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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

FACULDADE DE DIREITO

ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS

Autores:
Carlos Eduardo Manso
Dilze Onilda de Lima
Flávia Chaves de Lima
Inácio Roberto Gonçalves
Juliana Nassif Arena
Maira Blini de Carvalho

Trabalho realizado para a disciplina


Direito Internacional Público II
Profª Elizabeth de Almeida Meirelles
4º Semestre – Turma T

São Paulo
Direito Internacional Público 2

Maio de 2004
Direito Internacional Público 3

ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS: Sinopse

1. O sistema da Organização das Nações Unidas - ONU

Em 1943, durante a conferência de Moscou, surgiu a primeira menção


quanto à necessidade de se criar uma organização internacional. Os chefes de
Estado Churchill, Stalin e Roosevelt resolveram, em fevereiro de 1945, alguns
pontos principais sobre a nova organização como o sistema de tutela, votação do
conselho de segurança, entre outros.

O próximo passo foi um convite dos Estados Unidos, URSS, Grã- Bretanha e
China para a Conferência de São Francisco a ser realizada do dia 25 de abril à 26
de junho de 1945. Os representantes de cinqüenta países encontraram-se nessa
Conferência, que teve o nome de “Conferência das Nações Unidas para a
Organização Internacional”, o nome Nações Unidas foi proposto por Roosevelt.
Nessa Conferência foi preparada a Carta da ONU que entrou em vigor em 24 de
outubro de 1945, devido a isso este dia tornou-se o dia das Nações Unidas.

Segundo Thomas M. Frank, a ONU tem duas finalidades, a primeira é


resolver litígios, mantendo a paz entre os Estados, e a segunda é mobilizar a
comunidade internacional para deter uma agressão. Pode-se acrescentar mais uma
finalidade que é a de promover respeito aos Direitos Humanos.

A ONU possui duas categorias de membros, os membros originários que são


os presentes na Conferência de São Francisco ou que haviam assinado a
Declaração da Nações Unidas em 1942; e os membros admitidos, que ingressaram
nela após a sua constituição. É necessário destacar que não há qualquer tipo de
distinção em relação aos direitos e deveres das duas categorias de membros.

Sua sede é localizada em Nova Iorque, apesar disso não ter sido
estabelecido na Carta, a Assembléia Geral optou por este local para a sede em
dezembro de 1946.
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A ONU possui seis órgãos: Conselho de Segurança, Conselho de Tutela1,


Secretariado, Corte Internacional de Justiça, Assembléia Geral e Conselho
Econômico e Social.

1.2. A Assembléia Geral e o Conselho Econômico e Social (CES)

 Assembléia Geral

Na Assembléia Geral estão representados todos os Estados membros que


tem direito a um voto, apesar de poderem designar para representá-los até cinco
delegados.

A Assembléia Geral não é um órgão permanente, ela acontece anualmente,


todas as terceiras terças-feiras de setembro, com exceções em caráter excepcional.
Podem existir Assembléias Extraordinárias a qualquer momento desde que sejam
convocadas “pelo Secretário Geral, a pedido do Conselho de Segurança ou da
maioria dos membros das Nações Unidas” (Carta da ONU, art. 20).

A Assembléia já se reuniu em várias cidades como Londres e Paris, mas


desde a sétima assembléia, esta tem ocorrido sempre em Nova Iorque.

As questões processuais são decidas por maioria simples, enquanto que as


questões importantes (estabelecidas pelo art. 18) o são por 2/3. A Assembléia
funciona por meio de comissões, onde estão representados todos os seus membros:
1ª Comissão – questões de segurança e política, inclusive a regulamentação de
armamentos e Comissão Política Especial (compartilha o trabalho da 1ª Comissão);
2ª Comissão – assuntos econômicos e financeiros; 3ª Comissão – questões sociais,
humanitárias e culturais; 4ª Comissão – questões de tutela e territórios dependentes;
5ª Comissão – questões administrativas e orçamentárias; 6ª Comissão – questões
legais. Possui, ainda, comitês, como o Comitê Geral formado por um presidente e 17
vice-presidentes da Assembléia Geral, e os sete presidentes das citadas Comissões,
para supervisionar os trabalhos da Assembléia. Nas Comissões, as decisões são
tomadas por maioria dos membros presentes e votantes.

1
O Conselho de Segurança foi extinto em 1º de novembro de 1994.
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A Assembléia tem as seguintes funções: a) discutir e fazer recomendações


sobre “quaisquer questões ou assuntos que estiverem dentro das finalidades da
presente Carta ou que se relacionarem com as atribuições e funções de qualquer
dos órgãos nela previstos” (art.10); b) discutir e fazer recomendações sobre
desarmamento e regulamentação de armamentos; c) “considerar os princípios gerais
de cooperação na manutenção da paz e segurança internacionais” e “fazer
recomendações relativas a tais princípios” (art.11); d) fazer estudos e
recomendações sobre cooperação internacional, nos diferentes domínios
econômicos, cultual e social, codificação e desenvolvimento do DI; e) recomendação
para a solução pacífica de qualquer situação internacional, etc.

A Assembléia cabe também inúmeras atribuições exclusivas como eleger o


membros não permanentes do Conselho de Segurança e os membros dos
Conselhos de Tutela e Econômico e Social; votar o orçamento da ONU; aprovar os
acordos de tutela; autorizar os organismos especializados a solicitarem pareceres à
CIJ; coordenar as atividades desses organismos, entre outros.

Devido a relativa paralisia do Conselho de Segurança, em virtude do poder de


veto dos cinco membros permanentes, destaca-se a possibilidade de Assembléia
assumir suas responsabilidades, como citado no Apud Handbook da ONU: “se o
conselho de segurança, devido à falta de unanimidade dos membros permanentes,
deixar de exercer sua responsabilidade primária para manutenção da paz
internacional e da segurança em qualquer caso em que haja ameaça à paz, violação
da paz, ou ato de agressão, a Assembléia Geral considerará a questão
imediatamente, com vistas a fazer as recomendações apropriadas aos Membros,
sobre medidas coletivas, inclusive no caso de violação da paz ou ato de agressão, o
uso da força armada quando necessário, a fim de manter ou restaurar a paz
internacional e a segurança”

 Conselho Econômico e Social


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É formado por 54 membros eleitos pela Assembléia Geral, por um período de


três anos, sendo eles 14 membros da África, 11 da Ásia, 10 da América Latina, 6 da
Europa Ocidental, e 13 entre os ocidentais ou a eles assimilados.

Suas decisões são tomadas por maioria simples. Ele se reúne duas vezes ao
ano, sendo uma em Genebra e uma em Nova Iorque, podendo haver sessão
extraordinária.

As principais funções desse Conselho são: a) é o órgão responsável da ONU,


sob a autoridade da Assembléia Geral, pelos assuntos econômicos e sociais; b)
prepara relatórios e estudos e faz recomendações nestes assuntos; c) convoca
conferência e prepara projetos de convenção sobre matéria econômicas e sociais; d)
promove o respeito e a observância dos direitos do homem e das liberdades
fundamentais; e) negocia os acordos entre a ONU e as organizações
especializadas, bem como coordena as atividades dessas organizações, etc.

Possui uma série de Comissões (cujos membros são eleitos pelo CES)
formadas por técnicos que o auxiliam nas suas funções, são elas as Comissões de :
Estatística; População; Social; Direitos Humanos; sobre a situação da Mulher; sobre
Narcóticos; e, sobre comércio internacional de produtos de Base. Nas duas últimas,
são os governos que indicam diretamente seus membros.

Há também as quatro Comissões Econômicas Regionais: Comissão


Econômica para a América Latina (CEPAL) – atualmente também para o Caribe,
com sede em Santiago do Chile; Comissão Econômica para a Europa (CEE), com
sede em Genebra; Comissão Econômica Social para Ásia e Pacífico, com sede em
Banguecoque; Comissão Econômica para África (CEA), com sede em Adisabeba.
Acrescenta-se, também, a Comissão Econômica para Ásia Ocidental, constituída em
1973 (antiga BESNUB).

Essas comissões regionais visam contribuir para o soerguimento da região e


reforçar as relações econômicas entre os países unidos pela geografia.

1.3. O Conselho de Segurança e o Sistema de Segurança Coletiva


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Criado para ser o principal órgão das Nações Unidas, compunha-se,


inicialmente, de onze membros (dos quais cinco eram permanentes China, EUA,
França, Reino Unido e URSS) e seis eleitos pela Assembléia Geral para um prazo
de dois anos e sem faculdade de reeleição para o período imediato. Em 1963,
contudo, a composição do Conselho de Segurança foi modificada e passou a ter 10
membros não permanentes, além dos mesmos cinco membros permanentes. Cada
membro do Conselho tem ali apenas um representante e apenas um voto.

