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VwewwUVUUYUUUMwUVUUwUBUVUUUUwUUUUUeWULl Phot. ALbERES Freine-maia,N. A eidneca 3a, PzTipohin: Vorpa , 194 dail, - QUE £ CIENCIA? 1, Ciéneia-diselplina e cléncia-processo Acitncia pode ser visualizada sob dois aspectos fundamen- tais:a idnela jt feta (tal como é ensinada) e a ciéncia-processo (que estd sendo feita). A primeira ¢ a disciplina (ciéncia forma- lizada) que o professor ministra aos seus estudantes e estes devem aprender na linha pela qual é ensinada para que possam fazer exames e ser aprovados, Alids, os alunos aceitam a discipli- na que lhes é ministrada na base da autoridade dos seus profes sores e dos livros em que estudam. Aciéncia-processo (ciéncia em vias de fazer-se) 6 a ciéncia que o cientista realiza e que pode ser dividida em duas fases: a prépria pesquisa (isto é, 0s procedimentos de investigacio) ¢ a divulgagto de seus resultados (isto é, sua publicacto original). Essa tripla distingdo é essencial: de um lado, aciéncia-disciplina, tal como é ensinada em varios niveis de complexidade e, de outro, a cincia-pesquisa (que possul dots estdgios). A primeira é um ‘Pacote; e a segunda é um processo. Enquanto a ciéncia-pesquisa claramente representa algo de inacabado, sempre em fase de ampliagio e retificagio, a ciéncia-disciplina, com o fim de se facilitar sua didética, é muitas vezes, ministrada de forma dogmética, isto é, com caracterfsticas opostas &s de sua fonte, Gitncia-disciptina: conjunto de descrigées, interpretagbes, leis, teorias, modelos, ete,, que visa ao conhecimento de uma 7 CeO OPO OOOO OYE STOO OOOO UOTOUOUYOUVUYOUL arcela da realidade e que resultou da aplicaso de uma meto- dologia especial (metodologia clentifica). iéncia-processo: primeiro estdgio atividade, na base de uma metodologia especial (metodologia clentifica), que visa & formulago de descrigdes, Interpretag6es, leis, teorias, modelos, etc., sobre uma parcela da realidade; segundo estdgio ~ divulga- ‘do dos resultados assim obtidos. primeira, pelo menos nos graus mais elementares de seu ensine pode parecer um edificio acabado, irretocével, chelo de verdades (as “verdades cientificas"); a segunda, pelo contrétio, ‘como J foi dito, revela que se trata de algo em continua elaboracdo, ampliagdo ¢ revisio, Ao nfvel de primeiro grau, hd um velho preconceito de que © ensino deva ter sempre cardter dogmético, O bom professor, no entanto, jé iluminaré a mente dos jovens estudantes com problemas clentfficos e mesmo com pequenos projetos de pes- contandolhes que nem tudo esté elucidado, que as explicagBes ndo s4o absolutamente certas, que as teorias se ‘encontram em continuo processo de renovagio e aperfelgoamen- to, que mesmo criangas e jovens podem realizar investigacbes capazes de elucidar ‘certos problemas, etc. A medida que o estudante faz sua maravilhosa caminhada ao longo dos cursos, até atingir a pés-graduagio, deverd, cada vez mais, ir desenvol- vendo seu espirito erftico, preparando-se, em alguns casos, para ser, ele préprio, um clentista. Nunca, dessa forma, o estudante entrard em contato com a ciéncla como se esta fosse algo definitive e dogmético, Essa importante diferenga entre cléncia formal (disciplina, Jf feita e irretocdvel) e cidncia-processo (em fase de realizagho ¢, por isto mesmo, marcada por hipéteses provisérias) aparece de forma precisa na primeira atta (dada a 23 de dezembro de 1854) do curso de fistologia aplicada & medicina, proferido por Claude Bernard (1813-1878) no College de France, em Paris", Pela exceléncia de suas palavras, permito-me fazer ‘uma longa citago do grande cientista: “Todo mundo sabe que o ensino no Collage de France é de uma natureza diferente do que caracteriza as faculdades; que ele 1. Claude Bernard, 1855, Leons de plystologle expérimentale appliquée dla ‘ddieine faites au College de France. Toe 1" (1854-1855. J.B, Ballito ot la, Paris, 18 atende a outras necessidades; que se dirige a outro piblico; que sua maneira de proceder é essenclalmente diferente. / Aqui, 0 professor, sempre situado no ponto de vista da investigagiio, deve considerar a ciéncia, nfo no que ela possui de adquirido e assegurado, mas nas lacunas que apresenta, para se esforcar por Preenché-las com novas pesquisas, E, pois, as mais drduas e obscuras questées que ele de preferéncia se acomete, diante de um auditério jé preparado, por estudos anteriores, a abordé-las. Nas faculdades, ao contrério, o professor, situado no ponto de vista dogmitico, propde-se a reunir, numa exposigdo sintética, 0 conjunto de nogées positivas que a ciéncia possui, ligando-as por desses lagos que se chamam