porque sao eles que pronunciam o veredicto quanto & suficiéncia de nossos s- forcos e avaliam se apresentamos as caracterfsticas certas para justificar nossa admissao. Em segundo lugar, fatores materiais conformam nossa capacidade de alcancar objetivos, Apesar da importincia do aspecto determinagio, o que dizer se nos faltam meios para cfetivar nossas decisées? Podemos passat a procurar emprego em lugares com maior oferta, mas logo descobrir que o prego dos iméveis e do aluguel nessas Areas est muito.além de nossas possibilidades. Do mesmo modo, querendo escapar a condigao de poluigdo e superpovoamento, podemos nos mudar para um local mais saudével e perceber que pessoas com mais dinheiro que nbs 6 ‘Aso, identidade e entendimento na vida cotciana ji fizeram isso antes, e a ideia jé deixou de ser viavel economica- ‘mente, Nesse processo, os mais abastados inflacionaram o preco das moradias, inviabilizando a compra de casa pelas popu- lagbes atrafdas por aquela drea. Pode-se dizer algo semelhante a respeito de educagao e satide, Algumas éreas possuem escolas ¢ hospitais mais bem-equipados, mas so muito distantes, e optar Por educacio particular e planos de satide privados esté além de nossas possibilidades. © que demonstramos aqui é 0 fato de que a liberdade de escolha ndo garante nossa liberdade de efetivamente atuar sobre essas escolhas nem assegura a liberdade de atingir os re- sultados desejados. Mais que isso, demonstramos que o exer- icio de nossa liberdade pode ser um limi verdade alheia. Para sermos capazes de agit livremente, precisamos ter mais do que livre-arbitrio, Muito comumente, nés pensamos limitados pelo dinhei- ro de que dispomos, embora também consideremos as fontes simbdlicas de limitagao. Nesse caso, nossa liberdade pode nao depender do que fazemos, mas de quem somos, no sentido de como 0s outros nos veem, Usamos 0 exemplo da universidade, ‘mas podemos também ser recusados em um clube ou nao con- seguir emprego pela maneira segundo a qual nossas qualidades sdo julgadas — por exemplo, de acordo com raga, etnia, sexo, dade ou deficiéncia, De forma alternativa, tornar-se sécio de um clube pode depender de conquistas passadas — habilidades desenvolvidas, qualificagdes, extensio dos servicos ou 0 modo de falar que nossa educacao nos fez adquitit. Essas sé0 conse- quéncias duradouras de escolhas, anteriores que, acumuladas, tem efeitos em agbes futuras. Nossa liberdade de agir no presen- te € desse modo confor mada por nossas circunstancias passadas © experiéncias acumuladas. Essas experiéncias acumuladas conformam também o modo como nos sentimos em relagao as situacdes em que nos envolvemos no presente. Podemos supor, voltando a nosso exemplo da universidade, que d a esperada, mas talver. nao es Alguém com os outros 7 Vindos de familia de classe baixa, podemos nos sentir pouco a vontade em meio a colegas de classe média. Ou, sendo ca- t6licos mais tradicionais, podemos nao aceitar o divércio e 0 aborto. Talvez seja nessa conjuntura que os grupos em meio 408 quais nos sentimos a vontade sejam aqueles que nossa liberdade, posto que restringem a gama de opini podemos suportar, Grupos formais e informais so frequentemente constitul- dos (como discutitemos adiante) pelas expectativas que langam sobre seus integrantes, Ao fazé-o,exeluem quem eles presumern nao viver segundo tais requisitos. Quando esses hiatos de com- preensio se instalam entre grupos, costumam ser preenchidos Por suposigoes estereotipicas. Assim, € possivel afirmar que 0 fato de podermos nos ajustar as condigdes de atuagao no inte- rior do grupo limita nossa liberdade, ao nos impedir de realizar experigncias pobremente mapeadas e impzevistas, encontradas para além dos os me assim, liberados para praticar nossa liberdade, sob a condigao, dos a ideias e territ6rios espectficos. porém, de ficarmos Com relagao as pré ‘mesmo tempo autorizados e constrangidos. Em um nivel, nos é { ensinado que hé tipos de desejos que 0 grupo considera aceité- eis e realizaveis. Maneiras apropriadas de agir, falar, vestir-se e comportar-se em geral fornecem a orientagio necesséria para a desenvoltura na vida dos grupos de que fazemos parte. Julgamo- nos, entio, de