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ARTIGO
fatores que hoje o tornam objeto de várias críticas. treinamento para gerentes, focando habilidades no
Paralelamente, são mostrados os princípios básicos relacionamento interpessoal. No entanto, ainda se
do sistema de gestão por competências, suas tratava do “desenvolvimento de habilidades, e não
principais vantagens, bem como os fatores que de competências sociais, que agregassem valor à
levam à sua adoção. organização” (FLEURY, 1999).
Na década de 60 surgiu na Europa a abordagem
2. A UTILIZAÇÃO DOS CARGOS COMO sociotécnica, elaborada inicialmente por psicólogos
ELEMENTO-BASE DA GESTÃO DE sociais. O trabalho começava, já aí, a assumir
PESSOAS formas mais complexas e menos mecanicistas,
porém ainda sem relação mais profunda com a
Os sistemas de Gestão de Recursos Humanos que estratégia da empresa. Nos anos 80, foi marcante o
têm como elemento-base os cargos constituem hoje surgimento do modelo japonês de gestão, que se
a forma mais comum de sistema de Administração caracterizava por adotar o “trabalho cooperativo e
de Recursos Humanos encontrada nas empresas, de equipe, a falta de demarcação das tarefas a partir
embora venham sendo crescentemente questionados dos postos de trabalho e tarefas prescritivas a
por sua inflexibilidade e dificuldade de indivíduos” (HIRATA apud HIPÓLITO, 2000).
compatibilização com as novas formas
organizacionais e com a velocidade da organização O sucesso das empresas japonesas levou os
do trabalho. O método dos pontos, que é uma forma países ocidentais a repensarem suas concepções
de avaliação quantitativa dos cargos para determinar sobre organização e gerenciamento do trabalho.
a remuneração, foi criado por Merrill Lott e tornou- Ainda, o aumento da competição empresarial e da
se o método de avaliação de cargos mais utilizado diversificação da linha de produtos oferecidos pelas
no mundo (CHIAVENATTO, 1999: 236). empresas como fator de diferenciação favoreceu o
surgimento do conceito de gerenciamento dos
O início da utilização dos cargos como elemento- recursos humanos, alinhando a estratégia relativa às
base da gestão de pessoas dá-se juntamente com o pessoas à estratégia empresarial (FLEURY, 1999).
início da era industrial, atrelado aos modelos de Com o surgimento desse enfoque passou-se a dar
gestão Taylorista e Fordista (DUTRA, 1999), cuja maior importância ao desenvolvimento dos
característica mais marcante é o emprego da funcionários, como recurso para desenvolver as
produção em linha, que possibilitou o rápido estratégias empresariais. Várias práticas, como a
crescimento da indústria na época. A remuneração reengenharia, o downsizing, entre outras, foram
dos funcionários incluía, geralmente, pagamento criadas e tiveram seus momentos de destaque nessa
por peça (WOOD e PICCARELLI, 1999:32). fase e, segundo NAISBITT (apud HIPÓLITO,
Constitui-se em um sistema concebido pela lógica 2000), “fazem parte de um mesmo fenômeno: o
da engenharia, cujo principal papel era reduzir os desmantelamento das burocracias, na busca pela
custos com mão-de-obra e aumentar a produção, sobrevivência” em um ambiente competitivo.
minimizando o erro humano. Com o avanço da
industrialização, o sistema baseado no cargo foi 2.1. Deficiências do Sistema de Gestão baseado
tomando forma, com técnicas de análise, nos Cargos
especificação e avaliação de cargos. Por meio desse
A forma de gerir pessoas vem-se aprimorando
sistema facilitava-se a operacionalização do sistema
lado a lado com as diversas práticas de gestão
salarial, agrupando-se as muitas funções da fábrica
empresarial, sofrendo os impactos das crises
conforme as características semelhantes.