teorias, destinadas a dissimu- lar, tanto quanto possivel, os pontos obscuros e controvertidos que perturbariam, sem proveito, o espfrito do aluno iniciante. / Desta forma, esses dois tipos de ensino sto, por assim dizer, diametralmente opostos. O professor de faculdade vé a ciéncia no seu passado; ela é, para ele, como se fosse perfeita no presente; ele a vulgariza ao expor dogmaticamente o seu estado atual. O professor do Collage de France, ao contrétio, deve ter 08 olhos voltados para o desconhecido, em dirego ao futuro. / Longe de estar conclufda, a eléncia da vida apresentar-se-nos-& com suas imperfeigées; preocupar-nos-emos sem cessar, no com © que esté feito, mas com o que resta a fazer; e essa diresao progressiva é tanto mals importante - és o compreenderels sem dificuldades ~ quanto a ciéncia de que aqui nos ocupamos se encontra mais distanciada de seu completo desenvolvimento. / & preciso, Senhotes, estabelecer com preciso nosso ponto de ‘vista para bem compreender o tipo de liberdade que hé em nossas aulas ¢ a variedade de assuntos que este ensino comporta; aqui, Programa algum poderia ser nigorosamnente segul, conta, Hamente aos cursos das faculdades, necessariamente enqua- drados em wn programa periodicamente recomegado e nunca ultrapassando o nivel dos conhecimentos adquiridos, Pode-se, aqui, mudar de assunto todos os anos, todos os semestres; e, mesmo no decurso de um semestre, nosso plano poderé modifi- car-se se, atingindo um fildo de pesquisas interessantes, houver beneficio para a ciéncia em prossegui-lo sem demora. /Em uma palavra, escolhemos nossos estudos sob a tinica condiglo de realizar esforcos Incessantes com o fim de cooperar para o progresso da fisiologia e da medicina, procurando realizar esse Progresso em todas as questdes que possamos atingir e por todos ‘0s meios que se encontrem a nosso alcance” (p. 10-11). 19 CeO OCC OY OY OGY OWOOUOUHOWVOUUOUUUWOIR 2. Cléncla e conhecimento vulgar H& um limite preciso entre ciéncia (tal como praticada pelos cientistas) e senso comum (que as pessoas sem formacdo cientifica usam em suas observagées do dia-a-dia). B 0 que Gaston Bachelard (1884-1962) chamou de “corte episte- molégico™, Gragas a este, trata-se de esferas cognicivas diferen- tes, embora se possam referir & mesma realidade. A ciéncia acrescenta critério metodolégico, rigor e maior capacidade pre- ditiva ao conhecimento vulgar, ainda que este, de modo trivial e assistemdtico, também descubra fatos, formule explicagées e desenvolva teorias. ‘Mattalo Jiinior® (p, 15) dé-nos uma excelente definicao de senso comum: ‘um conjunto de infor jes ndo-sistema- ‘tizadas que aprendemos por processos formals, informais e, As vezes, inconscientes, ¢ que inclui um conjunto de valoragées. Essas informagSes sfo, no mais das vezes, fragmentérias e podem {nclutr fatos histéricos verdadeiros, doutrinas religiosas, lendas ou partes delas, principios ideolégicos as vezes conflitantes, informagSes clentificas popularizadas pelos meios de comuni- cago de massa, bem como a experiéncia pessoal acumulada, Quando emitimos opinises, langamos mio desse estoque de coisas da maneira que nos parece mais apropriada para justificar ‘ tornar os argumentos aceitdveis”, Como bem Jembra Bertrand (Arthur William) Russell (2872-1970) (p. 11 e 12), o método cientifico, “apesar de sua simplicidade essencial”, s6 6 empregado por uma fragdo insigni- ficante de pessoas para resolver uma frago insignificante de assuntos. Consulte-se qualquer clentista sobre patriotismo, mé- sica, esportes, artes plésticas, amor, guerra, politica, cinema, amizade, impostos, teologia, democracia, racismo, ete., e ver-se-4 que ele sempre usard 0 senso comum, talvez impregnado de 2. lon py 197, Pel Bee. Paci Aes Alls Bachelard, todo o progres dn clenia se faz atraves de “rupturas”¢ organiza uma tse da que se oronme ade Kua (ap 17). ORerdamen: tal da iste das ies no 6 pols sua "evolugo" aso Tevlagoes que nela core por sucssvos “cores epsteolgico ‘3, Heltor Matllo Jnior, 1986, A problemética do conhecimento. Cap. 1 de Construndo o saber: téenicas de meiodologiaclenefica (org. por Marla Cectia 1M. de Carvalho). Paprus, Campinas, 4, Beraand Russell, «/d, O panorama ‘Trad. de José Geraldo Vieira, Flama, S. Paulo (O exemplar que possuo est datado de 1949). dogmatismo — que repudiaria se se tratasse dos problemas que aborda cientificamente. Para Russell, a cidncia no passa de “senso comum educado” (idem; p. 71). © senso comum julga-se dono de verdades eternas, Nao tendo o refinamento da ciéncia, guarda as suas “verdades* com zelo e recusa-se a aceitar as teorias clentificas que as