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1939

Nessa obra de Cecília Meireles, há 85 romances, além de outros poemas, como os que
retratam os cenários. Em sua composição, é utilizada principalmente a medida velha, ou
seja, a redondilha menor, verso de cinco sílabas poéticas (pentassílabo) e,
predominantemente, a redondilha maior, verso de sete sílabas (heptassílabo), como
ocorre na “Fala Inicial”:

Não posso mover meus passos


por esse atroz labirinto
de esquecimento e cegueira
em que amores e ódios vão:
(...)

No entanto, deve-se observar que, por ser uma autora moderna, Cecília não se prende
totalmente a esse modelo. Vale-se, também, de versos mais curtos, de quatro sílabas,
como em “Fala aos Inconfidentes Mortos”:

Treva da noite,
lanosa capa
nos ombros curvos
dos altos montes
aglomerados...
(...)

Há também os mais longos, como os decassílabos em “Cenário”, no início:

Passei por essas plácidas colinas


E vi das nuvens, silencioso, o gado,
Pascer nas solidões esmeraldinas.
(...)

Quanto às rimas, a autora utiliza as chamadas imperfeitas (terminações de versos


semelhantes), como se pode observar no Romance XIII:

Eis que chega ao Serro Frio,


à terra dos diamantes,
o Conde de Valadares,
fidalgo de nome e sangue,
José Luís de Meneses
de Castelo Branco e Abranches.
Ordens traz do grão Ministro
de perseguir João Fernandes.
(...)

A escritora faz uso, ainda, de rimas perfeitas (terminação em sons vocálicos e


consonantais idênticos), tal como no Romance VI:

Já se preparam as festas
para os famosos noivados
que entre Portugal e Espanha
breve serão celebrados.
Ai, quantas cartas e acordos
redigidos e assinados!
(...)

CONTEXTO HISTÓRICO
Romanceiro da Inconfidência caracteriza- se como uma obra lírica, de reflexão, mas
com um contexto épico, narrativo, firmemente calcado na história. Em 1789, inspirados
pelas idéias iluministas européias e pela independência dos Estados Unidos, alguns
homens tentam organizar um movimento para libertar a colônia brasileira de sua
metrópole portuguesa.

Uma pesada carga tributária sobre o ouro extraído das Minas Gerais deixava os que
viviam dessa renda cada vez mais descontentes. Assim, donos de minas, profissionais
liberais – entre os quais alguns poetas árcades – e outros começaram a conspirar contra
Portugal. Contudo, o movimento é delatado e os envolvidos, presos. Alguns são
condenados ao exílio, e o único a ser executado, na forca, é Tiradentes, em 21 de abril
de 1792.

GÊNESE EM OURO PRETO


Nessa obra, Cecília Meireles utiliza-se, pela primeira vez, da temática social, de
interesse histórico e nacional, enfatizando a luta pela liberdade. Sem aprofundadas
reflexões filosóficas, mas com muita sensibilidade, a autora dá uma visão mais humana
dos protagonistas daquele que foi o primeiro grande movimento de emancipação do
Brasil: a Inconfidência Mineira.

Como se trata de um fato histórico, e dos mais importantes, a autora tem o cuidado de
não se limitar a relatá-lo em versos, mas procura recriá-lo por meio da imaginação.

A gênese da obra ocorreu, de acordo com depoimento da escritora, quando foi pela
primeira vez à cidade de Ouro Preto (ex-Vila Rica), local onde se organizou o
movimento de Tiradentes e seus companheiros.

Cecília afirmou: “Todo o presente emudeceu, como platéia humilde, e os antigos atores
tomaram suas posições no palco. Vim com o modesto propósito jornalístico de
descrever as comemorações de uma Semana Santa; porém os homens de outrora
misturaram-se às figuras eternas dos andores; (...) na procissão dos vivos caminhava
uma procissão de fantasmas (...). Era, na verdade, a última Semana Santa dos
inconfidentes: a do ano de 1789”.

ROMANCES
Tematicamente, pode-se localizar a ambientação da narrativa nos primeiros 19
romances. A descoberta do ouro, o início de uma nova configuração social com a
chegada dos mineradores e toda a estrutura formada para atendê-los, os costumes, os
“causos”, como o da donzela morta por uma punhalada desferida pelo próprio pai
(Romance IV), ou os cantos dos negros nas catas (VII), o folclore, a história do
contratador João Fernandes e de sua amante Chica da Silva e o alerta sobre a traição do
Conde de Valadares (XIII a XIX). A ênfase recai na cobiça do ouro, que torna as
pessoas inescrupulosas.
Vila Rica é o “país das Arcádias”, numa alusão direta ao neoclassicismo brasileiro, com
seus principais poetas e suas pastoras: Glauceste Satúrnio e Nise, Dirceu e Marília. No
belo Romance XXI, as primeiras idéias de liberdade começam a circular.

