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VIDAS SECAS - Graciliano Ramos (Resumo)

Livros exigidos nos principais vestibulares.

Os abalos sofridos pelo povo brasileiro em torno dos acontecimentos de 1930, a crise
econômica provocada pela quebra da bolsa de valores de Nova Iorque, a crise cafeeira, a
Revolução de 1930, o acelerado declínio do nordeste condicionaram um novo estilo ficcional,
notadamente mais adulto, mais amadurecido, mais moderno que se marcaria pela rudeza, por
uma linguagem mais brasileira, por um enfoque direto dos fatos, por uma retomada do
naturalismo, principalmente no plano da narrativa documental, temos também o romance
nordestino, liberdade temática e rigor estilístico.
Os romancistas de 30 caracterizavam-se por adotarem visão crítica das relações sociais,
regionalismo ressaltando o homem hostilizado pelo ambiente, pela terra, cidade, o homem
devorado pelos problemas que o meio lhe impõe.
Graciliano Ramos (1892-1953) nasceu em Quebrângulo, Alagoas. Estudou em Maceió, mas
não cursou nenhuma faculdade. Após breve estada no Rio de Janeiro como revisor dos jornais
"Correio da Manhã e A Tarde", passou a fazer jornalismo e política elegendo-se prefeito em
1927.
Foi preso em 1936 sob acusação de comunista e nesta fase escreveu "Memórias do Cárcere",
um sério depoimento sobre a realidade brasileira. Depois do cárcere morou no Rio de Janeiro.
Em 1945, integrou-se no Partido Comunista Brasileiro.
Graciliano estreou em 1933 com "Caetés", mas é São Berdado, verdadeira obra prima da
literatura brasileira. Depois vieram "Angustia" (1936) e Vidas Secas (1938) inspirando-se em
Machado de Assis.
Podemos justificar isto com passagens do texto:
"Os infelizes tinham caminhado o dia inteiro, estavam cansados e famintos."
"A caatinga estendia-se de um vermelho indeciso salpicado de manchas brancas que eram
ossadas"
"Resolvera de supetão aproveitá-lo (papagaio) como alimento..."
"Miudinhos, perdidos no deserto queimado, os fugitivos agarraram-se, somaram as suas
desgraças e os seus pavores".

ESTUDO DOS PERSONAGENS

• Baleia - cadela da família, tratado como gente, muito querido pelas crianças.
• Sinhá Vitória - mulher de Fabiano, sofrida, mãe de 2 filhos, lutadora e inconformada
com a miséria em que vivem, trabalha muito na vida.
• Fabiano - nordestino pobre, ignorante que desesperadamente procura trabalho, bebe
muito e perde dinheiro no jogo.
• Filhos - crianças pobres sofridas e que não tem noção da própria miséria que vivem.
• Patrão - contratou Fabiano para trabalhar em sua fazenda, era desonesto e explorava os
empregados.
• Outros personagens: o soldado, seu Inácio (dono do bar).

ESTUDO DA LINGUAGEM
Tipo de discurso: indireto livre
Foco narrativo: terceira pessoa
Adjetivos, figuras de linguagem:
Metáfora: " - você é um bicho, Fabiano".
Prosopopéia: compara Baleia como gente
ANÁLISE DAS IDÉIAS
Comentário Crítico: Esse livro retrata fielmente a realidade brasileira não só da época em que
o livro foi escrito, mas como nos dias de hoje tais como injustiça social, miséria, fome,
desigualdade, seca, o que nos remete a idéia de que o homem se animalizou sob condições
sub-humanas de sobrevivência.

RESUMO DA OBRA

Mudança
Em meio à paisagem hostil do sertão nordestino, quatro pessoas e uma cachorrinha se
arrastam numa peregrinação silenciosa _ _ . O menino mais velho, exausto da caminhada sem
fim, deita-se no chão, incapaz de prosseguir, o que irrita Fabiano, seu pai, que lhe dá
estocadas com a faca no intuito de fazê-lo levantar. Compadecido da situação do pequeno, o
pai toma-o nos braços e carrega-o, tornando a viagem ainda mais modorrenta _ .

