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Entre o Herói e o Sapo

Excetuando-se os picaretas e embromadores em geral, todo homem quer ser


reconhecido como herói. Em seu trabalho, em sua família, perante aos seus, perante a
sociedade. É desolador, no entanto, perceber o estresse, o desgaste e a impaciência
do dia-a-dia transformarem o garboso príncipe em um sapo rústico e embrutecido.
Apesar das conquistas, o aumento da carga de trabalho tornou-o rabugento,
descompassado, chato e inadequado.

Com o embrutecimento, subproduto natural da atividade de caça, a capacidade


para sonhos e sutilezas tende a desaparecer. Com isto, as críticas e queixumes da
desiludida esposa tendem com o tempo a se multiplicar. Condicionado a ser referido no
presente mais como fonte de problemas do que de soluções, o desacreditado paladino
passa a ver na outrora princesa, uma bruxa fonte de mal-estar e incompreensão.

Também os filhos que na infância o idolatravam tendo-o como modelo de força


e determinação, na cega adolescência tornam-se capazes de ridicularizá-lo sem
pestanejar. Exilado e caricaturado, experimenta um misto de tristeza e poder quando
percebe que só é lembrado quando os assuntos envolvem contas a custear.

E assim, o pobre macho humano à medida que avança na floresta profunda vai
se distanciando, tornando-se um estranho em seu próprio lar. Seu projeto de conquista
torna-se a única coisa palpável a se agarrar, pois perplexo, não sente mais ressonância
por quem está a lutar.

Cansado, procura esconder sua decepção com mais luta, mais trabalho.
Confundindo-se com seus feitos e deles unicamente tentando sustento para sua alma.
E assim, buscando um reconhecimento que só sobrevêm em palavras de velório sente-
se como um incompreendido mártir tentando a um “Édem” chegar.

Ganhou em volume, perdeu em substância. Questiona-se sobre o valor de tanta


luta e o sentido de suas conquistas. Do mergulho no álcool e depressão à busca de um
sorriso jovial num romance típico da “crise de meia-idade”, tenta o macho
desencantado reencontrar a sensação de força e garbosidade que as milhares de horas
de trabalho intenso cuidaram de arrancar.

Perdido enfim de si mesmo, só resta se agarrar às rotinas, ao comodismo e às


“aparências” e ironicamente aguardar a morte chegar.

Fosse menos heróico e mais humano. Menos inquebrantável e mais maleável.


Menos onipotente e mais reflexivo. Os valores da juventude, o brilho das idéias e a
poesia do cotidiano não se perderiam jamais.

Ficarão na história, aqueles que tenham sabido enfim superar tal dilema e
encontrar a tão esperada paz.

Aos heróis e trabalhadores de todos os tipos. Especialmente, a todos os pais.

Dr. Hélio Borges – Médico Psiquiatra – CRM/PR 16.914


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http://twitter.com/drhelioborges

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