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No processo de compreensão textual, o leitor de um dado texto necessita recorrer a

conhecimentos anteriores para atribuir-lhe sentido. Assim o leitor necessita utilizar-se


de conhecimentos prévios acumulados em interação com conhecimentos de nível
lingüístico, textual e de mundo para que o sentido seja constituído.
Ângela Kleiman (1989. p.15.27) em “O conhecimento prévio na leitura” destaca
a importância dos conhecimentos preliminares na compreensão textual, entendendo
que a leitura “é considerada um processo interativo”. Assim, discute a importância
desses conhecimentos que se manifestam no percurso da leitura, apresentando
inicialmente o conhecimento lingüístico.
O conhecimento lingüístico “é aquele conhecimento implícito” (KLEIMAN 1989.
p13) relativo aos mecanismos de funcionamento da língua. Abrange os conhecimentos
de cunho gramatical, lexical e semântico.
Compreende-se que se o leitor não tiver conhecimentos do arranjo lingüístico
presentes em um texto não conseguirá fazer inferências entre seus conhecimentos e
textos que lhe são expostos.
Para elucidar a necessidade desse tipo de conhecimento a autora cita como
exemplo um trecho de um texto (The analysis of myths), cujo discurso encontra-se em
língua inglesa.
Conforme afirma a autora, “o conhecimento lingüístico do leitor fica
comprometido”, logo que o trecho se encontra distanciado do leitor devido ser
manifesto em uma outra língua. Fará sentido esse tipo de texto se o leitor tiver
conhecimentos prévios dessa estrutura lingüística dominando-a.
A autora valendo-se do mesmo exemplo substitui o léxico do inglês para o
português, indicando que embora esteja escrito em língua materna, muitos dos termos
expressos no texto podem dificultar a compreensão, pois “trazem problemas de ordem
lingüística a um texto” (KLEIMAN 1989. p p.14) à vista que podem não ser
compreendidos certos usos/ conceitos do léxico.
O conhecimento lingüístico se faz fundamental no “processamento do texto”
(KLEIMAN 1989. p14) visto que possibilita que sejam agrupadas e classificadas de
forma “significativa” (KLEIMAN 1989. p15) as unidades distintas da língua (formas
mínimas) em textos.
Kleiman elucida o processamento textual procedendo em um primeiro
momento de um excerto de um artigo de Perini (KLEIMAN 1989 apud PERINI, M. A.
“Tópicos discursivos e a legibilidade dos textos”. P. 15) que aborda os agrupamentos
dos tempos verbais. Em seguida, a autora prossegue com outro exemplo, retirado de
um exame de vestibular, que discute a questão de uso de um adjetivo (“inexistente”),
que apresenta certa dubiedade quanto a seu uso. Assim, são necessários que sejam
mobilizados outros tipos de conhecimentos para que o sentido seja conferido a um
texto.
Continuando com a sua exposição, a autora aborda a questão do
conhecimento textual, ou “conjunto de noções e conceitos sobre o texto” (KLEIMAN
1989. p.16).
O conhecimento textual se constitui de tipos de textos (narração, descrição,
injunção, exposição, etc.) e de formas discursivas referentes às estruturas lingüísticas
amparadas em conhecimentos extralingüísticos de mundo para a sua elaboração.
Para explicar com maior aprofundamento a noção de conhecimento textual, a autora
parte de um artigo retirado do jornal “O Estado de São Paulo” referente ao lançamento
do livro de Ruth Rocha “O rei que não sabia de nada”, explicitando e contrapondo as
estruturas textual-discursivas (narração, exposição e descrição) presentes no texto.
Principiando do eixo narrativo presente no texto, observa-se que a narrativa em
sua essência é uma estrutura textual marcada por uma situação (enredo) que imbrica
em si diversos elementos para a sua constituição.Possui uma sequenciação
cronológica (ligada à noção de temporalidade – presente, passado e futuro), estrutura-
se em torno de personagens, “agentes da ação” (KLEIMAN 1989 p 17) que se
encontram ambientados em um meio físico “pano de fundo” (KLEIMAN 1989 p 17) no
qual os fatos se constituem.
Consoante a narrativa, em seguida a autora expõe a estrutura expositiva, cujo
foco distância do caráter narrativo que se volta para uma ordenação temporal e
espacial, centra a sua ênfase em temáticas, ou seja, “nas idéias e não nas ações”
(KLEIMAN 1989 p 17) em uma tese, ideia central.
E por fim, a autora foca-se na estrutura textual descritiva, que “se opõe
geralmente à narrativa” (KLEIMAN 1989 p 18), visto que a descrição tem por fim
produzir uma imagem significativa ao seu leitor, e para concretizá-lo utiliza-se de
qualificadores. A tipologia descritiva frente a outras tipologias não é uma forma
independente, ela faz parte do texto narrativo, (embora com algumas exceções
quando estiver presente em bulas e em manuais técnicos), na medida em que um
“objeto deva ser particularizado ou qualificado” (KLEIMAN 1989 p 19).É destacável a
importância dos conhecimentos lingüísticos e textuais para a compreensão das
práticas de leitura. Todavia, esses conhecimentos em muitas situações não suprem as
necessidades, devendo o leitor buscar complementação em conhecimentos adquiridos
anteriormente em suas práticas de interação. Deste modo, a compreensão só se
efetiva através do conhecimento de mundo ou conhecimento enciclopédico (definindo-
se por acontecimentos/conhecimentos passados e atuais que se manifestam na
sociedade e no individuo – contexto sociosubjetivo).
Para tornar compreensível a aplicação desse conhecimento quando inserido
em práticas de leitura, a autora vale-se de um texto (“Effect of comprehension on
retention of prose”. KLEIMAN 1989 p.21) que trata a respeito da descoberta da
América por Colombo, que cujas ideias se manifestam distorcidas frente a um leitor
que não consegue estabelecer significados em face do que lhe é exposto. É
necessário, pois que faça referenciação ao contexto extralinguístico para que possa
recobrar os sentidos manifestos pelo texto.
Kleiman prosseguindo, expõe que os conhecimentos de mundo se organizam
de duas formas definindo-se por conhecimentos de cunho estrutural e conhecimentos
parciais.
Primeiramente os conhecimentos estruturais, (“ordenados” KLEIMAN 1989
p.22) são relativos a instruções que anteriormente são adquiridas, e que se encontram
imersas em nosso dia a dia (“adquiridas informalmente” KLEIMAN 1989 p.22) através
da interação. São exemplos “ir ao médico, comer em um restaurante, assistir uma
aula” (KLEIMAN 1989 p22)
E, por conseguinte os conhecimentos parciais “esquemas que possuímos na
memória, relativo a assuntos, situações e eventos típicos de nossa cultura” (KLEIMAN
1989 p23), delimita expectativas sobre a ordem dos acontecimentos, visto que é algo
típico de uma determinada situação. A autora vale-se de um exemplo de um trecho de
uma fábula relativo à “caçada de veados”, fazendo inferências a elementos presentes
nessa relação, como cães e caçadores. (conhecimento implícito).
Visto a necessidade dos conhecimentos prévios para a compreensão textual, é
necessário que no momento de leitura, o leitor deva recorrer a esses tipos de
conhecimentos e também a pistas que são deixadas ao longo deste para que seja lhe
atribuído um significado. Não basta apenas ler o texto, mas compreendê-lo e utilizar-
se desses conhecimentos para a vida efetiva.

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