A cadela Baleia acompanha o grupo de humanos agora sem a companhia do outro animal da
família, um papagaio, que fora sacrificado na véspera a fim de aplacar a fome que se abatia
sobre aquelas pessoas. Na verdade, era um papagaio estranho, que pouco falava, talvez porque
convivesse com gente que também falava pouco _ _ .

Errando por caminhos incertos, Fabiano e família encontram uma fazenda completamente
abandonada. Surge a intenção de se fixar por ali. Baleia aparece com um preá entre os dentes,
causando grande alegria aos seus donos. Haveria comida. Descendo ao bebedouro dos
animais, em meio à lama, Fabiano consegue água. Há uma alegria em seu coração, novos
ventos parecem soprar para a sua família. Pensa em Seu Tomás da bolandeira. Pensa na
mulher e nos filhos.

A inesperada caça é preparada, o que garante um rápido momento de felicidade ao grupo. No


céu, já escuro, uma nuvem - sempre um sinal de esperança. Fabiano deseja estabelecer-se
naquela fazenda. Será o dono dela. A vida melhorará para todos _ .

Fabiano
Em vão Fabiano procura por uma raposa. Apesar do fracasso da empreitada, ele está
satisfeito. Pensa na situação da família, errante, passando fome, quando da chegada àquela
fazenda. Estavam bem agora _ _ . Fabiano se orgulha de vencer as dificuldades tal qual um
bicho. Agora ele era um vaqueiro, apesar de não ter um lugar próprio para morar. A fazenda
aparentemente abandonada tinha um dono, que logo aparecera e reclamara a posse do local. A
solução foi ficar por ali mesmo, servindo ao patrão, tomando conta do local. Na verdade, era
uma situação triste, típica de quem não tem nada e vive errante. Sentiu-se novamente um
animal, agora com uma conotação negativa. Pouco falava, admirava e tentava imitar a fala
difícil das pessoas da cidade. Era um bicho _ .
A uma pergunta de um dos filhos, Fabiano irrita-se. Para que perguntar as coisas? Conversaria
com Sinha Vitória sobre isso. Essas coisas de pensamento não levavam a nada. Seu Tomás da
bolandeira, apesar de admirado por Fabiano pelas suas palavras difíceis, não acabara como
todo mundo? As palavras, as idéias, seduziam e cansavam Fabiano.
Pensou na brutalidade do patrão, a tratá-lo como um traste. Pensou em Sinha Vitória e seu
desejo de possuir uma cama igual à de Seu Tomás da bolandeira. Eles não poderiam ter esse
luxo, cambembes que eram. Sentiu-se confuso. Era um forte ou um fraco, um homem ou um
bicho _ ? Sentia, por vezes, ímpeto de lutador e fraqueza de derrotado.
Lembrando dos meninos, novamente, achou que, quando as coisas melhorassem, eles
poderiam se dar ao luxo daquelas coisas de pensar. Por ora, importante era sobreviver.
Enquanto as coisas não melhorassem, falaria com Sinha Vitória sobre a educação dos
pequenos.

