Você está na página 1de 146

1

É importante dizer que a Introdução ao Estudo do Direito propicia


ao leigo uma visão global de todo o conteúdo existente na área do
Direito, e tal visão certamente nunca poderia ser obtida através do estudo
isolado de certas disciplinas.
Os conceitos específicos a cada ramo do Direito não são objeto da
disciplina em questão, restando clara a certeza de que apenas conceitos
comuns é que serão estudados. Esses conceitos são universais,
institucionais, e, independente do ramo a que se referirem, serão os
mesmos. Exemplos desse tipo de conceito seriam os conceitos de lei,
princípios, relação jurídica, fato ou negócio jurídico, dentre outros.
A técnica jurídica, ou seja, a prática aplicada ao Direito, em linhas
genéricas, também figura como objeto da disciplina em questão.
Dessa forma, torna-se evidente os principais objetos da Introdução
ao Estudo do Direito, que conta com a amplitude de conceitos pertinentes
à área, visão global do grande sistema existente dentro do Direito e
noções genéricas da prática jurídica.
Além das várias funções citadas para essa disciplina, a Introdução
ao Estudo do Direito propicia uma adaptação do leigo ao mundo jurídico,
de forma a conciliar os conhecimentos por ele já sabidos, com os outros
que acaba de se deparar.
DIREITO EMPRESARIAL Importante papel também reside na simplificação de conceitos e
situações inusitadas, que poderiam trazer certas dificuldades à
compreensão e formação de uma identidade e consciência jurídica.
As bases de um raciocínio jurídico são construídas nesse estágio.
Gilberto Augusto Chmulek Outros sistemas gerais do Direito
Advogado Há outros ramos, que embora não atuem exatamente como a
Especialista em Meio Ambiente e Desenvolvimento Introdução ao Estudo do Direito, sistematizando o Direito e organizando
Sustentável conceitos genéricos, comuns, de maneira introdutória, também se
propõem a analisar alguns aspectos gerais do Direito.
Mas é importante salientar que tais ramos dependem das noções
gerais trazidas pela Introdução ao Estudo do Direito.

O Direito e a Sociedade
O ser humano, por sua natureza, possui forças instintivas que
2017 atuam sobre ele, forças essas que influenciam na construção de seu
mundo cultural.

Direito
2

Assim, para viver em sociedade, o homem deve passar por um liberdade dos indivíduos. Há outras manifestações sociais que também
processo de adaptação, que deve se dar tanto na esfera interna quanto auxiliam o Direito nessa missão, quais sejam: a religião, a moral, a ética
na externa. e as regras de trato social.
Diz-se interna quanto for relativa ao corpo, sem a interposição da O "Estado de Natureza"
vontade, como o funcionamento dos órgãos diante de diferentes Naturalmente o homem vive em sociedade e é lá que ele encontra
situações em que deva se adaptar. as condições propícias ao seu completo desenvolvimento.
Já na esfera externa, a relação é do homem com o espaço exterior. Essa força natural é denominada instinto e que faz com que o
O homem tem inúmeras necessidades, que são satisfeitas pela natureza. homem se relacione com seu semelhante, e viva em comunidade.
Ele adapta e transforma o mundo a sua volta, e na carência de recursos, O Direito influenciando nas formas de interação social
constrói, cria e transforma a natureza para satisfação de determinada Os seres humanos podem se interagir de várias formas. Entende-
necessidade. se por formas de interação as diversas maneiras pelas quais os homens
Essas adaptações repercutem na formação da cultura de um convivem.
determinado local e influenciam a vida em sociedade. O homem, assim, Um homem influencia um grupo social e esse, por sua vez,
irá conviver e participar da vida em sociedade. influencia o homem, convivendo numa mútua influência.
Mas para que essa convivência seja a mais harmônica deve haver As várias formas de interação podem ser cooperação, competição
normas e regras a serem seguidas. e conflito.
O Direito e o homem se influenciam mutuamente. O Direito deve Na cooperação as pessoas estão envolvidas pelos mesmos
estar focado e adaptado ao meio para o qual foi produzido, obedecendo objetivos e valores, e, a partir desse senso comum, reúnem e
os valores que a sociedade elege como fundamentais, e o homem, por concentram seus esforços para a concretização de um determinado fim.
sua vez, deve obedecer as normas criadas. Já, na competição, os objetivos são individuais, devendo ser
O Direito Natural, ao contrário disso, possui como leis fundamentais obtidos em detrimento da parte adversária, havendo, portanto, uma
as leis advindas da natureza e do conceito da expressão justiça. Dessa disputa.
forma, o Direito Natural não se originou de uma criação humana. O conflito, por sua vez, se dá quando as partes não chegam a um
E por ser, inclusive, anterior ao próprio homem, não pode ser denominador comum, existindo um impasse. As partes, então, em posse
classificado como processo de adaptação social. de interesses contrários, recorrem à luta (moral ou física) ou buscam o
Mesmo diante dessa aparente contradição, a criação do Direito amparo judicial para pacificar o conflito.
deve estar baseada, também, nas regras do Direito Natural, pois seus Pode-se dizer que o Direito ao impor condutas e limitar a liberdade
princípios de respeito à vida, à liberdade, dentre vários outros, devem do indivíduo em prol de valores socialmente eleitos, torna possível a
estar contidos em qualquer Ordenamento Jurídico. existência das formas de integração (cooperação e competição),
O Direito, por ser fruto da elaboração humana, sofre também fornecendo regras e normas que trazem o devido equilíbrio nas relações
influencia do tempo e do local. sociais.
Por isso, ele deve estar sempre aberto às mudanças que ocorrem Diante do conflito, o Direito poderá atuar de duas formas:
durante as diferentes épocas, e assim, deverá estar sempre atualizado. - preventivamente: definindo de forma clara e precisa a titularidade
Após ter apontado alguns fatores de influencia para o Direito, é dos direitos;
importante destacar a real função da ciência jurídica: serve como - simultaneamente (no momento do conflito): apresentando
instrumento para gerar a paz e harmonia nas diversas relações sociais. soluções de acordo com a especificidade de cada caso, aplicando
Então, para que o Direito cumpra a sua função é necessária a penalidades e restaurando as partes no estado que se encontravam
imposição de determinados comportamentos e posturas, que limitam a anteriormente.
3