contradi- gam, Assim é que o heliocentrismo teve de esperar cerca de dois Séeulos para se integrar A cultura geral, enquanto a teoria da evolugdo ainda esté muito longe de ser consensualmente aceita, © senso comum acredita que diferentes pessoas, vendo 0 ‘mesmo fenémeno, sempre véem a mesma coisa. ss0 6 um puro equivoco; hé figuras de cubos, pirdmides, escadas, rostos, ete, que, examinadas até pela mesma pessoa, podem se mostrar, depois de alguns segundos, diferentes da forma como se mostra. vam a principio. Quando duas pessoas olham uma dessas figuras, pode acontecer que, num mesmo momento, uma esteja vendo algo bem diferente do que vé a outra. A expresso “eu vi com os ‘eu prépris alhos” nfo oferece garaniaalguma de que sea verdade o que se diz. A citncia nio 4 o senso comum aprofundado, refinado ou “educado", Ele criou as teorias da Terra plana, da Terra centro estético do universo, dos seres vivos criados instantaneamente e imutéveis desde entio, do Homem sem ligagées de origem com ‘05 demais seres vivos, etc. A ciéncia mudou tudo isso apesar de tudo {sto estar alicergado em “dados”. Estes no mudaram; mudou a sua interpretaglo. Se as coisas fossem como parecer ser, nfo seria preciso a ciéncia para tirar, do que esta escondido, a interpretagdo correta dos fatos. O conhecimento vulgar ndo gera o conhecimento cientifico, O cientista pode, através do primeiro, descobrir algo a pesquisar ¢, af sim, fazer eiéncia. Ele realiza, entéo, um “corte episte- molégico”, deixando de lado o que Bachelard chamou de “obs. tdeulo epistemolégico”, Porque o conhecimento vulgar é superficial e ingénuo, Um eminente cientista contou que, certa ‘vez, em conversa com um asiético que vivia ao nivel de cultura tribal muito atrasade, ouviu deste a informagio de que, & noite, © Sol voltava ao seu lugar de origem (o nascente), para reprodu. zir, no dia seguinte, o seu percursonormal em diregao ao poente: ~E por que nfo o vemos veltar? ~# porque esté escuro, 21 CWO OO OTT OTE OT OOOH OOUYWOWUVOUCYUOOUUGIIE Em suma, 0 Sol seria visto de dia porque estd claro; obviamente, ndo poderia ser visto na escuriddo da noite. Depois de analisar oito postulados da fisica cléssica, elabo- rados por O. L. Reiser - proposigées “evidentes” diante do conhecimento vulgar ~ Bachelard diz o seguinte: “Sto conside- radas evidentes porque so simples ¢ familiares; colocam-se Justamentena base do conhecimento vulgar porque efetivamente ‘© conhecimento vulgar é todo ele construfdo sobre estes alicer- ‘ces, Mas outras construgGes so possiveis, e as novas construgdes clentificas como a relatividade, a teorla dos quanta, a mectnica ondulatéria ou a mectinica de Dirac, nfo continuam o conhecl- ‘mento vulgar, mgs nascem de uma crftica e de uma reforma dos seus postulados" (p. 73). Essa posigio descontinufsta no & de aceltagdo geral. Hé quem admita (Russell, como vimos) a existéncia de uma conti- nuidade entre ciéneia ¢ senso comum, no sentido raion primeira flua do segundo, apenas possuindo, em geral, uma Ialor sofsticaglo. Karl Popper (1902- ) também diz que ‘todg citnela e toda flosofia so senso comuim esclarecido” (p. 42)°, Ble reconhece que o seniso comum é “um ponto de partida vago” e que a construgio se erige “sobre alicerces inseguros”, mas que, apesar disto, “podemos aprender com os nossos engarios, com a compreensio de que fizemos um erro"(p. 43). Para Popper, pois, “nosso ponto de partida é 0 senso comum” e “nosso grande instrumento para progredir é a critica” (p. 43). Vérias parcelas da cincia possuem menor seguransa do que outras parcelas do conhecimento vulgar. Isto é facilmente compreensivel: a citncia vai mais longe e, por isto, muitos de seus véos no tém o mesmo grau de preciso a que chegou 0 conhecimento vulgar em varias éreas que aborda. Quando se trata do mesmo ponto, é de se esperar, no entanto, que a citncia seja mais segura, mais exata, mais refinada; nfo se pode afirmar, porém, que tudo o que seja cientifico seja mais preciso e mais, certo do que tudo o que nos vem do conhecimento vulgar. 