O Conselho reúne-se periodicamente, podendo fazê-lo fora da sede da


Organização.

As decisões do Conselho são tomadas pelo voto afirmativo de nove dos seus
membros, quando se trata de questões processuais; e pelo voto afirmativo de nove
de seus membros, com a inclusão, entre estes, de todos os membros permanentes,
em todos os outros assuntos.

Essa exigência do voto afirmativo de todos os membros permanentes do


Conselho é o reconhecimento do chamado “direito de veto”, de qualquer deles
contra a maioria, ou até a unanimidade dos demais. O uso abusivo do direito de veto
paralisou durante muitos anos o Conselho e acabou por enfraquecê-lo com o
conseqüente fortalecimento da Assembléia Geral, que passou a opinar naqueles
assuntos em que o Conselho de Segurança não conseguia alcançar uma solução.

Deve abster-se de votar o membro do Conselho que for parte numa


controvérsia prevista no Capítulo VI da Carta da ONU (que possa vir a constituir uma
ameaça à paz e à segurança internacionais) ou numa controvérsia de caráter local,
a respeito da qual o Conselho deva tomar alguma resolução.

Qualquer membro das Nações Unidas que não for membro do Conselho
poderá tomar parte, sem direito a voto, na discussão de qualquer questão submetida
ao Conselho, se este considerar que os interesses do referido membro se acham,
especialmente, em jogo.

Analogamente, qualquer dos ditos membros ou qualquer Estado que não


pertença às Nações Unidas será convidado a participar, sem direito a voto, na
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discussão de qualquer controvérsia submetida ao Conselho, uma vez que seja parte
em tal controvérsia.

Segundo o art. 24 da Carta, os membros desta conferiram ao Conselho de


Segurança a principal responsabilidade na manutenção da paz e da segurança
internacionais e concordaram em que, no cumprimento dos deveres impostos por
essa responsabilidade, o Conselho proceda em nome deles.

Suas atribuições específicas são, essencialmente, as enumeradas nos


capítulos VI, VII, VIII e XII da Carta, dentre os quais se destacam: regulamentar os
litígios entre os Estados-membros da ONU; regulamentação de armamentos; agir
nos casos de ameaça e agressão; decidir “sobre as medidas a serem tomadas para
o cumprimento” das sentenças da CIJ. Cumpre-lhe, além disso, submeter à
consideração da Assembléia Geral, relatórios anuais e, quando necessário,
especiais.

Entre aquelas atribuições figuram as seguintes: convidar as partes em alguma


controvérsia e resolvê-la por algum meio pacífico; recomendar procedimentos ou
métodos de solução adequados para controvérsias ou situações que possam vir a
constituir uma ameaça à paz e à segurança internacionais; determinar a existência
de qualquer ameaça à paz, ruptura da paz ou ato de agressão e fazer
recomendações ou decidir medidas tendentes a manter ou restabelecer a paz e a
segurança internacionais; tomar a iniciativa para a negociação de acordos com os
membros da Organização sobre as forças armadas, a assistência e as facilidades
que cada um deles se comprometeu a propiciar ao Conselho para a manutenção da
paz e da segurança internacionais; fazer plano, com a assistência de uma comissão
de Estado-maior, para a aplicação das forças armadas de que possa dispor;
estimular o desenvolvimento da solução pacífica de controvérsias locais mediante
acordos ou entidades regionais e, eventualmente, utilizar tais acordos e entidades
para uma ação coercitiva, sob sua própria autoridade; aprovar os acordos de tutela
referentes às zonas designadas como estratégicas e fiscalizar a execução de tais
acordos, especialmente no tocante a matérias políticas, econômicas, sociais ou
educacionais.
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O Conselho de Segurança possui, ainda, poderes implícitos, não expressos


na Carta, Esta orientação foi consagrada a respeito da administração de Trieste,
quando do Tratado de Paz com a Itália2.

1.4. O Sistema de Tutela e o Conselho de Tutela. O Secretariado Geral.

Nos termos da Carta da ONU, o Conselho de Tutela deveria ser composto de


três categorias de Membros: 1) os que se encontrem à frente da administração de
territórios tutelados; 2) os membros permanentes do Conselho de Segurança que
não estiverem administrando territórios tutelados; 3) outros membros eleitos para um
período de três anos pela Assembléia Geral, em número suficiente para que o total
dos membros do Conselho de Tutela fique dividido em partes iguais, entre os
membros das Nações Unidas que administrem e os que não administrem territórios
tutelados. Na década de 90, o último território tutelado foi o de Palau (uma ilhado
Pacífico). Após isso, o Conselho de Tutela foi extinto, em 1º de novembro de 1994,
passando a Assembléia Geral a assumir suas competências, no que se refere ao
Sistema Internacional de Tutela (art.16 e Capítulo XII, da Carta da ONU).

O Secretariado Geral

É o órgão administrativo, por excelência, da Organização das Nações Unidas.


Tem uma sede permanente, que se acha estabelecida em Nova Iorque.
Compreende um Secretário-Geral, que o dirige e é auxiliado por pessoal numeroso,
o qual deve ser escolhido dentro do mais amplo critério geográfico possível.

O Secretário-Geral é eleito pela Assembléia Geral, mediante recomendação


do Conselho de Segurança. O pessoal do Secretariado é nomeado pelo Secretário-
Geral, de acordo com regras estabelecidas pela Assembléia.

Como funcionários internacionais, o Secretário-Geral e os demais


componentes do secretariado são responsáveis somente perante a Organização e
gozam de certas imunidades.

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Trieste seria internacionalizado e teria um governador nomeado pelo CS. Entretanto, ao Grandes – países com
poderes de veto – não chegaram a um acordo sobre o governador e o território foi entregue à Itália.
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O Secretário-Geral atua nessa qualidade em todas as reuniões da


Assembléia Geral, do Conselho de Segurança, do Conselho Econômico e Social e
do Conselho de Tutela, e desempenhará outras funções que lhe forem atribuídas por
esses órgãos.

Entre suas obrigações ordinárias, figura a de apresentar um relatório anual à


Assembléia Geral, sobre os trabalhos da Organização. Uma de suas mais
importantes faculdades é a de chamar a atenção do Conselho de Segurança para
qualquer assunto que, em sua opinião, possa ameaçar a manutenção da paz e da
segurança internacionais. O Secretário-Geral só é responsável perante a ONU, não
podendo, em conseqüência, receber instruções dos governos.

Dentre as funções do Secretariado, merece ser citado o art. 102, que prevê
que todo tratado firmado por Estado-membro deverá ser registrado e publicado pelo
Secretariado depois de ter sua entrada em vigor. A Convenção de Viena sobre o
Direito dos Tratados se ocupa da matéria minuciosamente nos art. 76 a 80.

2. As Organizações (Agências) Especializadas do Sistema das Nações Unidas

A Carta da ONU reproduziu o preceituado no Pacto da SDN (Sociedade das


Nações), no seu art. 57, que caracteriza as organizações especializadas como
aquelas “criadas por acordos intergovernamentais e com amplas responsabilidades
internacionais, definidas em seus instrumentos básicos nos campos econômico,
social, cultural, educacional, sanitário e conexos, e determina que serão vinculadas
às Nações Unidas, de conformidade com as disposições do art. 63.

Estes acordos, que são verdadeiros tratados internacionais, são preparados


pelo Conselho Econômico e Social (CES) e aprovados pela Assembléia Geral da
ONU, e eles determinam as relações entre tais organismos e a ONU (art.63). No
plano administrativo, tais acordos asseguram a uniformidade do estatuto de pessoal,
criam um fundo comum de pensões, etc.

A ONU exerce, com relação a esses organismos, uma função de


coordenação e cooperação através da CES (art.60). Tal cooperação é realizada pelo
Comitê Administrativo de Coordenação (CAC), criado em 1947.
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É de se assinalar que a ONU possui poder de iniciativa para a criação dessas


organizações (art. 59).

Essas organizações especializadas gozam de certa autonomia, apesar de


sujeitas à autoridade da ONU: a) desenvolvem atividades próprias no campo
internacional; b) têm sede diferente da ONU; c) possuem membros que não são da
ONU; d) sua estrutura administrativa é autônoma; e) possuem orçamento próprio; f)
possuem personalidade internacional.

Elas também podem pedir parecer à Corte Internacional de Justiça (CIJ)


desde que autorizadas pela Assembléia Geral.

Sua estrutura é geralmente formada por três órgãos: o Conselho, a


Assembléia e o Secretariado.