acordo com as expectativas, e nossa auttoestima é estabelecida segundo esse julgamento. Essas vantagens, contudo, sto facilmente transformaveis em problemas, quando nos aven- turamos além daquelas expectativas e estamos em um ambiente no qual se promovem diferentes desejos. Nessas circunstincias, formas alternativas de comporta- ‘mento podem ser consideradas apropriadas, e;assim, as cone- xOes entre condutas e intengées alheias, além de no serem Sbvias, nos parecem estranhas. A compreensdo que nos permite manter determinada conduta surge entao como limitacio acer- 8 Agio, identidade e entendimento na via cotidiana ca dos horizontes de nosso entendimento. O sociélogo francés Pierre Bourdieu, em seus abrangentes estudos da vida social, refere-se & disjungdo entre nossa percepgio de nés mesmos ¢ impos de aco nos quais nos encontramos, denominando-a Quando se dao essas disjuncoes entre nossas expectativas € nossa experiéncia, podemos refletir sobre a possibilidade de os grupos a que pertencemos no serem aqueles pelos quais opta- mos por livre escolha. Talvez integremos este ou aquele pura e simplesmenté por ali ter nascido, O grupo que nos define, nos ajuda a orientar nosso comportamento e se considera provedor de nossa liberdade pode nao ser aquele que escolhemos cons- cientemente e, assim, talver.se torne um convidado indesejado, Quando nele ingressamos, nio praticamos um ato de liberdade, ‘mas uma manifestagao de dependénc Nao optamos por ser franceses, espanhis, afto-caribenhos, ou de classe média. Podemos aceitar essa sorte com lade e resignagao, ou transformé-la em nosso destino, em entusidstico abraco da identidade de grupo ~ tornando-nos orgulhosos de quem somos e das expectativas lancadas sobre nds em consequéncia disso, ‘Transformar-nos, entretanto, exigiré grande esforgo contra jeradas indiscutiveis por aqueles que nos cercam. Autossactificio, determinagao ¢ persisténcia tomarao 0 lugar do conformismo a normas e valores do grupo. O contraste equivale a nadar a favor da maré ou contra ela. B assim que, apesar de nem sempre estarmos conscientes disso, nos tornamos dependentes dos outros: muito embora possamos nadat contra a corrente, fazemos isso numa diregao orientada ou conformada pelas expectativas e ages de quem esti fora do grupo com 0 qual estamos familiarizados. ‘As maneiras como agimos e nos percebemos sio confor- madas pelas expectativas dos grupos a que pertencemos, 0 que se manifesta de varios modos. Primeiro, hé os fins ou objetivos que estabelecemos com significado especial e nos quais conside- ramos valer a pena investir ~ eles variam de acordo com fatores, Sia ‘Alguém com os outros ” | tais como clase, raga ou género. Por exemplo, a maior parte das tarefas referentes a cuidar de alguém € desempenhada por mu- Iheres, ¢ assim, ha nitida tendéncia de elas gravitarem em torno de ocupagées especificas que recompensam esse aspecto, como enfermagem, magistério e servico social. Isso se apoia em supo- sigdes totalmente nao cientificas referentes & diviséo de trabalho entre homens e mulheres em termos dos tipos de caracterfsticas que supostamente cada um deles apresenta. Em segundo lugar, a maneira como esperamos concretizar esses fins é influenciada por outra manifestagio de expe: | de grupo, os meias aceitos para perseguir aqueles fins. Referimo- nos aqui &s condutas consideradas apropriadas a vida cotidiana. | A forma como nos vestimos, usamos nossos corpos, falamos, ‘mostramos nosso entusiasmo e até | fos efacas quando comemos so partes do modo como os grt- pos conformam a conduta de seus membros para que alcancem (seus oj Terceiro, assinalamos que os grupos, por sua vez, também | buscam identificar-se por ages que os distingam daqueles que esto fora de suas redes de relagdo formal e informal. Chama- mos de critério de relevdncia essa manifestagio que se refere 20 | fato de termos sido ensinados a distinguir os objetos ou pessoas | relevantes ou irrelevantes para os projetos de vida em que em- at aliados, inimigos, rivais, pessoas a quem | dar ouvidos ou desconsiderar é parte desse processo. } ‘Assim, devemos aos grupos a que pertencemos os bens que ‘buscamos, os meios empregados