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Etiologia

A leptospirose é uma doença febril aguda causada pela infecção de bactérias patogênicas do
gênero Leptospira, mais comumente os sorotipos da espécie Leptospira interrogans. A
Leptospira interrogans é uma bactéria do tipo espiroqueta, de forma helicoidal, gram-negativa
aeróbica obrigatória e possui flagelos periplásmicos (específicos das bactérias do tipo
espiroquetas). A ocorrência da leptospirose é favorecida pelas condições ambientais das
regiões de clima tropical e subtropical, onde a elevada temperatura e os períodos do ano com
altos índices de chuvas e inundações favorecem o aparecimento de surtos.

Patogênese e Zoonose

Vários animais (como suínos, equinos, bovinos, cães e etc) podem atuar como o reservatório
da doença sendo que o principal reservatório no meio urbano é o roedor (principalmente ratos
de esgoto e ratazanas). A bactéria após infectar o animal vai se alojar em seus rins do animal,
sendo eliminada pela urina no meio ambiente, contaminando água, solo e alimentos.

O homem é o hospedeiro terminal da doença, sendo infectado ao entrar em contato com a


urina dos animais infectados de modo direto, ou entrar em contato indireto com o ambiente,
como solos e águas contaminadas. A imunidade adquirida é sorotipo-específica, ou seja, um
mesmo indivíduo pode desenvolver anticorpos para um sorotipo específico da espécie da
leptospira, mas como há outros sorotipos diferentes, este mesmo indivíduo que teoricamente
deveria estar imune a doença, pode acabar se infectando novamente.

A leptospira penetra no organismo através das mucosas e da pele íntegra ou com pequenos
ferimentos e, após o período de incubação (que varia de um a vinte dias, sendo em média de
sete a quatorze dias), a leptospira alcança o sangue e se multiplica muito ativamente nele e em
vários órgãos, ingressando nas células principalmente no fígado, baço e rims por ter enzimas
que permeiam as membranas celulares. A leptospiremia dura em geral 2 a 3 dias, gerando
fase febril discreta e já no quarto dia haverá leptospiras nos rins. Durante essa fase ocorre
destruição de hemácias com o estabelecimento de discreta anemia, além de provocar
insuficiência renal e hepática.

A doença pode se manifestar desde uma forma assintomática, leve com evolução benigna até
mesmo alcançar uma forma mais grave para o paciente. Icterícia, insuficiência renal e
hemorragias são quadros indicativos da manifestação grave da doença, esta forma é
popularmente conhecida como Síndrome de Weil. A Síndrome da Hemorragia Pulmonar é um
caso emergente e que vem sendo considerado como outra manifestação grave da doença,
chegando a ser a manifestação mais letal por apresentar até 50% de taxa de letalidade se
comparado aos 10% da Síndrome de Weil.
Leptospirose Animal

Apesar da atenção com relação a leptospirose ser bastante voltada para o seu aspecto de
Zoonose por afetar a população de seres humanos, ela também irá afetar diversas espécies de
animais, como bovinos, suínos, cães, pequenos ruminantes como cabras e raramente, mas
também possível, gatos. As infecções crônicas nos animais geralmente são mais comuns do que
aguda ou subaguda e a maioria das infecções é assintomática. A forma aguda é caracterizada
por septicemia, hepatite, nefrite e hemoglobinúria. Nas formas subagudas, os sinais clínicos
são menos intensos e os abortos são freqüentes. Nas formas crônicas, o quadro clínico é
dominado por abortos, nefrite intersticial e em algumas espécies de infertilidade e uveíte.

Nos cães, a leptospirose pode se manifestar de até 3 formas clínicas: septicemia, forma renal e
forma hepática. Além do cão, estas formas podem ocorrer também em bovinos e suínos (esses
3 animais são os menos sensíveis a doença, e portanto são espécies que acabam tendo mais
manifestações clínicas se comparada as outras como eqüinos, caprinos e gatos, onde a doença
costuma se manifestar de forma assintomática e são menos freqüentes do que nos bovinos,
cães e suínos), sendo que a forma septicêmica está mais restrita aos animais jovens e o aborto
está mais relacionado com a leptospirose nos animais adultos.