São as seguintes: Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA);


Organização Internacional do Trabalho (OIT); Organização das Nações Unidas para
a Alimentação e Agricultura (FAO); Organização das Nações Unidas para a
Educação, Ciência e Cultura (UNESCO); Organização Mundial de Saúde (OMS);
Fundo Monetário Internacional (FMI); Banco Internacional para a Reconstrução e
Desenvolvimento (BIRD); Associação Internacional de Desenvolvimento (AID);
Sociedade Financeira Internacional (SFI); Organização da Aviação Civil
Internacional (OACI); União Postal Universal (UPU); União Internacional de
Telecomunicações (UIT); Organização Meteorológica Mundial (OMM); Organização
Intergovernamental Marítima Consultiva (IMCO).

O Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT) não é uma organização


especializada, mas devido às suas relações com algumas destas organizações é
geralmente incluído entre elas.

A Organização Internacional de Refugiados (OIR), criada em 1946,


desapareceu em 1951, e a Organização Internacional do Comércio (OIC), prevista
na Carta de Havana, de 1948, não foi ainda constituída e está abandonada.

3. A Corte Internacional de Justiça


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A Corte Internacional de Justiça (CIJ), foi estabelecida pela Carta da ONU


como o principal órgão judiciário das Nações Unidas (art. 7º) e é constituída e
funciona de acordo com as disposições do seu Estatuto (sua composição está
disposta nos art. 2º ao 33).

A Corte é composta de um corpo de 15 juízes independentes, eleitos sem


atenção à sua nacionalidade, dentre pessoas que gozem de alta consideração
moral, não podendo figurar entre eles dois nacionais do mesmo Estado e sendo
eleitos pela Assembléia-Geral e pelo Conselho de Segurança. Serão considerados
eleitos, para um período de nove anos, os candidatos que obtiverem maioria
absoluta de votos. Nenhum membro da Corte poderá exercer qualquer função
política ou administrativa, ou dedicar-se a outra ocupação de natureza profissional e
não poderá ser demitido, salvo opinião unânime dos outros membros quando
deixado de preencher as condições exigidas. Os membros da Corte, quando no
exercício de suas funções, gozarão dos privilégios e imunidades diplomáticas, bem
como perceberão vencimentos anuais.

A sede da Corte será a cidade de Haia, e seu Presidente e seu Vice-


Presidente serão eleitos por um período de três anos. A Corte funcionará
permanentemente, exceto durante as férias judiciárias por ela fixadas. A Corte
poderá, em qualquer tempo, formar uma Câmara para tratar de uma determinada
questão, sendo que o número de juízes serão determinados pela Corte, com um
mínimo de três. As despesas da Corte serão custeadas pelas Nações Unidas da
maneira que for decidida pela Assembléia-Geral.

Já com relação à Competência da Corte, esta está disposta nos art. 34 ao 38


e determina que essa competência abrange todas as questões que as partes lhe
submetam, bem como todos os assuntos especialmente previstos na Carta das
Nações Unidas ou em tratados e convenções em vigor. A Corte só atua em litígios
em que as partes sejam Estados (são partes no seu Estatuto todos os membros da
ONU e ainda Estados que não fazem parte das Nações Unidas, como é o caso da
Suíça).

Os Estados Partes do presente Estatuto poderão, em qualquer momento,


declarar que reconhecem como obrigatória, ipso facto e sem acordo especial, em
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relação a qualquer outro Estado que aceite a mesma obrigação, a jurisdição da


Corte em todas as controvérsias de ordem jurídica que tenham por objetivo: a
interpretação de um tratado; qualquer ponto de direito internacional; a existência de
qualquer fato que, se verificado, constituiria violação de um compromisso
internacional; a natureza ou extensão da reparação devida pela ruptura de um
compromisso internacional.

A Corte, cuja função é decidir de acordo com o direito internacional as


controvérsias que lhe forem submetidas, aplicará as fontes do direito internacional,
não prejudicando a faculdade da Corte de decidir uma questão ex aequo et bono, se
as partes com isto concordarem.

As línguas oficiais da Corte serão o francês e o inglês. As questões serão


submetidas à Corte por notificação do acordo especial ou por uma petição escrita
dirigida ao escrivão, tendo o processo duas fases, sendo uma escrita e a outra oral.
Para a citação de outras pessoas que não sejam os agentes (consultores e
advogados), a Corte dirigir-se-á diretamente ao governo do Estado em cujo território
deva ser feita a citação. As audiências da Corte serão públicas, a menos que a
Corte decida e outra de outra maneira ou que as partes solicitem a não-admissão do
público. A Corte proferirá decisões sobre o andamento do processo, a forma e o
tempo em que cada parte terminará suas alegações, e tomará todas as medidas
relacionadas com a apresentação das provas.

A sentença deverá declarar as razões em que se funda, e deverá ser lida em


sessão pública depois de notificados, devidamente, os agentes. A decisão é
definitiva e inapelável, e só será obrigatória para as partes litigantes e a respeito do
caso em questão. O pedido de revisão de uma sentença só poderá ser feito em
razão do descobrimento de algum fato suscetível de exercer influência decisiva, e
antes de 10 anos após a sentença. A menos que seja decidido em contrário pela
Corte, cada parte pagará suas custas no processo.

4. A Organização Internacional do Trabalho

 Criação: principais objetivos


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A criação da OIT foi prevista na Conferência da Paz de 1919, que aprovou o


Tratado de Versailles. A Parte XIII do citado tratado (elaborado pelas nações
vitoriosas na 1ª Guerra Mundial) enunciava os princípios gerais que deveriam guiar a
política da Sociedade das Nações no campo do trabalho. Assim afirmava o seu
preâmbulo: “a sociedade da Nações tem por objetivo estabelecer a paz universal,
que não pode ser fundada senão sobre a base da justiça social” (...) existem
condições de trabalho que implicam para um grande número de pessoas em
injustiça, miséria e privações” (...) a não adoção por uma nação qualquer de um
regime de trabalho realmente humanitário é um obstáculo aos esforços dos demais,
desejosos de melhorar a sorte dos trabalhadores nos seus próprios países”.

Conforme ressaltou Nicolas Valticos, esse preâmbulo, que de forma


ligeiramente modificada ainda é o da Constituição atual da OIT, continha o essencial
da tríplice justificação de uma ação legislativa internacional sobre as questões de
trabalho: política (assegurar bases sólidas para a paz universal), humanitária
(existência de condições de trabalho que geram injustiça, miséria e privações) e
econômica (o argumento inicial da concorrência internacional como obstáculo para a
melhoria das condições sociais em escala nacional, ainda que invocado agora em
último lugar).

O tratado então celebrado consagrou o Direito do Trabalho como novo ramo


da ciência jurídica e criou a OIT, com a participação de representantes dos
empresários e dos trabalhadores na sua assembléia e no seu órgão colegiado de
administração, para universalizar os respectivos princípios.

Características

O texto original da Constituição da Organização foi reformado em outubro de


1946, após a criação da ONU. A OIT, que antes fora parte da Sociedade das
Nações (SDN), mas que, pouco a pouco, conquistou sua autonomia e obteve o
reconhecimento da sua obra, teve então afirmada, expressamente, sua
independência jurídico-institucional. Por conseguinte, ela é uma pessoa jurídica de
direito público internacional, de caráter permanente, constituída de Estados, que
Direito Internacional Público 15

assumem, soberanamente, a obrigação de observar as normas constitucionais da


organização e das convenções que ratificam, integrando o sistema das Nações
Unidas como uma das suas agências especializadas.

A OIT é uma associação de Estados, mas não uma entidade supra-estatal; e,


como acentuou Plá Rodriguez, “possui uma composição tripartite que impede sua
inclusão em qualquer categoria jurídica conhecida antes de sua criação”.

 Membros e estrutura

A OIT conserva a estrutura orgânica com que foi criada em 1919, a saber: a
Conferência Internacional do Trabalho; o Conselho de Administração (CA); e, a
Repartição Internacional do Trabalho (RIT).

Integram ainda a organização, funcionando com relativa autonomia (direção e


orçamentos próprios), o Instituto Internacional de Estudos Trabalhistas, sediado em
Genebra, e o Centro Internacional de Aperfeiçoamento Profissional e Técnico, com
sede em Turim. Outrossim, além dos comitês e comissões que funcionam no CA e
na RIT, a OIT participa de órgãos instituídos com a ONU, a OMS e a UNESCO.

A Conferência, o Conselho de Administração e quase todos os órgãos


colegiados e reuniões da OIT são constituídas de representantes de governos, de
associações sindicais de trabalhadores e de organizações de empregadores.

Segundo Albert Thomas, o tripartismo da OIT corresponde a “um


compromisso entre a representação dos Estados, como tal, e a representação dos
indivíduos e dos grupos que compõem a comunidade internacional.