A partir do Romance XXIV, a insatisfação, a revolta contra a corte portuguesa é


explicitada com a confecção de uma bandeira (Libertas quae sera tamen). Do XXVII ao
XLVII, há a atuação do alferes Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, que
procurava atrair mais gente para a conspiração, em longas cavalgadas pela estrada que
levava ao Rio. Contudo, os planos são abortados antes de ser efetivamente colocados
em prática por causa dos delatores, principalmente Joaquim Silvério dos Reis (XXVIII):

(...)
Ai, que o traiçoeiro invejoso
junta às ambições a astúcia.
Vede a pena como enrola
arabescos de volúpia,
entre as palavras sinistras
desta carta de denúncia!
(...)

Segue-se uma devassa completa, prisões, confisco de bens, falsos testemunhos, a morte
de Cláudio Manuel da Costa, o Glauceste Satúrnio, sob condições misteriosas (XLIX), a
execução de Tiradentes, antecipada na fala do carcereiro (LII) e explicitada nos
romances LVI a LXIII:

(...)
Já lhe vão tirando a vida.
Já tem
Fruto de longa pesquisa histórica, Romanceiro da Inconfidência é, para muitos, a
principal obra de Cecília Meireles. Nesse livro, por meio de uma hábil síntese entre o
dramático, o épico e o lírico, há um retrato da sociedade de Minas Gerais do século
XVIII, principalmente dos personagens envolvidos na Inconfidência Mineira, abortada
pela traição de Joaquim Silvério dos Reis, o que culminou na execução de Tiradentes.

GÊNERO ROMANCEIRO
O gênero romanceiro é uma coleção de poesias ou canções de caráter popular. De
tradição ibérica, surgiu na Idade Média e é, em geral, uma narrativa com um tema
central. Cada parte tem o nome de romance – que não deve ser confundido com a
denominação do atual gênero em prosa.

Nessa obra de Cecília Meireles, há 85 romances, além de outros poemas, como os que
retratam os cenários. Em sua composição, é utilizada principalmente a medida velha, ou
seja, a redondilha menor, verso de cinco sílabas poéticas (pentassílabo) e,
predominantemente, a redondilha maior, verso de sete sílabas (heptassílabo), como
ocorre na “Fala Inicial”:

Não posso mover meus passos


por esse atroz labirinto
de esquecimento e cegueira
em que amores e ódios vão:
(...)

No entanto, deve-se observar que, por ser uma autora moderna, Cecília não se prende
totalmente a esse modelo. Vale-se, também, de versos mais curtos, de quatro sílabas,
como em “Fala aos Inconfidentes Mortos”:

Treva da noite,
lanosa capa
nos ombros curvos
dos altos montes
aglomerados...
(...)

Há também os mais longos, como os decassílabos em “Cenário”, no início:

Passei por essas plácidas colinas


E vi das nuvens, silencioso, o gado,
Pascer nas
Fruto de longa pesquisa histórica, Romanceiro da Inconfidência é, para muitos, a
principal obra de Cecília Meireles. Nesse livro, por meio de uma hábil síntese entre o
dramático, o épico e o lírico, há um retrato da sociedade de Minas Gerais do século
XVIII, principalmente dos personagens envolvidos na Inconfidência Mineira, abortada
pela traição de Joaquim Silvério dos Reis, o que culminou na execução de Tiradentes.

GÊNERO ROMANCEIRO
O gênero romanceiro é uma coleção de poesias ou canções de caráter popular. De
tradição ibérica, surgiu na Idade Média e é, em geral, uma narrativa com um tema
central. Cada parte tem o nome de romance – que não deve ser confundido com a
denominação do atual gênero em prosa.

Nessa obra de Cecília Meireles, há 85 romances, além de outros poemas, como os que
retratam os cenários. Em sua composição, é utilizada principalmente a medida velha, ou
seja, a redondilha menor, verso de cinco sílabas poéticas (pentassílabo) e,
predominantemente, a redondilha maior, verso de sete sílabas (heptassílabo), como
ocorre na “Fala Inicial”:

Não posso mover meus passos


por esse atroz labirinto
de esquecimento e cegueira
em que amores e ódios vão:
(...)