A dependência: Direito X Sociedade indivíduo é inibido a obedecer por receio às penalidades que podem ser
O Direito existe em função de uma determinada sociedade, para a sofridas.
qual foi criado, e está diretamente voltado. Ele somente tem existência Contudo, deve-se ter em mente que o Direito existe e foi criado
dentro de uma sociedade.atores sociais influenciam o Direito; são eles os para um determinado fim: harmonizar a coexistência dos indivíduos que
costumes, tradições e a cultura de um povo. convivem em uma mesma sociedade, e por isso esse caráter imperativo
Há também fatores externos, como o Direito Natural, que também se faz tão importante.
exercem influência sobre a ciência jurídica. Mas há limites à atuação do Direito, pois seu papel reside tão
Na hipótese de fator social ser contrário a um princípio de Direito somente em proporcionar ao indivíduo segurança, através dos princípios
Natural, a função do Direito será corrigir a imperfeição. de justiça; e apenas por isso é que se justifica a regulamentação de
As normas do Direito, na maior parte dos países são positivadas, determinadas atividades e restrições à liberdade.
ou seja, escritas e organizadas em Códigos. O Direito não pode ter domínio absoluto sob pena do indivíduo
Há países, porém, em que essas normas não são positivadas, perder sua personalidade.
ficando estabelecidas pelos costumes. A influência desses outros sistemas de controle social.
A criação das leis e do Ordenamento Jurídico é feita por um órgão Primeiramente é importante dizer que tanto as normas éticas
específico, denominado Poder Legislativo. quanto as normas técnicas auxiliam e influenciam o Direito.
Esse órgão terá, então, a missão de criar o Direto. Nessa tarefa, o Dessa forma, é importante distinguir as normas éticas e normas
Poder Legislativo deverá estar atento aos diversos fatores, dentre eles, a técnicas.
expectativa popular, as experiências já existentes e as mudanças nos As normas éticas dizem respeito à orientação dos comportamentos
contextos sociais. pela religião, moral, costumes e regras de trato social, já as normas
O legislador se preocupar com tudo isso, pois o Direito deve ser técnicas indicam os meios (como fazer, desempenhar) determinadas
atual, contemporâneo, não alheio às expectativas de sua época, sob atividades humanas para obtenção de um objetivo específico.
pena de se tornar inútil para a função que irá desempenhar dentro da Em outras palavras, as normas técnicas auxiliam nos
sociedade. procedimentos, indicando os passos e caminhos para se chegar em um
Diferentemente do que se esperava há tempos, o Direito não determinado fim.
deverá apenas garantir a vida, liberdade, propriedade e segurança. O Um exemplo é a importância da técnica jurídica para a elaboração
papel do Direito, hoje, é assegurar o bem estar coletivo, fornecendo, de uma lei. Através do processo legislativo, o legislador coloca dentro de
também, justiça, bem estar e progresso aos indivíduos. uma lei, princípios fundamentais de Direito.
O legislador, no exercício de sua função, deverá verificar os Formas de controle social
contextos históricos, naturais e científicos, elaborando uma lei que Primeiramente é importante estabelecer os pontos de semelhança
possibilite os direitos necessários a todas as pessoas. entre Direito e religião, para entender de que forma a religião influencia o
Formas de controle social Direito.
Não é só o Direito que funciona como forma de controle social. A religião, que pode ser definida como conjunto de crenças em uma
Outras diversas modalidades de manifestação social se prestam a essa determinada divindade ou força sobrenatural. É uma criação humana que
função, como a religião, as regras de trato social e os costumes. Essas busca explicações para o mundo e para os vários questionamentos
se dão em forma de descrição de condutas, sugestões e conselhos, sem sociais.
nenhuma força impositiva. A religião, na formação de sua doutrina, estipula valores e
O Direito, claro, possui maior grau de efetividade haja vista que as princípios a serem seguidos e obedecidos pelo homem durante a vida.
condutas por ele impostas se dão por um processo de coação, em que o
4