 Finalidades e competência

A OIT possui expressa competência para tratar de questões que visem à


justiça social, no seu mais largo conceito, tendo em vista o progresso material e
espiritual do ser humano, em condições de liberdade e dignidade, com segurança
econômica e iguais oportunidades. Consagra-se, portanto, o correto entendimento
de que a paz não é apenas a ausência de guerra, vinculando seu conceito a uma
Direito Internacional Público 16

ordem internacional com justiça social, onde os direitos fundamentais do homem não
sejam afrontados pelo subdesenvolvimento econômico que gera a miséria entre
grandes continentes humanos e a instabilidade política dos respectivos Estados.

A OIT deverá fomentar também: a plenitude do emprego e a elevação dos


níveis de vida; a formação profissional e a garantia de iguais oportunidades
educativas e profissionais; a colaboração entre empregadores e empregados na
preparação e aplicação das medidas sociais e econômicas; à proteção à infância e à
maternidade e a promoção de alimentos, habitação, recreação e cultura adequados.
Deverá ainda colaborar com os demais organismos internacionais competentes
visando à adoção de medidas sobre a expansão da produção e do consumo, sem
graves flutuações, o progresso econômico e social das regiões menos
desenvolvidas, o favorecimento de um comércio internacional com um volume
elevado e constante, a melhoria da saúde, o aperfeiçoamento da educação e o bem-
estar de todos os povos.

Resta claro que é amplíssima a competência da OIT, porque: ex ratione


materiae, não se limita a questões específicas do Direito do Trabalho e da
Previdência Social; e, ex ratione personae, não se circunscreve aos sujeitos da
relação de emprego, às associações sindicais e às pessoas vinculadas aos sistemas
de seguro social.

 As convenções da OIT e sua importância

Compete à Conferência Internacional do Trabalho, como assembléia geral da


OIT, elaborar e aprovar as normas que constituem a regulamentação internacional
do trabalho, da seguridade social e das questões que lhe são conexas, com a
finalidade de fomentar a universalização da justiça social. Essa atividade normativa,
que se instrumentaliza por meio de convenção e recomendações, é a principal razão
de ser da Organização.

As convenções, uma vez ratificadas, constituem fontes formais de direito,


gerando direitos subjetivos individuais, nos países onde vigora a teoria do monismo
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jurídico e desde que não se trate de diploma meramente promocional ou norma que
necessite de leis nacionais ou outras medidas para se tornarem aplicáveis.

Desta forma, as convenções da OIT são tratados3 multilaterais abertos, de


caráter normativo. Multilaterais, porque podem ter um número irrestrito de partes;
abertos, porque podem ser ratificados, sem limitação de prazo, por qualquer dos
Estados-membros da OIT, ainda que esse Estado não integrasse a Organização
quando da aprovação do tratado (o simples fato de estar filiado à OIT permite ao
país aderir a qualquer das convenções até então adotadas, salvo as que forma
revistas por outras e que, por esse motivo, não mais permanecem abertas à
ratificação); de caráter normativo, porque contêm normas cujo destino é a
incorporação ao direito interno dos países que manifestaram sua adesão ao
respectivo tratado.

A importância das convenções da OIT reside principalmente na influência de


tais normas que poderá efetivar-se de diversas formas: a) influência
independentemente de ratificação, seja por indução indireta, quando um país se
inspira, no ato de legislar, em disposições constantes em outras legislações, elas
mesmas inspiradas nas normas internacionais, seja por indução direta, quando o
legislador é norteado imediatamente por elas; b) influência motivada pela ratificação
de uma convenção em suas duas modalidades, de normas internacionais auto-
executivas e de espontânea ação de harmonização; c) influência por ação de
controle internacional.

5. Regulamentação das Relações Econômicas Internacionais: o Grupo Banco


Mundial e o FMI

 Fundo Monetário Internacional - FMI

O FMI é uma conciliação dos planos White e Keynes (elaborados durante


a 2ª GGM). Keynes, no seu projeto, propunha que o FMI pudesse criar uma moeda
3
As expressões “convenção” e “tratado” são sinônimas, mas a tendência do direito comparado é a de reservar a
primeira para os tratados multilaterais abertos adotados em conferências realizadas no âmbito de organismos
internacionais ou regionais de direito público.
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internacional específica. As dívidas da Inglaterra seriam pagas nessa moeda e não


em uma moeda nacional, como o dólar, cuja emissão não era controlada por ela. O
plano Keynes visava mais objetivos de ordem interna, como pleno emprego, etc.
Este plano poderia ser o “embrião de um futuro governo econômico do mundo”.
Havia nele um abandono importante de soberania. O plano White visava a liberação
do comércio, a estabilidade do câmbio e os pagamentos internacionais.

Foi criado em 1945 e tem como objetivo básico zelar pela estabilidade do
sistema monetário internacional, notadamente através da promoção da cooperação
e da consulta em assuntos monetários entre os seus 181 países membros.
Juntamente com o BIRD, o FMI emergiu das Conferências de Bretton Woods4 como
um dos pilares da ordem econômica internacional do pós-Guerra. O FMI objetiva
evitar que desequilíbrios nos balanços de pagamentos e nos sistemas cambiais dos
países membros possam prejudicar a expansão do comércio e dos fluxos de capitais
internacionais. O Fundo favorece a progressiva eliminação das restrições cambiais
nos países membros e concede recursos temporariamente para evitar ou remediar
desequilíbrios no balanço de pagamentos. Além disso, o FMI planeja e monitora
programas de ajustes estruturais e oferece assistência técnica e treinamento para os
países membros.

A autoridade decisória máxima do FMI é a Assembléia de Governadores,


formada por um representante titular e um alterno de cada país membro, geralmente
ministros da economia ou presidentes dos bancos centrais. A diretoria executiva,
composta por 24 membros eleitos ou indicados pelos países ou grupos de países
membros, é responsável pelas atividades operacionais do Fundo e deve reportar-se
anualmente à Assembléia de Governadores. A diretoria executiva concentra suas
atividades na análise da situação específica de países ou no exame de questões
como o estado da economia mundial e do mercado internacional de capitais, a
situação econômica da instituição, monitoramento econômico e programas de
assistência financeira do Fundo. A Assembléia de Governadores do FMI é
assessorada ainda pelo "Comitê Interino" e pelo "Comitê de Desenvolvimento"
(conjunto com o BIRD), que se reúnem duas vezes por ano e examinam assuntos
4
Os acordos de Breton Woods foram os primeiros tratados internacionais com conteúdo econômico e financeiro,
com vocação mundial.
Direito Internacional Público 19

relativos ao sistema monetário internacional e à transferência de recursos para os


países em desenvolvimento, respectivamente.

O auxílio financeiro é feito mediante um intercâmbio de moedas. O país-


membro entrega a sua moeda na quantidade correspondente à moeda estrangeira
que ele vai receber e no prazo de 3 anos ou 5 (no máximo) ele deve resgatar a sua
moeda com pagamento em ouro ou em moeda que o FMI aceite. O “empréstimo” é
dado em condições, como o controle dos salários e uma restrição ao crédito.

Maiores quotistas (cada Estado tem uma quota-parte, que inlfuencia o número
de votos e que são revistas a cada 5 anos): EUA, Japão, Alemanha, Grã-Bretanha e
França. O Brasil é país membro fundador do FMI e possui hoje 1,47% do poder de
voto do organismo.

 Banco Mundial - BIRD

O Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD) foi


criado em 1945 e conta hoje com 180 países membros. Juntamente com a
Associação Internacional de Desenvolvimento (IDA), instituída em 1960 e destinada
a prover assistência concessional aos países de menor desenvolvimento relativo.

O BIRD constitui o Banco Mundial (denominação dada, pelo imprensa anglo-


saxônica) organização que tem como principal objetivo a promoção do progresso
econômico e social dos países membros, mediante o financiamento de projetos com
vistas à melhoria da produtividade e das condições de vida desses países. O BIRD
utiliza recursos obtidos principalmente no mercado internacional de capitais, mas
também possui recursos próprios. Somente aqueles países membros do Fundo
Monetário Internacional (FMI) podem fazer parte do BIRD.

Em 1956, foi estabelecida a Corporação Financeira Internacional (IFC), cuja


função básica é promover o desenvolvimento econômico dos países membros
através do crescimento e fortalecimento do setor privado. A IFC não aceita garantias
governamentais para os projetos financiados e também atua mediante a compra de
participações em investimentos privados. Em 1988, criou-se a Agência Multilateral
de Garantias de Investimentos (MIGA), que objetiva oferecer garantias contra riscos
Direito Internacional Público 20

não-comerciais para investimentos estrangeiros nos países membros. O BIRD, a


AID (Associação Internacional de Desenvolvimento) e a MIGA formam o Grupo
Banco Mundial. Ainda que os quatro organismos sejam instituições legalmente e
financeiramente separadas, compartilham serviços administrativos do BIRD e, no
caso da AID, também recursos de pessoal.