econômicas mundiais do crescente aumento da
Altamente técnico no início, o sistema de gestão competição entre as empresas e da globalização. O
baseado no cargo foi sofrendo mudanças ao longo Sistema de Gestão baseado no cargo tem sofrido
de sua existência, passando a dar maior ênfase aos muitas críticas, já que foi concebido em um
aspectos comportamentais. Já na década de 30 mercado com baixa variabilidade de produtos e
surgiam programas mais estruturados de ganhos de escala, e que se caracterizava por exibir
mão-de-obra abundante, com baixa exigência de • Metodologia desatualizada, que faz com que o
qualificação, e atividade de produção rotineira e sistema passe uma “ilusão de mensuramento”
estruturada (DUTRA, 1999). Entre as limitações (EMERSON, 1991:48), pois tenta quantificar as
dos sistemas tradicionais apontadas pela literatura, funções com uma falsa objetividade (HIPÓLITO,
podem-se citar: 2000) sobre a realidade organizacional. Muitas
vezes, na tentativa de agrupar várias funções
• Falta de flexibilidade do sistema baseado nos
numa mesma descrição de cargo, acaba-se por
cargos, que está-se tornando obsoleto dadas as
não descrever bem nenhuma das funções
condições atuais em muitos mercados, tais como
agrupadas (EMERSON, 1991:40). Há ainda o
a reestruturação organizacional, o downsizing, a
alto custo de revisão do sistema: manutenção
reengenharia, a introdução de novos produtos no
trabalhosa, muito tempo gasto com comitês de
mercado, e até mesmo o surgimento de novas
avaliação de cargos, e, por vezes, desperdiçado
formas de organização do trabalho, como as
pois o sistema tem vida curta (WOOD e
equipes virtuais. Em virtude dessas mudanças, os
PICCARELLI, 1999).
funcionários têm trabalho a ser feito, mas muitos
não terão um cargo certo e bem definido por • Centralização das decisões na área de RH,
muito tempo (LAWLER III, 1998: 57). O sistema impedindo que os gerentes, principais
atual acaba por apresentar “baixa flexibilidade, responsáveis pelo dia-a-dia dos funcionários,
reduzindo a agilidade organizacional”, possam opinar nas decisões salariais. Nos
promovendo um “estilo burocrático de gestão” sistemas tradicionais a “descentralização das
(HIPÓLITO, 2000). decisões salariais” é inviável (HIPÓLITO, 2000).
•O sistema tradicional de gestão não recompensa • Desalinhamento com a estratégia da empresa,
os funcionários pelo que realmente se espera que com uma grande “dificuldade em acompanhar e
eles façam, já que as faixas salariais, nos sistemas sinalizar os objetivos organizacionais”
baseados no cargo, tendem a reproduzir o valor (HIPÓLITO, 2000), privilegiando as “ligações
de mercado: média, valores máximo e mínimo. hierárquicas em detrimento do foco nos processos
Raramente os gestores têm permissão para críticos e no cliente” (WOOD e PICCARELLI,
remunerar o indivíduo acima das faixas salariais, 1999).
não importa quanto o desempenho esteja acima
• Incentivo ao carreirismo, o que torna as
da média (EMERSON, 1991: 40). Dado o uso dos
promoções verticais excessivamente importantes
cargos, geralmente reconhece-se o tempo e não a
e dificulta a convergência de esforços para
contribuição dos funcionários quando da tomada
objetivos comuns (WOOD e PICCARELLI,
de decisões; assim, o sistema não “encoraja o
1999: 43).
desenvolvimento de habilidades e competências”
(HIPÓLITO, 2000). • Limitação da área de atuação das pessoas,
induzindo “as pessoas a se enxergarem dentro de
• Falta de confiança nas informações obtidas de
um sistema sobre o qual elas têm pouca ou
pesquisa salarial (HIPÓLITO, 2000), já que em
nenhuma influência e, conseqüentemente,
razão das mudanças freqüentes nas organizações,
consideram sua responsabilidade limitada à sua
a mesma denominação para um cargo nem
área de função” (SENGE apud HIPÓLITO, 2000:
sempre significa as mesmas atribuições em
40).
organizações diferentes. As funções
desempenhadas por indivíduos que teoricamente
2.2. Por que hoje o Sistema de Gestão baseado
ocupam os mesmos cargos são com freqüência
no Cargo ainda é o mais utilizado?
diversas em organizações diferentes, já que o
mais comum ultimamente são funções pouco Apesar de se apontarem várias limitações ao
padronizadas, que variam muito segundo a sistema que utiliza os cargos como elementos-base
realidade de cada empresa e de cada mercado. da gestão de pessoas, ele ainda hoje é o sistema
mais utilizado, embora em processo de atualização
Quadro 3.1: Pesquisa RH2010: Principais focos têm que ser desenvolvidas para se chegar a essa
de atenção das empresas nos próximos 10 anos estratégia. Porém, “as organizações que se
esforçarem neste sentido certamente conquistarão
Filosofias e Princípios de Gestão Sim uma vantagem competitiva importante sobre as
Diferentes vínculos de trabalho e formas demais” (WOOD e PICCARELLI, 1999: 88).
