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PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO


ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRATICA
REGISTRADO(A) SOB N°

ACÓRDÃO I miii mil mil um um um um um mi mi


*02980421*
Vistos, relatados e discutidos estes autos de
Apelação n° 992.09.067288-6, da Comarca de São Paulo,
em que é apelante TELECOMUNICAÇÕES DE SÃO PAULO S/A
TELESP sendo apelado IVANDETE ALMEIDA DOS SANTOS.

ACORDAM, em 36 a Câmara de Direito Privado do


Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte
decisão: "DERAM PROVIMENTO EM PARTE AO RECURSO. V.
U.", de conformidade com o voto do Relator, que
íntegra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos


Desembargadores ROMEU RICUPERO (Presidente), JAYME
QUEIROZ LOPES E ARANTES THEODORO.

São Paulo,13 de maio de 2010.

^z±/-r
ROMEU RICUPERO
PRESIDENTE E RELATOR
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal de Justiça do Eblado de São Paulo
Seção de Direito Privado

Apelação Cível c o m Revisão n° 9 9 2 . 0 9 . 0 6 7 2 8 8 - 6


Apelante: TELECOMUNICAÇÕES DE SÃO PAULO S/A
TELESP TELEFÔNICA
Apelado: IVANDETE ALMEIDA DOS SANTOS
Comarca: SÃO PAULO - 3 6 a VARA CÍVEL

VOTO N.° 1 3 . 7 3 5

EMENTA - Prestação de serviço Alegação cie cobrança


indevida Inexigibilidade de débito e indenização por danos
morais Procedência parcial Cabe à empresa de telefonia
apresentar a prova contrária à alegação que lhe é dirigida,
posto que só ela possui condição técnica para isso
Aplicação do disposto no art 6". inc VIII. do CDC e arl 62
da Resolução n" cVi da Anotei Ônus do qual não se
desincumbiu Dano moral não configurado na espécie, em
que não houve negativação. cobrança ou qualquer ato
vexatório Inexistência de lesão à dignidade humana
Recurso de apelação da ré provido em pai te. para excluir a
indenização pelo dano moral

RELATÓRIO.

Trata-se de apelação interposta por


Telecomunicações de São Paulo S/A - Telefônica (fls. 76/83) contra a r.
sentença de fls. 67/71, cujo relatório adoto, que julgou procedente a ação
ajuizada por Ivandete Almeida dos Santos, declarando inexistentes os débitos

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e inexigíveis as cobranças do serviço Speedy a partir do mês de novembro de
2007, e condenando a ré à devolução em dobro dos valores cobrados até a
concessão da antecipação de tutela - que resta confirmada - e ao pagamento
de indenização por danos morais, no valor de R$ 4.150,00, acrescida de
correção monetária e de juros de mora de 1% ao mês, desde a data da
sentença. A ré deverá, outrossim, rever o valor da conta referente ao período
de 02/02/08 a 17/02/08. Afastou o pedido de condenação à devolução dos
gastos com assistência técnica. Em razão da sucumbência na maior parte dos
pedidos, arcará a ré com o pagamento das custas, despesas processuais e
honorários advocatícios que fixou em 10% sobre o valor da condenação.

A apelante lembra que se trata de ação na qual


a apelada discute o cancelamento do serviço Speedy. Segundo a autora, tal
cancelamento teria sido solicitado por diversas vezes, sem atendimento. Por
isso, pleiteou a devolução dos valores pagos indevidamente e ainda a
condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais.

A recorrente afirma que só houve uma


solicitação de cancelamento, isso em 17/07/08. As outras solicitações
referem-se a alteração de serviço ou para comparecimento de técnico para
verificar o problema em sua linha telefônica. Portanto, o serviço foi
devidamente prestado, não devendo prosperar as alegações trazidas pela
apelada.

Impugnou a indenização por danos morais,


posto que não demonstrados. Alternativamente requer a redução do qiiantum
indenizatório.

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O recurso de apelação é tempestivo, foi
preparado (fls. 84/85), recebido (fl. 86) e respondido (fls. 89/93).

FUNDAMENTOS.

A autora propôs ação de nulidade de cobrança


cumulada com indenização por danos e pedido de tutela antecipada em face
da Telefônica - Telecomunicações de São Paulo S/A. Alegou que solicitou a
instalação do serviço "speedy" a aproximadamente dois anos. Ocorreu que,
após a instalação, a linha telefônica começou a funcionar de modo precário.
Por essa razão, solicitou a visita dos técnicos da empresa ré, porém o
problema não foi resolvido. Então, pediu por telefone o cancelamento do
serviço "speedy" em novembro de 2007 (prot. 84000875-52), repetindo a
solicitação em fevereiro e março do ano seguinte. Sem êxito o pedido,
continuou a cobrança do serviço "speedy" nas faturas, bem como de serviços
de reparos da linha, referente ao ano de 2008, que jamais foram feitos. Foram
registrados vários protocolos de reclamações junto à Telefônica.

