34 EXPANSÃO | 19 de Março 2010
NACIONAL
EMPREGO
Fórum reúne
encontro de... elite
De volta a Lisboa para mais um fim-de-semana de recrutamento,
para o País, de angolanos qualificados na diáspora, o fórum Elite
Angolan Careers juntou 31 empresas e mais de 400 candidatos.
PAULA CARDOSO
Ninguém entra sem convite e
ninguém sai sem uma “porta” de
acesso ao mercado de trabalho.
Escolhidos pelo currículo para
participarem no Elite Angolan
Careers, centenas de recém-li-
cenciados angolanos, seleccio-
nados dos quatro cantos do
mundo, encontram no fórum de
recrutamento um canal privile-
giado de contacto com algumas
das maiores empresas que ope-
ram no País.
“Mais do que uma oportuni-
dade de emprego, o fórum pode
ser uma oportunidade única
para mudar de vida”, defende
Maria Baptista, estudante ango-
lana na diáspora e uma das 750
pessoas convidadas para o even-
to, que o Expansão acompanhou
durante o último fim-de-sema-
na em Lisboa.
Organizado pela Elite Inter-
national Careers, empresa fun-
dada em Londres, há dois anos, o
fórum transformou-se numa
das principais imagens de marca
da firma, que tem na política de
Exclusivo para
angolanos, o fórum
de recrutamento
da Elite vai
ao encontro
da política
de angolanização
do País
angolanização dos quadros do
País um importante “parceiro”
de negócios.
“Não nos podemos esquecer
de que a preferência pelo recru-
tamento de angolanos não passa
apenas por uma opção das em-
presas”, nota Marco Carvalho,
director de recursos humanos
da Technip, firma especialista
na área de engenharia e uma das
31 empresas que marcaram pre-
sença no fórum do passado fim-
-de-semana.
Ele próprio um “produto” do
Elite Angolan Careers – partici-
pou na primeira edição lisboeta
do evento, há um ano –, Marco
lembra que a selecção de qua-
dros nacionais é não só um im-
perativo legal, como “tem de ser
entendida no processo de re-
construção do País”.
A importância da angolaniza-
ção das empresas para o desen-
volvimento nacional também é
destacada por Edgar Kalu, re-
presentante da Coca-Cola no fó-
rum. “Não se trata apenas de
promover o desenvolvimento da
economia”, considera o técnico
de recrutamento, defendendo
ainda a necessidade de as firmas
apostarem nos jovens angola-
nos. Nesse sentido, Carlos Fer-
nandes, director nacional de for-
mação e desenvolvimento da
Coca-Cola, explica que, além da
presença assídua nos fóruns de
recrutamento da Elite, a empre-
sa investe muito na formação de
quadros com pouca experiência
ou mesmo sem experiência.
11 entrevistas em menos de
48 horas
Este é o caso da maioria dos par-
ticipantes no Angolan Careers:
65% dos candidatos convidados
para o evento do passado fim-
-de-semana tinham no máximo
três anos de vida activa.
Ainda longe dessa marca, Ma-
ria Baptista, de 24 anos, que via-
jou de Moscovo, na Rússia, para
participar no evento, anseia pelo
mês de Agosto para regressar a
Luanda e iniciar uma carreira
numa petrolífera.
Foi com este objectivo que
esta estudante de Engenharia,
na especialização Geologia e Mi-
nas, entregou o currículo à Elite
International Careers e desem-
bolsou cerca de 600 USD na des-
locação a Lisboa. “Não tenho dú-
vidas de que é um investimento
que vale a pena”, diz a futura en-
genheira, que, apesar de ainda
estar em fase de conclusão dos
estudos, foi escolhida para parti-
cipar em quatro entrevistas.
Mais opções teve Rui Carlos,
que aos 28 anos, e após uma dé-
cada de estudos em Gestão de
Empresas no Reino Unido, tam-
bém vê no fórum da Elite um
passaporte para regressar a casa.
“Fui escolhido para 11 entrevis-
tas de 11 empresas e espero que
alguma delas me ofereça condi-
ções para voltar a Angola.”
As propostas – segundo as in-
formações recolhidas pelo Ex-
pansão junto dos candidatos e
dos representantes das empre-
sas – rondam os 3000 USD para
posições de base, valor acrescido
dos benefícios específicos de
cada firma.
De fora da maioria das ofertas
de trabalho fica o alojamento e o
transporte, encargos que não in-
O caminho
para Angola
31 empresas
marcaram presença na segunda
edição do fórum de Lisboa
7000
pessoas
inscreveram-se para participar
no processo de recrutamento
750
candidatos
receberam convite
para entrar no fórum, mas
apenas 423 compareceram
15 países
compõem o mapa da diáspora
dos candidatos
timidam Sandra Faustino, 39
anos, recém-licenciada em Psi-
cologia. Apesar de viver há 15
anos em Portugal, Sandra garan-
te que está preparada para voltar
imediatamente para o País. “Te-
nho família em Luanda, por isso
casa nunca seria um problema.”
Este é, contudo, um custo que
dissuade alguns candidatos, ao
mesmo tempo que faz com as
empresas a operar no País pro-
curem cada vez mais trabalha-
dores nacionais, em prejuízo de
expatriados.
