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Discriminação positiva ou punição

Em 2001, através do despacho, “ Orientações gerais para uma melhor gestão da questão da
gravidez nas escolas” emitido pelo Ministério de Educação, se “aconselha as alunas a
suspender a frequência ao estabelecimento de ensino em caso de gravidez”. Como base
para a implementação desta norma invocou-se “que a gravidez das alunas tem criado
constrangimentos no funcionamento, pois as escolas não tem condições (nem em termos
de estrutura física e equipamentos, nem em termos de apoio/aconselhamento psicológico
e/ou outro) e que alem disso muitos professores não se encontram preparados para lidar
com tal situação”1.

A adopção desta medida, provocou na altura um forte debate público. De um lado


situavam-se aqueles que receberam com beneplácito esta medida, enquanto reposição do
carácter sacralizado do espaço escolar2. De outro os que consideraram que a medida era a
tradução, sob a forma de orientação, duma postura conservadora, que tinha como
objectivo dar satisfação ao pânico moral duma sociedade, que estava sendo confrontada
com o facto das praticas tradicionais do exercício da sexualidade, tanto no marco
(conjugalidade) como na função (apenas reprodução), estar mudando radicalmente.

Voltados sete anos sobre a implementação, das “ Orientações gerais para uma melhor
gestão da questão da gravidez nas escolas”, ainda não foram equacionadas as implicações
pessoais e sociais da medida adoptada, para as adolescentes grávidas, que interrompem
temporária ou definitivamente o processo de educação formal, ou as consequências em
matéria de igualdade e equidade de género e continua a invocar-se a mesma, como no caso
presente para obrigar as alunas grávidas a suspender a matricula. Contudo os dados
publicados pelo INE (QUIBB 2006), permitem ver que, a gravidez como causa objectiva
de abandono escolar é mencionada por 3,2% das jovens: 3,8% no meio urbano e 2,5% no
meio rural, sendo inexistente como factor de interrupção dos estudos para os jovens do
sexo masculino, o que revela que este factor tem um impacto negativo exclusivamente na
vida escolar das raparigas.

Será que o Ministério de Educação, ao adoptar esta medida não viola os direitos cidadãos
das raparigas? A Constituição da República de Cabo Verde estabelece no artigo 49º “todos
têm a liberdade de aprender (…) que compreende:
1
Ministério de Educação, Cultura e Desporto. Gabinete do Ministro. “Orientações gerais para uma melhor gestão da
questão da gravidez nas escolas” 2001
2
A Semana. Sexta-feira, 17 de Junho de 2005: A medida veio a moralizar a escola.
a) O direito de frequentar estabelecimentos de ensino e de educação e de neles
ensinar sem qualquer discriminação, nos termos da lei;
Também, os grandes princípios que orientam a educação em Cabo Verde estão
consubstanciados na Lei de Bases do Sistema Educativo3 (LBSE), estabelecem “que todo
cidadão têm o direito e o dever da educação e que o sistema educativo dirige-se a todos os
indivíduos independentemente da idade, sexo, nível sócio económico, intelectual ou
cultural, crença religiosa ou convicção filosófica de cada um”.
É bom lembrar, ainda que o Governo de Cabo Verde, ao ser interpelado, em Agosto de
2006, na apresentação do relatório sobre a eliminação de todas as formas de discriminação
contra as mulheres, sobre a adopção desta medida respondeu que (ICIEG 2007, pág 199) “
a medida inicialmente causou controvérsias em alguns sectores da sociedade civil, face a um
entendimento erróneo(..) Contudo (..) a suspensão, nada mais que do que uma medida
analisada caso a caso (…) que em dialogo com os país, a escola e a aluna partilham a
decisão de anular a matricula”
A postura decisão adoptada neste momento, e a carta enviada pela aluna a Ministra da
Educação, mostram que se esta agir em contradição flagrante com o que o governo vem
divulgando, porque se nesta matéria quiséssemos fazer uma discriminação positiva a favor
das raparigas, o correcto seria que as alunas pudessem decidir se querem continuar ou não,
e independentemente da opção reconhecer o direito a uma licença de maternidade, e apoio
pedagógico especifico para que tenha sucesso no processo de ensino aprendizagem.

3
Lei n.º 103/III/90, de 29 de Dezembro: aprovada em 01/12/90, promulgada em 26/12/90 e actualizada em Outubro de
1999

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