Cadeia
Fabiano vai à feira comprar mantimentos, querosene e um corte de chita vermelha. Injuriado
com a qualidade do querosene e com o preço da chita, resolve beber um pouco de pinga na
bodega de seu Inácio. Nisso, um soldado amarelo convida-o para um jogo de cartas. Os dois
acabam perdendo, o que irrita o soldado, que provoca Fabiano quando esse está de partida. A
idéia do jogo havia sido desastrosa. Perdera dinheiro, não levaria para casa o prometido.
Fabiano, agora, pensava em como enganar Sinha Vitória, mas a dificuldade de engendrar um
plano o atormentava.
O soldado, provocador, encara o vaqueiro e barra-lhe a passagem. Pisa no pé de Fabiano que,
tentando contornar a situação à sua maneira, agüenta os insultos até o possível, terminando
por xingar a mãe do soldado amarelo. Destacamento à sua volta. Cadeia. Fabiano é
empurrado, humilhado publicamente.
No xadrez, pensa por que havia acontecido tudo aquilo com ele. Não fizera nada, se quisesse
até bateria no mirrado amarelo, mas ficara quieto. Em meio a rudes indagações, enfureceu-se,
acalmou-se, protestou inocência _ . Amolou-se com o bêbado e com a quenga que estavam
em outra cela. Pensou na família. Se não fosse Sinha Vitória e as crianças, já teria feito uma
besteira por ali mesmo. Quando deixaria que um soldadinho daqueles o humilhasse tanto?
Arquitetou vinganças, gritou com os outros presos e, no meio de sua incompreensão com os
fatos, sentiu a família como um peso a carregar.
Vidas Secas

O drama da família de retirantes, obrigada a se mudar constantemente por causa da seca, é


narrado num estilo com economia de adjetivos, que transmite a aridez do ambiente e suas
conseqüências para os sertanejos
Vidas Secas, romance publicado em 1938, retrata a vida miserável de uma família de
retirantes sertanejos obrigada a se deslocar de tempos em tempos para áreas menos castigadas
pela seca. A obra pertence à segunda fase modernista, conhecida como regionalista, e é
qualificada como uma das mais bem-sucedidas criações da época.

O estilo seco de Graciliano Ramos, que se expressa principalmente por meio do uso
econômico dos adjetivos, parece transmitir a aridez do ambiente e seus efeitos sobre as
pessoas que ali estão.

A ESTÉTICA DA SECA
O livro consegue desde o título mostrar a desumanização que a seca promove nos
personagens, cuja expressão verbal é tão estéril quanto o solo castigado da região. A miséria
causada pela seca, como elemento natural, soma-se à miséria imposta pela influência social,
representada pela exploração dos ricos proprietários da região.

Os retirantes, como o próprio nome indica, estão alijados da possibilidade de continuar a viver
no espaço que ocupavam. São, portanto, obrigados a retirar-se para outros lugares. Uma das
implicações dessa vida nômade dos sertanejos é a fragmentação temporal e espacial.

Graciliano Ramos conseguiu captar essa fragmentação na estrutura de Vidas Secas ao utilizar
um método de composição que rompia com a linearidade temporal, costumeira nos romances
do século XIX.

A proposital falta de linearidade, ou seja, de capítulos que se ligam, temporalmente, por


relações de causa e de consequência, dá aos 13 capítulos de Vidas Secas uma autonomia que
permite, até mesmo, a leitura de cada um de forma independente.

ENREDO
O enredo, marcado por essa falta de linearidade temporal, tem dois capítulos bem definidos: o
primeiro (“Mudança”) e o último (“Fuga”). “Mudança” narra as agruras da família sertaneja
na caminhada impiedosa pela aridez da caatinga, enquanto em “Fuga” os retirantes partem da
fazenda para uma nova busca por condições mais favoráveis de vida. O romance estrutura-se
por meio da sequência retirada/permanência em terras alheias/retirada.

Nos 11 capítulos intermediários, a família de retirantes não se estabelece em um local próprio,


mas na propriedade de um fazendeiro, onde Fabiano, o chefe dessa família, assume a
condição de meeiro, lavrador que planta em sociedade com o dono do terreno, tendo direito à
metade da colheita.
Merece destaque, no romance, o capítulo “Baleia”. Foi o primeiro escrito por Graciliano
Ramos e o que mais tem autonomia em relação aos demais. Se em todos os outros capítulos
há certa independência, e eles podem ser lidos fora da sequência proposta pelo autor, nesse
caso a leitura pode até ser feita isoladamente. Essa possibilidade se deve a sua estrutura, que
se assemelha mais à de um conto.