de relacionamento 97% Vários autores têm tentado definir o conceito de
Autodesenvolvimento 97% competência, e isso hoje representa uma das
Comprometimento da força de trabalho dificuldades encontradas para a difusão do sistema:
com os objetivos organizacionais 97% sua difícil conceitualização. Os primeiros conceitos
de competência surgiram nos estudos de
Gestão por Competências 96%
PRAHALAD e HAMEL (apud FLEURY, 1999),
Educação Corporativa 96% que definiram competência essencial como o
Empowerment 95% conjunto de habilidades e tecnologias necessárias
Gestão do Conhecimento 95% para agregar valor a uma organização. Para
diferenciar as competências essenciais das não-
Empregabilidade 93%
essenciais, é preciso considerar que uma
Gestão de RH coerente com negócios 92% competência essencial deve, de acordo com os
Fonte: Pesquisa RH 2010, 2000. autores, passar por três testes:
• Valor percebido pelo cliente: as competências
Inicialmente, o conceito de competência surgiu essenciais são as habilidades que permitem à
com base nas core competencies, ou competências empresa oferecer um benefício fundamental ao
essenciais, conceito desenvolvido por PRAHALAD cliente;
e HAMEL apud FLEURY (1999). De acordo com
os autores, o aumento de competição entre as • Diferenciação entre concorrentes: a competência
empresas, conhecimentos altamente perecíveis, essencial também deve representar uma
principalmente sobre a tecnologia, e grande característica que torne uma organização única entre
instabilidade são alguns dos fatores que fizeram – e seus concorrentes, muitas vezes não por ser a única
fazem – com que as empresas passem de uma a possuir aquela característica, mas sim por possuir
perspectiva de estrutura estável para a de essa competência num grau acima da média do
instabilidade e generalidade, orientadas por um mercado;
conjunto de competências que as diferenciem da • Capacidade de expansão: as competências essenciais
concorrência; as posições defensivas dão lugar a um são as “portas de entrada para os mercados do
desenvolvimento de vantagem competitiva que se futuro”, ou seja, devem dar vazão a uma gama de
sustente, e a estratégia alinhada ao mercado passa a novos produtos imaginados ou serviços a serem
ser uma estratégia que pressupõe que o mercado gerados a partir dela.
apresenta tantas mudanças e possibilidades que
torna necessária uma visão consistente para “criar” As competências essenciais devem, portanto, ser
as oportunidades de realização. um parâmetro norteador das políticas da empresa
em geral. Sob o ponto de vista da Gestão de
Assim, esse é um sistema que se liga menos às Pessoas, as competências tendem a estar
atividades cotidianas e operacionais do que os relacionadas com os indivíduos que fazem parte da
sistemas que ainda têm por base o elemento cargo, e organização. Assim, as competências individuais
que está mais voltado para o futuro da organização devem ser decorrentes das core competencies, que
como um todo, para a sua estratégia (LEDFORD, são atribuídas à organização.
1995). Prever o futuro, contudo, não é tarefa
simples; poucas empresas têm posicionamento Uma das definições mais conhecidas e aceitas
estratégico claro, ou visão clara sobre seu futuro, sobre o conceito de competência, já no sentido mais
daí a dificuldade em estabelecer quais competências individualizado, é dada por FLEURY (1999):
o escopo de seu projeto de gestão por competências, considerados pelas organizações por determinarem
pois ainda hoje há organizações cujo sistema de os pontos que mais se adequam à realidade da
produção, ao menos em parte, assemelha-se muito empresa e, dependendo do seu porte, até mesmo à
aos sistemas tradicionais, específicos e rotineiros. realidade de partes da organização (Quadro 3.2).
Assim, existem alguns parâmetros que devem ser
Específico Genérico
Tradicional Moderno
Observável Abstrato
Durável Temporário
Cada parâmetro, de acordo com LAWLER III desenvolvidas, que estejam ligadas ao plano
(1998), deverá ser analisado para formar o sistema futuro da empresa. A vantagem de utilizar
que mais se adeque a cada organização, conforme competências já existentes é que elas são
segue: familiares à organização e se aplicam bem a
organizações estáveis. Porém, em alguns casos é
1. Especificidade X Generalidade. Quanto mais
necessário prever as necessidades futuras.
atreladas a um cargo específico, menos gerais se
tornam as competências. Elas podem ser 3. De baixo para cima X De cima para baixo. Pode-
determinadas dessa maneira quando dizem se determinar as competências com base no que
respeito a um certo cargo ou área da empresa. Já os indivíduos utilizam para desempenhar seus
com relação aos objetivos estratégicos, as papéis, para então chegar à estratégia da
competências tendem a ser menos específicas, e empresa, no topo da estrutura organizacional.
se aplicam a todos os funcionários da Esse método é muito parecido com o desenho
organização. dos sistemas tradicionais, portanto já conhecido
e mais fácil de ser aplicado. Quando se parte da
2. Tradicionalismo X Modernidade. O sistema
estratégia para as funções, tem-se como base a
pode também dar ênfase às competências que já
premissa de que as competências são mais
existem na organização, apresentadas por
relacionadas à estratégia da empresa do que ao
indivíduos de alta performance, ou então
que se pratica atualmente.
enfatizar novas competências, ainda por serem
12.5% 5.0%
13.3%
20.0%
14.2%
35.0%
Em média, os participantes são homens na faixa com a opinião de pessoas altamente qualificadas,
dos 40 anos de idade, dos quais a grande maioria capacitadas para nos dar um panorama da área de
(85%) passou por algum curso de especialização. Recursos Humanos.