Nos animais, assim como nos humanos a leptospirose é provocada geralmente pela espécie
Leptospira interrogan (além de ter outras espécies patogênicas com Leptospira borgpetersenii
e Leptospira kirschnerii), no entanto é importante salientar que a L. interrogan possui muitos
sorotipos diferentes (como L. interrogan Icterohaemorrhagiae, L. interrogan Canicola, L.
interrogan Pomona e etc) e que os animais podem ser infectados por diferentes sorotipos da
leptospira, por exemplo: um bovino pode contrair leptospirose ao ser infectado tanto pela L.
interrogan Icterohaemorrhagiae como pela L. interrogan Canicol. O fator determinante para
qual sorotipo infectar o bovino será o hospedeiro primário, isto é, o animal que vai atuar como
reservatório para aquele determinado sorotipo da leptospira. Nesse caso, o bovino pode
contrair a doença ao entrar em contato com o hospedeiro primário da L. interrogan
Icterohaemorrhagiae que é o roedor, bem como pode contrair a doença ao entrar em contato
com o hospedeiro primário da L. interrogan Canicol, que é o cão. Esse foi apenas um exemplo,
mas no geral essa idéia é válida para as demais espécies de animais que vão contrair a doença.

Nos caninos, há quatro síndromes reconhecidas incluindo:


 Síndrome hemorrágica aguda,
 Síndrome ictérica,
 Síndrome subaguda ou urêmica
 Forma inaparente.

As primeiras duas formas são causadas primariamente, pela Leptospira Icterohaemorrhagiae


enquanto que as duas últimas são causadas pela L. Canicola. Os estágios iniciais da doença
nestas formas são caracterizadas por: depressão, anorexia, vômitos e diarréia ou constipação.
Os sinais clínicos específicos de cada síndrome aparecem pouco depois.
Nos Bovinos, a espécie de L. borgpetersenii sorotipo Hardjobovis e a L. interrogans sorotipo
Hardjoprajitno estão associados à duas condições respectivamente:

 Síndrome reprodutiva: caracterizada por abortos e infertilidade da vaca por


mortalidade embrionária;

 Síndrome da Queda Brusca de Produção de leite: caracterizada pela flacidez do úbere,


leite com coloração de colostro, febre e anorexia. Além, claro, de ser evidente a queda
da produção de leite por parte da matriz

Nos suínos, as leptospiroses se expressam sobre diversas formas, incluindo formas


inaparentes; formas subclínicas (nefrite intersticial crônica que conduz a um quadro de
insuficiência renal); formas moderadas (febre, anorexia, baixo desenvolvimento); formas
severas (febre, icterícia, hemorragias e mortes). Os sinais clínicos mais comuns são consistentes
com as alterações reprodutivas (infertilidade, abortamentos tardios, contaminação dos leitões
por via transplacentária). Os sorotipos principais incluem: Pomona, Kennewicki (Estados
Unidos), Tarassovi, Bratislava, Muenchen, Icterohaemorrhagiae e, em menor grau, o sorotipo
Sejroe e Hardjo.

Nos equinos, a doença é caracterizada por febre, depressão, anorexia e icterícia. Oftalmia
periódica ou abortos podem ocorrer após o pique febril. A leptospirose crônica é normalmente
detectada em eqüinos com uveíte recorrente. Os principais sorotipos são: Pomona,
Icterohaemorrhagiae, Grippotyphosa, Autumnalis, Canicola, Sejroe e Bratislava (o cavalo seria
um reservatório deste sorovar).

Nos ovinos, a infecção assintomática é mais frequente. Nos casos agudos, geralmente raros, os
animais apresentam anorexia, abatimento, hemoglobinúria, icterícia, anemia e mortalidade
alta (cordeiros). Na forma crônica, o quadro de nefrite é observado, mas os sinais clínicos são
alterações reprodutivas, incluindo mortalidade e, sobretudo abortamentos. Os principais
sorotipos associados com a infecção são: Grippotyphosa, Sejroe, Icterohaemorrhagiae e
Tarassovi. Nas cabras, a infecção conduz a icterícia, hemoglobinúria, infertilidade,
abortamentos e a uma taxa de mortalidade alta nos animais jovens. Os sorotipos mais
freqüentes são: Grippotyphosa, Pomona, Icterohaemorrhagiae e Canicola.

Nos gatos, a leptospirose é menos freqüente ou não diagnosticada. Os sorotipos identificados


são: Icterohaemorrhagiae, Pomona, Grippotyphosa, Ballum e Canicola. Os sinais clínicos são
comparáveis aos observados nos cães.