nessa busca ¢a maneira como dis- tinguimos quem pode e quem no pode colaborar nesse processo. Dessa forma, uma enorme quantidade de conhecimento pritico € adquirida, e sem ela nao seriamos capazes de conduzir nossas ati- vvidades cotidianas e nos voltar pata projetos de vida especificos. ‘Na maioria dos casos, trata-se de conhecimento t pois orienta nossa conduta sem que sejamos Hlecessariamente capazes de expressar como € por que ele opera de determina- das maneiras, Se, por exemplo, nos perguntarem que cédigos ‘usamos para nos comunicar e como deciframos os significados [ 40 Agto, identidae # entendimento na vida coticiana das agbes, podemos até nao entender o sentido da pergunta, De que forma explicamos 0s cédigos, tais como as regras de gra- ‘miética que proporcionam a comu: te como dados em nossas flues mesmo que nao possamos enunciar as regras que nos permite agit, podemos rotineiramente demonstrar nossas habilidades que dependem de sua existéncia, De fato, baseando-se nisso, Garfinkel fundou um ramo da s metodologia, que estuda as, consideradas taken-for-grantec : por exemplo, a to- ‘mada correta da vez de falar nas conversagdes, como iniciamos e conclufmos nossas frases e como atribuimos caracteristicas a pes- soas com base em seus modos de vestir e de mover o corpo no dia a dia, enfim, em seus gestos de rotina, E grasas a esse conhecimento de fundo, objeto de estudo dos etnometodélogos, que nos sentimos seguros em nossas acdes. Isso depende de esquecermos justamente as origens do saber que exerce esse poderoso controle sobre nds. Hle chega sob a forma de ‘uma atitude natural, suspendendo o tipo de questionamento que a microssociologia converte em objeto de pesquisa. Quando ‘amos a literatura sociolégica sobre saber social e vida co- ) abre-se uma fascinante érea de interesse que nos permite compreender mais sobre nossas interacées. Ao fazer isso, 0 que parecia autoevidente revela-se uma colecao de crencas variéveis de acordo com as caracterfsticas de grupo, tempo, local, espaco ¢ poder, Na préxima seco, examinaremos alguns desses insights em termos de como nos tornamos n6s mesmos com os outros. ci6logo americano Harold Alguém com 0 outro: perspectivas sociolégicas Um dos principais personagens que ofereceu uma compreensio de como internalizamos entendimentos de grupo foi o psicélo- Alguém com 08 outros a go social americano George Herbert Mead. Para ele, quem nds somos, nosso self, nfo é atributo com o qual tenhamos nascido, ‘mas um trago adquirido ao longo do tempo por meio de teragdes. A fim de compreender como isso ocorre, Mead di iu nossa percepsao do self em duas partes, 0 “Eu” e 0 “Mi argumentando que nossas mentes buscam uma “relagéo de tamento” com o mundo em que estamos. Isso, porém, nfo significa que simplesmente reflitamos as expectativas de nosso ‘grupo, porque (como vimos) também podemos agir no mundo, Para entender esse processo, Mead sugeriu que podemos chegar a conhecer nosso self por intermédio dos outros apenas por comunicagio simbélica. A linguagem nao ¢ apenas o meio pelo qual falamos, mas tam- ‘bém aquele com o qual nos ouvimos e avaliamos nossas aes ¢ fa- las de acordo com as respostas dos outros. Nesse sentido, o Eu pode ser pensado como uma “conversacao, que tem lugar dentro de nés, na qual a linguagem atua como meio que permite esse processo, bem como nos pensar como um “todo”, O Mim, por outro lado, refere-se ao modo como organizamos nossas expectativas de gru- po em nossas a¢Ges. Respondemos aos outros em termos de como 1hos vemos, o que é constantemente modificado de acordo com os diferentes parametros sociais de nossa rotina Esse processo se estabelece em trés etapas de nosso de- senvolvimento, Primeiro, o estagio preparatorio, em que nossa percepgio do self € passiva, posto que constituida de atitudes ‘que outros demonstram em relacdo a nés. A consciéncia, en- » se desenvolve rapidamente, e respondemos aos outros.com simbolos do grupo, que nos permitem definir nossa conduta em termos considerados apropriados para o cendrio. Em outras palavras, uma crescente consciéncia de nés é derivada das res- postas alheias, Nesse estgio, no podemos experimentar nosso self