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Edmundo Colen

LANTERNAS VERMELHAS – 1991


(Da hong deng long gao gao gua)
Direção: Zhang Yimou

Trabalho realizado para a disciplina de


Fotografia e Iluminação do curso
Comunicação Social: Habilitação em
Cinema e Vídeo. (5º período)

Belo Horizonte
16 de novembro de 2009
SOBRE LANTERNAS E A COR VERMELHA

As lanternas coloridas fazem parte da milenar cultura chinesa e mesmo nos dias atuais,

para comemorar as festas tradicionais, os chineses penduram lanternas vermelhas de

modo a aumentar o ambiente festivo. A cor vermelha no país significa “Boa Sorte” e é

usada para celebrar a paz.

Interessante notar que a cor vermelha no ocidente, normalmente está associada ao sexo

ou à violência, por ser a cor do sangue, assim como no esoterismo está associado ao

“amor carnal” e a cor azul (especialmente o azul claro) associada ao “amor divino”, já

que relacionada à cor do céu ou ainda através do manto de Nossa Senhora.

Eiseinstein já criticava a tentativa de se atribuir significados psicológicos genéricos às

cores. “Na arte não são as relações absolutas as decisivas, mas as relações arbitrárias dentro de um

sistema de imagens ditadas pela obra de arte particular". Contextualizar as cores, desta forma,

seria reduzi-las a poucos significados não universais e, portanto, não inerentes ao ser

humano como um todo e mais especialmente nas artes, já que artistas diferentes definem

o que cada cor significa em cada momento ou para si mesmos.

Duas breves referências em relação ao “vermelho” podem ser citadas, no intuito de

exemplificar diferentes conotações para o uso de uma mesma cor: Ingmar Bergman

compôs todo o cenário interno de “Gritos e Sussurros” (1972) com esta cor afirmando

justificando que imaginava ser o interior do ventre todo vermelho. Em “O Fabuloso

Destino de Amélie Poulain” (2001), Jean-Pierre Jeunet utilizou-se desta cor, assim como

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uma paleta de cores saturadas digitalmente, para dar mais vida à personagem e aos

cenários, criando um clima de fantasia.

Em “Lanternas Vermelhas” Zhang Yimou emprega os tons de vermelho, dando-lhe


diversos significados.

O FILME

Songlian (Gong Li) é uma jovem de 19 anos, na China dos anos 20, que se vê, após a

morte do pai, pressionada por sua madrasta a se casar, aceitando ser a “Quarta Senhora”

de um homem rico e poderoso (Jingwu Ma) que mantém rígidas tradições familiares.

Uma das mais importantes regras é a das lanternas vermelhas. A esposa escolhida pelo

Senhor (assim chamado pelas esposas e os criados, embora o personagem chama-se

“Chen Zuoqian”) para passar a noite, tem as lanternas de sua casa acesas e recebe um

tratamento privilegiado.

O Senhor detém o poder sobre o destino de suas esposas e criados. Mesmo aparentando

se submeter aos desejos das “Senhoras”, o faz, pois assim, mantém seu domínio sobre

as mesmas, deixando-as acreditar que elas podem influenciá-lo com chantagens ou

demonstrações de submissão.

Songlian entra neste universo de contradições, de máscaras e tenta se impor para

conquistar privilégios, já que é a mais nova entre todas. Mas sendo jovem e

inexperiente, poucas chances ela tem para lutar contra as outras “Senhoras” e até

mesmo, contra Yan’er (Lin Kong) que lhe é designada para ser sua criada.

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A FOTOGRAFIA DE LANTERNAS VERMELHAS

Logo ao início do filme um diálogo entre a madrasta e Songlian é ouvido, mas a câmera

permanece fixa sobre a jovem em primeiro plano frontal. Seus olhos se mantêm

abaixados e a luz estourada sobre seu rosto avermelhado realiza um intenso contraste

com sua roupa amarela (a única vez em que ela “se veste” com esta cor) e o fundo

esverdeado com retângulos em preto. Um plano com grande significado: Songlian, em

frente às grades, aceita seu destino resignadamente.

O filme é divido em estações, sendo a primeira o verão. Logo após a cena inicial e a

legenda indicando a estação, um plano de conjunto mostra, em tons amarelo-

esverdeados com a luz estourada, trabalhadores caminhando em um campo e o

surgimento de Songlian que se dirige à casa do “Senhor”, carregando uma mala de

couro marrom avermelhado (cor de “terra”). Como para denotar sua pouca idade, e

conseqüentemente, dando-lhe o aspecto de inocência, ela se veste como uma colegial:

camisa e meias brancas, saia e sapatos pretos compondo com suas tranças igualmente

pretas.