Requereu a devolução dos valores pagos


indevidamente desde novembro de 2007 e dos valores cobrados pela
assistência técnica, que, aliás, não foi prestada, com a aplicação do artigo 42
da Lei 8.078/90; requereu também a indenização por danos morais no
montante de 30 (trinta) salários mínimos.

Foi deferida a antecipação da tutela para


determinar que a Telefônica se abstivesse de cobrar pelo serviço "speedy" não
mais desejado (fl. 20).
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Na contestação, a empresa ré aduziu, em suma,


que cancelou o serviço assim que solicitado, não havendo nenhum dano
material ou moral. Ademais, a autora não comprovou os alegados danos, haja
vista que sequer fora negativado seu nome. Alegou que em 17/07/08 foi
cancelado o "speedy", não existindo solicitação de cancelamento anterior. A
autora efetuou ligações solicitando outros serviços e fora constatado defeito
no seu equipamento. Salientou que disponibilizou seus serviços e resolveu
todas as solicitações na esfera administrativa. Impugnou a indenização por
danos morais, bem como a repetição do indébito, posto devidos e legais os
valores cobrados.

Em réplica, a autora salientou que a Telefônica


somente efetivou o cancelamento em 17/07/08, quando recebeu a carta de
citação, inclusive com a liminar deferida.

A ação foi julgada procedente, com


indenização por danos morais fixada em R$ 4.150,00.

A apelação merece prosperar, em parte.

De fato, a autora alega que solicitou o


cancelamento do serviço "speedy" em novembro de 2007, conforme
protocolo n° 84000875-34; no entanto, a Telefônica continuou emitindo
faturas com a cobrança dos serviços.

De outro lado, a Telefônica insiste que


cancelou o serviço "speedy" em 17/07/08, não existindo solicitação anterior
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de cancelamento.

Em tais casos, cabe à empresa de telefonia


apresentar a prova contrária às alegações que lhe são dirigidas, posto que só
ela possui condições técnicas para isso, o que não aconteceu neste caso. Cabe
aqui a inversão do ônus da prova (art. 6o, inc.Vlll, do Código de Defesa do
Consumidor).

Outrossim, cabe ressaltar ainda o disposto no


art. 62 da Resolução n° 85 da Anatel:

"O assinante tem direito de questionar os


débitos contra ele lançados pela Prestadora, não se
obrigando a pagamento dos valores que considere indevidos
Parágrafo único: O pagamento dos valores
questionados pelo Assinante somente poderá ser exigido pela
Prestadora quando comprovar a prestação dos serviços
objeto do questionamento ".

Portanto, deve ser mantido o disposto da r.


sentença quanto à declaração de inexistência de débitos referentes ao serviço
"speedy" a partir do mês de novembro de 2007, assim como a condenação da
ré à devolução em dobro dos valores cobrados até a concessão da antecipação
de tutela.

Não obstante, e ainda que incidente o disposto


no art. 14 do CDC, isto é, a responsabilização da concessionária
independentemente da verificação de culpa, não se vislumbra, no caso
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concreto, a existência de danos morais a serem indenizados.

O que há aqui é o pedido de cancelamento do


serviço "speedy" em novembro de 2007, que não foi atendido pela Telefônica
que continuou enviando fatura de cobrança. Não houve negativação em
cadastro de inadimplentes, nem cobrança judicial dessa suposta dívida, nem
qualquer ato de constrangimento que pudesse implicar em ofensa aos direitos
de personalidade da autora.

Sérgio Cavalieri Filho examina com acuidade a


configuração do dano moral, em lição irrepreensível:

"O que configura e o que não


configura o dano moral? Na falta de critérios objetivos, essa questão
vem-se tornando tormentosa na doutrina e na jurisprudência,
levando o julgador a situação de perplexidade. Ultrapassadas as
fases da irreparabilidade do dano moral e da sua inacumulabilidade
com o dano material, corremos, agora, o risco de ingressar na fase
de sua industrialização, onde o aborrecimento banal ou mera
sensibilidade são apresentados como dano moral, em busca de
indenizações milionárias.
Este é um dos domínios onde mais
necessárias se tornam as regras da boa prudência, do bom senso
prático, da justa medida das coisas, da criteriosa ponderação das
realidades da vida. Tenho entendido que, na solução dessa questão,
cumpre ao juiz seguir a trilha da lógica do razoável, em busca da
concepção ético-jurídica dominante na sociedade. Deve tomar por
paradigma o cidadão que se coloca a igual distância do homem frio,
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insensível, e o homem de extrema sensibilidade.
"A gravidade do dano - pondera
Antunes Varela - há de medir-se por um padrão objetivo (conquanto
a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias de cada
caso), e não à luz de fatores subjetivos (de uma sensibilidade
particularmente embotada ou especialmente requintada). Por outro
lado, a gravidade apreciar-se-á em função da tutela do direito: o
dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma
satisfação de ordem pecuniária ao lesado" (Das Obrigações em
Geral, 8J ed., Coimbra, Almedina, p. 617).
Dissemos linhas atrás que dano
moral, à luz da Constituição vigente, nada mais é do que agressão à
dignidade humana. Que conseqüências podem ser extraídas daí? A
primeira diz respeito à própria configuração do dano moral. Se dano
moral é agressão à dignidade humana, não basta para configurá-lo
qualquer contrariedade.
Nessa linha de princípio, só deve ser
reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou
humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no
comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições,
angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor,
aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão
fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da
normalidade do nosso dia-a-dia, no trabalho, no trânsito, entre os
amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e
duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do
indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o
dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenizações
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pelos mais triviais aborrecimentos.
Dor, vexame, sofrimento e
humilhação são conseqüência, e não causa. Assim como a febre é o
efeito de uma agressão orgânica, dor, vexame e sofrimento só
poderão ser considerados como dano moral quando tiverem por
causa uma agressão à dignidade de alguém'1 (Programa de
Responsabilidade Civil, 3U edição, São Paulo, Malheiros Editores,
2002, n.° 19.4, pp. 88-89).

Logo em seguida, no item 19.4.1, alerta que:

"Outra conclusão que se tira desse


novo enfoque constitucional é a de que mero inadimplemento
contratual, mora ou prejuízo econômico não configuram, por si sós,
dano moral, porque não agridem a dignidade humana. Os
aborrecimentos deles decorrentes ficam subsumidos pelo dano
material, salvo se os efeitos do inadimplemento contratual, por sua
natureza ou gravidade, exorbitarem o aborrecimento normalmente
decorrente de uma perda patrimonial e também repercutirem na
esfera da dignidade da vítima, quando, então, configurarão o dano
morar' (autor e obra citados, p. 89).

O monografista ressalta que "o importante,


destarte, para a configuração do dano moral não é o direito em si mesmo, mas
sim a repercussão que ele possa ter", isto é, "uma agressão pode acarretar
lesão em bem patrimonial e personalíssimo, gerando direito material e moral.
Não é preciso para a configuração deste último que a agressão tenha
repercussão externa, sendo apenas indispensável que ela atinja o sentimento
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íntimo e pessoal de dignidade da vítima. A eventual repercussão apenas
ensejará o seu agravamento" (autor e obra citados, p. 90).

Aqui, reitera-se que a emissão de faturas, com


valores aparentemente indevidos, não afetou a esfera da dignidade humana da
autora e, por conseguinte, o dano moral não é devido.

Nessa direção, a jurisprudência do STJ sobre o

tema:

•RESPONSABILIDADE CIVIL
INDENIZAÇÃO. DANOS MORA/S. INTERRUPÇÃO
SERVIÇO TELEFÔNICO. MERO DISSABOR.
O mero dissabor não pode ser alçado ao
patamar do dano moral, mas somente aquela agressão que
exacerba a naturalidade dos fatos da vida. causando
fundadas aflições ou angústias no espírito de quem ela se
dirige. " (REsp. n° 606.382/MS, Quarta Turma, Rei. Ministro
CÉSAR ASFOR ROCHA, j . 04/03/2004).

'DANO MORAL. INTERRUPÇÃO DE


SERVIÇO TELEFÔNICO. MERO DISSABOR.
Mero contrariedade pelo bloqueio de linha
telefônica não causa dano moral indenizável". (REsp. n°
633.525/MA, Terceira Turma, Rei. Ministro HUMBERTO
GOMES DE BARROS, j . 15/12/2005).

A ré, ora apelante, deve arcar com a


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10
sucumbência.

Destarte, pelo meu voto, dou


p a r c i a l p r o v i m e n t o ao r e c u r s o .

^N

LôSEÈS^SICy^ERO/
Relator

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