5. Gaston Bachelard, 1978, A filosofia do ndo. Filosofia do novo espirito soo Te carta ete ete 6, Conhectmento objetivo, Uma abordagem evoluciondri, Trad, de Milton ‘Amado, itataia, BH/EDUSP, SP, 1975, A posigio descontinuista, acima mencionada, refere-se & “ciéncia moderna” (que muitos aceitam como tendo: surgido com Galileu ~ 1564-1642) e ao conhecimento vulgar igualmente de hoje. Porque no hé diivida de que a ciéncia, tal como a conhe- cemos atualmente, resultou de um longo processo de maturagdo com infcio no Homem primitivo, que, de forma tosca, J4 mani- festava preocupagées “filoséficas” e “clentificas”. Assim & que teenologias rudimentares, formas de escrta, tentativas de clas. sificagio, desenvolvimento de terminologias, documentos mate. méticos, observagdes astronémicas, ete. - tudo isso geTOu-se 20s. poucos, lado a lado com a “filosofia” e a religido, dentro de alguns milénios anteriores & nossa era. A fllosofia grega (que inclula a ciéncia de seu tempo) teve inicio no século VII aC; ‘costuma-se, por exemplo, colocar onascimento da “ciéncia natural” grega em ‘Tales de Mileto (ca. 640-562), para quem o elemento fundamen- coisas seria a Agua. A tese da estrita continui, wuito bem expressa por Forbes e Dijksterhuis’: “A nossa ciéncla modema descende segundo uma linha continua e ininterrupta dos pensamentos dg Tales ¢ de homens do mesmo quilate de seus contemporaneos®, Temos tanta justificagdo para iniciarmos a histéria das cincias com ele como para comegar a biografia de uma pessoa a partir da altura [época] em que era ‘uma crianga” (p. 36). Dois pontos merecem ser aqui acentuados. Primeiro: Em suas observacbes corriqueiras do dia-a-dia e em suas opinides extracientificas, os cientistas usam o senso comum e nfo a metodologia que costumam empregar no seu trabalho profis- sional. Segundo: Hé um fluxo inegével da clénela para o conhe- cimento vulgar. Através dos meios de comunicagio de massa, 0 conhecimento cientifico ~ as vezes, recentissimo ~ é difundido entre o piblico em geral que, desta forma, passa a adotar termos, explicagées, teorias e leis (oriundos da ciéneia e, em geral, mal digeridos), que costuma repetir sem que saiba justificar. 7.R.J. Forbes eB. J. Ditsterhus, /¢, Hltéria da Citnela eda Tenologia. Vol Doane nl deca de Sve Hora Utada ake 8, Anaximandro (ca. 610-547), Anaximenes (ca. 550-480) e Herdlit ig Sus oes pare ren ml ou mens a mesa dos Pledgoras (570-497), Parménldes (535-450), Leulpo (600-490), ete. ‘com quem a cléncia grega ating o apogeu, de 884.922, SOO POS POT GOTO OPP PGUPOUPPWTOPTPOGUOUUVOIE ‘8, Uma definigéo de ciéncia Os filésofos da ciéncia ndo costumam propor definigbes ae citneia. Crelo que essa precauglo se deve a pelo menos trés raz6es: 1. toda definigdo tende a ser incompleta (sempre limitan- te, 4 por isto mesmo, excludente), 2.0 problema é muito complexo, como se poderd ver ao longo deste livro; 3. dificl- ‘mente dois filésofos da ciéncia concordariam sobre como definir = isto é, fazer caber numa formulagio reduzida ~ todo o objeto de seus estudos, HA diferentes conceltos de citncia. Colocando de lado as preocupag6es epistemoldgicas de alto nfvel e usando os elemen- tos basicos aqui jé referidos como caracterfsticos da ciéncia-dis- ciplina e da ciéncia-processo, podemos apresentar uma tentativa simplificada e tosca de definigfo: Ciéncia é um conjunto de descrig6es, interpretagdes, teorias, leis, modelos, etc,, visando ao conhecimento de uma parcela da realidade, em continua amplia- go ¢ renovagio, que resulta da aplicagdo deliberada de uma metodologia especial (metodologia cientifica), 4. Cléneia pura e cléncia aplicada Antigamente, chamava-se de ciéncia pura a que nio tivesse Preocupagées e nem possibilidades previstveis de aplicacdo (por exemplo, sistemdtica de abelhas, comportamento sexual de dro- s6filas, astronomia lunar, etc.). Por outro lado, ciéncia aplicada ra a que diretamentee¢ voltava para a solugto de problemas Praticos e, como tal, apresentava uma perspectiva préxima de aplicagdo (por exemplo, a qufmica das sulfas ou dos antibisticos, a fisica dos meios de propulsdo, a tecnologia da extragdo de minérios radiativos, etc). * Hoje, a ciéneia é vista por outro angulo, Como varias pesquisas da antiga “ciéncia pura” acabaram tendo aplicagio e outras tantas da chamada “ciéncia aplicada” terminaram no produzindo os frutos esperados, prefere-se, em geral, dizer cdn- ia bésica e aplicagdes da citncia, isto é, tecnologia. A primeira niio visa diretamente ao seu aproveltamento na drea da utilizagio pratica, mas pode vir a encontré-lo; isto significa que ela se faz com a tinica preocupagio de resolver problemas de conheci- ‘mento, sem excluir a possibilidade de que possa vira ter poderosa influéncia no setor que nfo foi procurado de infcfo, A tecnologia, or outro lado, visa, de infcio e durante todo o seu trajeto, & Procura de uma aplicagao. A biologia molecular realizou, entre os anos 40 e 60 deste século, um progresso semelhante ao da quimica dos fins do século XVIII aos anos 1930. Ela surgiu e se desenvolveu sem Preocupay de aplicaco, além de continuar a ser uma ciéncia bisica, tomou-se, nos wltimos anos, com a engenharia genética ¢ os estudos sobre virus, uma tecnologia, Além