Para o desenvolvimento de suas atividades o BIRD conta com um presidente


e um corpo de 24 diretores-executivos, apontados ou eleitos pelos países ou por
grupos de países membros. A Assembléia de Governadores, formada geralmente
por ministros da economia ou de finanças, reúne-se anualmente, ocasião em que
são revistas as atividades do ano fiscal precedente e traçadas as linhas gerais de
atuação do Banco para o período seguinte. A redução da pobreza e a promoção do
desenvolvimento sustentável são os focos da atuação do BIRD, que tem se
dedicado crescentemente à promoção da gestão governamental eficaz e do
fortalecimento da sociedade civil, do investimento em setores de infra-estrutura e
serviços e do incentivo ao desenvolvimento do setor privado.

Observa-se que os acordos de empréstimos são regidos pelos estatutos do


BIRD (considerados normas de DIP), bem como por normas gerais do DIP, e são
registrados na ONU. Quando surgem litígios em torno de empréstimos, eles são
resolvidos amigavelmente ou por tribunal arbitral especial. A política do BIRD é só
dar empréstimo aos Estados que mantém em ordem seus pagamentos de dívidas
públicas externas, bem como àqueles que pagam indenização em caso de
nacionalização. É, no fundo, um meio de fazer política dos países exportadores de
capital. O BIRD recusa empréstimos para a criação ou desenvolvimento de
empresas do Estado e só os concede em casos especiais “quando o capital privado
está ausente e o banco se assegurou de que a participação do governo não trará
prejuízos”.

A sua sede é no Estado-membro que possui maior número de quotas, os


EUA, controlando 20,9% dos votos do BIRD. Fica em Washington, D.C.
Direito Internacional Público 21

A nova ordem econômica internacional

O Sistema Bretton-Woods, que formou a nova ordem econômica


internacional, não tem dado muita atenção aos países em desenvolvimento. Já que
a filosofia do sistema é baseada na liberdade e igualdade de concorrência, o
benefício gerado pela ordem econômica internacional é praticamente exclusivo dos
países industrializados. Aliás, desde que não haja mecanismo internacional que
possa exercer o papel de redistribuidor das riquezas adquiridas por essa ordem
econômica internacional, justamente para os países em desenvolvimento e para os
países pobres, a má distribuição da riqueza começa a ameaçar a paz internacional.

Os países em desenvolvimento reclamam pela reforma do sistema econômico


internacional, pedindo, a princípio, o direito soberano de explorar os recursos
naturais e o direito de desenvolver-se (com ajuda obrigatória dos países
industrializados).

Entretanto, a Nova Ordem Econômica Internacional (NOEI) varia muito,


dependendo da sua aplicação nas diversas áreas. De qualquer modo, o primeiro
acerto foi a assistência financeira (a meta foi 0,7% do PIB) que os países em
desenvolvimento alegaram ter o direito de receber, já que é uma compensação pela
exploração.

Se a NOEI é a noção econômica e política, a sua forma legal é o Direito


Internacional de desenvolvimento. Entretanto, desde que a aplicação da NOEI é
muito ampla, O Direito Internacional de Desenvolvimento tenta explorar o que é
aceitável pelo conceito do direito internacional.

Assim, o DI de desenvolvimento é baseado no reconhecimento da


desigualdade econômica dos países soberanos, ou seja, em termos da NOEI,
significa o reconhecimento do direito do Estado e do povo de existir e se
desenvolver. O mito do princípio da igualdade formal foi substituído pela igualdade
real. Assim, soberania não é mais a simples defesa da soberania política, mas sim o
princípio pelo qual se recupera o direito da igualdade econômica e, portanto, o
direito ao desenvolvimento econômico.
Direito Internacional Público 22

6. Regulamentação das Relações Comerciais Internacionais : o GATT e a OMC.

 Acordo Geral de Tarifas e Comércio – GATT

O Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT) não é propriamente uma


organização especializada da ONU mas, devido às suas relações com estas
organizações, ele é incluído entre elas, porém não é uma organização internacional.
O GATT não assinou qualquer acordo com a ONU, entretanto, surgiu em uma
conferência convocada pelas Nações Unidas (Conferência de Genebra de 1947,
entrando em vigor em 1948). Ela prevê uma série de princípios que regem as
relações comercias entre os Estados, como o de igualdade econômica, e condena a
discriminação.

O GATT foi criado pela diplomacia dos EUA, inspirada em Cordel Hull, pois
este considerava que a eliminação das barreiras comercias acarretaria maior
desenvolvimento mundial que contribuísse para a paz. Suas principais funções são:
promover o pleno emprego; incrementar o comércio internacional; e aumentar o
padrão de vida. As rodadas de negociação do GATT tem como objetivo promover
negociações e discussões do que causa desequilíbrio no comércio internacional.

O tratado do GATT de 1947 tinha várias limitações: 1) não estavam


abrangidos os produtos agrícolas, os serviços e os têxteis; 2) os países do 3º e 4º
mundos se beneficiavam de normas especiais; 3) dentro de certas condições, o
comércio no interior das zonas de livre comércio e nas uniões aduaneiras não
estava sujeito às normas gerais.

Por sua vez, as normas que regem atualmente o comércio internacional são
objeto de várias criticas: a flutuação das taxas de câmbio elimina os efeitos das
medidas tomadas pelo GATT; o multilateralismo não se adapta à sociedade
internacional, que tem grandes diversidades; os EUA tem grandes vantagens, como
o tamanho de seu mercado e o seu poder político, que lhe permite adotar a
retorsão; as estratégias das empresas são mais importantes do que as dos Estados.

Tem sido assinalado que o GATT, de 1994, não torna inteiramente caduco o
GATT de 1947. As regras específicas do GATT de 1994 prevalecem sobre as de
1947, não sendo os acordos de 1994 uma ruptura fundamental com o de 1947.
Direito Internacional Público 23

 Organização Mundial de Comércio – OMC

A Organização Mundial de Comércio (OMC), surgiu na assinatura da Ata Final


da Rodada Uruguai, em 15 de abril de 1994, de um acordo concluído em
Marraqueche. A sua estrutura é formada por uma Conferência Ministerial,
constituída por representantes dos Estados, que visa ratificar as negociações
comercias (reunindo-se a cada 2 anos); um Conselho Geral que supervisiona as
decisões da Conferência; e por Órgãos do Conselho (Conselho de Mercadorias,
Conselho de Serviços, Conselho de propriedade intelectual, Órgão de Solução de
Controvérsias e Órgão de Exame das Políticas Comerciais), tendo sua sede em
Genebra.

A OMC tem por objetivo ser a moldura para a condução das relações. Ela
será o foro para as negociações entre os membros, bem como "administrará o
entendimento relativo às normas e procedimentos que regem a solução de
controvérsias" e cooperará com o FMI e o BIRD.

No GATT, os países tinham maior liberdade para serem protecionistas. Já a


OMC estabelece regras de comércio liberal, só havendo obrigação do tratado de
nação mais favorecida, especialmente, na área de serviços. As regulamentações
internas devem ser imparciais.

A OMC não é uma organização especializada na ONU e o seu acordo não


menciona os países em desenvolvimento.

7. A Organização dos Estados Americanos e o Sistema Interamericano de


Direitos Humanos

 Organização dos Estados Americanos – OEA

A OEA foi criada pela IX Conferência Internacional de Estados Americanos


(Bogotá, maio de 1948), com base em mandato contido na Resolução IX da
Conferência Internacional Interamericana sobre os Problemas de Guerra e Paz
(México, 1945). A referida Resolução encomendava a reorganização, consolidação e
Direito Internacional Público 24

fortalecimento do Sistema Interamericano. Da referida Conferência, emanaram


importantes documentos do sistema interamericano, como a própria Carta da OEA,
o Tratado Americano de Soluções Pacíficas, conhecido como Pacto de Bogotá, e a
Declaração Interamericana de Direitos e Deveres do Homem, assinada sete meses
antes da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Como um dos mais antigos organismos regionais do mundo, a OEA


atravessou um século em busca de soluções para os principais problemas do
Continente, mostrando notável capacidade não só de adaptação à conjuntura
histórica mas até mesmo de inovação. Encontra-se atualmente em processo de
revitalização, marcado por novas perspectivas de atuação, ao lado de novos
desafios. A partir da década de 90, a ênfase no fortalecimento da democracia
marcou os trabalhos da Organização, ocorrendo, ao mesmo tempo, uma atualização
de sua agenda política, resultante do novo quadro internacional. Assim, a OEA
passou a atuar mais intensamente em áreas de interesse de seus Estados-
membros, tais como o comércio e integração, controle de entorpecentes, repressão
ao terrorismo, corrupção, lavagem de dinheiro e preservação do meio-ambiente.