NARRADOR
A escolha do foco narrativo em terceira pessoa é emblemática, uma vez que esse é o único
livro em que Graciliano Ramos utilizou tal recurso. Trata-se, na verdade, de uma necessidade
da narrativa, para que fosse mantida a verossimilhança da obra. Por causa da paupérrima
articulação verbal dos personagens, reflexo das adversidades naturais e sociais que os afligem,
nenhum parece capacitado a assumir o posto de narrador.

O autor utilizou também o discurso indireto livre, forma híbrida em que as falas dos
personagens se mesclam ao discurso do narrador em terceira pessoa. Essa foi a solução para
que a voz dos marginalizados pudesse participar da narração sem que tivessem de arcar com a
responsabilidade de conduzir de forma integral a narrativa.

ESPAÇO
A narrativa é ambientada no sertão, região marcada pelas chuvas escassas e irregulares. Essa
falta de chuva – somada a uma política de descaso do governo com os investimentos sociais –
transforma a paisagem em ambiente inóspito e hostil.

Inverno, na região, é o nome dado à época de chuvas, em que a esperança sertaneja floresce.
O sonho de uma existência menos árida e miserável esboça-se no horizonte e dura até as
chuvas cessarem e a seca retornar implacável. No romance, essa esperança aparece no
capítulo “Inverno”, em que Fabiano alimenta a expectativa de uma vida melhor, mais digna.

O retorno à visão marcada pela falta de perspectivas recomeça com o fim das chuvas, com o
fim da esperança. Na obra, pode-se apontar, também, para dois recortes espaciais: o ambiente
rural e o urbano. A relevância desse recorte se deve às sensações de adequação ou
inadequação dos personagens em um ou outro espaço.

Fabiano consegue, apesar da miséria presente, dominar o ambiente rural. Incapaz de se


comunicar, o personagem, desempenhando a solitária função de vaqueiro, não sente tanto as
conseqüências de seu laconismo. Além disso, conhece as técnicas de sua profissão, o que lhe
dá uma sensação de utilidade e permite que goze até de certa dignidade. A passagem em que
seu filho o admira ao vê-lo trabalhando deixa claro isso. Na cidade, porém, Fabiano vivencia,
a cada nova experiência, o sentimento de inadequação. Os capítulos “Festa” e “Cadeia”
ilustram bem essa sensação.

TEMPO
Além da falta de linearidade do tempo, em Vidas Secas há nítida valorização do tempo
psicológico, em detrimento do cronológico. Essa opção do narrador de ocultar os marcadores
temporais tem como principal conseqüência o distanciamento dos personagens da ordenação
civilizada do tempo.

Dessa forma, nota-se que a ausência de uma marcação cronológica temporal serve, enquanto
elemento estrutural, como mais uma forma de evidenciar a exclusão dos personagens.
Por outro lado, a valorização do tempo psicológico na narrativa faz com que as angústias dos
personagens fiquem mais próximas do leitor, que as percebe com muito mais intensidade.

CONCLUSÃO

Vidas Secas é um dos maiores expoentes da segunda fase modernista, a do regionalismo. O


diferencial desse livro para os demais da época é o apuro técnico do autor. Graciliano Ramos,
ao explorar a temática regionalista, utiliza vários expedientes formais – discurso indireto livre,
narrativa não-linear, nomes dos personagens – que confirmam literariamente a denúncia das
mazelas sociais.

Vidas Secas - Graciliano Ramos - resumo

Capítulo 1: Mudança

Os sertanejos Fabiano, o pai, Sinhá Vitória, a mãe, os dois meninos, acompanhados pela
cachorra Baleia e o papagaio de estimação atravessavam a Caatinga pernambucana.