desse aspecto, & importante lembrar que, & medida que evolui a tecnologia, podem igualmente se ampliar as possibilidades de aplicagdo de uma cléncla bésica. Por exemplo: a astronomia, cujos conhecimentos foram antigamente usados para fins religio- 40 (marcar datas de festas ¢ cerimSnias), agricolas (determinar épocas de chuva, de filo, etc.; de plantio e colheita, etc), astrolégicos, etc., hoje é imprescindivel ao desenvolvimento da astrondutica, ‘Nao ha, pois, dois tipos de ciéncia - um “puro” e outro “aplicado". O que ha & ciéncia e aplicagées da cléncia, O que hd € a pesquisa basica (que pode gerar aplicacdes) e a pesquisa tecnolégica (que diretamente visa a essas aplicagées). Exemplo tipico de pesquisa tecnolégica é o que se refere & supercondutividade. Trata-se da capacidade que possuem certos elementos (chumbo, meresrio, niébio), quando muitissimos res- friados (a temperaturas da ordem de 270°C negativos), de conduzir a eletricidade com resisténcia nula, isto é, sem aqueci- mento e sem perda. Esse fendmeno foi descoberto pelo fisico +holandés Heike Kamerlingh-Onnes (1853-1926), em 1911, tendo Ihe valido 0 Prémio Nobel dois anos depois. Por varios motivos, as possibilidades de emprego prético dos supercondutores $6 surgiram por volta de 1960, sendo que nos anos 70 e 80 é que as pesquisas tecnolégicas comecaram a dar o9 seus primeiros resultados préticos, A aplicagdo “natural” dos supercondutores esté, obviamente, na feitura de cabos para o transporte, a longas distdncias e sem perda, de energia elétrica ~ tecnologia especi- almente titi] em pafses como o Brasil, Mas hé outras. Por exem- plot nos trens projetados para correr a alta velocidade (acima de 300 km/h), toma-se invidvel o emprego de rodas e tilhos, devendo manter-se o velculo acima de seu suporte. Para isto, uusase a suspensio por “colchto de ar” ou a suspensio por levitagto magnética. Para esta itima, os supercondutores po- dem ser de utilidade. Intimeras pesquisas esto sendo realizadas em alguns paises (por exemplo, no Japio e na Alemanha) para COOH E OE YOUVEUWYUYOUUUUVVOWUUUUWVUOWUIIL viabilizar e aperfeigoar a levitagdo magnética por superconduto- res. Assim como “o microscépio cria a microbiologia” (Bache- lard®, p. 117), 0 desenvolvimento tecnolégico vai criando opor- tunidades nao sé para o surgimento de novas ciéncias como para © desenvolvimento, de forma dantes insuspeitada, das ciencias ‘Jf existentes. Referirei um fato: a espaconave Voyager-2, ao ‘atravessar, no dia 24 de janeiro de 1986, o plano equatorial de Urano (descoberto por Sir Willian Hershel, 1738-1822, em 1781), verificou que esse planeta possui nfo apenas as cinco luas que, com dificuldade, se véem da Terra - Oberon, Titdnia, ‘Umbriel, Ariel e Miranda (aqui referidas da mais externa & mais intema), mas também outras dez, que circundam Urano em ‘Srbitas cada vex menores, Oberon, na érbita mais externa, dista 583.400 km do centro do planeta (que tem 25.600 km de raio), enquanto a menorzinha e mais interna de todas estd apenas a cerca de 600 kan de sua superficie. As cinco grandes luas tém os seguintes diametros aproximados (km): Miranda (500), Ariel e Umbriel (1.200), Titdnia e Oberon (1.600), enquanto que, nas menores, o didmetro é de apenas cerca de 40-80 km em nove e 160 Km em uma (a mais externa). Uma minuciosa e fascinante andlise da operagdo Voyager-2 e da situacdo geolégica das luas uranianas (com fotos das geis maiores) pode ser encontrada no artigo de Johnson e cols.’ No final do século XVII, Luigi Galvani (1737-1798) obser- ‘vou que descargas elétricas vam contrago em miisculos de re outros animais, Verificou ainda que, ao pendurar patas def, por melo de arames de core, em bares defrro, também ‘ocorria contraglo muscular sempre que as patas tocassem o ferro, assim fechando o circuito ferro-cobre-pata-ferro, Galvani explicou o fendmeno admitindo que a eletricidade seria gerada pelos tecidos da pata de rd e apenas conduzida pelos metais, O fisico Alessandro Volta (1745-1827) nfo concordou com essa explicagio, uma vez que julgava que a eletricidade seria formada pelo arco resultante do contato entre os metais. Essa controvérsia ‘eve importante papel heuristico, Volta construiu um dispositivo gerador de eletricidade e que consistia em chapas de dois dife- 9. G. Bachelard, 1981, O novo ephito cenfice, Tad. de Rembero Franelsco Kuhnen. Abi, Paulo (Colegdo "Os Pensadores"). 