diretamente, mas s6 pelas respostas dos outros, 0 que, en- tretanto, inicia o proceso de nos tornarmos capazes de julgar nossas performances nas interagbes com os outros. Depois, como criangas no estdgio de atuagao, encenamos diferentes “outros’, na forma de papéis que, entretanto, nao so 2 Ago, Identidede ¢ entendimento na vida cotidiana interligados ¢ carecem de organizagdo global. Aprender uma linguagem e atrelar sentimentos a determinados papéis so pro- ccessos centrais nessa etapa. E nela as respostas dos outros sio novamente de grande relevancia na compreensio do que é importante encenar. Em terceiro lugar, a organizacdo das atitudes do grupo co- mega.a ser consolidada no estdgio do jogo ou de atuagio segundo as regras do jogo. Aqui, os papéis sio aprendidos por meio de sua relagdo com os outros. Embora uma variedade de “personagens” seja interpretida, as regras do jogo se tornam mais aparentes. Nosso cardteré, assim, construfdo pelo tratamento de nés como objetos de nossas prOprias acdes, uma vez que elas s40 compre- endidas pelas respostas dos outros & nossa performance, A ideia de self segundo Mead nao é a de ser passivo, Ativi dade e iniciativa marcam os dois lados da interacZo. Afinal, uma das primeiras habilidades aprendidas pela crianca ¢ como dlscri- minar e selecionar, traso que nao pode ser adquirido sem o su- porte da habilidade de resistir e suportar presses ~ em outras palavras, de assumir uma posigdo ¢ agir contra forgas externas, Por conta de sinais contrarios de varios outros significativos,* 0 Eu tem que ser posto de lado, distanciado, observando as pres- ses internalizadas pelo Mim, Quanto mais forte for o Eu, mais autOnomo se torna o caréter da crianga. A forga do Eu se expres- sana habilidade e na presteza da pessoa para colocar em teste as pressées internalizadas pelo Mim, verificando seus verdadeiros poderes e seus limites, dessa maneira desafiando-os e suportan- do as consequéncias. No curso dessa aquisicao, fazemos perguntas a nosso res- peito, ea primeira questo que se Volta sobre a individualidade € como formulou 0 filsofo francés Paul Ricoeur, “Quem sou eat” Nela, experimentamosa contradicio entre iberdade e depen. déncia como um conflito interior entre o que desejamos e aqui- Jo que somos obrigados a fazer por conta da presenca de outros “Ei inglés, signficane other, cutros dotados de significa do sett. (N-T) tegoria cunhada por Mead, que diz respeito aot que servem dereferéncia para oestabelecimento Alguém com os outros a signifcativos e suas expectativas em relacio a n6s. Hi, portanto, imagens de comportamento aceitavel que sio projetadas sobre nossas predisposi¢oes. Neste ponto, chegamos s interagoes entre 0 biol6gico € © social, Grandes somas de dinheiro tém sido gastas na tentativa de determinat as bases genéticas de diferentes aspectos do compor- tamento humano. Entretanto, as interpretagdes dos estudiosos influenciados pela teoria da evolucdo de Darwin diferem entre sia respeito de saber, por exemplo, até que ponto somos compe- titivos ou cooperatives por natureza, enquanto sabemos que as agbes ¢ 0 modo como sio avaliadas diferem de uma cultura para outra, Como observou o especialista em genética britinico Steve Jones, o termo mais problematico em genética ¢“para”—no sen- tido de que descobrir um gene pode sugerir que ele serve para ‘uma forma particular de comportamente. "Apesar desses argumentos ¢ das elevadas quantias destina~ das A pesquisa genética ~ ¢ as companhias farmactuticas se mo- bilizam em busca de lucros potenciais - a maioria dos intelec- tuais concordaria em passar para a sociedade a responsabilidade de estabelecer ¢ fortalecer os padres de um comportamento aceitavel, Sociedades e grupos desenvolvem, ao longo do tempo, ‘meios de controlar seus integrantes. Sigmund Freud, o fundador da psicandlise, sugeriu que os instintos jamais sAo domesticados, as “reprimidos" levados para o inconsciente. S40, assim, man- tidos no limbo pelo superego, como o conhecimento internali- zado das demandas e pressoes exercidas pelo grupo. Foi por essa razao que Freud descreveu o superego como uma “guarnigao numa cidade conquistada” pelas forgas vitoriosas da sociedade. © proprio