Patologia

Em achados de necropsia é possível ver que o organismo foi afetado por anemia, as vezes
icterícia, petéquias e sufusões sub-serosas e sub-mucosas, esplenomegalia, aumento de
volume hepático e áreas amareladas irregulares; rins congestos, aumentados de volume com
hemorragias corticais em casos mais recentes, os linfonodos costumam estar aumentados e
edematosos.
Exames Diagnósticos

Para começar, exames iniciais como hemograma, bioquímica do sangue (uréia, creatinina, FAL,
bilirrubinas, TGO, TGP, CPK e eletrólitos), radiografia de tórax e eletrocardiograma devem ser
solicitados para avaliar a gravidade do caso e ajudar na suspeita da leptospirose. Nisso, esses
exames podem apresentar alterações laboratoriais comuns relacionado a doença, tais como:

 Anemia normocrômica, leucocitose (com neutrofilia e desvio para a esquerda) e


trombopenia
 Elevação das bilirrubinas
 Hipertransaminasemia não muito expressiva
 Potássio sérico normal ou abaixo do normal, mesmo na vigência de insuficiência renal
aguda
 Uréia e creatinina elevadas
 Radiografia de tórax mostrando infiltrado intersticial difuso nas formas mais graves
 Gasometria arterial mostrando acidose metabólica e hipoxemia
 Arritmias variadas após a terceira semana da doença
 Baixa densidade urinária, proteinúria, hematíria microscópica e leucocitúria são
frequentes no exame de urina

Realizado os exames inicias, é necessário utilizar métodos de diagnóstico para a doença. No


caso da leptospirose, os métodos indicados são os exames de sorologias. No entanto, não há
uma única técnica recomendada para uso em todas as situações. O uso de testes combinados
permite uma maior sensibilidade e especificidade no diagnóstico (por exemplo, vamos ver que
o MAT pode ser realizado em conjunto com a técnica de microscopia em campo escuro para a
visualização da leptospira).

É importante saber que métodos diretos como por exemplo o PCR, a Microscopia em Campo
Escuro e Imunofluorescência são úteis na identificação prévia da bactéria no paciente e irá
confirmar suspeitas com relação a doença leptospirose. No entanto os melhores exames a se
fazer no caso dessa doença são, inevitavelmente, os testes sorológicos como ELISA e MAT para
fechar o diagnóstico. Vamos analisar inicialmente os exames diretos e em seguida os testes
sorológicos.

Antes disso, é importante saber que a cura da leptospirose aguda coincide com a suspensão da
bacteremia e o aparecimento de anticorpos circulantes, geralmente na segunda semana pós-
infecção. Os anticorpos protetores são do tipo IgM e IgG, que são dirigidos, principalmente
para os antígenos da estrutura externa do patógeno.
Exames diretos (para detecção de leptospiras):

1. Microscopia de Campo Escuro

A microscopia de campo escuro é utilizada como uma forma preliminar de identificação de


leptospiras na urina. A vantagem é que o teste pode ser realizado de forma rápida no entanto
o teste tem uma baixa especifidade e sensibilidade, isto é, é difícil visualizar as leptospiras no
microscópio devido a presença de outras substâncias no fluído aonde as bactérias se
encontram e também para que as leptospiras apareçam na microscopia é necessário estarem
em uma alta concentração devido a baixa sensibilidade dessa microscopia. Esse exame não
deve ser considerado definitivo para o diagnóstico pois a quantidade de leptospiras presente
na urina pode variar bastante, e na fase aguda da doença é possível que as bactérias nem
mesmo sejam observáveis na urina. É um bom exame preliminar, portanto deve ser
acompanhado de outros exames e testes para identificação do patógeno, unido as informações
obtidas pelos exames iniciais e tudo mais.

2. Imunofluorescência

Para realizar a imunofluorescência para detectar leptospiras, é preciso o tecido, sangue ou até
mesmo a urina do paciente. A utilidade desse teste está aumentando pois ele é rápido, tem
boa sensibilidade e pode ser aplicado em amostras congeladas. Antes de realizar esse teste, é
necessário realizar um teste sorológico do animal para identificar qual o sorotipo da leptospira
que está no organismo do paciente para que o conjugado fluorescente reaja com o tipo de
sorotipo da bactéria e assim possa ser visível no microscópio.

