10 Saúde
Saúde na rede altera
relacionamento entre
médicos e pacientes
Buscar informações sobre doenças na internet propicia uma
conduta mais participativa frente a diagnósticos e tratamentos
“As pessoas mentem.” Essa é a má-
xima que o arrogante Dr. House usa
para justificar seus métodos de diag-
nosticar sem, ao menos, comunicar-se
diretamente com seus pacientes. Gre-
gory House é personagem de um seria-
do norteamericano que de certa forma
ilustra um comportamento típico do
relacionamento “médico-paciente” na
América Latina. A tese da pesquisadora
em Saúde Pública da USP, Wilma Ma-
deira da Silva, mostra que a utilização
da internet como fonte de informação
tem possibilitado uma participação
mais ativa dos pacientes diante de um
diagnóstico.
Durante três meses, a pesquisadora
disponibilizou um questionário on-
line de 16 perguntas discursivas sobre
o uso da internet para a obtenção de
informações relativas à saúde de pa-
cientes ou de pessoas próximas a eles.
As questões foram respondidas por 116
pessoas. O material mostrou que os in-
ternautas acessam a rede pelo menos
uma vez por semana para se informa-
rem sobre o assunto.
Segundo os estudos de Wilma, os
países latinos têm uma tradição pa-
ternalista no atendimento médico, ou
seja, uma relação de mando e sub-
missão. Entre vários entraves aponta-
dos por ela estão a falta de tempo no
atendimento, que impede o estabeleci-
mento de vínculos entre profissionais
e pacientes, e uma prática médica
autoritária, de quem detém o conhe-
cimento frente ao paciente leigo. “Não
se trata de um problema existente ape-
nas no âmbito da assistência da rede
pública, ou do SUS, mas também iden-
tificado no setor privado”, acrescenta
Wilma.
A facilidade em encontrar infor-
mações na web pode ter um impacto
positivo nessa relação. Na pesqui-
sa, cerca de 67,2% das informações
trazidas pelo paciente serviram de
subsídios para decidir sobre os pro-
cedimentos realizados. Outro dado
relevante é que mais da metade dos
participantes afirmam que houve
uma reação negativa por parte dos
médicos frente ao interesse dos pa-
cientes em buscar mais informações
na internet.
Em julho deste ano, a médica Lu-
ana Fanha Souto, clínica geral que
trabalha no Centro Hemoterápico de
Blumenau, lançou o livro Autonomia
Sofia Franco cados 47.437 portadores com idade desfavorecer a ereção. “Quando um
Dra. Luana Souto adverte que existem muitas páginas com dados errados ou incompletos
do Paciente na Prática Médica. Ela estão em tratamento: “é preciso ter guém que hoje tem seus 60 anos não vativo nas relações sexuais.
defende que a autonomia é uma con- confiança no site ou na mídia onde se viveu essa situação de risco quando
dição na qual “o doente é o paciente, conseguiu os dados. Eles precisam ter começou a ter relações sexuais. Já era
a doença é dele e, por isso, ele deve credibilidade. Tem muita informação
participar ativamente do processo. errada ou desencontrada”.
Questionar sem no entanto, afrontar Um caso desses já aconteceu com a
o médico”. Já a conduta adequada do médica. Um paciente com fibromialgia
profissional seria a de escutar quem chegou ao pronto atendimento e pediu
está doente e tentar adaptar o trata- para que seu problema fosse tratado
mento ao estilo de vida do paciente, a com o mesmo medicamento receitado
sua condição financeira e a seus há- pelo médico do seriado House. Porém,
bitos. nem todos os medicamentos autoriza-
Segundo Luana, o conhecimento dos no exterior podem ser vendidos no
obtido na rede é útil para ambos. Ao país. “Tive de explicar que o remédio
escutar o paciente, cria-se um vínculo só é permitido nos EUA e que o órgão
de confiança, benéfico para os dois: os de controle deles, o FDA - Food and
médicos garantem um maior compro- Drugs Administration - era super rígi-
metimento dos pacientes no tratamen- do com o consumo da droga, pois cau-
to e os pacientes, muitas vezes, trazem sa fortíssima dependência química”,
atualidades sobre novas formas de se exemplifica Luana.