ego fica em permanente suspensio entre dois pode ‘es: 0 instintos, ditecionados para o inconsciente, mas potentes € rebeldes; e 0 superego, que pressiona o ego a manter as puls6es no inconsciente e prevenir sua fuga do confinamento. ‘A sociéloga feminista e psicdloga americana Nancy Chodo- row alterou esse ponto de vista utilizando a chiamada teoria da relacio de objeto para analisar diferengas de género nos compro ‘metimentos emocionais. Apesar do fato de um filho demonstrat “amor primério” por sua mae, esse desejo é reprimido. Como re~ a Ago, identidado © entendimento na vids catidions sultado, ele abandona esse relacionamento rumo a um dominio no qual o elo com a mae € rompido, e aquele amor, reprimido. Ofilho torna-se, entdo, “o outro’, esua autonomia é conquistada por meio da repressao do desejo. Uma filha, por sua vez, experi- ‘menta um alinhamento, e sua percepgao do self nao € formada pelo processo de distingao em relacao a mae. Entra em jogo, ai a énfase de género na empatia, associada 4 menor preocupacao das mulheres para se diferenciar dos mundos de que elas so parte fundamental. Outros socidlogos seguiram a hipdtese de Freud. Norbert lias, que fundiu as intuigoes do pai da psicandlise com a pes- quisa hist6rica explicativa, sugeriu que nossa experiéncia do self decorre da dupla pressio & qual todos somos expostos. Nossa jé ci- tada atitude ambigua em relagdo a nés mesmos ¢ o resultado da posi¢do ambivalente na qual essas duas pressdes, agindo em dire- [es opostas, nos colocam, Logo, nao se discute a ideia de que todas as sociedades controlam as predisposigdes de seus membros ¢ se empenham em conter uma gama de interagdes admissiveis. Entretanto, até onde sabemos, ndo ha evidéncia conclusiva de que os seres humanos sejam naturalmente agressivos e tenham de sercolocados em cabrestos ou domados.O que tende ser interpre- tado como a erupeto da agtessio natural é muito habitualmente ‘um resultado de insensibilidade e raiva ~ambas as atitudes rastre- veis até suas origens mais sociais do que genéticas. Em outras palavras, embora seja verdade que os grupos treinem e controlem as condiutas de seus membros, disso nao decorre necessatiamente que eles tornem essas condutas mais humanas e morais. Isso sig- nifica apenas que, como resultado dessa vigilancia e dessa atitude correcional, a conduta se adapta melhor aos parametros co taveis em um dado tipo de grupo social. 1¢80, importancia e aco © proceso de formacio de nosso self e de como nossos instintos podem ot ndo ser suprimidos costuma ser denominado social- Alguém com os outros 8 ago. Somos socializados ~ transformados em seres capazes de viver em sociedade — pela internalizagio das coergbes sociais. Consideta-se que estamos aptos para viver e agir em grupo quando adquirimos as competéncias para nos comportar de maneira aceitével e, ento, somos considerados livres para as- sumir 2 responsabilidade de nossas ages. Quem so, porém, aquelas pessoas significativas com as quais interagimos e que, assim, nos socializam? Vimos que a forga realmente operante no desenvolvimento do self €a imagem infantil das intengdes e expectativas de outros significativos. De fato, a liberdade de uma crianca para fazer sele- «es em meio a essas expectativas no é completa, visto que algu- ‘mas pessoas podem forgar suas opinides sobre a percepsao que é da crianca mais efetivamente que outros em seus mundos. Apesat disso, a crianga nao pode evitar escolher, ainda que as demandas alheias sejam contraditérias e nda possam ser alcancadas simulta- neainente. Afinal, algumas delas exigem mais atencio que outras , assim, adquirem maior importancia em sua vida. A necessidade de conferir importancia diferencial a expec~ tativas, todavia, ndo ¢ restrita a criangas, Experimentamos esse tipo de demanda como rotina em nosso cotidiano. Corremos o risco de desagradar alguns amigos que estimamos e respeita- mos a fim de apaziguar outros, de quem igualmente gostamos. Por exemplo, sempre que expressamos opiniges politicas, haverd aqueles de quem gostamos que nao as apreciarao e aqueles que passardo por cima de ressentimentos contra nds por expressé-las. Atribuir relevancia dessa forma