Valores esses que induzem seus fiéis a determinadas condutas e consciência individual e nesse sentido a ética superior atua para que os
proibições para que o objetivo final, que é o bem, seja atingido. preceitos religiosos sejam obedecidos por uma força superior e não
Nesse aspecto, o Direito e a religião se parecem por expressarem exclusivamente pela vontade livre do indivíduo.
mecanismos de controle social, que impõem condutas e valores e que A Moral social, última concepção para se explicar a moral positiva,
têm como finalidade o bem comum. é um conjunto de princípios e critérios que orientam a vida social de um
Como aspecto de divergência, aponta-se o caráter de insegurança povo, em uma determinada época e local. Vale dizer que essa moral não
trazido pela religião, pois a Igreja oferece respostas que baseadas na fé. é fruto de uma consciência individual, mas de acordo com valores eleitos
Já o Direito parte de pressupostos concretos e fornece segurança e por uma sociedade.
proteção ao indivíduo nas suas relações entre os seus semelhantes e o Critérios de distinção entre Direito e Moral
Estado. Atualmente inúmeros critérios são utilizados para distinção entre
Direito e moral Direito e Moral, sendo essas de ordem formal e material (que diz respeito
Primeiramente é importante frisar que as palavras Direito e moral ao conteúdo).
são distintas, porém se influenciam e se completam, e devido a esse fato No ponto de vista formal pode-se verificar algumas distinções:
é que se faz necessário o estudo dessa relação. O Direito é bilateral, enquanto a moral é unilateral. Essa distinção
A moral tem como idéia e valor central o conceito de bem, que pode relaciona-se ao fato de que a ciência jurídica teria dupla sentido; pois por
ser entendido como tudo aquilo que promove e desenvolve o ser um lado concede direitos, e por outro impõe deveres. Já a moral tem
humano. A partir dessa idéia central é são retirados princípios e diretrizes suas regras simplificadas, impondo tão somente deveres, e o que se
até se chegar às regras morais, que influenciam o comportamento e a espera dos indivíduos é a obediência as suas regras.
mentalidade humana. Outro aspecto seria o fato da exterioridade do Direito e interioridade
Há uma classificação a respeito do conceito da moral, que é da Moral. Por essa distinção entende-se que o Direito se ocupa das
relevante para o presente estudo. atitudes externalizadas dos indivíduos, não atuando no campo da
Moral natural X Moral positiva (a moral positiva, por sua vez, se consciência, somente quando necessário para averiguar determinada
divide em: moral autônoma, ética superior dos sistemas religiosos e conduta.
moral social). Já a moral se destina a influenciar diretamente a consciência do
Pode-se dizer que a moral natural não seria criação humana e indivíduo, de forma a evitar que as condutas incorretas sejam
decorreria do conceito de bem, preexistente a qualquer idéia de tempo e externalizadas, e quando forem, serão objeto de análise somente para se
local. Não se refere a determinado povo ou localidade, mas sim a toda a verificar a intenção do indivíduo.
raça humana de forma genérica, é uma concepção retirada da própria Vale dizer que esse critério não atingiria a moral social.
natureza. Outro ponto de distinção é que na moral, a adesão às regras se dá
A Moral positiva, por outro lado, pode ser explicada por suas de forma autônoma, ou seja, o indivíduo tem a opção de querer ou não
concepções, quais sejam: aceitar aquelas regras.
Moral autônoma: é a concepção do conceito de bem individualizada É, portanto, um querer espontâneo. Importante registrar que esse
à consciência de cada indivíduo. É uma moral separada de quaisquer critério também não atinge a moral social. Já com o Direito ocorre de
influências externas. É interna a cada pessoa, tendo sua vontade livre. forma diversa, pois o indivíduo se submete a uma vontade maior, alheia à
Ética superior dos sistemas religiosos: é a concepção de bem sua, de forma obrigatória.
repassada nas doutrinas religiosas. O fiel que confirma sua fé age com O Direito é coercitivo enquanto a moral é incoercível. Isso ocorre
autonomia e liberdade. Contudo, se a doutrina apresentar imperfeições porque o Direito tem como uma de suas características mais marcantes a
sistêmicas, relacionadas à lógica, podem surgir conflitos com a coercibilidade, ou seja, o indivíduo deverá obedecer as normas por temer
5

