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Entretanto, as pessoas que se desviam um pouco da exceléncia nao sdo censuradas, quer fagam no sentido do mais, quer 6 fagam no sentido do menos; censuramos apenas as pessoas que se desviam consideravelmente, pois estas nao passario despercebidas, Mas nao é facil determinar racionalmente até onde ¢ em que medida uma pessoa pode desviar-se antes de tornar-se censurdvel (de fato, nada que é percebido pelos sentidos é facil de definir); tais coisas dependem de circunstancias especificas, ¢ a decisdo depende da percepgao, Isto é bastante para determinar que a situagio intermediaria deve ser louvada em todas as circunstAncias, mas que As vezex devemos inclinar-nos no sentido do excesso, As vezes no sentido da falta, pols assim atingiremos mais facilmente o meio- termo ¢ o que é certo, 9 9 ETICA A NICOMACO As virtudes intelectuais ¢ a sabedoria pratica No Livro VI Aristoteles define as virtudes intelectuais, classificando-as em cinco formas: a arte ou técnica (technd), 0 conhecimento cientifico (episteme), a prudeénca, saber pratico ou discernimento (phronesis), a intuigao intelectual (noesis) ¢ a sabedoria (sophia). No Capitulo V, temos a definigao da phronesis, geralmente traduzida pelo termo latino prudentia, que por sua vez pode ser traduzido por prudéncia, saber pratico, ou capacidade de discernimento.Anstoreres : a definigao & & 5, Com referéncia ao discernimento, chegaremos a sua i onsidera| 5 s de: i le exceléncia se considerarmos quais sao as pessoas dotadas desta forma nse Peni e qi ari : ernimento ser capa -se que é caracteristico de uma pessoa de discernimento F deliberar bem acerca d éb ente para si mesma, nav em li cerca do que é bom e conveniente para si mest relaga 5 cr saber quais elagao a um aspecto particular ~ por exemplo, quando se quer saber q\ r satide e of fisico =, & as espécies de coisas que concorrem para a salide € para o vigor sim acerca das espécies de coisas que nos levam a viver em de um modo im acerca das espécies de coisa geral. A evidéncia disto é 0 fato de dizermos que uma pessoa € aH: de ela calcula bem discernimento em relagao a algum aspecto particular quando ela calcula be com vistas a algum objetivo bom, diferente daqucles que sao o objetivo de uma arte qualquer. Consequentemente, no sentido mais geral a pessoa capaz de bem deliberar € dotada de disce: ito. Mas ninguém delibera acerca das coisas invaridvers, nem acerca de ages que nao podem ser praticadas, Portanto, uma vez que 0 conhecimento cientifico envolve demonstragao, mas nao pode haver demons- tragao de coisas cujos primeiros princfpios sao variaveis. porque tudo nelas é varidvel, e porque ¢ impossivel deliberar acerca de coisas que s40 como so por necessidade, o discernimento nao pode ser conhecimento cientifico nem arte; ele nao pode ser ciéncia porque aquilo que se refere as ages admite variagées, nem arte, porque agir e fazer sao coisas de espécies diferentes. A alternativa testante, entao, é que ele é uma qualidade racional que leva a verdade no tocante as acGes relacionadas com as coisas boas ou ms para os seres humanos. De fato, enquanto fazer tem uma finalidade diferente do proprio ato de fazer, a finalidade na a¢ao nao pode ser senao a propria acao, pois agir é uma finalidade em si. E por esta raz4o que pensamos que homens como Péricles tém discerni- mento, porque podem ver o que é bom para si mesmos ¢ para os homens em geral; consideramos que as pessoas capazes de fazer isto sao capazes de bem dirigir as suas casas c cidades. E esta explicacao do nome “moderagao", que significa “preservar o discernimento”. © que a moderacao preserva é a nossa convic¢ao quanto ao nosso bem, pois o prazer e 0 softimento, na verdade, nao destroem todas as conviccdes — por exemplo, eles nao destroem a convicgao no sentido de que o triangulo tem ou nao tem seus Angulos ignais aos de dois Angulos retos, mas somente conviccdes acerca de atos a praticar. Efetivamente, 05 primeiros princ{pios das agdes que praticamos esto na finalidade a que clas visam, mas as pessoas desgastadas pelo prazer ou pelo sofrimento fracassam inteiramente quando sc trata de discernir qualquer destes primeiros Principios ~de discernir que por causa destes ou por estes elas devem escolher e praticar todos os atos que elas escolhem e praticam ~, pois a deficiéncia moral destréi 95 primeiros principios.