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A GRANDE TRANSFORMACAO A profunda crise do capitalismo global em seu “néicleo orginico” (Unio Européia, EUA e Japio), a partir da crise financeira de 2008/2009, e seu desen- volvimento sistémico na borda periférica do sistema mundial ~ os ditos “paises emergentes’, entre eles o Brasil - na primeira metade da década de 2010, demons- trou, com vigor, a natureza instével do sistema mundial do capital. Trata-se de ‘uma crise global do desenvolvimento capitalista comparavel Aquela que ocorrew a partir de 1929. Como observaram Gérard Duménil e Dominique Lévy, tal como a crise de 1929, a crise de 2008/2009 foi uma crise de hegemonia financeira, sendo distinta, portant, das crises de 1890 ¢ 1973/1975, considerada por eles, crise de Iucratividade. Dizem eles: “A taxa de lucro é uma importante varivel na anslise das crises estruturais. As crises das décadas de 1890 e de 1970 foram o resultado da tendéncia de queda de lucros. Reciprocamente, a Grande Depressio e a crise do neoliberalismo no estdo ligadas & tendéncia de queda da taxa de luctos. Nos dois casos a queda da taxa de lucto estava passando por um lento processo de recuperagdo, Nem uma tendéncia de alta, nem a de queda da taxa de lucro, podem ser consideradas um. determinante da crise atual. ss0, claro, néo significa que, sob certos aspectos, a taxa de lucro nao seja relevante nesta analise. A Grande Depressio ¢ a crise atual tém em comum o fato de cada uma delas ter marcado o fim de um periodo de he- ‘gemonia financeira, ”E prosseguem: “A Grande Depressio pode ser denominada de ‘a crise da primeira hegemonia financeira’. Essa denominacio expressa direta- ‘mente seus aspectos em comum com a crise do neoliberalismo, ele proprio a crise da segunda hegemonia financeira. Ambas foram consequéncia do exercicio da hhegemonia, a expressao irrestrita das exigéncias das classes altas que forcaram os ‘mecanismos econdmicos até os limites da sustentabilidade, extrapolando-os por fim” [o grifo é nosso} (Duménil e Lévy, 2014) Como vimos acima, Duménil Lévy, em suas anélises da crise de 2008/2009, desprezam como nexo explicativo, o movimento tendencial da queda da taxa de lucro, Dizem eles: “Nem uma tendéncia de alta, nem a de queda da taxa de lucro podem ser consideradas um determinante da crise atual. ” Entretanto, podemos dizer que, o movimento da taxa de lucro é ~ e ndo é ~ um determinante da crise atual, Existe uma ligica dialética concreta na explicagdo da crise de 2008/2009. & preciso resgatar a natureza complexa da crise do neoliberalismo, Num primeiro ‘momento, somos levados a concordar com eles: a crise do neoliberalismo que as- sistimos a partir da crise de 2008/2009 trata-se de fato, de uma crise de hegemonia {inanceira e néo uma crise de lucratividade. Nas iltimas décadas de desenvolvi- ‘mento do capitalismo global, a taxa média de lucto tem passado por uma Jenta recuperagio. Mas, num segundo momento, temos que reconhecer que, a lenta recuperacio da taxa de lucro dos oligopélios mundiais que ocorreu de fins da década de 1980 para cé, diz respeito mais Aquilo que Carcanholo e Sabatini (2015) denominaram. “Iuctos ficticios” do que a uma recuperagio efetiva da lucratividade das corpora- es industriais. Na verdade, a recuperasdo da rentabilidade do capital organi zado a partir do “niicleo orginico” e centro dinamico do capitalismo global nio resultava apenas dos variados instrumentos de elevagio da taxa de exploracao do trabalho, colocados em agio frente & crise de lucratividade de meados da década 4e 1970, apontando assim, para um novo ciclo de produgao de valor e reproduca0 ampliada do capital produtivo. A era do capitalismo global é a era da precari zagao estrutural do trabalho. Entretanto, persiste como movimento tendencial, cm Giltima instancia, a crise da producdo/realizacao (formagao) de valor, mesmo ‘ocorrendo a elevagio da taxa de exploracdo do trabalho como obsticulo a lei da tendéncia (¢ contratendéncias) & queda da taxa de lucros. Na verdade, o principal ‘movimento contratendencial a queda da taxa de lucros é a financeirizagio da ri queza capitalista, provocando a estupenda expansio dos mecanismos especula- tivos responséveis pela produgao de uma forma diferenciada de riqueza ficticia de natureza especulativa-parasitéria, resultante de operagées que se desenvolvem, numa dimensio distinta da especulagio tradicional. £ o que Carcanholo e Saba- dini denominaram de lucrosficticios. Portanto, 0 que Duménile Lévy consideram a lenta recuperagdo da taxa de hucto na era do capitalismo global indica a consti- tuigio de uma rentabilidade esptiria proveniente do dominio da especulagio pa- rasitéria sob o comando do capital especulativo parasitério que opera no plano do mercado global, dominando as decisoes de toda atividade macroecondmica 4das unidades intranacionaise regionais, Portanto, a crise de hegemionia financeira expressou, no plano da aparéncia, a crise do capital especulativo parasitirio; e, no plano da esséncia, a efetividade da crise estrutural de valorizagio do valor que per- siste, desde a crise de 1973/1975". A crise estrutural do capital, em sua dimensio de crise do capital produtivo, criow um novo padréo de acumulagio de capital co- ‘mandado pelo capital financeiro, um movimento contratendencial -efetivamente espiirio ~ a queda da taxa média de lucro, 1 Acris estrutral de valrizagd do valor ou crise estrutural de valoizagdo produtiva de capital ~ em contrast com a valerzagio fictcia predominante no eapitalsmo neoliberal ~éa crise de produgiolrealizacto da mais-valia extealda com a exploragio da foca de trabalho. Ela origina se da tendéncia histérica de aumento da composigzo onginica do capital, que é a relagio entre trabalho morte (€) ou capital constante trabalho vivo (x) ou capital varivel,relago definida ‘em termes de valor. Eo que Marx expos no Livzo II de"O Capital” a0 compor a formula para ‘ocilculo da comporiio orginica do capital é cl. Marx conclu que o aumento da comporigia ‘orginica do capital (Q) conduz a0 decrescimente, a longo prazo, da taxa média de cro, Primeio, cle observa que taxa de lucto¢ caleulada como p= sl, Depois, divide ambos os tetmos por v, para encontrar ae fungdes da taxa del ai que p (axa de lucr) é fungi

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