tratar determinadas doenças. No en-
tanto, ela faz um alerta àqueles que Fernanda Martins
Florianópolis, setembro de 2009
Sobe incidência do vírus HIV em
pessoas acima de 50 anos
O mais recente levantamento so- adulto na época em que o vírus (HIV)
bre a Aids no Brasil constata que o começou a se manifestar, com hábi-
vírus HIV não respeita os mais velhos. tos formados e relações estáveis. Por
Segundo dados do Ministério da Saú- isso, não tem a preocupação em usar
de, as pessoas acima de 50 anos con- o preservativo”, relata.
taminadas pelo HIV já representam Viotti também declara que o medo
9% do total de infectados. Somente da disfunção erétil é um agravante
em 2007, foram registrados 4.715 no- contra o uso de camisinha por ho-
vos casos nessa faixa etária. Em 1997, mens na terceira idade. Segundo o
esse número não chegava a 2 mil. médico, os problemas de ereção au-
O primeiro caso de Aids em pes- mentam com o passar dos anos, o que
soa com mais de 50 anos de idade foi gera insegurança. Assim, o momento
notificado em 1982. Desde então, até de colocar o preservativo pode tra-
junho de 2008, já foram diagnosti- zer ansiedade e, consequentemente,
avançada. De acordo com o médico homem passa por uma situação de
infectologista Eduardo Campos Oli- estresse, a excitação é cortada ime-
veira, o aumento do contágio em diatamente. Por isso, a chance de ele
pessoas mais velhas está relacionado, perder o enrijecimento do pênis ten-
principalmente, ao advento de medi- tando colocar a camisinha é muito
camentos contra a disfunção erétil, grande. Por isso, não é à toa que se
como o Viagra, e à falta de uso de vê os casos de HIV aumentando nessa
preservativos. faixa etária”, aponta Oliveira.
Conforme a Sociedade Brasileira Os médicos entrevistados esclare-
de Urologia, quase 50% da população cem que o vírus age da mesma forma
masculina com mais de 40 anos sofre em pacientes jovens e idosos. Entre-
de disfunção erétil, isto é, possui di- tanto, quanto maior a idade, maior
ficuldade em ter e manter a ereção. a chance de a Aids agravar as enfer-
Até início da década de 90, não existia midades já pré-existentes. “Na maio-
medicamento para combater o pro- ria das vezes, as pessoas mais velhas
blema. Em 1998, o Viagra chegou ao apresentam problemas-base de saú-
país e trouxe uma nova perspectiva de, como hipertensão, doença pulmo-
para muitos brasileiros. nar e coronariana. Com o HIV, essas
O uso do remédio se popularizou. doenças tendem a piorar”, explica
Além de fácil de usar, o fármaco apre- Oliveira. O geriatra Viotti acrescenta
senta poucas contraindicações e é que o tratamento da Aids em idosos é
muito eficaz. Na maior parte dos ca- mais complicado: “o organismo dos
sos, melhora extremamente a ereção, idosos é um pouco mais frágil, tanto
a rigidez e o tempo de recuperação por causa das enfermidades, quanto
para uma nova ereção. No entanto, pelo uso de remédios para tratá-las.
com a maior possibilidade de manter Assim, sua capacidade de recupera-
uma prática sexual satisfatória, cres- ção é um pouco menor. A infecção
ceram também as chances de prolife- pelo HIV abala muito a imunidade, e
ração da Aids, visto que muitos idosos o uso de drogas mais fortes e comple-
renegam o uso de camisinha e que xas, como os antivirais, torna-se mais
relações sexuais desprotegidas são a complicada”.
principal forma de contágio do HIV. Para diminuir o contágio na ter-
O médico especialista em clínica ceira idade, o Ministério da Saúde
médica e geriatria Rogério Guedes lançou em dezembro de 2008 a pri-
Viotti afirma que a falta de costu- meira campanha contra o HIV volta-
me é um dos motivos que explicam da para pessoas acima de 50 anos. A
a resistência ao uso de preservativos iniciativa tem o objetivo de despertar
entre pessoas na terceira idade. “Al- adultos e idosos para o uso de preser-
Angieli Maros
Histórico
De 1984 a 2007, foram registrados em Santa Catarina aproximadamente 20 mil casos de Aids.
Desses, 2.115 são em indivíduos com 50 anos de idade ou mais, sendo a maior parte em homens
Joinville 214
Blumenau 133
38 Chapecó
Itajaí 152
São José
105
36,13% dos
soropositivos com 282 Florianópolis
mais de 50 anos são
mulheres Criciúma 99
63,87% são homens, num total Fonte: Vigilância Sanitária de SC
de 1.207 infectados Infográfico: Rogério Moreira Júnior