a imposição de uma penalidade que será certamente exercida pela força As regras de trato social não se relacionam com as idéias de
estatal. Já a moral não possui essa característica, pois não há segurança como se preocupa o Direito. Seriam, pois, regras criadas pela
instrumentos punitivos para aqueles que não observam as suas regras. sociedade para que o convívio social seja mais harmônico, ameno e mais
Registra-se, oportunamente, que a moral social, apesar de não agradável.
possuir caráter punitivo, constrange os indivíduos a cumprirem as suas Essas regras seriam aquelas relacionadas à etiqueta, cortesia,
regras, desestimulando o descumprimento. linguagem, educação, amizade, dentre outros.
No que diz respeito ao conteúdo, Direito e moral também se Os principais objetivos dessas regras seriam tornar o ambiente
diferenciam na medida que os objetivos do Direito visam a criação de um mais suave, permitindo um convívio social agradável e harmônico.
ambiente dotado de segurança e ordem, para que o indivíduo possa As regras de trato social não são autônomas, ou seja, compõem os
desenvolver nas mais variadas esferas, tanto na pessoal, profissional e valores sociais, da mesma forma que Direito e da Moral.
cultural. Principais características
Já a moral se destina a aperfeiçoar o ser humano, sua consciência São características das regras de trato social ser um fenômeno
e para tal lhe impõe deveres na relação consigo mesmo e para com o característico da sociedade, pois as regras dizem respeito ao convívio
próximo. com o próximo, e são relevantes somente dentro desse contexto. Dessa
Quanto ao conteúdo, que diferenciam o Direito e a moral, surgem forma, serão regras inúteis num contexto individual.
quatro teorias: Elas possuem caráter externo pois não incorporam a consciência
-Teoria dos círculos concêntricos: por esta teoria haveria dois do indivíduo, mas apenas refletem ao exterior, com as aparências.
círculos, sendo que um está inserido no outro. O maior pertenceria à São, também, regras unilaterais por não imporem direitos e
moral, enquanto que o menor pertenceria ao Direito. Isso significa que a obrigações correlatas, mas tão somente deveres ao se apresentar ao
moral é maior que o Direito, e que o Direito dela faz parte; subordinando- próximo.
se às regras morais. Os padrões dessas regras não são criados por cada indivíduo, mas
-Teoria dos círculos secantes: por essa teoria haveria dois círculos são eleitos pela sociedade, para se criar um ambiente de bem estar
que se cruzam até um determinado ponto apenas. Isso significa que o social. À essa característica dá-se o nome de heteronomia.
Direito e a moral possuem um ponto comum, sobre o qual ambos têm Outra característica das regras de trato social se refere ao fato
competência para atuar, mas deverá haver uma área delimitada e dessas não apresentarem penalidades pelo descumprimento como no
particular para cada um pois há assuntos que um não poderá interferir na Direito. Não são regras impostas coercitivamente pelo órgão estatal.
esfera do outro. Apesar de não serem punidas com penalidades concretas como no
- A visão Kelseniana: Para Kelsen o Direito é autônomo e a Direito, as regras de trato social apresentam um grande incentivador para
validade de suas normas nada têm a ver com as regras morais. Para ele seu cumprimento, qual seja, a crítica, censura e reprovação social, que
haveria dois grandes círculos totalmente independentes um do outro. podem ser instrumentos de coerção, às vezes, até mais eficaz que no
- E, por fim, a Teoria do mínimo ético: por essa teoria o Direito Direito.
deveria conter o menor número possível de regras morais, somente Por fim, possuem a característica de diferenciar a cobrança por
aquelas que forem indispensáveis ao equilíbrio das relações. Pode-se classes, pois essas regras não são cobradas de forma idêntica para a
dizer que essa teoria se opõe ao pensamento do máximo ético, que se toda a sociedade, ou seja, o nível de cobrança reduz quanto menor a
expressa na adoção pelo Direito de uma grande parte da moral, para que classe social e o nível de escolaridade de um indivíduo.
as relações sociais sejam reguladas de forma mais próxima à
consciência dos indivíduos. Direito e os fatores de influência externos
6

O Direito e a realidade se influenciam, e cabe, ao Direito, O fator econômico diz respeito ao montante de riquezas produzidas
acompanhar as diversas oscilações sociais, uma vez que é para a numa sociedade de forma a influenciar alguns ramos do Direito, que se
sociedade que o Direito serve e para a qual foi criado. relacionam diretamente a esse fator, como o direito tributário, comercial,
Assim, verifica-se a existência de certos fatores, sociais e jurídicos, reais (propriedade), obrigações dentre outros. É importante dizer que o
que repercutem diretamente na esfera jurídica. Direito também influencia os processos de transformação na esfera
Esses fatores influenciam a sociedade e, em conseqüência, econômica.
impõem mudanças efetivas no quadro de leis, de forma acelerada ou Quanto à religião, diferentemente de outros tempos, não se verifica
lentamente. mais aquele domínio que a Igreja exercia sobre o Direito. Atualmente,
esta influencia de forma indireta, auxiliando na formação da sociedade e
Fatores Naturais X Culturais das consciências humanas, mas constitui um processo totalmente
Os fatores de influência podem ser naturais e culturais. separado do Direito.
Fatores naturais são aqueles que possuem relações com a A moral, como já dito anteriormente, constitui um processo de
natureza e seus vários aspectos, tais como, geográficos, demográficos e adaptação humana, que auxilia na formação do próprio Direito. É certo
antropológicos. que muitos valores da moral estão inseridos na ciência jurídica, e dessa,
Os fatores naturais geográficos relacionam-se ao clima, recursos forma a moral exerce uma grande influência sobre o Direito.
naturais, território, fator demográfico e fator antropológico. A educação, processo pelo qual o ser humano atinge seu
O clima é fator que influencia no crescimento da população, pois desenvolvimento intelectual pleno, é composto de inúmeras leis que
nas regiões de clima quente, o homem atinge seu pleno desenvolvimento disciplinam o conteúdo, a forma, níveis, disciplinas, enfim, todos os
de forma mais rápida. Assim, constitui fator de influência indireta, pois aspectos que devem ser verificados pelo Estado para um bom
diante dessa constatação, o legislador poderá fixar regras de direito de aperfeiçoamento intelectual.
família diferenciadas, obedecendo a peculiaridade de cada região. Assim também haverá influência desse ramo no Direito e suas leis.
Já os recursos naturais têm influência direta, por se tratarem de Há outras esferas que também podem influenciar ou determinar a
riquezas que devem ser administradas pelo Estado, na forma de tributos criação de uma lei, como a política, na qual cada grupo político possui
específicos para cada produto, afim de regular a exploração do homem suas tendências, objetivos e valores; a opinião pública, que exerce
na natureza. pressão sobre alguns setores sociais, e dessa forma influencia o Direito.
O território, por sua vez, é de caráter indireto pois influencia o Há, ainda, os grupos organizados, que possuem idéias comuns e
homem no seu modo de vida, no que diz respeito à organização da organizam-se para exercer maior pressão sobre o poder público e, por
sociedade, habitação e sua economia. fim, as medidas de hostilidade também influenciam o Direito, vez que é
O fator demográfico, poderá influenciar diretamente no momento uma forma de pressão mais agressiva, a fim de pressionar o poder
que o Estado criar leis para o controle ou incentivo à natalidade, pois é público para que as suas metas sejam devidamente atendidas.
muito importante o equilíbrio entre o número de pessoas, espaço e Finalmente é importante comentar a respeito da revolução e sua
alimentos para o bem estar social. influência no Direito. A revolução desencadeia, no Direito, um processo
O fator antropológico poderá ser vislumbrado na relação do homem de transformação rápido e abrangente.
e seu desenvolvimento, ressaltando as características mais marcantes de Pode ser conceituada como movimento, oriundo de parcela da
cada população. Este será um fator de influencia indireta. sociedade insatisfeita contra as instituições existentes, que visa, pela
Os fatores culturais, por outro lado, são produções da própria força, a mudança para um outro tipo de ideologia, previamente criada por
sociedade, e são específicos de cada povo e sua localidade, podendo esse grupo.
ser: econômicos, de cunho religioso, moral e educacional.
7