10, Torrence V, Johnson, Robert Hamilton Brown e Laurence A, Soder- lon, 1978, The moons of Uren, See AM, 2564) 4082, Tentes metals dispostos alternadamente (por exemplo, cobre e zinco) e separados por pano ou papel umedecide num eletrolito, Estava, assim, descoberta a pilha voltaica, composta de células eluates (cada grupo dos dois diferentes metals separados por ‘uma solugio ou dcida). Note-se que as palavras volt ¢ voleagem, de uso internacional, derivam do nome do grande fisico. Por outro lade, Galvani voltou as suas experiéncias e Provou a exstincla de elercdade nos tecidosvivs (sto & ‘mesmo sem o emprego de metais), tendo criado a preparagio que hoje se denomina de pata galvanoscépica. Estas ¢ outras alavras, como galvanémetro e galvanizar, tem origem no nome do famoso fisiologista italiano, Como se v8, como diz Lineu Freire-Maia no seu interessante artigo de que tirel esse exemplo (1979, Ciencia pura ou aplicada? Gigne. Cult,, 30(3);49-51), da ‘controvérsia entre Volta e Galvani, aciéneia obteve duas grandes descobertas: a pilha eo conceito de eletricidade animal, Ambos ‘estavam fazendo ciéncia bésica; uma delas gerou imediatamente ‘um notével avango teenolégico, enquanto a outra (eletricidade animal), sendo um importantfssimo achado de ciéneia “pura', possibilitou, mais tarde, o desenvolvimento de uma série de aparelhos que fazem parte da teenologia médica (por exemplo, 06 que se usam para investigagées sobre o coragio, tal como @ eletrocardiografia). © artigo de L. Freire-Maia aborda outros problemas sobre ciéncia “pura” ¢ cidncia aplicada, como a controvérsia entre Lssenko ea genética na URSSe suxsrepercussbesna agrcutura soviética, a descoberta e a aplicaso da penicilina, 0 desenvolvi- mento de linhagens brasileiras de café resistentes & ferrugem (@oenga causada pelo fungo Hemileia vastatrix) no Brasil (por Alcides Carvalho e L. C. Ménaco) e a descoberta de anti-histam{- niicos especificos para controle da secreco géstrica e tratamento da ilcera duodenal. 0 autor do artigo acha que ndo se devem pér de lado os programas urgentes para a soluglo de problemas tals como a desnutricio, a esquistossomose, a doenga de Chagas, 0 desenvolvimento de formas alternativas de energia (por exem- Bio, deo), em pats tas come obra mas que nfo a pode esquecer “que o progresso de um pals, a longo prazo, depende fundamentalmente da ciéneia pura, alicergada na criatividade”, A genética é a citncia que estuda a variagéo e a heredita- Hledade, isto é, procura descobrir a origem da multiplicidade de formas dentro de uma mesma espécie e o modo pelo qual se herdam as varias carecteristicas, As bases dessa ciéncia foram POO SSG OOS GIS OOH OPI OITTPOPOPTOUPOOOR Jlangadas em 1865, por um frade agostiniano ~ o genial abade Gregor Mendel (1822-1884) -, na base de cruzamentos entre variedades de ervilhas. Por mais incrivel que possa parecer, as pesquisas do grande frade constituem, atualmente, a base da genética médica (que estuda a heranga dos disturbios heredi- trios), da eugenia (que procura meios de diminuir a freqlléncia de anomalias genéticas nas populagées humanas), da agricultura (que luta por criar novas e melhores variedades de plantas itels ‘a0 homem) e da zootecnia (cuja principal finalidade é a obtengio de racas de animais dotados de malor serventia). Ora, como se vt, de trabalhos aparentemente iniitels, surgiu, mais uma vez, ‘uma vasta messe de realizagées dotadas de incalculdvel impor. tancia, © grande geneticista americano Hermann Joseph Muller (1890-1967) (Prémio Nobel em 1946), publicou, em 1927, 08 resultados de suas pesquisas de varios anos: havia descoberto que a ago dos raios X sobre pequenas moscas chamadas dros6- filas provocava, em seus descendentes, um aumento da freqtién- cia de mutagées. Essa descoberta fundamental nfo tinha aplicagdespraticas e poderie ser taxada, or algum observador desavisado, como destitufda de valor para a humanidade. Basea- dos, porém, nessa descoberta, outros cientistas fizeram, mais tarde, agir 0s raios X sobre o cogumelo que produz a penicilina ¢, de sua descendéncia, obtiveram linhagens que produziam mais i Uma m inperdocia -veio produzir, pois, mais ago prética para a humanidade. ‘Nao se esquesa, no entanto, que, desde o in{cio, a descoberta de Muller ampliava o espectro da ago biolégica das radiagbes fonizantes, desta forma revelando'o maior perigo de seu ‘uso AS de outubro de 1776 falecia, em Londres, o mercador John Ellis. Hoje, seu nome é eélebre, no porque tenha exercido, com eficitncia, a sua atividade comercial, mas porque posoufa ‘uma mania: com paciéneia beneditina, costumava recortar algas de cores variadas e, colando-as sobre tdbuas, compunha belos desenhos que causavam grande admiragdo a todos. Certo dia, um amigo aconselhou-o a realizar alguns “quadros" para as prince- Sas de seu pals e, entdo, John Ellis, na inteng&o