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1. Introdução
1
Segundo MIGUEL REALE1, o filósofo do Direito indaga dos princípios lógicos,
histórico-culturais e éticos do Direito, que são problemas de ordem filosófica.
1
REALE, Miguel. Lições preliminares de Direito. São Paulo : Saraiva, 1988, p. 16.
2
intersecção”, sem deixar de ter em vista que, no decorrer de cada tópico, já se
procura delinear a dinâmica que permeia tal correlação.
2. Conceito de ética
Quer dizer que a conduta é a ação na qual está inerente o princípio da responsabilidade, porque
quem escolhe assume a responsabilidade pela escolha feita, o que transparece no sinônimo
‘comportamento’, que se refere mais à ação em confronto com um conjunto de regras ou um
modelo.
A Ética, sendo uma ciência normativa, não é mera descrição daquilo que usualmente os homens
fazem, mas assinala, ao contrário, uma aspiração no sentido de serem seguidas determinadas
diretrizes consideradas necessárias ao aperfeiçoamento humano.
2
REALE, Miguel. “A ética do juiz na cultura contemporânea”. Revista Forense comemorativa - 100 anos, Tomo
II. Paulo Nader - Coord., Rio de Janeiro : Forense, 2006, p. 775.
3
HENTZ, José Soares. Ética e Hermenêutica. O papel do juiz na efetivação da justiça. RNDJ, vol. 79, jul/2006, p.
29.
4
REALE, Miguel. Lições preliminares de Direito. São Paulo : Saraiva, 1988, p. 17.
3
os apetites, paixões e desejos. Assim os homens devem buscar o que ele
convencionou chamar de justo meio-termo. Ou seja, o justo do dever é a consciência
do meio-termo.
4
contrato social estabelecer para cada sócio uma participação idêntica nos
resultados, ambos receberão o mesmo quinhão. Conclui-se, assim, que muitas
relações amorais ou imorais realizam-se à margem das normas jurídicas, em que
pese o desejo natural de que o Direito tutele só o “lícito moral”. Sempre permanece
um resíduo de imoral no Direito.
Mas mesmo no Direito Público, sob o ponto de vista moral, fácil é perceber
como a avaliação moral varia de pessoa a pessoa, vislumbrando-se discutível o
precitado resíduo de imoralidade em regras de Direito Público, como ocorre na regra
da maioridade penal insculpida no art. 228 da Constituição da República brasileira,
que estabelece: “São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos
às normas da legislação especial” 6.
Refletir sobre questões como essa leva-nos a concluir que, para as pessoas
que julguem ser uma imoralidade não punir a pessoa de dezesseis anos referida na
6
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, 1988, art. 228.
5
situação hipotética em pauta, o Direito brasileiro estaria a consagrar uma
imoralidade, ao passo que, os que partilham o entendimento oposto vão além para
dizer que se trata de uma verdadeira cláusula pétrea a regra da maioridade penal
aos dezoito anos de idade, não havendo, por conseguinte, imoralidade na regra
jurídico-constitucional mencionada. Em suma, a análise valorativa da regra da
maioridade penal, sob a ótica moral, é eminentemente subjetiva, ao passo que a
regra jurídica é objetiva: são dezoito anos e ponto final.
“Ao mesmo tempo que reconhecemos o Direito como uma técnica específica de
uma ordem coercitiva, podemos colocá-lo em nítido contraste com outras ordens
sociais que perseguem, em parte, os mesmos propósitos que o Direito, mas
através de métodos bem diversos. Além disso, o Direito é um meio, um meio
social específico e não um fim. O Direito, a moralidade e a religião, todos os três
proíbem o assassinato. Só que o Direito faz isso estabelecendo que, se um
homem cometer assassinato, então outro homem, designado pela ordem jurídica,
aplicará contra o assassino certa medida de coerção prescrita pela ordem
jurídica. A moralidade limita-se a exigir: não matarás. E, se um assassino é
relegado moralmente ao ostracismo por seus pares, e se vários indivíduos evitam
o assassinato não tanto porque desejam evitar a punição do Direito, mas a
desaprovação moral de seus pares, permanece ainda uma grande diferença: a
de que a reação do Direito consiste em uma medida de coerção decretada pela
ordem e socialmente organizada, ao passo que a reação moral contra a conduta
imoral não é nem estabelecida pela moral, nem é, quando estabelecida,
socialmente organizada. Nesse aspecto, as normas religiosas encontram-se mais
próximas das normas jurídicas do que as normas morais. Pois as normas
religiosas ameaçam o assassino com a punição por uma autoridade sobre-
humana. As sanções que as normas religiosas formulam têm um caráter
transcendental; não se trata de sanções socialmente organizadas, apesar de
estabelecidas pela ordem religiosa. São provavelmente mais eficientes do que as
sanções jurídicas. Sua eficácia, contudo, pressupõe a crença na existência e no
poder de uma autoridade sobre-humana” 7.