“A participação em dois fó-
runs da Elite, com 70 entrevistas
incluídas e três salas para recru-
tamento, representa um investi-
mento de quase 100 mil USD”,
calcula Maria Fernandes, geren-
te de recursos humanos da pres-
tadora de serviços Halliburton,
acrescentando que, somando
despesas com alojamento,
transporte e alimentação, o
“custo de um expatriado por
ano” chega a ultrapassar esse va-
lor. “O recurso à mão-de-obra
angolana é a melhor forma de
crescermos todos”, conclui a
responsável.
EXPANSÃO | 19 de Março 2010 35
Entrevista Miguel Vieira
Consultor associado e director
comercial para Angola
da Elite International Careers
“50% dos candidatos
são colocados”
Um dos mentores do Elite Ango- riência, a área de especialização
lan Careers, Miguel Vieira (ao ou as funções a desenvolver.
lado) revela ao Expansão a fór-
mula por trás do fórum de recru- Já aconteceu não terem qual-
tamento que alicia cada vez mais quer solução para apresentar
angolanos a regressarem ao País. ao cliente?
A menos que se pretenda algo que
Costuma dizer que os fóruns
de recrutamento da Elite não
ainda não existe, como um astro-
nautaangolano,conseguimossem-
são feiras de emprego. Qual a
diferença?
pre encontrar um serviço que res-
ponde às necessidades do cliente.
Acredito que a selecção dos par- Seaempresaestiveràprocurasóde
ticipantes é o que nos diferencia uma pessoa, vamos dizer-lhe que
das outras ofertas do mercado.
Temos uma base de dados com
não justifica participar num fórum
de recrutamento, mas se estiver à
mais de 20 mil currículos e, em procura de vários colaboradores,
função do perfil de trabalhado- não há solução melhor do que o fó-
res que os nossos clientes pre- rum: pode gastar 10 mil libras (cer-
tendem recrutar, conseguimos cade15milUSD),masconseguere-
apresentar várias soluções, to-
das ajustadas às necessidades
crutar 20 pessoas, o que equivale a
um custo de 500 libras por pessoa.
que nos foram identificadas pe-
los clientes.
Pelo contrário, se essa mesma em-
presa for a uma empresa de recru-
tamento que lhe vai cobrar 15% do
Com tantos currículos para salário anual dessas mesmas 20
analisar, de quanto tempo pessoas,pensandoque15%dosalá-
precisam para encontrar os rioanualsejam1000librasamulti-
candidatos certos?
Tentamos ter sempre um míni-
mo de 30 dias de trabalho antes
plicar por 20 pessoas, sai bastante
mais caro do que a participação no
nossoevento.
de apresentarmos a nossa pré-
-selecção às empresas, porque Está ainda em curso o recru-
não podemos deixar de acompa- tamento para a Arábia Saudi-
nhar um cliente com quem já es- ta. Têm outros países em
tamos a lidar há cerca de cinco perspectiva?
ou seis meses para dar resposta a Antes da selecção para a Arábia
outro que venha ter connosco
hoje a pedir uma solução urgen-
Saudita, que será ainda neste
mês em Londres, também recru-
te para amanhã. Antes de mais, támos para a Nigéria e para a
temos de ser realistas. América Latina. No próximo
ano queremos recrutar para o
Mas como se processa a tria- Iraque e para a Líbia, sempre
gem de candidatos? com o mesmo formato.
Além de contarmos com uma
equipa de 17 colaboradores, Qual a taxa de sucesso de um fó-
onde se incluem especialistas na rumcomasdimensõesdoquese
angariação de talento, temos um realiza em Lisboa e em Luanda?
sistema informático que foi des- Sabemos que nos dois meses após
envolvido em exclusivo para nós a realização do fórum, 50% dos
e que nos ajuda a identificar can- candidatos são colocados ou estão
didatos a partir de determina- em vias de o ser, faltando para isso
Angola, Portugal e África do Sul foram os países eleitos para recrutar quadros médios e superiores para algumas das maiores empresas a operar no País. Com destaque para as petrolíferas e as instituições financeiras dos parâmetros. Permite-nos, formalizar algumas etapas, como,
por exemplo, seleccionar pes- porexemplo,arealizaçãodetestes
soas segundo os anos de expe- psicotécnicos.
RESPOSTAS PARA UM FUTURO EM ANGOLA
Convidado para a abertura do Elite Angolan Careers, José Octávio
Serra Van-Dúnem, sociólogo e professor da Universidade
Agostinho Neto, destacou, para o Expansão, o contributo
da iniciativa para o amadurecimento do mercado de trabalho
nacional. “Foi uma surpresa enorme ver um grande número de
empresas nacionais e estrangeiras, incluindo multinacionais,
interessadas em sair de Angola em busca de quadros angolanos”,
disse o docente, lembrando que a oportunidade de integração
imediata de recém-licenciados no mundo laboral vai ao encontro
das prioridades de angolanização do País. Apesar de acreditar
que a evolução do ensino nacional não vai travar a formação
Fotos: Hermínio Clemente
de angolanos no exterior nos próximos anos, Serra Van-Dúnem
considera que a tendência será invertida “à medida que formos
fortalecendo as nossas capacidades institucionais, em termos
de universidades, institutos médios e cursos técnicos”.
No entanto, o sociólogo defende que, seja qual for
a nacionalidade do diploma, “o importante é que os quadros
saiam das instituições bem formados e que encontrem respostas
não apenas para o seu futuro, mas para um futuro em Angola”.
Em busca de propostas para trabalhar em Luanda, Rui Carlos e Sandra Faustino, de 28 e 39 anos, respectivamente, aceitaram o convite da Elite International Careers para o Fórum de Recrutamento de Lisboa