de produzir obras ainda mais valiosas, saiu & cata de material, tendo coletado um grande ntimero de plantas. Passou a examinar, com cuidado, todos os vegetais que havia colhido e, depois de muito observ 28 rrti—<(Owrstsrss—~—~—SsSCSN Jos, chegou & espantosa conclusdo de que muitas daquelas “plantas” eram, na realidade, animais... Com isto, John Ellis, um mercador de Londres, alargou o campo da zoologia e, assim, trouxe uma preciosa contribuigo ao progresso da ciéncia. Seus estudos continuaram, ainda, por anos a fio e, perguntando sobre qual a finalidade de tanto esforso, respondeu: “...para mim, essas Pesquisas abriram novas perspectivas de assombro e maravilha, ao contemplar quac variadamente, quéio extensamente a vida estd distribufda pelo universo das coisas; por isso, é posstvel que 0s fatos aqui relatados, e esses exemplos da natureza animada, ‘num campo até hoje totalmente ignorado, venham a provocar, em outros, idéias igualmente agradaveis", John Ellis fazia ciéncla, pela prépria ciéncia; apenas queria descobrir novos fatos, Java apenas alargar a vislo que a humanidade tem das coisas, © grande cientista hiingaro Albert von Szent-Gyorgyi (1893-1986), Prémic Nobel em 1937, que realizou importantes estudos sobre processos de combustio biolégica e descobriu a vitamina C, também possula idéias semelhantes: “O homem que se langa ao trabalho com 0 intuito de descobrir qualquer coisa itil devia, realmente, ser expulso do laboratério”, Em suma ~ da ciéncia basica podem brotar possibilidades insuspeitadas de aplicac&o, mas fa uma alta freqiiéncia de cientistas que nao estd interessada nessas possibilidades. Eles fazem citncia como John Ellis e Szent-Gyorgyi. 5. Ciéneias formais e fatuais ‘As citneias sto geralmente classificadas em formais ¢ reais (ou fatuais). As primeiras so as légico-mateméticas; como nelas. iio se pode demonstrar tudo, parte-se de Prlnefpis que dever ser aceitos sem demonstragio (axiomas). As varias disciplinas mateméticas constroem-se sobre essas proposigées primitivas; ‘sao ditas axiomaticas. Também a geometria é uma cléncla for- mal. Para se saber que a soma dos angulos internos de um trian- gulo ¢ igual a dois retos, ndo se desenharam triangulos e ndo se Tediram seus angulos para, depois, em cada caso, se realizar a ‘soma dos trés. Certamente que, com tall método, descobrir-se-la, que a relagto @ apenas aproximada, ‘As outras ciéncias (reais) jé lidam com fatos. Podem ser classificadas em dois grupos ~ as naturais (fsica, quimica, 29 POO OG GOTO OTOWOT OP PTDPOPOWTTTYPOOYOWUITWTIIE biologia...) eas humanas (psicologia, sociologia, economia, etc.). (CE. Costa, 197, p. 9e soi 6. Ciéncia, filosofia e filosofia da ciéncia Aciéncia visa a procura da verossimilhanga — isto é, do que nos parega ser verdadeiro, O clentista acredita que, em geral, parte dos fatos para, em seguida, elaborar a sua “descoberta”. A ‘renga popular de que a ciéncia conduz A verdade deriva de outra renga: a de que siio os fatos que geram a descoberta. E como, segundo o refrdo popular, contra 0s fatos nfo hé 805, assim se desenvolveu!o mito de que a citncia pode tudo explicar e que, por definigdo, suas explicagdes so verdadeiras. Nada disso é correto, A pesquisa mais elementar parte de ‘uma hipétese (teérica) e mesmo a mais simples descoberta no é gerada pelos fatos mais resulta de uma interpretagdo deles. ‘Como se vé, hipétese na entrada e hipétese na salda. Os fatos da cigneia sao, pois, fatos selecionados, interpretados, marcados de teoria, Nao h4, para a nossa apreensdo, fatos “brutos”, “puros”, em estado “natural”. E falsa, pois, a doutrina de que os objetos sejam exatamente como parecem ser (“realismo ingénuo” de Bertrand Russell; “...nunca vemos o que pensamos que vemos"; loc cit, p. 58). ‘Nao é raro que clentistas formulem idéias diferentes diante dos mesmos dados. # a teoria que cada um aceita que 0 faz apreender os dados nfo como realmente so mas como cada teoria diz que devem ser. Essa atribuigéo de sentido aos fatos pela teoria foi referida, por exemplo, em 1986, pelo paleontolo- sista R. Lande, Ele deciarou que, relativamente a gradualismo, estase e mudanga répida (problemas ligados & moderna teoria aevolugfe), viioseminenescientstas “com diferentes pontos le vista chegaramn a conclusées opostas a respeito das mesmas séries de dados"™, Als, esse conflito de interpretagées é comum nas varias subteorias - além das mencionadas — da teorla geral da evolugio (por exemplo, as ligadas & selego natural, & deriva, a0 polimorfismo, & filogénese, etc.) 11, Newton CA. da Costa, 1977, 0 aos, matemd- ca, ME NOE fos Coma, 197, neds fndamens da 12. Cts