7
KELSEN, Hans. Teoria geral do Direito e do Estado. Trad.: Luís Carlos Borges. São Paulo : Martins Fontes,
2005, p. 24.
6
referirem, as primeiras, ao mundo da conduta espontânea, enquanto as segundas se
encontram no âmbito da ordenação coercitiva da conduta humana.
8COMPARATO, Fábio Konder. Ética: direito, moral e religião no mundo moderno. São Paulo : Companhia das
Letras, 2006, p. 592.
7
Segundo a distinção trazida por JOSÉ GERALDO BRITO FILOMENO9:
“Poder social é aquele que se observa em qualquer tipo de sociedade, como seu
elemento constitutivo formal, e derivado do espírito gregário e da affectio
societatis do homem.
(...)
Ou seja, cuida-se aqui da plena consciência da vida social e de sua disciplina
para a manutenção da ordem e, consequentemente, condições para o alcance
de seus fins.
(...)
Cada sociedade, dependendo de seu tipo e fins, terá um núcleo peculiar de
poder (por exemplo, a diretoria de um clube, o conselho diretor de uma
sociedade comercial, a congregação de uma faculdade, etc.). Poder político
aparece com a institucionalização do poder social e com a criação do Estado,
que é a sociedade política por excelência”.
Mas o Estado não existe em si ou por si; existe para resolver problemas da
sociedade, quotidianamente; existe para garantir segurança fazer justiça,
promover a comunicação entre os homens, dar-lhes paz e bem-estar e
progresso. É um poder de decisão no momento presente, de escolher entre
opções diversas, de praticar os actos pelos quis satisfaz pretensões
generalizadas ou individualizas das pessoas e dos grupos. É autoridade e é
serviço” 10.
9
FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de Teoria Geral do Estado. Rio de Janeiro : Forense Universitária,
1994, p. 131/132.
10 MIRANDA, Jorge. Teoria do Estado e da Constituição. Rio de Janeiro : Forense, 2007, p. 214.
8
Note-se que os atos próprios do poder político, sendo autoridade e sendo
serviço, inserem-se no universo das condutas qualificadas como “poderes-deveres”,
ou como querem alguns, “deveres-poderes”, pois seria a função precípua de quem
exerce o poder político servir a uma coletividade e, para bem servir, é que se dota
sua tarefa de certas prerrogativas, dentre as quais se insere inclusive o uso da força.
“O Poder, no direito público atual, só aparece, só tem lugar, como algo ancilar,
rigorosamente instrumental e na medida estrita em que é requerido como via
necessária e indispensável para tornar possível o cumprimento do dever de
atingir a finalidade legal.
(...)
Tendo em vista este caráter de assujeitamento do poder a uma finalidade
instituída no interesse de todos – e não da pessoa exercente do poder -, as
prerrogativas da Administração não devem ser vistas ou denominadas como
‘poderes’ ou como ‘poderes-deveres’. Antes se qualificam e melhor se designam
como ‘deveres-poderes’, pois nisto se ressalta sua índole própria e se atrai
atenção para o aspecto subordinado do poder em relação ao dever,
sobressaindo, então, o aspecto finalístico que as informa, do que decorrerão
suas inerentes limitações”.
11
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, 17ª ed. Malheiros : São Paulo, 2004, p.
40, 62.
9
Atender aos fins de interesse público é um preceito ético. E mais, é um
preceito ético que é também um preceito jurídico. No Brasil, por exemplo, o
parágrafo 1º, do art. 1º, de sua Constituição Federal, estabelece que “todo o poder
emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente,
nos termos desta Constituição” 12.
12 BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, 1988, art. 1º, parágrafo 1º.
13
BOBBIO, Norberto. Teoria geral do direito. Martins Fontes : São Paulo, 2008, p. 208.
10
Vê-se, pois, que poder constituinte é poder de editar as normas jurídicas de
superior hierarquia, ou seja, as normas ditas constitucionais, de força obrigatória a
toda a coletividade.
11
três idéias básicas a saber: garantia de direitos, separação dos poderes, princípio
do governo limitado14.
14 NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional, 3ª ed. Rio de Janeiro : Forense; São Paulo : Método, 2009, p. 48.
15
Idem, ibidem, p. 50.
12
a) limitação do poder arbitrário, através de pactos celebrados na Idade
Média. Inglaterra tem vários documentos escritos celebrados entre
cidadãos e governantes para haver limitação ao poder;
É nesse contexto que nasce a Carta Magna de 1.215, pela qual o Rei João
Sem-Terra estabeleceu determinadas concessões aos lordes ingleses, ressalvado
que o documento não pode ser considerado como primeira constituição escrita, haja
vista, principalmente, o reduzido grau de limitação ao poder do monarca, ausência
de ampla proteção a direitos fundamentais e participação popular em sua produção.
16
NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional, 3ª ed. Rio de Janeiro : Forense; São Paulo : Método, 2009, p.
55/56.