O Brasil foi um dos 21 primeiros signatários da Carta da OEA, cujo artigo 1º


define a Organização como um organismo regional dentro das Nações Unidas,
criado para conseguir uma ordem de paz e justiça, para promover a solidariedade de
seus integrantes, intensificar a colaboração entre eles e defender a soberania, a
integridade territorial e a independência dos Estados americanos. A Carta
estabeleceu como propósitos essenciais da Organização: garantir a paz e segurança
continentais; prevenir as possíveis causas de dificuldades e assegurar a solução
pacífica de controvérsias entre seus membros; organizar a ação solidária destes em
caso de agressão; procurar a solução dos problemas políticos, jurídicos e
econômicos que surgissem entre os Estados-membros; e promover, por meio da
ação cooperativa, seu desenvolvimento econômico, social e cultural.

São Estados-membros, atualmente em número de 35: Antígua e Barbuda,


Argentina, Bahamas, Barbados, Belize, Bolívia, Brasil, Canadá, Chile, Colômbia,
Costa Rica, Cuba (cujo Governo está suspenso desde 1962), Dominica, El Salvador,
Equador, Estados Unidos, Granada, Guatemala, Guiana, Haiti, Honduras, Jamaica,
Direito Internacional Público 25

México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana, São Cristóvão


e Nevis, Santa Lúcia, São Vicente e Granadinas, Suriname, Trinidad e Tobago,
Uruguai e Venezuela. Há 45 Observadores Permanentes na OEA. O Secretário-
Geral da Organização é o colombiano Cesar Gaviria Trujillo, que iniciou, em 1º de
janeiro de 2000, seu segundo mandato de cinco anos (até 1º de janeiro de 2005).

As estruturas da OEA – Corpo de Governo – são: a Assembléia Geral, o


Conselho Permanente e o Conselho Interamericano de Desenvolvimento Integral –
CID. Para coordenação e cooperação com outras organizações, a OEA conta com:
Fundo Interamericano de Assistência para Situações de Emergência; Secretaria
Executiva para o Desenvolvimento Integral; Subsecretaria de Assuntos Jurídicos;
Subsecretaria de Administração Fundo Interamericano de Assistência para
Situações de Emergência; Secretaria Executiva para o Desenvolvimento Integral;
Subsecretaria de Assuntos Jurídicos; e, Subsecretaria de Administração.

São organismos especializados da OEA: a Organização Pan-Americana de


Saúde (OPAS), o Instituto Interamericano da Criança (IIC); a Comissão
Interamericana das Mulheres (CIM); o Instituto Pan-Americano de Geografia e
História (IPGH); o Instituto Interamericano do Índio (III); o Instituto Interamericano
para Cooperação para a Agricultura (IICA).

A Organização dos Estados Americanos é o principal foro de concertação


política do hemisfério e o eixo de gravitação do sistema interamericano. Seus
Estados-Membros conformam uma das principais vertentes da política externa
brasileira, e nisto consiste sua importância para o Brasil.

Os princípios historicamente defendidos e observados pela diplomacia


brasileira na OEA são a autodeterminação, a não-intervenção, a solução pacífica de
controvérsias e o não uso da força. Ademais, a atuação do Brasil há muito privilegia
a promoção da democracia, da paz e do desenvolvimento.

O Brasil reconhece que a OEA, que já teve à frente de seu Secretariado-


Geral um brasileiro, o Embaixador Baena Soares, ocupa posição de destaque para
tratar regionalmente desses problemas e, nesse contexto, participa atentamente das
discussões em torno de itens relevantes da agenda interamericana.
Direito Internacional Público 26

 O Sistema Interamericana do Direitos Humanos - CIDH

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) é uma das


entidades do sistema interamericano de proteção e promoção dos direitos humanos
nas Américas. Tem sede em Washington, D.C. e o outro órgão é a Corte
Interamericana de Direitos Humanos, com sede em São José, Costa Rica.

A CIDH é o órgão principal e autônomo da OEA, que surgiu da Carta da


Convenção Americana sobre Diretos Humanos, e que atua na representação de
todos os países membros da Organização. Está integrada por 7 membros
independentes e autônomos, que não representam nenhum país em particular e são
regidos pela Assembléia Geral.

Em abril de 1948, a OEA aprovou a Declaração Americana dos Direitos


e Deveres do Homem, em Bogotá, Colômbia, sendo o primeiro documento
internacional de direitos humanos de caráter geral. A CIDH foi criada em 1959,
reunindo-se pela primeira vez em 1960. Em 1961 a CIDH começou a realizar visitas
in loco para observar a situação geral dos direitos humanos nos paises para
investigar uma situação particular.

Desde 1965 foi autorizada expressamente a receber e processar denúncias e


petições sobre casos individuais em locais que alegam violações dos direitos
humanos. Em 1969 foi aprovada a Convenção Americana sobre Direitos Humanos,
que entrou em vigor no ano de 1978 e foi ratificada em 1997, por 25 países. A
Convenção define os direitos humanos que os Estados ratificantes se comprometem
internacionalmente a respeitar as garantias para que sejam respeitados.

São suas atribuições: receber, analisar e investigar denúncias que alegam


violação dos direitos humanos; observar a vigência geral dos direitos humanos nos
Estados membros, e quando considera conveniente publica informes especiais
sobre a situação em um estado particular; realizar visitas in loco aos países para
aprofundar a observação geral da situação, e também para investigar uma situação
particular. Geralmente, essas visitas resultam na preparação de um informe
respectivo, que é publicado e enviado para a Assembléia Geral; estimular a
Direito Internacional Público 27

consciência dos direitos humanos nos países da América; realizar e participar de


conferências e reuniões de com representantes de governos, acadêmicos, grupos
não governamentais, etc., para difundir e analisar temas relacionados com o sistema
interamericano dos direitos humanos; recomendar aos Estados membros da OEA
sobre a adaptação de medidas para ajudar a promover as garantias dos direitos
humanos; requerer aos Estados que tomem "medidas cautelares" específicas para
evitar danos graves e irreparáveis aos direitos humanos nos casos urgentes. Pode
também solicitar que a Corte Interamericana requeira "medidas provisórias" dos
Governos em casos urgentes de perigo a pessoas. Somente em casos da jurisdição
da Corte Interamericana atua frente a Corte em certos litígios; solicitar "Opiniões
Consultivas" à Corte Interamericana sobre aspectos de interpretação da Convenção
Americana.

8. Mercado Comum do Sul - MERCOSUL

 Antecedentes:

As circunstâncias geográficas sempre tiveram presença marcante na história


do Cone Sul. Em torno do Rio da Prata, Rio Paraguai e Rio Paraná (Bacia do Prata),
disputaram-se as mais violentas batalhas da região. Em 1585 registra-se o primeiro
intercâmbio comercial (ilegal, pois a coroa espanhola autorizava apenas alguns
portos a comerciarem) entre Buenos Aires e o Brasil. Nos séculos seguintes, a Bacia
do Prata testemunhou os capítulos mais marcantes da história do Brasil, Paraguai,
Argentina e Uruguai (disputas luso-espanholas pela posse de territórios da América
Austral, Guerra Cisplatina, a independência do Uruguai, a Farroupilha, a Guerra do
Paraguai, o Pacto do ABC, entre outros).

Na 2a.Guerra Mundial, Brasil e Argentina ensaiaram pela primeira vez (1914)


medidas concretas visando uma União Aduaneira entre suas economias. Diferenças
políticas e diplomáticas entre os dois países, principalmente após Pearl Harbour e
tomadas de atitudes perante o Eixo, impediram avanços do projeto.

Com o fim do conflito, abre-se novo período marcado por uma crescente
interdependência econômica, pelo surgimento de blocos regionais e pela
Direito Internacional Público 28

transnacionalização do capital. Na área comercial, a conferência de Breton Woods


definiria novos rumos do mundo capitalista – criação da OIC (que não chegou a
existir mas marcou novo padrão de multilateralização das relações comerciais,
baseada no princípio da “Cláusula da nação mais favorecida”, consagrada 3 anos
mais tarde com a assinatura do GATT. Na Europa, o BENELUX (Bélgica, Holanda e
Luxemburgo) é a primeira experiência de integração econômica do pós-guerra.

