Comunicagdo e Sociedade, Vol. 4, 2002, 117-130 O DEL{RIO DA DISFORMIDADE O CORPO NO IMAGINARIO GROTESCO ALBERTINO GONCALVES * RESUMO Universal, o imaginario grotesco anima os subterraneos, os intersticios e as margens de todas as sociedades humanas. Neste artigo, relevamos alguns dos seus tracos genéricos mais marcantes, a comegar pelo papel especifico do corpo. Na passada, sondamos diversas manifestacées do grotesco na vida contempordnea, principalmente ao nivel da linguagem, da comunicagiio, das artes dos rituais da vida quotidiana. ABSTRACT The grotesque imaginary animates the underground areas, the interstices and the margins of all human societies. In this article, I will address some of its generic traits, starting with the specific role of the body. T will inquire various manifestations of the grotesque in contemporary societies, mainly at the level of language, communication, arts and rituals of everyday life. Tudo indica que o vocabulo «grotesco» se prende com a descoberta, no século XV, de umas gravuras ornamentais nos subterraneos das Termas de Tito, em Roma (Bakhtin, 1987: 28). Devido a sua originalidade, foram denominadas grotescas, a partir do italiano grotta (gruta). Em verdade, e tanto quanto se sabe, o grotesco assombra, e anima, as cavernas, as mar- gens, os interstfcios e os interregnos da generalidade das sociedades huma- nas. Reverso da ordem (Balandier, 1980), cavidade nocturna (Durand, 1969), «parte do diabo» (Maffesoli, 2002), a poténcia ! grotesca palpita nas veias * Universidade do Minho. | Emprega-se aqui «poténcia» no sentido que Maffesoli (1984) atribui a palavra francesa puissance. 117do social par gua purge renova, Com freqwéncia veel esta puso ‘evtllzdara desepcadels‘ubulencss Je desordem que se apaderar da ‘ina da cena cost para var or tm tempo, a argulteetura socal, Inaiso correspondents ror de roreat © de nerlion ation. Asse ‘hontecia cm a Baan, ag feta So ides ea panto, ssl acon isce sind oe com 0 exmnaval ou o Halloween. Ressalese, no emai, lave serait deste apaatoas, ans epic, nists pleas, © {Euceco germina, sem tregua, numa profusto de recantosdisseminados ‘no pro sie da vida quiidana. © groteco manteve, po explo, no Oude a0 Tongo dos séeloa tm lugar procminerse np wniverso dou Shntos agers retorvads pela banda devenhade 0 extrwrdinio grkesco ‘oahia eimeage, de tm modo eequada,tgko ou dslctica cam © ‘rund da exerci cndinava do dina Gin Incertas,cicicas os consnoas ‘Sfemat neni doimanro to ae aan ‘Gus sto tragoe mais caractericos do imagindro grousco? E que saga peered ao corpo? “hexpertncia do mundo proteice concent so om domains ¢ momen tos bem Cemancad. hit sede tom Ge intervals © os Irregos de {Quran a retin oil mediante a suspensto do tempo ov a eva em ‘Eterminadon nics do taido Soca (Mffesot, 1968) For asta, eae {es weno pic da universalidade berdade, igual eabuncinc> (Gakhtin, 1987-8) Oespoyo eo tempo sroeseos eles defers do passa sero, do marginal e co euraordinsio. A sua sctividode ara, ioverte ‘Efisin as heragia, spies ox valor vigetae. Ngo 9, conto, Tiquido que ela consitin em movimento ou uma idelogia de wansfor ‘acto, rensionaa ou evoluciodra, da vociedade.Habitualmeniy a ink ‘Gatres de indole grotsca no se asaumem como ahieratives eects 0 poder esabelsido. Anas ple contro, como sunka George Balancer Ti9so)revignram s orden 0 poser solando, locale ernporarameate, 35 ‘dees »desrdem ea coatesaga. Ao eabo desta dace, oper esta Teloraa nats estimidade es opsieso enlraqueelda peo afroutameno, {hs tenses «pl deco tual dos energiaa violent, potencllmente ferodorm de issuretcees © relia. O carter Jinko devs dalétcs ‘obresai no contrast enre as figure do rele do bobo da cots des faces Soponsas de wes poder apesar deco, itgrado. Kar so ais, 5 aeiee {eberem ave a igure do bo, o8 outa eqivalente, e enconta usente 2 ate aut so ¢ rip ie tang grt deca ret snap nen cnn pin nen 8.No tniverso grotesco, ox principais protagonistas tendem a ser sujeltos colectivos hiperbilicos e exorbitantes, que se afirmam como auténticas flegorias do mundo, da vida da morte. Agigantados, dsformes, excedem- Se, num contigio sem ceriméni, a todos os niveis, por todos canals e em todos os sentidos » Os individios confundem-se e comungam num corpo palpitante e efervescente que adquire vida propria. Em proficua comuni- egao com o meio ambiente, com os elementos ¢ as forgas da natureza, este ‘corpo colectivo reveste uma dimensio edsmica. Assim so os corsos carna- ‘alescos, 0s magotes de gente dos quadros de Pieter Bruegel (ver Figuras 1 122), 0s monstros fantésticos dos inlermos de Hieronymus Bosch (Figuras 3, ‘566 ou os gigantes dos romances de Francois Rabelais (o ventre de Panta ‘gruel albergava cidadesinteiras). Nem todos os corpos colectivos remetem, ‘Contudo, para o imaginério grotesco. A parada militarizada e a massifcario ‘concentraciondria * relevam, por exemplo, de outras formas de vids, algu- ‘mas de inspiragdo totalitéria. Nos ajuntamentos grotescos, os individuos Ilo se alinham, nem se anulam. Irvedutiveis, exuberantes e imprevisivels, flo se vergam perante nenhum chefe de orquestra. A emergéncia do todo ‘flo subentende a diluicio das partes. ‘No universo grotesco, tudo e todos estio em perpétuo movimento, Jonge ‘de qualquer equllbro, eternidade ou perfecio: «triunfo de uma espécie de Iihertago tempordria da verdade dominante e do regime vigente, de abo- ligdo provieéria de todas as relagdes hierarquicas privilégios, regras etabus ") (o carnaval] era a autntica festa do tempo, a do futuro, das alternén- cas e renovagdes. Opunha-se a toda perpetuacao, a todo aperfeigoamento e Tegulamentagio, apontava para o futuro ainda incompleto» (Bakhtin, 1987, er (190: 139) comprowa ge, as Ants plo derbies de eros correrponde 28 ‘dines dex de de Beste, presets o prod Ss Sutras de eran. De innurg TPs ter una expertcia semvl dea erbertnciaexroverta dos ores cle tion grote ssid, or eerpa8 Revs de Ggattones ¢Cabeyudos, com o Grupos (SZ ede 2s Picrn na Prog do Reps em Vana do Casa, ta mano frimeto dada Romaria de Noma Serra Agia (Maris wa 2000. Para um eto Tima tanbem serve es ermine aidan pomonide poe etnies universe 119