Desalentados pela seca, pelo sol forte, pela fome, pela sede, pelo cansaço de existirem seguem
arrastando seus mulambos por dentro dos leitos dos rios esturricados. Procuram lugar, o
menino mais novo acaba desmaiando diante das tamanhas imposições da vida. Fabiano
aperta-lhe com a espingarda, com o facão, com as ameaças guturais, mas o excomungado não
se mexe. Fabiano, então se compadecem do filho ao ver os urubus fazendo seus giros entre o
sol e o chão esturricado. Carregou-o nas costas, como um pacote; e seguiam. Agora mais
vagarosamente, porém ele tinha que seguir viagem. Era sua perseverança. Ele não sabia para
onde ir, mas tinha de prosseguir. A morte do papagaio, aquela noite, trouxe a todos uma
mistura de alegria trágica e tristeza esperançosa. Afinal, era sempre assim, andavam sempre
divididos. Divididos entre a perda e a necessidade. Num dia de sorte, a cachorra baleia caçou
um preá dos bons. Aquela caça dava o tom da emoção e da salvação desses viventes. Sinhá
Vitória, como se beijasse, lambia o sangue do preá que escorria pelas ventas da cachorra.

Capítulo 2: Fabiano

Os infelizes chegaram, então, a uma fazenda abandonada e seca, em que pouco vivo restava.
Restos suficientes para alegrar a todos, sobretudo, Fabiano, que, agora, sentia-se relaxado,
sentia-se homem. Ou melhor, um bicho. Sim, um bicho. Orgulhava-se, afinal que importava?!
Eles estavam vivos. E somente bichos poderiam sobreviver àquelas circunstâncias. Fabiano
orgulhava-se de ser um bicho. Um cabra. Cabra vivendo em terra alheia, cuidando de coisas
alheias; ele entendia-se bem com a natureza. Sua vida seca e difícil o reduzira à condição
natural: era um bicho, grugunhia como bicho, relacionava-se com a família como um bicho e
era feliz assim. Recordava-se de seu antigo patrão: seu Tomás da bolandeira, homem culto,
inteligente, só não sabia mandar. Imaginem, em vez de mandar, pedia. Era um absurdo.
Pedir?! Isso lá era jeito de tratar empregado. Fabiano admirava seu Tomás, tentava imitá-lo no
jeito de falar, tentava imitar palavras difíceis de modo enrolado e incompreensível, de
qualquer maneira, pois eram muito melhores que seus poucos bocejos.

Capítulo 3: Cadeia

O dono da fazenda finalmente apareceu. Ainda bem, pois a fazenda estava “cuidadinha”. Deu
a Fabiano o cargo de capataz. Agora iriam viver. Teriam até dinheiro.

Fabiano foi então à vila para fazer feira com o dinheiro emprestado e para vender um porco
que matara. Porém, o fiscal do governo exigiu-lhe imposto e o impediu de vender a carne.

Na mercearia do seu Inácio, Fabiano acaba se envolvendo em um jogo de cartas com o


soldado amarelo. Perdeu o dinheiro. Sentindo-se desolado diante da situação, retirou-se
bruscamente do jogo. Como iria explicar à família aquilo?!

O soldado amarelo considerou aquilo uma ofensa, prendeu Fabiano, surrou-o


humilhantemente na cadeia. Durante a noite inteira, sua mente não se acerta, fica confusa,
uma mistura de revolta e desalento.

Capítulo 4: Sinhá Vitória

Sinhá Vitória está desiludida, a situação do dia-a-dia piora cada vez mais. seu sonho de ter
uma cama de couro, como a do antigo patrão, Seu Tomás, fica cada vez mais distante. Como
conseguí-la? Gasta tempo tentando dar alguma esperança ao sonho, mas a vida é mais forte. A
miséria impõe-se cada vez mais fortemente, já anda perdendo a paciência com os meninos,
com a Baleia, com o Fabiano. Tenta a todo custo manter o sonho, o sonho de que um dia
viverá com o mínimo de dignidade. Essa possibilidade de que um dia tudo seria diferente já
fazia a diferença. Por muitas vezes ela sentia-se quase feliz.