Nos anos seguintes, a América Latina verá experiências malgradas de


integração: (União Aduaneira de 1941, novo Pacto do ABC de 1954). Em 1948, a
CEPAL estabelece, como objeto, a criação de uma união adunaneira latino-
americana. Brasil, Argentina, Chile e Uruguai, representados sob os auspícios da
CEPAL, preconizam a adoção de uma política de deliberação progressiva de seu
comércio recíproco.

Em decorrência, em 1960, é criada a Associação Latino-Americana de Livre


Comércio (ALALC), pelo Tratado de Montevidéu, que se configura como um
instrumento de multilateralização do comércio regional. As metas da ALALC não
foram cumpridas, principalmente em decorrência da “Cláusula de nação mais
favorecida regional”, que forçava que todos os países deveriam reconhecer
preferências concedidas a um país-membro da associação.

Em 1975, verificado o esgotamento do sistema preconizado pela ALAC, o


ideal integracionista ganha nova força com a criação do Sistema Econômico Latino-
Americano (SELA), integrado por todos os países latino-americanos, inclusive Cuba.

A criação do Mercosul, objetivo definido pelo Tratado de Assunção, de


26/03/91, e reafirmado pelo Protocolo de Ouro Preto, de 17/12/94, não apresenta
uma ação diplomática isolada, mas sim o resultado de longo processo de
aproximação entre Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai.

Foi a criação da Associação Latino Americana de Desenvolvimento


Intergovenamental (ALADI), em 1980, em substituição à ALALC, que gerou as
condições necessárias à promoção, em bases mais realistas, do aprofundamento do
processo de integração latino-americana. A extinção da “Cláusula de nação mais
favorecida regional”, permitiu a outorga de preferências tarifárias entre dois ou mais
Direito Internacional Público 29

países da ALADI, sem a extensão automática das mesmas a todos os membros da


Associação, o que viabilizou o surgimento de esquemas sub-regionais de
integração, como o Mercosul.

A integração Brasil-Argentina, antecedente imediato do Mercosul foi


impulsionada por três fatores principais: a superação das divergências geopolíticas
bilaterais; o retorno à plenitude do regime democrático nos dois países; e a crise do
sistema econômico internacional.

Os fatos que antecederam a formação do Mercosul de maior destaque: a


Declaração de Iguaçu (1985), dos presidentes Sarney e Alfonsin, buscava acelerar
a integração dos dois países em diversas áreas e estabelecia bases para a
cooperação no campo do uso pacífico da energia nuclear; a Ata de Integração
Brasileiro-Argentina (1986), estabeleceu princípios fundamentais do “Programa de
Integração e Cooperação Econômica” (PICE), que objetivava propiciar a formação
de um espaço econômico comum por meio da abertura seletiva dos mercados
brasileiro e argentino; Tratado de Integração, Cooperação e Desenvolvimento
(1988), objetivou construir, no prazo máximo de 10 anos, um espaço econômico
comum por meio da liberalização integral do comércio recíproco; eliminação de
todos os obstáculos tarifários e não-tarifários ao comércio de bens e serviços.

Foram assinados 24 protocolos em diversas áreas. Os de natureza comercial


foram consolidados em um único Acorde de Complementação Econômica nº 14, da
ALADI.

Outras circunstâncias de natureza política, econômica, comercial e


tecnológica, decorrentes das grandes transformações da ordem econômica
internacional, influenciaram a integração brasileiro-argentina: globalização da
economia (nova estrutura de produção e novo padrão industrial e tecnológico);
formação dos megablocos econômicos e a tendência à regionalização do comércio;
impasses no multilateralismo econômico, prevalecentes em certas fases do
processo de negociação da Rodada Uruguai, do GATT; protecionismo e quadro
recessivo em muitas economias desenvolvidas, responsáveis pela absorção de 65%
das exportações latino-americanas; esgotamento do modelo de substituição das
importações; consciência da necessidade de aprofundar o processo de integração
Direito Internacional Público 30

como forma de aproveitar o entorno geográfico; e, convergência na adoção de novas


políticas econômicas que privilegiam abertura do mercado interno, busca de
competitividade, maximização das vantagens comparativas e reforma do papel do
Estado – mais democrático e menos intervencionista.

Em 06/07/90, Brasil e Argentina firmam a Ata de Buenos Aires, e fixam a data


máxima de 31/12/94 para a conformação definitiva de um Mercado Comum entre os
dois países. Em agosto de 1990, Paraguai e Uruguai são convidados a incorporar-se
ao processo integracionista.

Como conseqüência, é assinado, em 26/03/91, o Tratado de Assunção para


Constituição do Mercado Comum do Sul. O Tratado instrumento jurídico
fundamental do Mercosul, é um “acordo-quadro” (não se esgota em si mesmo, mas
é continuamente complementado por instrumentos adicionais). Ele estabelece as
condições para se alcançar, até 31/12/94, a União Aduaneira entre os quatro países,
etapa anterior ao Mercado Comum.

Este tratado determina, entre outros: o estabelecimento de um programa de


liberalização comercial (reduções tarifárias progressivas, lineares e automáticas,
acompanhadas de eliminação de barreiras não-tarifárias); a coordenação de
políticas macroeconômicas; o estabelecimento de uma Tarifa Externa Comum
(TEC); o estabelecimento de listas de exceções ao programa de liberação de
produtos “sensíveis”; e, a constituição de um regime geral de origem e de um
sistema de solução de controvérsias.

O Tratado estabelece, também, uma estrutura institucional transitória para o


Mercosul, que permanecerá inalterada até dezembro de 1994, quando o Protocolo
de Ouro Preto definirá sua estrutura organizacional definitiva.

A estrutura operacional do Mercosul possui características originais que a


diferenciam de outros modelos de integração, cujas conseqüências são importantes,
pois definem, por um lado, a natureza flexível e gradual do processo, que não se
encontra preso à rigidez de estruturas decisórias alheias à vontade ou à capacidade
de compromisso dos governos envolvidos.
Direito Internacional Público 31

Assim, o Mercosul é uma organização intergovernamental (são sempre os


governos que negociam entre si, não existindo órgãos supranacionais); e as
decisões são sempre tomadas por consenso, não existindo a possibilidade de voto.

Uma decisão adotada pelo Mercosul, na medida em que é consensual, reflete


a disposição do governo dos 4 sócios em sua plena aplicação. No plano jurídico,
essa sistemática cria, por outro lado, a necessidade de adotar procedimentos
nacionais para incorporação da norma acordada ao ordenamento jurídico nacional
em cada Estado Parte. Os Estados devem comprometer-se em adotar medidas para
sua plena incorporação do ordenamento.

O Mercosul é personalidade jurídica de direito internacional, o que


possibilitará ao bloco a aquisição de direitos e a sujeição a obrigações como uma
entidade distinta dos países que o integram. Reconhece o Tratado de Assunção,
seus protocolos e instrumentos adicionais, bem como os demais acordos celebrados
no âmbito do Tratado como fontes jurídicas do Mercosul. São idiomas oficiais o
português e o espanhol, e os documentos são redigidos no idioma do país sede das
reuniões.

A estrutura atual (que manteve a estrutura transitória do Tratado de


Assunção, criando-se novos órgãos no Protocolo do Outro Preto) possui cerca de 50
foros negociadores, alguns de natureza exclusivamente técnica, outros com funções
políticas ou executivas. São órgãos da estrutura: o Conselho do Mercado Comum
(CMC); o Grupo Mercado Comum (GMC); a Comissão de Comércio do Mercosul
(CCM); a Comissão Parlamentar Conjunta (CPC); o Foro Consultivo Econômico-
Social (FCES); e a Secretaria Administrativa do Mercosul (SAM).

 O sistema de solução de controvérsias

O sistema de solução de controvérsias se fundamenta no Tratado de


Assunção e, principalmente, no Protocolo de Brasília, que foi ratificado pelo
Protocolo de Ouro Preto, e atualmente complementado pelo Protocolo de Olivos.

a. Tratado de Assunção, 1991:


Direito Internacional Público 32

É o instrumento jurídico fundamental do Mercosul. Embora não tenha criado o


mercado comum, nem a conformação definitiva de sua estrutura institucional, definiu
os objetivos do processo de integração e os mecanismos para alcançá-lo.

Fruto desse tratado é o processo, que evolui em etapas, conforme as


necessidades que vão surgindo e a situação específica de seus Estados Partes. A
estrutura institucional criada pelo Tratado de Assunção - e posteriormente redefinida
pelos Protocolos de Ouro Preto e de Olivos, tem natureza intergovernamental (a
tomada de decisões supõe o consenso entre todos os Estados Partes), o que
contrasta com a estrutura burocrática integracionista européia, que contemplou
desde o início a existência de órgãos supranacionais.