Letreiros não legendados aparecem enquanto ela caminha em direção à câmera e se

unem no grande portal iluminado em tons avermelhados da propriedade do Senhor.

Novamente, a câmera em primeiro plano coloca Songlian em frente à “novas grades”.

desta vez, ainda mais opressivas.

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O uso de primeiros planos é uma constante contrastando com planos gerais e de

conjunto da propriedade, mas, ainda assim, criando um clima claustrofóbico.

Apesar de a cultura chinesa apresentar grande gama de cores em seus ornamentos,

praticamente todas as cenas são monocromáticas, destacando-se o vermelho no interior

das casas e uma luz azulada no exterior, fazendo com que muitas vezes, toda a tela seja

tomada por apenas uma destas cores.

A exceção vem no início com a entrada de Songlian na propriedade. O verão é

iluminado em tom sépia com luzes laterais de grande intensidade luminosa que estoura

nas paredes das casas gerando, desta forma, uma sensação de calor e secura.

As roupas dos criados são pretas, numa ausência de luz que contrasta com o ambiente e

as demais personagens. Songlian, vestida de branco e preto, inicialmente, não se difere,

portanto, da criadagem.

A intensa luminosidade só é quebrada pelas janelas com grades pretas e as duas

circunferências vermelhas em cada uma, que se sobressaem na cena. Songlian

aproxima-se da jovem Yan’er, a única entre os criados a usar roupa branca, destacando-

se assim, como uma personagem importante na narrativa e desta forma, diferenciada.

Normalmente os corredores que dão às casas das “Senhoras” são mostrados em plano de

conjunto, tendo a entrada ao fundo, criando a sensação de distanciamento e

conseqüentemente, de isolamento, ainda que toda a propriedade forme um conjunto de

casas próximas umas das outras.

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O ritual de acender as lanternas vermelhas na casa da esposa escolhida desenha um

contraste impactante entre o vermelho que emana da casa eleita em relação è escuridão

em que estão envoltas as outras “Senhoras”.

Zuoqian (o Senhor) nunca é fotografado de forma a se ver nitidamente seu rosto. As

cenas em que aparece são realizadas em planos de conjunto ou quando em planos mais

fechados, a câmera se fixa em uma das “Senhoras”, deixando visível apenas uma parte

de seu corpo, o que reforça a idéia de que ele pode ser “qualquer homem poderoso”

daquela época em que imperava (?) um machismo exacerbado. O foco da narrativa é,

portanto, nas mulheres. Isso necessariamente não possibilita afirmar ser um filme

“feminista”, mas certamente, uma história sobre a opressão contra as mulheres e das

mulheres.

A cena em que, primeira vez o Senhor vai à casa de Songlian, é totalmente iluminada

em vermelho e apesar da intensidade da cor, não há significação de amor ou

sensualidade, nem a interiorização de “Bergman”, nem a alegoria de “Jeunet”. A

construção é de frieza e constrangimento, um uso extraordinário para significação desta

tonalidade.

Alternando quase sempre os tons avermelhados do interior das casas com o azulado das

noites ou das outras estações, especialmente o outono e inverno, são criadas atmosferas

que contrastam no olhar do espectador, ao mesmo tempo significantes da presença ou da

ausência do Senhor.

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Entre os tons azulados encontram-se as “Senhoras” em seus anseios, em sua solidão no

vagar pela propriedade, que permanece imersa, desta forma, em seu aspecto mais

sombrio, reforçado pelos planos mais abertos com que é mostrada intermitentemente.

Uma cena, em especial, marca profundamente o sombrio da tonalidade azulada utilizada

por Yimou: a “Terceira Esposa” ao ser levada para a morte, se agita desesperadamente

entre os braços de seus carrascos. De início se vê o forte contraste entre o azul e o

vermelho que emana das lanternas. Os planos são mais fechados, proporcionando

grande dramaticidade, especialmente ao ser colocado em contraste com a figura de

Songlian vestida de azul. Os planos se tornam mais abertos à medida que conduzem a

esposa para a pequena casa situada no alto da propriedade. Numa mescla de planos

objetivos e subjetivos, todos eles preenchendo a tela de azul, proporcionam à cena um

clima sombrio, distante e frio sem, no entanto, perder a tensão gerada que continua

mesmo durante os gritos de horror de Songlian ao descobrir a mulher enforcada,

imagem não mostrada ao público. Uma longa seqüência mas de grande impacto

emocional, obtida através de uma tela, praticamente, monocromática.