O objetivo da revolução é a criação de um novo Direito, baseado Dessa forma, "Direito" será, então, um conjunto de regras sociais,
em novos pressupostos e valores, distinto daquele anteriormente que tem em sua base as idéias da moral, religião e regras de trato social.
existente. Vale dizer que a característica mais marcante do Direito é a
Cumpre salientar que a Revolução é mais abrangente do que o imposição de pena pelo Estado. Embora as outras ramificações também
"Golpe de Estado", vez que no último os objetivos não são tão possuam normas de controle social, nenhuma delas possui o caráter
abrangentes e o que se pretende é a tomada de poder de um grupo para punitivo que o Direito tem sob a tutela do Estado.
outro, sem, contudo querer mudar todo o sistema existente. O ideal de Justiça é causa principal do Direito e, para atingi-lo,
deverá existir normas que tenham como base a segurança jurídica, que
As várias definições da palavra Direito disciplina o respeito nas relações entre os indivíduos e dos indivíduos
Durante muito tempo os vários juristas discutiram sobre a perante o Estado.
terminologia "Direito", tendo, os mesmos, concluído que ainda não Registra-se que, durante a história, o Direito já teve inúmeros
haviam chegado a uma proposição e conceituação que abrangesse todo conceitos e definições, mas, se devidamente analisadas, verifica-se que,
o conteúdo da palavra. cada qual carece de algum sentido, que não fora devidamente abordado.
Dependendo do ponto de vista que se analisa, o Direito terá uma
definição ou outra, em função do enfoque, podendo ser classificado de Nomenclaturas importantes para o dia-a-dia do Direito.
diversas formas. São várias as nomenclaturas que acompanham o dia-a-dia do
Assim, pode-se dizer que é difícil existir uma única definição que Direito, e é de suma importância que essas diferenciações sejam ditas,
conceitue, de forma específica, todo o sentido que a palavra "Direito" pois a palavra Direito poderá ser utilizada em qualquer desses sentidos:
poderá assumir. Ciência do Direito: Em sentido geral, é aquele ramo que estuda e
As diversas definições podem ser nominais ou reais (lógicas). organiza os conceitos e institutos jurídicos, e em sentido mais amplo
As nominais buscam explicar determinada expressão através da poderá ser a especificação de um determinado sistema jurídico, dentro
análise do nome. As definições nominais ser etimológicas, que analisa a do grande conjunto que forma o Direito. Exemplo: Matheus é estudante
origem da palavra e sua formação; ou semânticas, que verifica os de Direito.
sentidos que a palavra possa ter. Direito Natural: é um conjunto de princípios basilares, que não são
Pela definição nominal a palavra "Direito" pode ser apontado como fruto da criação da sociedade, nem do Estado, sendo, pois, um Direito
aquilo que está reto, conforme a reta, que não tem inclinação. Já, pela que surge por exigências da natureza. Esse Direito advém da própria
definição semântica a palavra "Direito" tem o sentido de ser um conjunto natureza e suas regras serão sempre imutáveis e universais, como o
de leis, estar de acordo com a lei, que estuda as leis. direito à vida e liberdade. Esses princípios de Direito natural é que devem
Por outro lado, as definições reais, ou lógicas, buscam explicar a nortear a criação das leis.
palavra "Direito", de acordo com determinado método. Direito Positivo: são as leis que devem ser seguidas em um
A lógica formal possui como critério para se chegar ao significado determinado local e época, por imposição estatal. Vale dizer que não são
da palavra o gênero próximo, que salienta as semelhanças entre somente as leis escritas, pois há países, que embora não possuam leis
determinados institutos e as diferenças específicas. escritas e organizadas, em códigos, essas decorrem dos costumes e tem
Dito isso, pode-se conceituar o Direito como conjunto de regras a mesma força de uma lei escrita.
sociais, que buscam, através dos ideais de Justiça, trazer harmonia aos Direito Objetivo: pode ser entendido como a norma propriamente
indivíduos, que obedecem por temerem a imposição de penalidades por dita. Exemplo: O Direito Civil busca a defesa das partes nas relações
parte do Estado. jurídicas interpessoais.
8