* o ® a @ . : 2 aa Textor basicoy de ética Odiscernimento deve ser entdo uma qualidade racional que leva d verdade no tocante as agdes relacionadas com os bens humanos, Mas além disto, embora. haja uma exceléncia em materia de arte, nio ha tal exceléncia em matéria de discernimento; na arte, ¢ prefer cl a pessoa que et conseientemente, mas em matéria de discernimento, & semelhanga do que acontece com as varias formas de exceléncia, ocorre o contrario, E claro, entido, que odiscernimento & uma forma de exceléncia, ¢ nio uma arte. Havendo, portanto, duas partes da alma dotadas de razao, o discernimento deve ser uma forma de exeeleneia de uma das duas, ou seja, da parte que forma opinides, pois a opinido se relaciona com o que é varia cl, da mesma forma que odiscernimento, O discernment entretanto, no é apenas uma qualidade racional, ¢ isto & evidenciado pelo fato de se poder deixar de usar uma faculdade pul o discernimento mente racional, mas nao 13. Devemos entao examinar mais uma vez a exceléncia moral, pois o que ocorre com ela tem estreita analogia com o que acontece com o discernimento em sua relagdo com 0 talento. © discernimento ¢ 0 talento nao silo a mesma coisa, mas so coisas semelhantes, ¢ a exceléncia natural se relaciona de ma: neira idéntica com a exceléncia em sentido estrito, Realmente, todos pensamos que cada tipo de carter de certo modo condiz naturalmente com quem o possui, puis desde © momento exato do nascimento nds seriamos justos, ou dotados de autodominio, ou corajosos, ou terfamos outras qualidades morais. ‘Nao obstante, esperamos descobrir que o verdadeiro bem é algo diferente, ¢ que as varias formas de exceléncia moral no sentido estrito condizem conosco de outra maneira, De fato, até as criangas € os animais selvagens possuem as disposigdes naturais, mas sem a razo elas podem evidentemente ser nocivas, De qualquer modo, parece bastante dbvio que uma pessoa pode ser induida em erro pelas disposigdes naturais, da mesma forma que um corpo pesado destituido de visio pode chocar-se violentamente com obstiiculos por lhe fal tar a visio; acontece o mesmo na esfera moral, mas se uma pessoa de boa disposicao natural dispde de inteligéncia passa a ter exceldncia em. termos de conduta, e a disposi¢ao que antes tinha Apenas a aparénecia de exceléncia moral Passa a ser exceléncia moral no sentido estrito, Portanto, da mesma forma que nna parte de nossa alma que forma opinides ha dois tipos de qualidades, que sto Otalento ¢ o discernimento, na parte moral tainbérm hi dois tipos, quie so a exceléncia moral natural e a exceléncia moral em sentido estrito, ¢ esta tiltima Pressupoe discernimento, E por isso que algumas pessoas dizem que todas as formas de exceléncia moral so formas de discernimento, razdo pela qual Sécrates sob certos aspectos estava certo ¢ sob ‘outros aspectos estava errado; com efeito, pensando que todas as formas de exceléncia moral sito formas deAristoteles 45 discernimento ele estava errado, mas dizendo que a exceléncia moral pres- supoe discernimento ele estava certo, Uma prova desta assercao é que ainda hoje todas as pessoas que definem a exceléncia moral, depois de mencionar a disposigao moral ¢ scus objetivos, acrescentam que se trata de uma disposi- Go consentanea com a reta razao; ¢ a reta razdo é a rao consentanea com © discernimento, Todas as pessoas, entao, parecem de certo modo adivinhar que a excel icia moral € uma disposigao desta natureza, ou seja, a disposicao consentinca com o discernimento. Mas devemos ir um pouco além, pois a exceléncia moral nao é apenas a disposigao consentanca com a reta razao; ela & a disposigao em que esta presente a reta razdo, e 0 discernimento ¢ a reta ravAo relativa A conduta. Sdcrates pensava. portanto, que as varias formas de exceléncia moral sao manifestagdes da razdo, pois dizia que todas clas eram formas de conhecimento cientffico, enquanto nés pensamos que elas pressu- poem a manifestacao da razao. E claro, entao, diante do que foi dito, que sem o discernimento nao é posstvel ser bom no sentido préprio da palavra, nem é possivel ter discerni- mento sem a exceléncia moral. Desta maneira podemos também refutar 0 argumento dialético segundo o qual se poderia sustentar que as varias formas de exceléncia moral existem separadamente umas das outras; poder-se-ia dizer que a mesma pessoa no é dotada da melhor mancira pela natureza para a pratica de todas as formas de exceléncia moral, de tal modo que ela j4 teria adquirido uma enquanto ainda nao tinha adquirido outra. Esta afirmagao é possivel a respeito das formas naturais de exceléncia moral, mas nao a respeito daquelas em relagao as quais uma pessoa € qualificada de boa em sentido ir- restrito, pois justamente com uma qualidade — 0 discernimento ~a pessoa teré todas as formas de exceléncia moral. E é ébyio que, ainda que o discernimento nio tivesse qualquer valor pratico, terfamos necessidade dele porque ele é a forma de exceléncia moral da parte de nosso intelecto a qual ele convém*; é 6bvio também que a escolha nao sera acertada sem o discernimento, da mesma forma que nao o sera sem a exceléncia moral, pois o discernimento determina 0 objetivo e a exceléncia moral nos faz praticar as ag6es que levam ao objetivo determinado. Mas apesar disto 0 discernimento nao tem o primado sobre a sabedoria filos6fica, isto é, sobre a parte mais elevada de nosso intelecto, da mesma forma que a arte da medicina nao usa a satide, mas se esforga para que ela exista: ela emite ordens, entdo, no interesse da satide, mas nao dé ordens a sadde. * Ou seja, ¢ Obvio que, ainda que 0 discernimento nao tivesse qualquer valor pratico, mesmo assim terlamos ie ose tee ita We dors i eid ‘moral correspondente a essa parte de nosso intelecto,UL DUUUURUUD LURE DS Peete eee | Ox © OFS $2189 tod “epua ep soe} idurop1o

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