A intergovernamentalidade permitiu, ao Mercosul, a criação de uma estrutura


de caráter ágil e flexível, pouco onerosa e pautada pela simplicidade de
procedimento e pela busca do entendimento direto. As normas elaboradas pelos
órgãos do Mercosul não possuem validade nem aplicação automática nos Estados
Partes, carecendo, para tanto, de sua incorporação nos ordenamentos jurídicos
nacionais.

Quando um cidadão ou empresa se sente afetado por uma norma do


Mercosul, ou alega implementação inadequada dessa norma por parte de seu
governo, pode recorrer ao Poder Judiciário de seu próprio país. Para a hipótese de
que o mesmo cidadão ou empresa, ou o próprio Governo, se sinta afetado pela
conduta do Governo de outro Estado Parte, o recurso cabível deve ser buscado no
sistema de solução de controvérsias.

b. Protocolo de Brasília, 1991:

Este Protocolo criou três fases de solução de conflitos: a negociação, a


conciliação e a arbitragem. É marcado pelo consenso e transitoriedade.

Os Estados Partes devem procurar resolver suas diferenças, antes de tudo,


mediante negociações diretas (prazo de 15 dias). Se não obtiverem êxito, qualquer
dos Estados Partes na controvérsia poderá submetê-la à consideração do Grupo
Mercado Comum que, no máximo em 30 dias deverá formular suas recomendações.
Se a intervenção do GMC não for suficiente, as partes poderão recorrer ao
Direito Internacional Público 33

Procedimento Arbitral, que tramitará ante um Tribunal Arbitral Ad Hoc, composto de


três árbitros, designados a partir de listas depositadas previamente na Secretaria
Administrativa do Mercosul em Montevidéu.

Este tribunal fixará sua sede em algum dos Estados Partes e adotará suas
próprias regras de procedimento, observadas a garantia do contraditório e a
celeridade processual. O Tribunal poderá julgar conforme o direito (Tratado de
Assunção, acordos derivados, decisões do CMC, resoluções do GMC, diretrizes da
CCM e disposições do Direito Internacional) ou, solicitado pelas partes, poderá
decidir ex aequo et bono.

Do laudo não cabe recurso e, se não for cumprido pelo Estado Parte no prazo
máximo estipulado pelos árbitros, acarretará a adoção de medidas compensatórias
temporárias, tais como a suspensão de concessões ou equivalentes.

As duas primeiras etapas desse procedimento revestem-se de caráter


intergovernamental: as próprias partes poderão chegar à solução amigável da
questão. Já a solução arbitral não se dará por consenso, mediante laudo inapelável
e obrigatório para os Estados Partes, tem força de coisa julgada. Diante disso, o
sistema de solução de controvérsias do Protocolo de Brasília aceita, de certo modo,
a supranacionalidade da sentença arbitral.

Quanto a reclamações de particulares, este procedimento está previsto no


Protocolo de Brasília. Reconhece que o objetivo visado pelo Tratado de Assunção
não se alcança somente com a participação dos Estados, pois pressupõe a
participação dos operadores econômicos, dos nacionais dos Estados membros. As
pessoas físicas ou jurídicas que se sentirem afetadas por uma sanção ou aplicação,
por qualquer dos Estados Partes, de medidas legais ou administrativas de efeito
restritivo, discriminatórias ou de concorrência desleal, iniciarão o procedimento
formalizando suas reclamações ante a Seção Nacional do GMC do Estado Parte
onde tenham residência habitual ou sede de negócios.

Se a Seção Nacional decidir patrocinar a reclamação do particular, optará


entre a negociação direta com a Seção Nacional do GMC do Estado Parte ou levará
o caso, sem mais consultas, diretamente ao GMC; este poderá denegar ou receber
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a reclamação. Comprovada a procedência, qualquer outro Estado Parte poderá


requerer a adoção de medidas corretivas ou a anulação das medidas questionadas.
Caso o requerimento não prospere, o Estado Parte poderá recorrer ao procedimento
arbitral.

c. Protocolo de Ouro Preto, 1994:

Este Protocolo estabeleceu estruturas próprias para o Mercosul, com a


criação de órgãos específicos para cuidar dos variados temas que envolvem a
integração multinacional. Além de institucionalizar-se, o Mercosul passou a ter
personalidade jurídica de Direito Internacional.

Dentre os órgãos criados, a CCM – Comissão de Comércio do Mercosul, além


do respeito comunitário de suas diretrizes, tem atribuição singular para receber
reclamações apresentadas pelas Seções Nacionais, de autoria de Estados Partes
ou particulares, relacionadas com as situações previstas para utilização do
procedimento de solução de conflitos do Protocolo de Brasília, quando estiverem em
sua área de competência.

Não afasta o sistema para dirimir divergências estabelecido pelo Protocolo de


Brasília; mas cria um sistema paralelo utilizado para questões relativas ao comércio
entre os Estados Partes, e destes com terceiros. As decisões continuam com a
primazia pelo consenso. Se este não for alcançado, o CCM encaminhará ao GMC
para que este decida sobre a matéria, também de forma consensual. Caso não seja
resolvida possibilita-se o acionamento da fase arbitral.

d. Protocolo de Olivos, 2002:

O Protocolo de Olivos não traz alterações fundamentais à sistemática


anterior, mas permitiu certo avanço ao processo de integração regional.

A grande inovação foi a criação do Tribunal Permanente de Revisão (TPR),


cuja decisão tem efeito de coisa julgada com relação as partes, mas sem qualquer
tipo de posição vinculante para decisões futuras. Permite que os Estados Partes lhe
submetam diretamente, eliminando etapa prévia dos Tribunais Ad Hoc. Esse novo
Tribunal é dotado, portanto, de competência para revisar aquilo que se decide “em
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primeira instância”, com poderes para, eventualmente, efetuar uma diferente


ponderação do Direito aplicado.

Entende-se que o recente Protocolo de Olivos pode permitir certo avanço no


progresso de integração regional, mesmo que distante da elaboração de um Direito
Comunitário no Mercosul. Não obstante essas inovações, o Mercosul vem
atravessando sérios problemas de credibilidade, seriedade e conveniência, como
conseqüência dos conflitos institucionais, econômicos, sociais etc. em que estão
submersos os países que o integram.

A criação do TPR tende a fortalecer a estrutura institucional do Mercado


Comum do Sul, supondo uma determinação convincente e reiteradamente
esperançosa para continuar com o compromisso assumido, notadamente
contribuindo para a aplicação uniforme das normas do Mercosul. Para tanto, na sua
elaboração, considerou-se a necessidade de garantir a correta interpretação,
aplicação e cumprimento dos instrumentos fundamentais do processo de integração
e do conjunto normativo.

Essa nova instância de solução de controvérsias objetiva evitar laudos


díspares sobre a mesma matéria – o que realmente ocorria anteriormente e não
propiciava a segurança jurídica necessária. De tal modo, os indivíduos ou Estados
podem ter conhecimento do que é possível ou não fazer diante das normas jurídicas
e o que é ou não permitido à livre iniciativa das pessoas. Tal novidade, que consta
como cerne do novo sistema, foi notadamente inspirada no sistema de solução de
controvérsias adotado pela Organização Mundial do Comércio (OMC), cujo órgão de
apelação funciona como uma instância uniformizadora das regras multilaterais.

Outra importante inovação é a permissão para o Estado demandante, caso


seja de seu interesse, escolher o foro internacional para decidir a lide. Desse modo,
evitará decisões duplas na mesma controvérsia, como já ocorrido entre o Brasil e a
Argentina, especificamente nas questões têxteis e avícolas.

De igual importância foi a regulamentação da etapa post-laudo, ou seja, o


cumprimento do laudo pelo Estado perdedor do litígio e os efeitos de seu eventual
descumprimento, vindo a sofrer as medidas compensatórias.
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REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:

LAWAND, Arthur Miguel Ferreira. Novo Protocolo de Olivos. Disponível na Internet:


http://.mundojuridico.adv.br. Acesso em 29 de abril de 2004.

MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de direito internacional público. Rio de


Janeiro: Renovar, 2004.

NASSIF E COSTA, Kazan Sidharta. Fundamentos constitucionais e solução de


controvérsias no Mercosul. São Paulo: Memória Jurídica Editora, 2000.

RANGEL, Vicente Marotta. Direito e relações internacionais. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2000. 6a. ed.

SÜSSERIND, Arnaldo. Convenções da OIT. São Paulo: LTR, 1998. 2a. ed.

THORSTENSEN, Vera. OMC: Organização Mundial do Comércio; São Paulo:


Aduaneiras, 2001. 2a. ed.

Textos extraídos da Internet:

http://www.mercosul.gov.br

http://www.un.org

http://oas.org

http://www.bancomundial.org.br

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