Direito Subjetivo: é a possibilidade que a norma dá de um indivíduo Características mais marcantes da norma jurídica
exercer determinado conduta descrita na lei. É a pretensão que surge É importante verificar que as normas jurídicas possuem
para uma das partes, quando a outra descumpre um dever jurídico. características comuns, sendo elas:
Exemplo: se uma pessoa te deve um valor em dinheiro, a lei te A Bilateralidade, é uma característica que possui relação com a
concede o direito de cobrar a dívida por meio de um processo judicial de própria estrutura da norma, pois, normalmente, a norma é dirigida a duas
execução. partes, sendo que uma parte tem o dever jurídico, ou seja, deverá
Por fim é importante esclarecer a idéia de Ordem Jurídica, que, a exercer determinada conduta em favor de outra, enquanto que, essa
princípio, pode ser definida como a sistemática jurídica que cria um todo outra, tem o direito subjetivo, ou seja, a possibilidade dada pela norma de
harmônico, com subdivisões que se dão pela natureza das normas, que, agir diante da outra parte.
quando semelhantes, são agrupadas juntas. É importante dizer que Uma parte, então, teria um direito fixado pela norma e a outra uma
quando uma determinada norma atua em um situação, essa norma não obrigação, decorrente do direito que foi concedido.
poderá ser analisada de forma isolada, pois ela pertence e um todo, Outra é a generalidade, característica relacionada ao fato da norma
unitário, que é Ordem Jurídica. valer para qualquer um, sem distinção de qualquer natureza, para os
A Ordem Jurídica, que é organizada num grande sistema indivíduos, também iguais entre si, que se encontram na mesma
harmônico, possui como lei basilar a Constituição, que contém desde os situação. A norma não foi criada para um ou outro, mas para todos. Essa
princípios estruturais, até regras de funcionamento do Estado, e por ter característica consagra um dos princípios basilares do Direito: igualdade
esse caráter fundamental, todas as demais manifestações de Direito de todos perante a lei.
devem estar em sintonia com ela. A abstratividade diz respeito ao fato de a norma não ter sido criada
Embora, na teoria, a Ordem Jurídica seja um todo harmônico, na para regular uma situação concreta ocorrida, mas para regular, de forma
prática, se verifica que podem existir leis conflitantes entre si, e para que abstrata, abrangendo o maior número possível de casos semelhantes,
o impasse seja resolvido, é necessário que o jurista utilize métodos de que ocorrem, normalmente, da mesma forma. A norma não pode
interpretação que levem em conta a idéia de sistema. disciplinar situações concretas, mas tão somente formular os modelos de
Pode-se dizer que esse trabalho dos juristas aperfeiçoam a Ordem situação, com as características fundamentais, sem mencionar as
Jurídica. particularidades de cada situação, pois é impossível ao legislador prever
Nesse momento é importante conceituar instituto jurídico, que pode todas as possibilidades que podem ocorrer nas relações sociais.
ser definido como o agrupamento de normas semelhantes entre si, que A imperatividade é uma característica essencial, pois a norma, para
disponham de um determinado assunto comum. Seria, pois, uma parte ser cumprida e observada por todos, deverá ser imperativa, ou seja,
da Ordem Jurídica, de cunho mais específico. Vale dizer que a reunião de impor aos destinatários a obrigação de obedecer. Não depende da
vários institutos forma a Ordem Jurídica. vontade dos indivíduos, pois a norma não é conselho, mas ordem a ser
A norma jurídica seguida.
As normas jurídicas são estruturas fundamentais do Direito e nas A coercibilidade, por fim, pode ser explicada como a possibilidade
quais são gravados preceitos e valores que vão compor a Ordem do uso da força para combater aqueles que não observam as normas.
Jurídica. Essa força pode se dar mediante coação, que atua na esfera psicológica,
A norma jurídica é responsável por regular a conduta do indivíduo, desestimulando o indivíduo de descumprir a norma, ou por sanção
e fixar enunciados sobre a organização da sociedade e do Estado, (penalidade), que é o resultado do efetivo descumprimento. Pode-se
impondo aos que a ela infringem, as penalidades previstas, e isso se dá dizer que a Ordem Jurídica também estimula o cumprimento da norma,
em prol da busca do bem maior do Direito, que é a Justiça. que se dá pelas sanções premiais. Essas sanções seriam a concessão
de um benefício ao indivíduo que respeitou determinada norma.
9