3. Detecção de DNA – PCR


O teste de ampliamento do DNA, mais conhecido como PCR, também pode ser utilizado para
detectar a presença de leptospiras no organismo do paciente. Utiliza-se tecidos e fluidos
corporais para realizar a amplificação do DNA e assim poder detectar o DNA dessas bactérias
na amostra usada. O teste de PCR tem sido utilizado para o diagnóstico da leptospirose em
animais. Em geral, o PCR da urina é mais útil do que dos tecidos. O processamento de amostras
(tecidos) é mais difícil, pois frequentemente, contem inibidores que podem causar resultados
falsos positivos.
A maioria dos testes PCR feitos são capazes de identificar a presença da leptospira na amostra,
porém esses testes não conseguem determinar qual sorotipo a bactéria possui. Apesar disso, O
PCR pode ser uma técnica determinante no diagnóstico da leptospirose, devido a sua alta
especificidade em detectar o DNA alvo. O ponto negativo é que ela é uma técnica muito
complexa, e custa caro. Além de exigir profissionais extremamente bem capacitados para
realização do exame.

Métodos Sorológicos
Como foi dito, os métodos sorológicos são essenciais e são considerados os melhores métodos
de diagnóstico para a leptospirose. A sorologia é barata, razoavelmente sensível e amplamente
aplicada. Os testes utilizados geralmente são o ELISA e Aglutinação Microscópica (MAT):

MAT - Teste de Aglutinação Microscópica (Soro sem hemólise)


Muito utilizado no mundo todo, o MAT é um teste sorológico que vai utilizar como base a
identificação por microscopia em campo escuro da aglutinação do soro do paciente com os
antígenos da leptospira, e para ser realizado é preciso a mistura, em diluições apropriadas, de
soro e leptospiras vivas. Essa técnica detecta tanto anticorpos da classe IgM quanto IgG, e é
altamente específica e sensível porque os antígenos de superfície que reagem durante a
aglutinação não são compartilhados com outros microorganismos. Deve-se analisar pelo
menos duas amostras de soro do paciente, sendo a primeira na fase aguda e a segunda após
10 a 15 dias da coleta da primeira amostra. Os sorovares (o sorotipo da bactéria) utilizados
nesse teste são cultivados pelo próprio laboratório e ao realizar o teste, são utilizados bactérias
vivas com vários sorovares para aumentar a taxa de sucesso do teste.

Após colheita da mistura, é feita a incubação e depois a leitura das lâminas criadas para
visualizar as reações entre o sorovar e os anticorpos do soro do paciente.

Uma reação MAT é considerada positiva quando menos de 50% das leptospiras estão livres,
pois as demais leptospiras ficaram aglutinadas (grudadas) com os anticorpos presentes no soro
do paciente demonstrando que o paciente tem anticorpos reagindo aos antígenos da
leptospira. Além disso, o teste irá revelar também qual é o sorotipo da bactéria que está
presente no corpo do paciente, pois presume-se que o sorovar que sofreu mais aglutinação
com o anticorpo do paciente é o que está infectando o organismo.

ELISA – Teste Imunoenzimático (Soro sem hemólise)


O teste ELISA é um teste que também é muito utilizado, e no caso da leptospirose se torna o
método de diagnóstico preferido para se utilizar. Ele foi desenvolvido utilizando um número de
diferentes preparações antigênicas e protocolos de ensaios. Assim como o MAT, o ELISA é
altamente específico e possui grande sensibilidade na detecção antigênica. No caso da doença
leptospirose, o teste de ELISA será para detecção do anticorpo IgM, que se torna positivo a
partir da segunda semana de doença. Recomenda-se a realização de pelo menos dois exames,
um no início e outro a partir da quarta semana de doença.

O teste basicamente funciona da seguinte forma: um antígeno aderido a um suporte sólido


(placa de ELISA) é preparado, a seguir coloca-se sobre o antígeno (no caso, o antígeno da
leptsopira) os soros em teste, na busca de anticorpos contra o antígeno. Se houver anticorpos
no soro em teste ocorrerá a formação da ligação antígeno-anticorpo, que posteriormente é
detectada pela adição de um segundo anticorpo dirigido contra imunoglobulinas da espécie
onde se busca detectar os anticorpos a qual é ligada à peroxidase. Este anticorpo anti-IgG,
ligado à enzima denomina-se conjugado. Ao adicionar-se o substrato apropriado para a enzima
o local onde ocorreu a reação antígeno-anticorpo apresentará uma coloração.

Ao visualizar que a amostra apresentou coloração, indicará que houve reação antígeno x
anticorpo, fazendo concluir que o resultado foi positivo na busca do antígeno (nesse caso,
antígeno da leptospira)

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