significa, inevitavelmente, a buir menos importancia ow até irrelevancia a outras opiniées. Esse risco aumentaré de acordo com o grau de heterogencidade do ambiente em que vivemos, ou seja, do quanto ele for caracte- rizado por diferentes pontos de vista, valores e interesses. Fazer uma selesdo a partir de nossos ambientes significa escolher grupos de referéncia, Trata-se de gruposem relacdo aos quais medimos nossas agdes e que fornecem os padroes a que aspiramos, O modo como nos vestimos, falamos, sentimos ¢ agimos em diferentes circunstincias constitui tragos conforma- 4% ‘AgEo, identidade e entendimento na vide cotidiana dos por nosso grupo de referéncia, O sociélogo canadense radi- cado nos Estados Unidos, Erving Goffman, sensivel observador da vida cotidiana, cujos livros oferecem fascinante compreen- so de nossas ades, escreveu sobre a importincia da “figura- a0” ou “trabalho da face” “Face” € definida como o valor que uma pessoa attela a suas ages em termos dos atributos que elas demonstra, Por sua vez, aqueles com os quais se busca iden- tificagao avaliardo essas demonstragSes, Um bom desempenho ‘profissional” ¢instancia em que a autoestima de uma pessoa € sua posigfo eth seu grupo podem ser reforcadas. Esses processos nao so sempre conscientes, nem hé neces- sariamente alguma ligagao entre nossas intengGes ¢ os resulta~ dos de nossas agdes. Como dissemas em relacio A comunicagao, aquilo que tencionamos pode nao estar alinhado com 0 que ocorre de fato, levando a frustragio e mal-entendidos. Alterna- tivamente, os grupos podem nio perceber nossos esforcos para imitar seus modos de conduta. Alguns séo agrupamentos de referencias normativas, posto que estabelecem as normas para ‘nossa conduta sem estar presentes em cada uma ¢ em todas as interagbes, De particular importincia em meio a esses grupos sio fa- lia, amigos, professores e nossos chefes no trabalho. Ainda que essas pessoas estejam na posigdo de responder a nossas ages, podem nao se tornar grupos de referéncia, 0 que s6 ocorre quando lhes atribuimos importincia. A desobediéncia no tra- balho pode ocorrer quando negligenciamos ou desprezamos as coergbes normativas langadas sobre nés por chefes ¢ optamos por seguir padrées que eles podem condenar. Podemos também. “bancar o indiferente” quando o grupo demanda envolvimen- to profundo ¢ paixdo. Assim, a fim de exercer sua influencia, € necessdrio algum grau de consentimento para que um agrupa- mento se transforme em grupo de referencia. Outra instincia de influéncia, além dos contextos imediatos de nossas agdes, sio os grupos de referéncia comparatives. Tra- ta-se de grupos aos quais nao pertencemos, ou porque estamos além de seu alcance, ou porque eles esto além do nosso. Assim, Alguém com 08 outros "7 “vemos” 0 grupo sem ser por ele vistos. Atribuir importancia, esse caso, € aco unilateral. Por conta da distancia entre nés ¢ eles, os integrantes do grupo sio incapazes de avaliar nossas ages e, logo, nao podem corrigir desvios nem nos cobrir de elo- gios. Nos tempos atuais, nos vemos crescentemente mobilizados diante de situagdes sobre as quais recebemos, pela midia, enor- mes quantidades de informagio, mais sob a forma de descrig6es do que por contato com os outros. ‘Como resultado, 0 papel de grupo de referencia compara- tivo na formacdo de nosso senso contemporaneo do self é mais, pronunciado. A midia transmite informagdes sobre as gltimas miodas e estilos com velocidade sempre maior, e alcangando os pontos mais distantes do globo, Nesse proceso, uma autoridade pode ser investida por conta do préprio estilo de vida que esses grupos tornam visualmente acessiveis e que pode levar a imita- do e A aspiragio de a eles pertencer. Sintese A socializagto nunca cessa em nossas vidas. Por essa razdo, 08 Sociélogos distinguem estagios de socializagao (primério, secun- dario e terciério) que produzem formas de interagao comple- xas ¢ transformadoras entre liberdade ¢ independéncia, Por exemplo, em algumas situagdes, quem foi criado em pequenas comunidades rurais pode sentir-se perdido em uma cidade estranha, na qual a indiferenca dos desconhecidos produz sen- timentos de desamparo exacerbados pelo volume do