Isso demonstra claramente que a pesquisa contou
“cima para baixo”, ou seja, da “estratégia para a com desempenho muito acima ou muito abaixo da
tarefa” (LAWLER III, 1998). média, que são geralmente os que mais chamam a
atenção dos gerentes no dia-a-dia, quando imperam
No âmbito dos funcionários, a Gestão por
os métodos tradicionais (GREENGARD, 1999;
Competências surge como um fator motivacional, já
KOCHANSKI, 1998).
que incentiva o desenvolvimento pessoal e
profissional dos funcionários, pois eles vão O sistema de Gestão por Competências
adquirindo mais e melhores competências. acompanha a “velocidade de comercialização de
Ultimamente, vêm ocorrendo mudanças no conjunto produtos no mercado, a satisfação dos clientes” e “a
de expectativas das pessoas em relação às suas flexibilidade” dos mercados atualmente
carreiras (DUTRA, 1999), uma vez que as pessoas (KOCHANSKI, 1998).
estão “cada vez mais remetidas a elas mesmas como
Por fim, o Sistema de Gestão por Competências
referência para sua relação com o mundo, estando
“representa uma mudança cultural em direção a um
cada vez mais mobilizadas por valores como
maior senso de responsabilidade e autogestão dos
autonomia e liberdade nas suas escolhas de
funcionários” (KOCHANSKI, 1998), o que vem em
carreira”. Também ganham maior atenção aspectos
resposta a uma das maiores preocupações atuais dos
como integridade física, psíquica e social, e, nesse
gestores, que consiste em aumentar o
sentido, a Gestão por Competências surge como
comprometimento dos funcionários com os
fator motivacional e de retenção de talentos.
resultados do negócio (ALBUQUERQUE e
O que acaba ocorrendo, nesse sentido, é uma FISCHER, 2000).
maior pressão para que as empresas sejam
transparentes com as pessoas e possuam processos
6. LIMITAÇÕES DO ESTUDO
de comunicação mais eficientes, gerando assim uma
maior expectativa de vida em geral, o que amplia o O presente trabalho foi realizado com base numa
tempo de vida profissional ativa dos funcionários. revisão bibliográfica, e em partes do resultado da
Existe hoje uma “maior exigência de condições pesquisa RH 2010, que tratou de tendências na
concretas para o contínuo desenvolvimento” gestão de pessoas. Para um estudo mais
(DUTRA, 1999) e pressão para que as pessoas aprofundado do tema, seria necessário um estudo de
continuamente se atualizem, como condição para casos de implantação do Modelo de Gestão por
sua empregabilidade. De fato, a questão da Competências e de seus resultados. Porém, em
empregabilidade foi apontada por 94% dos virtude do fato de o tema ser recente, é grande a
participantes da Pesquisa RH2010 como uma das dificuldade em encontrar informações sobre casos já
maiores preocupações quando da tomada de decisão implementados.
na Gestão de Pessoas, e, conforme foi visto, está
relacionada com os pontos positivos oferecidos pelo
Sistema de Gestão por Competências. 7. RECOMENDAÇÕES DE ESTUDO
O desenvolvimento das competências no novo Para maior aprofundamento, recomenda-se um
modelo é também incentivado de forma autogerida, estudo mais detalhado das mudanças que o Modelo
ou seja, os funcionários passam a gerenciar o de Gestão por Competências traz às diversas
próprio desenvolvimento (GROVES, 1999). Essa é práticas de Recursos Humanos: remuneração,
uma característica que surge como resposta à treinamento, recrutamento e seleção, avaliação de
preocupação das empresas de incentivar o desempenho e planos de carreira.
autodesenvolvimento de seus funcionários, e foi
consenso entre os participantes da pesquisa.
8. CONCLUSÃO
As competências também proporcionam um
método estruturado para remunerar o desempenho Este trabalho faz um paralelo entre os sistemas
de todos os funcionários, e não somente daqueles tradicionais de gestão de pessoas, baseados no