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O americano Ed Fries havia construído, em 18 anos, uma boa carreira na Microsoft.

Como
diretor do Microsoft Game Studios, o cientista da computação tinha uma vida confortável e
prestígio, mas pediu demissão, em 2004, para passar mais tempo com a família. Queria ficar no
mercado de videogames, sua paixão, mas sem a pressão de ser chefe. Por dois anos, integrou o
conselho de algumas companhias e ajudou amigos a criarem empresas. Nas horas vagas, jogava
World of Warcraft, em que milhões de pessoas disputam partidas simultâneas pela internet. Na
sua mesa, um boneco que ganhou em uma conferência o inquietava. Ele tinha sido feito com
impressão 3D, processo que permite fabricar modelos customizados, peças e protótipos com
partículas de materiais, como o plástico.

Entre uma partida e outra do game, ele criou uma empresa para fazer bonecos dos personagens
do jogo com a tecnologia 3D. “Se você me dissesse, há cinco anos, que eu estaria em um negócio
de impressão, o chamaria de louco”, disse Fries. “Mas a impressão 3D permitiu juntar esses dois
mundos.”

Impressoras 3D já estão no mercado há pelo menos 20 anos. A partir de modelos digitais, feitos
em programas de design como o AutoCAD, essas máquinas constroem produtos reais ao
sobrepor finas camadas de plástico, metais, silicone ou gesso em pó. A pilha de camadas é
solidificada usando técnicas que variam da aplicação de produtos químicos à exposição a raios
ultravioleta. Originalmente essas impressoras custavam entre US$ 500 mil e US$ 1 milhão. Isso
as limitava às grandes empresas, que as usavam para fazer protótipos a um custo de centenas de
dólares em até oito semanas.

Por volta de 1995, o preço já havia caído pela metade e o tempo de produção, reduzido para
algumas horas. Hoje, é possível comprar máquinas 3D por cerca de US$ 15 mil. Essas versões
mais baratas ajudaram a viabilizar negócios como o de Fries.

No lançamento de sua empresa, a FigurePrints, em dezembro de 2007, Fries previa vender 10 mil
unidades dos bonecos no primeiro ano de produção. Em dois meses, tinha dez vezes mais
pedidos. Com quatro máquinas em operação, a empresa produz 2 mil bonecos por mês. O cliente
identifica seu personagem e escolhe uma pose e um pedestal para o boneco, vendido a US$ 100.
O faturamento mensal de US$ 200 mil paga custos, salários dos quatro sócios, taxa de 6% de
direitos autorais à Wizard, dona do jogo, parcelas do empréstimo bancário feito para montar o
negócio e ainda gera lucro.

A tecnologia em seu estágio atual já permite fazer objetos de plástico, metal, silicone e gesso. No
lugar de ir às lojas, consumidores poderão baixar arquivos digitais de sites especializados e
imprimir produtos cada vez mais refinados
A meta para 2009 é internacionalizar o negócio. “Em breve, vamos atender também a Europa e
planejamos fazer o mesmo na Ásia, o que deve criar um mercado quatro vezes maior do que
temos hoje”, afirma Fries. A FigurePrints faz parte de um segmento que surgiu de uma
revolução, que começa com o barateamento da impressão 3D.

A empresa americana não está sozinha. A holandesa Shapeways, que nasceu no centro de
pesquisas da Philips, chegou ao mercado em julho do ano passado. Artistas, arquitetos e
designers enviam arquivos digitais de suas criações pela internet para concretizá-las por preços
que variam entre US$ 50 e US$ 150. O programa de computador da empresa analisa as
informações para verificar a viabilidade de produzi-las e, em alguns casos, faz ajustes. Isso inclui
até projetos mais complexos, com partes móveis. “Você pode fazer, por exemplo, um relógio que
funciona de verdade”, diz Peter Weijmarshausen, presidente da Shapeways. O objeto é entregue
em até dez dias.

As impressoras usadas por esses negócios não custam mais o preço de uma casa, mas ainda não
são uma opção economicamente viável para o consumidor comum.

Pensando em resolver essa equação de preço, o estudante americano Evan Malone usou seu
talento em engenharia para criar uma máquina capaz de ser montada em casa. A Fab@Home é
mais lenta e tem menos resolução do que as suas concorrentes comerciais, mas conta com uma
vantagem: as instruções para construí-la estão disponíveis na internet. Desde então, outro
modelo, a RepRap, chegou ao mercado com a mesma filosofia. Qualquer um com pelo menos
US$ 2 mil no bolso, habilidades e tempo disponível pode ter a sua.

Mas a real revolução ainda está por vir. A Desktop Factory quer ser a Apple da impressão 3D.
Desde 2004, a empresa americana trabalha para criar uma alternativa mais eficiente e fácil de
usar do que as impressoras montadas pelos usuários, e mais baratas do que os modelos
comerciais. Sua arma para chegar lá é uma impressora de US$ 5 mil. A tarefa tem se provado
mais difícil do que se imaginava.

No ano passado, todo o design foi refeito para acabar com os entupimentos recorrentes. Cathy
Lewis, presidente da companhia, quer lançar a primeira leva da nova geração de impressoras até
junho deste ano. Mas ela não se dará por satisfeita quando seu modelo de US$ 5 mil chegar ao
mercado. “Acredito que seja preciso uma versão de US$ 1 mil para que haja uma adoção em
massa”, diz Cathy. “Vamos chegar lá em cinco anos.”

A ambição de Cathy é tornar as impressoras 3D tão corriqueiras quanto os modelos tradicionais e


permitir, assim, que os usuários fabriquem as próprias lanternas, bonecas, calçados e até mesmo
joias. Esse futuro não está tão longe quanto se imagina.

Uma previsão feita pelo instituto de pesquisas americano Gartner aponta que até 2011 existirão
300 mil impressoras 3D no mercado. Em 2007, pouco mais de 3,5 mil foram vendidas. Hoje, a
tecnologia já evoluiu a ponto de ser usada por médicos para fazer próteses de titânio, implantes
dentários e aparelhos auditivos. Já há estudos para criar objetos biodegradáveis e “imprimir”
amostras de pele, vasos sanguíneos e órgãos para transplante de células humanas contidas em um
gel. “O céu é o limite”, afirma Cathy.

O cientista Thomas Easton, que está finalizando um livro sobre a revolução da impressão em 3D,
equipara o estágio atual da tecnologia ao computador pessoal nos anos 70. “Assim como os PCs,
vai evoluir e se tornar acessível a um número cada vez maior de pessoas”, afirma Easton.
“Objetos passarão a ser informação e isso vai mudar radicalmente a forma como as empresas
operam.”

No lugar de ir às lojas, consumidores poderão baixar arquivos digitais vendidos ou fornecidos de


graça por designers, como acontece no site neozelandês Ponoko, e imprimir produtos cada vez
mais refinados. Outros sites irão surgir. Varejistas digitais, como a Amazon, terão de se adaptar.
Empresas montarão negócios baseados na produção de coisas que poderão ser feitas em casa.
“Essa mudança não será instantânea”, diz Easton. “Mas as empresas que a ignorarem ficarão à
margem do mercado. Quem entender antes, terá um negócio bem sucedido.”

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