tréfego, pelas multidées em correria ¢ pela arquitetura. Risco ¢ con- fianga se mistucam, entdo, em diferentes graus, para potencia- lizar ou minar 0 que o sociélogo Anthony Giddens chamou de epuranga ontol6gica’ Por outro lado, hé também quem se sinta em casa nessa cidade, cujo anonimato facilita 0 movimento, € a diversidade pode servir de fonte de identidade. Ha ainda, porém, aquelas situagées sobre as quais os individuos nao t8m controle, O que “ Agio, identidade e entench 0 soci6logos chamam de condigdes macroestruturais pode ter consequéncias drasticas para todos nds. Um abatimento econd- ico repentino, a iminéncia de desemprego em massa, a explo- sto de uma guerra, a degradacao de poupangas de toda uma a por obra da inflacao violenta e a perda de seguranga pela ida do direito a algum beneficio em tempos de dificulda- des ~ estes sio apenas alguns exemplos. Essas mudangas tem potencial para colocar em duivida e mesmo minar as con tas de nossos padroes de socializacao ¢, entdo, requererem a ra- dical reconstrtigéo de nossas ages e das normas que orientam nossa conduta, De maneira menos espetaculosa, cada um de nés enfrenta diariamente problemas que demandam reajustes ou questionam nossas expectativas. Por exemplo, quando mudamos de escola ou de emprego, entramos para a universidade, deixamos de ser Solteiros ¢ nos tornamos casados, compramos uma casa prépria, ‘nos mudamos, nos tornamos pais ou cidadios de terceira idade, Gabe, portanto, pensar nas relagbes entre liberdade e depen- déncia como um processo continuo de mudanga e negociagao cujas interagdes complexas sao iniciadas ao nascermos € s6 se encerram quando morres Nossa liberdade também nunca esté completa. Nossas agées presentes sio conformadas e até configuram objeto de coersao Por parte de nossas agGes passadas. Rotiheiramente nos depa- tamos com escolhas que, apesar de atraentes, sfo inexequiveis, A liberdade tem um custo que varia com as circunstancias, ¢,na Procura de novas oportunidades e coisas as quais aspiramos, a Viabilidade e a probabilidade de uma “nova ruptura” tornam-se cada vez mais remotas depois de certa idade, Ao mesmo tempo, a liberdade as vezes é comprada com 0 Prego da maior dependéncia dos outros, Falamos sobre o papel desempenhado pelos recursos materiais e simbélicos no pro- cesso de fazer da escolha uma proposicdo vidvel e realista, bem como do fato de que nem todo mundo tem garantido o acesso a esses recursos, Assim, enquanto todas as pessoas so livres e nao podem ser outra coisa send livres ~ elas sdo obrigadas a assti- Alguém com 08 outros ” rir responsabilidade por tudo que fizerem -algumas sio mais livres que outras, porque seus horizontes e escolhas de ago sa0 ‘mais amplos, e elas, por outro lado, podem depender da restri- a0 dos horizontes de outros. Podemos dizer que a proporcio entre liberdade e depen déncia é um indicador da posigdo relativa ocupada na socie- dade por uma pessoa ou por toda uma categoria de pessoas. O que chamamos de privilégio parece ser, quando avaliado mais de perto, um grau mais elevado de liberdade e mais baixo de depen- déncia, Isso se manifesta de diferentes maneiras e por dife- rentes razées no processo em que sociedades e grupos buscam justificar seus estados de coisas a fim de legitimar suas respecti vas posigdes. Quando, entretanto, so criados hiatos em né conhecimento a respeito dos outros, eles frequentemente si0 pteenchidos com preconceito. A maneira como os sociélogos se debrucam sobre esses temas € 0 assunto para o qual nos vol- taremos no Capitulo 2. Questées para refletir 1. Quais sio os objetivos de sua vida e de que meios voce ters de dispor para alcangé-los? 2. Quais s4o os grupos de referéncia em sua vida e qual a rela- 0 entre suas agbes e as expectativas delest 3. Como voc8 vé o relacionamento entre liberdade ¢ depen- déncia? 4, Para vocé, qual é a relacio entre far estabelecemos para nés, sejam atingiveis ou nao? Analise essa uestdo em relagio ao “critério de relevancia” Sugestdes de leitura Bauman, Zygmunt. Freedom, Milton Keynes, Open University P 1988. ‘Analise a8 mesmas questées a que nos dedicamos nese capitulo

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