Capítulo 5: O menino mais novo

O menino mais novo sentia realmente afeto pelo pai. Queria, quando adulto, ser vaqueiro
como o pai. Não tinha nome, mas isso não tem importância, pois bicho não precisa de nome
mesmo. Ficava imaginando o dia em que poderia montar uma égua alazã e guiar o gado, ao
lado do pai, fazendo inveja para todos, até para o irmão mais velho.

Resolveu exibir a sua vocação: saiu montado em um bode cavalgando, e lá se foi para o fundo
do barranco todo machucado, para as risadas do irmão mais velho, para a repreensão no olhar
da Baleia.

Capítulo 6: O menino mais velho

O menino mais velho vivia observando o trabalho da mãe na cozinha. Sinhá Vitória vivia
reclamando da vida: ê inferno, sempre dizia. Inferno: a palavra parecia tão carregada, cheia de
sentido; o menino precisava saber o seu significado. Perguntava à mãe, foi insistente,
perturbador, pois deixou a mãe numa situação muito difícil. A mãe não sabia explicar-lhe.
Sentiu-se limitada e indignada acabou descontando seu desgosto no filho, que saiu humilhado
e foi se consolar com sua fiel amiga Baleia, que, no entanto, estava concentrada na cozinha,
onde sinhá Vitória preparava o osso com medula e até nacos de carne. Ele estava só, impedido
de saber, de ter alguém para dividir as suas angústias.
Capítulo 7: Inverno

Com o inverno chegaram as chuvas no sertão. Sentada ao redor do fogo, a família se aquecia à
noite. Conversavam continuamente sobre suas miragens: um nordeste sem seca, a caatinga
verde, rapadura para comer, o gado gordo. Fabiano regatava-se. Mas mesmo a época de
prosperidade não afastava as preocupações de Sinhá Vitória. Preocupava-se, pois, junto com
as chuvas poderiam vir também as enchentes.

Capítulo 8: Festa

Fabiano e sua família foram passar o natal na cidade. O aperto das roupas e o desconforto
causado pelos sapatos que eram estreados, juntamente com a sensação de ridículo que sentiam
por estarem dentro de roupas que não eram de uso comum para eles comprometia a felicidade
daquele momento. Felicidade que chegaram a sentir com a sensação de serem pessoas
normais.

Na hora da missa, Sinhá Vitória tentava adquirir um vínculo positivo com a situação, tentava
participar da cerimônia já os meninos estavam tomados pelo medo. Desolados viam os pais
menores do que os santos, menores e mais insignificantes do que já eram, tão menores que
aquela gente da cidade, e era tanta gente, tantas coisas novas. Cochichavam as tantas
descobertas. Sentiam-se como selvagens, bichos do mato. Sentiam-se como Fabiano se sentia,
preso, igual a quando estivera na cadeia. Resolveu então ir à bodega do Seu Inácio. Lá, bebeu,
procurou briga, desafiou todos, sem obter resposta. Nem ele nem suas intrigas importavam
para os outros. Humilhado, voltou para perto da família para agüentar aquele desconsolo de
festa.

Capítulo 9: Baleia

Baleia ficou doente. Seus pêlos caíram, as costelas apareciam na pele rósea, onde manchas
escuras convertiam-se em pus e sangravam. As chagas cobriam-lhe a boca de inchaço.

Fabiano resolveu matá-la, Sinhá Vitória achou precipitado, afinal, não estava louca. Fabiano
achava que era hidrofobia, por isso não havia escolha.

Os meninos foram levados para dentro. Fabiano chamava a cachorra. Os meninos se


desesperaram: vão bulir com a Baleia, não é mãe?!