Classificações Constitucionais: decorrem da Constituição Federal, ou de suas


Vários juristas apresentam diversas classificações para as normas, emendas. É a norma mais importante do país, não podendo ser
e, assim, salienta-se as mais correntes, dependendo de cada critério.Em contrariada em nenhuma hipótese.
relação ao sistema que pertencem: leva em conta o local de atuação das Complementares: complementam algumas omissões da
normas, e assim elas podem ser: Constituição Federal. Possuem hierarquia logo abaixo das normas
 Nacionais: quando as normas devem ser observadas no limite de constitucionais.
um país; Leis ordinárias: estão localizadas num plano inferior. São as leis,
 Direito estrangeiro: quando apesar de pertencerem a outro país, medidas provisórias e leis delegadas.
poderá ser aplicada no território do outro, pelas relações diplomáticas Normas regulamentares: advindas dos decretos e as
que possuem; individualizadas, decorrentes de testamentos e sentenças.
 Direito uniforme: quando dois ou mais países adotam as mesmas
leis, que são usadas nos dois territórios. * Em relação à sanção: podem ser:
* Em relação à fonte: leva em conta a origem das normas, e assim Perfeitas: quando a sanção para o descumprimento da norma é a
elas podem ser: nulidade do ato, ou seja, age como se o ato nunca tivesse existido;
Legislativas: quando escritas e organizadas; Mais que perfeitas: quando a norma, além de considerar nulo o ato
Consuetudinárias: quando as normas advém dos costumes; na hipótese de descumprimento, prevê sanção para aquele que violou a
Jurisprudenciais: quando são retiradas de decisões dos tribunais; norma;
Menos do que perfeitas: quando o descumprimento da norma é
* Em relação à validez: essa característica se subdivide levando em combatido apenas com a sanção (penalidade);
conta o espaço, tempo, e conteúdo material. Imperfeitas: quando não prevê nem a possibilidade de sanção ou
- No espaço: as normas podem ser: nulidade do ato como conseqüência do descumprimento da norma;
Gerais: são aquelas que valem em todo o território nacional, sendo
essas as leis federais, * Em relação à qualidade: podem ser:
Locais: são aquelas que atuam apenas em parte do território, Positivas: quando a norma permite exige do indivíduo uma conduta
podendo ser as leis federais, estaduais ou municipais. compatível com uma ação ou omissão;
- No tempo: se classificam pela vigência: Negativas: quando a norma implica na proibição de uma ação ou
Por prazo determinado: quando a própria lei determina o período omissão.
que irá atuar;
Por prazo indeterminado: quando a lei não prevê esse período de * Em relação à vontade das partes: podem ser:
duração de sua atuação. Taxativas: quando independem da vontade das partes por
- Âmbito material: se classificam pelo conteúdo: abrangerem conteúdos de caráter fundamental;
Direito Público: quando o Estado seria uma das partes da relação, Dispositivas: leva em conta a vontade das partes, por se referirem
e impõe seu poder, verificando, dessa forma, uma relação de aos interesses particulares, podendo ou não serem adotadas.
subordinação; Rígidas: quando o conteúdo não oferece alternativas, sendo
Direito Privado: quando as partes são tidas como iguais, numa impositiva a ordem (exemplo: aposentadoria compulsória).
relação de coordenação. Elásticas: quando admitem a maleabilidade da situação pelo juiz,
por conter termos de significação ampla (exemplo: "usos e costumes da
* Em relação à hierarquia: por essa classificação podem ser: região...");
10

Alguns aspectos que devem conter numa norma jurídica O Direito possui uma classificação muito relevante que o distingue
A norma, ao ser elaborada, para que possa ser objeto de cobrança, em dois grandes ramos: Direito Público e Direito Privado.
impondo o ajuste de condutas individuais, deve possuir vigência, ou seja, Há, na doutrina, inúmeros debates jurídicos a respeito dessa
deve se apresentar válida. A validade depende de requisitos técnico- distinção, chegando existir, inclusive, teorias a respeito de tema.
formais, tais como a obediência ao procedimento previsto para Entretanto o objetivo, nesse tópico, não é ficar tecendo comentários
elaboração da norma (processo legislativo), do respeito à vacatio legis, sobre essas teorias, mas, passar ao estudo dessa grande classificação,
ou seja, aguardar um período previsto para que depois da publicação, a de ordem prática e didática e seus desdobramentos.
lei ingresse no mundo jurídico. O Direito Público, pode ser explicado como um grande ramo de
A eficácia, por sua vez, significa que a norma cumpriu a finalidade a normas que possuem natureza pública, na qual o Estado atua com seu
que se destinava, pois, foi socialmente observada, tendo solucionado o poder, por ser um tema de relevante caráter social e organizacional da
motivo que a gerou. Uma lei é eficaz quando cumprida a sua função sociedade.
social. Já o Direito Privado possui outro enfoque, pois visa disciplinar as
A legitimidade, último requisito da norma jurídica, é ser originada do relações inter-individuais, e os interesses privados.
poder competente, ou seja, ser produzida, por quem a lei autoriza. Dessa forma, pode-se dizer que são ramos do Direito Público: o
Direito Constitucional, Administrativo, Financeiro, Penal, Internacional
Ramos do Direito - Particularidades do Direito Público, Internacional Privado e Processual. E os ramos do Direito
Dependendo do enfoque que se queira dar ao Direito, pode-se Privado são: Direito Civil, Direito Empresarial, Direito do Trabalho. É
dizer que ele apresenta algumas classificações. importante dizer, nesse momento, que o que se pretende não é fornecer
Quanto à abrangência, pode ser Direito Comum ou Direito Especial. conceitos específicos de cada um dos ramos acima citados, mas tão
As regras de Direito Comum visam toda a coletividade e envolvem somente abordar, de forma bastante genérica, do que tratam cada um
quaisquer relações jurídicas, como as leis trabalhistas. Já as regras de desses ramos.
Direito Especial é mais centrado, e destinado não à toda coletividade,
mas tão somente a uma parcela do todo, como no caso do menor, que Ramos do Direito Público
possui no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), as disposições · Direito Constitucional: as normas de Direito Constitucional são
sobre os menores. normas internas e estruturais cada Estado. Elas disciplinam as
Outro aspecto seria quanto à situação a que se encontra a Ordem instituições políticas, a estrutura de governo, organização dos poderes do
Jurídica, o Direito pode ser: Direito Regular ou Direito Singular. Estado, limites de funcionamento, a sociedade, e as garantias
O Direito Regular é exercido de acordo com seus princípios e fundamentais de cada indivíduo. Seriam normas que fornecem um
regras, no estado normal. Já o Direito Singular, ocorre diante de uma modelo para as demais leis que surgirem. São normas que montam toda
situação excepcional, onde o há quebra da estrutura lógica, e dos a estrutura da sociedade e ditam os parâmetros econômicos, políticos e
preceitos fundamentais pelas autoridades competentes. Um exemplo sociais.
seria os períodos de guerras, e "estado de sítio". · Direito Administrativo: é o ramo do Direito Público que
A dicotomia: Direito Público X Direito Privado regulamenta a atividade estatal, com todos os serviços públicos postos à
A princípio é importante ter em mente que o Direito é um todo disposição da sociedade, em busca do bem comum. Vale dizer que o
harmônico, com seus princípios e regras fundamentais que estruturam Direito Administrativo se preocupa com a prestação do serviço público, a
todo o sistema jurídico. Entretanto, para facilitar o estudo, é necessário forma e limites de atuação e ainda disciplina o relacionamento entre
distinguir algumas categorias. entes públicos e privados, e a relação dos indivíduos com a
Administração Pública.
11