13
requisito essencial de seus agentes é ter inscrição em partido político,
apresentando-se, portanto, o Judiciário, como o mais indicado a garantir a
supremacia da Constituição.
14
Estado de legalidade. Durante o nazismo, os governantes cumpriam o que estava
prescrito nas leis do Estado. Diante deste cenário, acentuou-se a preocupação da
humanidade com conteúdo moral, valorativo, ético, destas leis.
15
normativa, devendo ser entendidos seus princípios como normas jurídicas de
observância obrigatória e de supremacia com relação às demais normas jurídicas.
18
Apud NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional, 3ª ed. Rio de Janeiro : Forense; São Paulo : Método, 2009,
p. 48.
19
MIRANDA, Jorge. Teoria do Estado e da Constituição. Rio de Janeiro : Forense, 2007, p. 2.
16
(...)
Chama-se também Direito político, por essas serem normas que se reportam
directa e imediatamente ao Estado, que constituem o estatuto jurídico do Estado
ou do político, que exprimem um particular enlace da instância política e da
instância jurídica das relações entre os homens”.
“Por outro lado, não raro, ao adoptar-se a expressão Direito político, segue-se
uma visão restritiva do seu âmbito, circunscrevendo-o à organização e à
limitação jurídica do poder político. Ou seja, reduz-se o Direito político ao Direito
do Estado-poder e relega-se para fora ou para diferentes zonas tudo quanto
concerne ao Estado-comunidade. Porém, esta maneira de entender deve ter-se
por insatisfatória, pois não pode haver estatuto de poder sem estatuto da
comunidade política a que se reporta, nem limitação da autoridade dos
governantes sem consideração da liberdade dos governados.
(...)
A Constituição é tanto Constituição política como Constituição social, não se
cinge à ordenação da vida estatal (em sentido estrito). Nem sequer o Direito
constitucional do século XIX se confinou aos órgãos e agentes do poder político;
ele foi, além disso (ou através disso) um Direito dos cidadãos diante do poder –
ao garantir os direitos e liberdades individuais e ao incluir neles a propriedade,
intervinha, pelo menos negativamente, na sociedade. E, como se reconhece à
vista desarmada, as Constituições actuais contemplam larguíssimos aspectos e
áreas da dinâmica econômica, social e cultural em interacção com o Estado”.
Além dos pontos de intersecção trazidos nas linhas anteriores, cumpre trazer
outros elementos que esclareçam a correlação entre Ética, Poder e Direito
Constitucional, a iniciar com a reiteração de que as normas éticas se encontram no
plano da conduta espontânea, ao passo que as normas jurídicas, que não deixam de
17
ser normas éticas, se encontram no âmbito da ordenação coercitiva da conduta
humana.
Cabe, pois, indagar: por que, mesmo diante de tamanha proteção que a
limitação de poder encontra tanto na consciência do povo, quanto no Direito
Constitucional, ainda se apresenta costumeiro o abuso e desvio de poder? Onde
está a causa fundamental da falha no controle do poder?
20COMPARATO, Fábio Konder. Ética: direito, moral e religião no mundo moderno. São Paulo : Companhia das
Letras, 2006, p. 589.
18
poder político, econômico, religioso, cultural -, tem-se mostrado uma das mais
fortes paixões a agitar o coração humano”.
E acrescenta21:
8. Conclusão
21
Idem, ibidem, p. 590.
22
Apud MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, 17ª ed. Malheiros : São Paulo,
2004, p. 40, 62.
19
Se todo o poder emana do povo, aos agentes públicos em geral cumpre servir
e prestar contas ao povo, que deve, por sua vez, lançar mão de todos os
instrumentos de controle de poder que o Direito Constitucional lhe confere, quer seja
indiretamente, por intermédio dos poderes constituídos, quer seja um controle social
direto exercido por mecanismos como iniciativa popular, referendo e plebiscito,
dentre outros instrumentos, haja vista ser o povo o titular do poder supremo no
regime Republicano, com autoridade para exercer seu poder diretamente.
Bibliografia
BOBBIO, Norberto. Teoria geral do direito. Martins Fontes : São Paulo, 2008, p. 208.
______ , Constituição da República Federativa do Brasil, 1988, art. 1º, parágrafo 1º.
COMPARATO, Fábio Konder. Ética: direito, moral e religião no mundo moderno. São
Paulo : Companhia das Letras, 2006, p. 592.
FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de Teoria Geral do Estado. Rio de Janeiro :
Forense Universitária, 1994, p. 131/132.
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HENTZ, José Soares. Ética e Hermenêutica. O papel do juiz na efetivação da
justiça. RNDJ, vol. 79, jul/2006, p. 29.
KELSEN, Hans. Teoria geral do Direito e do Estado. Trad.: Luís Carlos Borges. São
Paulo : Martins Fontes, 2005, p. 24.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, 17ª ed.
Malheiros : São Paulo, 2004, p. 40, 62.
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