Fabiano alcançou a cachorra perto do alpendre, estava irritado com a situação. Atirou. A carga
atingiu a pata traseira de Baleia. A cachorra saiu de pernas tortas, arrastando-se em três delas
para detrás de uma moita de espinhos. Sua consciência sumia-lhe. Era tarde. Precisava
descansar.

Com um enorme esforço, tentava vencer o nevoeiro que tomava conta dela. A muito custo
abriu os olhos e viu em sua frente Fabiano segurando um objeto ameaçador. Pensou em
mordê-lo, mas como podia, depois de ter passado a vida toda na obediência, juntando o gado
a um só sinal de seu dono. Ela pertencia a ele. Sabia disso.

Foi então que reparou em todos aqueles bichos soltos. Já era de noite, já era alucinação.
Estranhou a ausência dos meninos. Tudo era uma noite de inverno, fria, gelada, nevoenta.
Ela queria dormir ali entre a cozinha e o alpendre, na pedra quente do fogão. Amanhecendo,
acordaria feliz, lambendo a mão de um Fabiano enorme, as crianças rolariam com ela em um
pátio imenso, o mundo ficaria cheio de preás, gordos, grandes, o nordeste seria um campo
verdejante, cheio de árvores e bichos. Tudo seria diferente.

Capítulo 11: Contas

Fabiano foi até a casa do patrão para receber seu pagamento. O patrão apresentou-lhe cálculos
que eram muito distintos daqueles que Sinhá Vitória havia preparado. Era tão pouco e injusto.
Fabiano, de impulso, reclamou, proferiu com blasfêmias. O patrão tentou justificar-se dizendo
que contavam-se ali os juros pelos empréstimos antecipados. Provavelmente, os cálculos
estavam certos.

Fabiano aceita a explicação, gente como o patrão não ia ter motivos para prejudicá-lo. Ele
sempre fora respeitador e honesto, o patrão devia de ser também.

Porém, o sonho de se firmar naquela fazenda destorcia-se. A idéia de permanecer ali era
abalada por uma ameaça, seria demitido?

Fabiano revolta-se. Por que tinha de ser sempre aquilo?!

Capítulo 12: O soldado Amarelo

Passado um ano de sua injusta prisão, Fabiano reencontra-se com o soldado amarelo perdido
pela caatinga. Tinha nas mãos a chance de se vingar. Uma facada e ele mandava aquele
sujeito para outro mundo. Aquilo era um covarde, se aproveitava da farda e da autoridade.
Fabiano respeitava a lei. Por isso deixou aquele mulambo ir embora vivo. Fabiano possuía
princípios.

Capítulo 13: O Mundo Coberto de Penas

A presença das aves de arribação representava a aproximação da nova seca. Fabiano tentava
espantá-las atirando-nas, porém, em vão. Era a luta contra o destino, contra sua natureza
cruel. Sua sina só era comparável à sina de Baleia. Uma desgraça total. Ao pensar no dono da
fazenda e no soldado amarelo, Fabiano ficava à beira da loucura. Ele era um homem, ou antes
um cabra safado. Se não fosse teria entrado para o cangaço. Tinha feito miséria. Tinha matado
aquele fazendeiro injusto e aquele soldado desumano. Mas ele era um cabra safado. Voltou
então para casa impotente e fraco.

Capítulo 14: Fuga

Com a nova seca, Fabiano juntou todas as coisas, a sua família e seguiu caminho. Mais uma
vez estavam de mudança. Retirantes. Como as aves de arribação. Como bichos. Não tinham
escolha. Recordavam-se da Baleia. Desconsolados, fugiam de madrugada. Era bom evitar o
confronto com o patrão. Aquilo não era humano. No caminho o passo tinha de ser intenso.
Seguiam: Fabiano, Sinhá Vitória, o menino mais velho, o menino mais novo. Para onde? Eles
não sabiam. Sabiam que tinham que prosseguir. Estava escrito.

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