Referindo ainda à “Terceira Esposa” um destaque para seu figurino e com ele, a

alternância de emoções produzidas pela cor vermelha: sempre que ela canta (era uma

cantora de ópera), ela veste um kimono vermelho ricamente ornamentado, independente

de seu estado de espírito. Logo ao terminar uma ária, ela retira a vestimenta (despe o

personagem dentro da personagem) e por baixo, usa outro kimono de cor mais escura

(azul ou preto).

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O figurino das esposas normalmente segue em cores que se alternam entre o vermelho,

azul ou preto (às vezes branco), sempre realçado pela tonalidade que impregna toda a

tela. É significativo que à jovem criada Yan’er só lhe é dado roupas claras, como que se

buscasse a jovialidade e inocência, ainda que seja uma personagem dúbia: nutre desejos

de ser uma das “Senhoras” (alimenta um sonho infantil), mas ao mesmo tempo, inveja e

odeia.

Yamou ressalta e reúne o uso das duas cores – azul e vermelho – nas seqüências finais

do filme. Acentua estas cores em tons mais escuros e vibrantes através de planos de

conjunto, quando os criados se dirigem à casa da esposa assassinada. Ao entrarem

dentro do quarto, toda a tela é inundada de vermelho, aqui, criando uma perspectiva

fantasmagórica. Ao saírem, novamente um plano de conjunto, reafirma o contraste entre

as cores, com a luz vermelha emanando da casa contra o azul que impera “do lado de

fora”.

Igualmente, o quarto de Songlian é inundado pelo vermelho das lanternas, agora,

indicando o seu enlouquecimento.

Ao final do filme, ainda que marcante os tons de vermelho, finalmente Yamou emprega

um uso mais naturalista das cores: o sépia inicial das paredes das casas ou o azulado das

mesmas durante o filme são abandonados e pode se ver com definição as construções

além do andar e olhar perdidos de Songlian, em frente às lanternas vermelhas, vestida

com sua “roupa escolar” do início do filme.

À loucura são dadas as cores da realidade.

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FICHA TÉCNICA (resumida)

Título original: Da Hong Deng Long Gao Gao Gua

Ano de Lançamento: 1991

Produção: Fu-Sheng Chiu

Direção: Yimou Zhang

Roteiro: Ni Zhen baseado na novela de Su Tong

Direção de Fotografia: Lun Yang e Fei Zhao

Direção de Arte: Juiping Cao

Figurino: Huamiao Tong

Trilha Original: Naoki Tachikawa e Jiping Zhao

Elenco:

Gong Li (Songlian),

Saifei He (terceira esposa),

Cuifen Cao (segunda esposa)

Shuyuan Jin (primeira esposa),

Jingwu Ma (Chen Zuoqian) e

Lin Kong (Yan'er).

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

CRI. on line. Rádio Internacional da China. Lanternas Coloridas. 2006. Disponível em


<http://portuguese.cri.cn/152/2006/12/27/1@58580.htm> Acesso em 07.11.09.

EBERT, Carlos. Cor e Cinematografia. Associação Brasileira de Cinemtaografia. Disponível


em <http://abcine.org.br/site/index.php?option=com_content&task=view&id=171&Itemid=133>.
Acesso em 07/11/09.

EISENSTEIN, Sergei. O Sentido do Filme. Apresentação, notas e revisão técnica: José Carlos
Avellar. Tradução: Teresa Ottoni. Rio de Janeiro. Jorge Zahar Ed, 2002.

RIBEIRO, Milton. Sobre Gritos e Sussurros de Ingmar Bergman. 2009. Disponível em


<http://miltonribeiro.opsblog.org/2009/07/03/sobre-gritos-e-sussurros-de-ingmar-bergman/>. Acesso em
07.11.09.

OUTRAS FONTES:

IMDB. Ficha Técnica de “Da Hong Deng Long Gao Gao Gua”. 1991. Disponível em:
<http://www.imdb.com/title/tt0101640>. Acesso em 07/11/09.

LANTERNAS VERMELHAS. Gênero: Drama; China, Hong Kong, Taiwan, 1991. Título

Original: “Da Hong Deng Long Gao Gao Gua”; Direção: Yimou Zhang; Produção: Fu-Sheng

Chiu; Roteiro: Ni Zhen; Distribuição: Spectra Nova; 119 minutos. DVD.

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