No entanto, deve-se observar que, por ser uma autora moderna, Cecília não se prende
totalmente a esse modelo. Vale-se, também, de versos mais curtos, de quatro sílabas,
como em “Fala aos Inconfidentes Mortos”:

Treva da noite,
lanosa capa
nos ombros curvos
dos altos montes
aglomerados...
(...)

Há também os mais longos, como os decassílabos em “Cenário”, no início:

Passei por essas plácidas colinas


E vi das nuvens, silencioso, o gado,
Pascer nas solidões esmeraldinas.
(...)

Quanto às rimas, a autora utiliza as chamadas imperfeitas (terminações de versos


semelhantes), como se pode observar no Romance XIII:

Eis que chega ao Serro Frio,


à terra dos diamantes,
o Conde de Valadares,
fidalgo de nome e sangue,
José Luís de Meneses
de Castelo Branco e Abranches.
Ordens traz do grão Ministro
de perseguir João Fernandes.
(...)

A escritora faz uso, ainda, de rimas perfeitas (terminação em sons vocálicos e


consonantais idênticos), tal como no Romance VI:

Não posso mover meus passos


por esse atroz labirinto
de esquecimento e cegueira
em que amores e ódios vão:
(...) Treva da noite,
lanosa capa
nos ombros curvos
dos altos montes
aglomerados...
(...) Passei por essas plácidas colinas
E vi das nuvens, silencioso, o gado,
Pascer nas solidões esmeraldinas.
(...) Eis que chega ao Serro Frio,
à terra dos diamantes,
o Conde de Valadares,
fidalgo de nome e sangue,
José Luís de Meneses
de Castelo Branco e Abranches.
Ordens traz do grão Ministro
de perseguir João Fernandes.
(...) á se preparam as festas
para os famosos noivados
que entre Portugal e Espanha
breve serão celebrados.
Ai, quantas cartas e acordos
redigidos e assinados!
(...) ...)
Ai, que o traiçoeiro invejoso
junta às ambições a astúcia.
Vede a pena como enrola
arabescos de volúpia,
entre as palavras sinistras
desta carta de denúncia!
(...) (...)
Já lhe vão tirando a vida.
Já tem a vida tirada.
Agora é puro silêncio,
repartido aos quatro ventos,
já sem lembrança de nada. (...)

A Carlos Drummond de Andrade


João Cabral de Melo Neto

Não há guarda-chuva
contra o poema
subindo de regiões onde tudo é surpresa
como uma flor mesmo num canteiro.
Não há guarda-chuva
contra o amor
que mastiga e cospe como qualquer boca,
que tritura como um desastre.
Não há guarda-chuva
contra o tédio:
o tédio das quatro paredes, das quatro
estações, dos quatro pontos cardeais.
Não há guarda-chuva
contra o mundo
cada dia devorado nos jornais
sob as espécies de papel e tinta.
Não há guarda-chuva
contra o tempo,
rio fluindo sob a casa, correnteza
carregando os dias, os cabelos.

Difícil ser funcionário


João Cabral de Melo Neto

Difícil ser funcionário


Nesta segunda-feira.
Eu te telefono, Carlos
Pedindo conselho.

Não é lá fora o dia


Que me deixa assim,
Cinemas, avenidas,
E outros não-fazeres.

É a dor das coisas,


O luto desta mesa;
É o regimento proibindo
Assovios, versos, flores.

Eu nunca suspeitara
Tanta roupa preta;
Tão pouco essas palavras —
Funcionárias, sem amor.

Carlos, há uma máquina


Que nunca escreve cartas;
Há uma garrafa de tinta
Que nunca bebeu álcool.

E os arquivos, Carlos,
As caixas de papéis:
Túmulos para todos
Os tamanhos de meu corpo.

Não me sinto correto


De gravata de cor,
E na cabeça uma moça
Em forma de lembrança

Não encontro a palavra


Que diga a esses móveis.
Se os pudesse encarar...
Fazer seu nojo meu...

Carlos, dessa náusea


Como colher a flor?
Eu te telefono, Carlos,
Pedindo conselho.

O poema acima, escrito em 29-09-1943,

Guiné Bissau

Nostalgia
Cinzento nicotina
serpenteia o meu quarto
argola o tempo que não passa
Tu não apareces
nada acontece….
O som sobe em 33 rotações
a voz sofrida de Ottis Reding
sustenta o calor de um canto soul
Emerges de uma nota de piano
por momentos bailas
na circunferência de uma bola de fumo
que se esquiva pela persiana
Fica o som dilatado do sax
a dar passagem a Ottis
a sentenciar “time is over”
Nada acontece…
Nicotino o espaço que se fecha
sobre mim sem ti

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