bblogata en Deva. Yallog, 198, “And then @ nade ‘occurs — Weak links in in of argument from punctuation to hierarchy, Biol & Philos, $:3-28, 30 H& quem distinga entre citncia ¢ filosofia, crendo que aquela nos daria conhecimentos seguros e, as vezes, irretocdvels (leis da fisica, teoremas matemdticos, algumas teorias biolégicas, etc.), enquanto a segunda — com pretensSes acimas das nossas capacidades ~ apenas nos ofereceria “visBes do mundo” sujeitas, em geral, a sofrer total descrédito. A teoria da evolugilo (na sua formulagto mais geral), o teorema de Pitdgoras, a lei de Boyle- Mariotte, ete. seriam “fatos” insofismavels, enquanto os sistemas de Santo Tomés de Aquino e de Karl Marx (para s6 citar dols exemplos extremos) seriam conjuntos de proposicées antagéni- cas que continuam vivos apenas porque criaram escolas que recebem amplo crédito por parte de seus adeptos. Hi, como bem. se pode ver, uma descomunal simplificagio nesta maneira de pensar. Nem a ciéncia é uma forecedora perene de “verdades” e nem as doutrinas filoséficas s6 ttm 0 valor de composigdes musicais que podem agradar a uns endo a todos. Ambas preten- dem procurar a “verdade”, se bem que os clentistas sabem que 0 que realmente encontram é a verossimilhana. A filosofia no seria a sabedoria, “sé digna dos deuses", segundo Pitdgoras (670-497), mas 0 “amor da sabedoria” (Hlo-sofia); a ciéncia também o é em grande parte, Ambas se distinguem, no entanto, da f religiosa que pode ter a certeza com base em critérios que transcendem as da filosofia e da ciéncia, Mas o que muitas vezes acontece é que os cientistas, também com elementos sabidamen- te insatisfatérios, afirmam saber o que, na verdade, apenas eréem saber. Hé uma fé cientifica, que obviamente difere da féreligiosa, ‘mas que no deixa de ser também uma fé, Aceitar, por exemplo, {que a megaevolugio seja produzida pelos mesmos mecanismos (estes, aparentemente bem conhecidos) que promovem amicroe- volugéo nio deixa de ser um ato de fé, Actneia nfo futus no dcuo. Nio i cena que asa s6 cientista; ele é também cidaddo de uma cultura, politico, fil6so, ete, mesmo que néo tenha consciéncia disso. Quem fala mal da politica ou da flosofig est, sem o saber, tomando uma posigfo politica ou filosdfica. 13."Semoquerdelapt cst amen philosopher” Blase Pascal, 1962, Perse, Teste abl par Lous Lafuma,Prface @Anded Doda Seu Party 258 (Oliv ara data de 1962 mes sun inpreso x6 terminou em 1968). {ambi Pewamentos (rad. e nota de Americ de Carvalho), Publ. Europe-Ané- Hea, 1978, p14. 31 GOOG OOOO OY YOO OOTTWOITOVUOYOUOWIIOR Outro ponto a ser assinalado é que a filosofia nao pode ser aceita como uma simples “continuaggo” da ciéncia, no sentido de que, depois de obtido um conhecimento cientifico, se possa fazer a “filosofia” desse conhecimento, desta forma construindo- se toda a filosofia, Isto. palmente pode (e deve) ser feito, mas ‘como diz Henri Bergson’* (1859-1941), ainda é tarefa do préprio clentista, Reduzir a fungdo da filosofia a mera prosseguidora do que a ciéncia j4 conseguiu (ou pretendeu) determinar seria rebaixar a fungdo da filosofia A de simples auxiliar e conti- ruadora da eiéneia, indo, desta forma, mais além que esta, mas jelos mesmos caminhos. Cada ciéncia pode e deve ter sua losofia, diz Bergson, mas essa flosofia é ainda cidncia e quem ‘a deve fazer é o proprio cientista. A filosofia feita pelos filésofos tem dimens6es maiores e alcances mais profundos, Se a cltnca € a busca da verossinihanga através da interpretagio de fatos, a filosofia da ciéncia procura saber como os cientistas atingem sua pretendida meta (se é aatingem), {sto é, como se faz ciéncia, Em outros termos, é uma reflexio ‘sobre 0s pressupostos fundamentais e os procedimentos gerais de pesquiza clentifica. Desea forma, podemos visualizar trés niveis: os fatos, a citncia (que estuda os fatos) e a filosofia da citnela (que estuda a citneia). Para John Losee (1932- )*5, que prope a visio acima (a filosofia da ciéncia como uma criteriologia de segunda classe, sendo a ciéncia uma criteriologia de primeira classe), a primeira aborda problemas tais como: 1. Que caracteristicas difer ‘outros tipos de indagacao? 2, Que procedimentos devem ser seguidos pelos cientistas? 3, Que condigBes precisam Ser satisfeitas para que uma explica- do cientifica possa ser aceita como correta? jam a indagagdo cientifica de 14 Hens Bergson, 1985, La pensée et le mouvant. Quadrige/P.U., Pati [Ns piginas 154 e seguiaes, Bergaon faz uma notdve andlse ds entre ‘losofiaecitacas. Menclonel ete asssunto no meu lio Teoria da evolupfo —do

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