· Direito Financeiro: O Estado, para prestar os serviços públicos em · Direito processual: para definir o objeto de estudo desse ramo do
prol dos cidadãos, necessita de recursos, que advém dos tributos Direito, primeiramente, é importante dizer que é o Estado que detém o
(impostos, taxas e contribuições). Assim, seria a preocupação central do poder de aplicar o Direito, estabelecendo a ordem, aplicando as
Direito Financeiro, o estudo dos princípios e diretrizes que norteiam a penalidades, e solucionando os conflitos entre as partes, por meio de um
forma de aplicação, administração e gerenciamento desses recursos processo judicial. Dessa forma, o ramo em questão visa disciplinar de
públicos para a execução destes serviços, e ainda o planejamento que forma isso vai se dar, estabelecendo princípios e regras a serem
necessário de forma que a receita e despesa pública se equilibrem no previamente obedecidas, tanto pelo Estado, quanto pelas partes na
grande orçamento público. É a intenção do Direito Financeiro que o disputa judicial. Assim a função do Direito processual é organizar a forma
Estado empregue seus recursos da maneira mais eficiente possível para de como o Estado vai prestar esse poder-dever de julgar, e como as
a sociedade. partes devem agir no embate judicial.
· Direito Penal: ramo do Direito que disciplina as condutas humanas Ramos do Direito Privado
que podem por em risco a coexistência dos indivíduos na sociedade. O · Direito Civil: ramo do Direito Privado por excelência, pois visa
Direito Penal vai regular essas condutas com base na proteção dos regular as relações dos indivíduos, estabelecendo direitos e impondo
princípios relacionados à vida, intimidade, propriedade, liberdade, enfim, obrigações. O Direito Civil atua em toda a vida do indivíduo, pois
princípios que devem ser respeitados no convívio social. Dessa forma, o disciplina todos os campos de interesses individuais. O Código Civil, ou
Direito Penal vai descrever as condutas consideradas crimes (condutas seja, reunião de todas as leis de Direito Civil, é estruturado em duas
mais graves) e contravenções (condutas menos grave) e as respectivas grandes partes: geral, que contém normas de caráter abrangente, que
penas cominadas. Vale dizer que o Estado é o responsável pelo direito servem a qualquer área do Direito Civil e parte especial, que trata dos
de punir, e o faz mediante critérios pré- estabelecidos, com o intuito de assuntos específicos. Na parte Geral encontram-se os livros que contém
desestimular os indivíduos a transgredirem as normas, e, também, de os temas relativos às pessoas, aos bens e aos fatos jurídicos. Já a parte
readaptar o indivíduo ao convívio social. especial os livros são: obrigações, Direito de Empresa, Direito das
· Direito Internacional Público: é o ramo do Direito voltado a Coisas, Direito de Família, Direito das Sucessões e um livro
disciplinar as relações entre os vários Estados, possuindo princípios e complementar das disposições finais e transitórias. Assim verifica-se que
diretrizes, que visam uma interação pacífica entre os Estados, tanto na o Direito Civil abrange todas as área do relacionamento humano, que
esfera política, econômica, social e cultural. Vale dizer que são criados serão objeto de estudo durante todo o Curso de Direito.
organismos internacionais, tais como a ONU (Organização das Nações · Direito Comercial: é o ramo do Direito destinado a regular a
Unidas) e a OMC (Organização Mundial do Comércio), para auxiliar na prática do comércio, bem como o direito das partes envolvidas. O
descoberta de interesses comuns, e de que forma interação dos Estados comércio, responsável por movimentar as riquezas de um país, deve
vai se dar. possuir princípios e regras próprias, visando uma justa relação entre os
Os instrumentos dos acordos entre os Estados são denominados atores do comércio. Há regras inerentes, também, aos títulos de crédito
tratados. (formas utilizadas em pagamentos), que circulam durante a prática
· Direito Internacional Privado: ramo destinado a regular a situação comercial, como o cheque, a nota promissória, letra de câmbio, etc.
do estrangeiro no território nacional, pois como o estrangeiro está em · Direito do Trabalho: é um ramo que se destina a disciplinar as
local diverso de seu país, haveria um conflito de leis a serem aplicadas relações de trabalho, estabelecendo princípios e regras, de forma a evitar
no caso concreto: a lei estrangeira, ou do local onde o indivíduo se a exploração pelo do trabalho, e conceder direitos e obrigações
encontra? Assim, a base do Direito Internacional Privado seria regular recíprocos tanto aos que prestam os serviços, quanto para àqueles cujo
essas relações e estabelecer diretrizes e normas, dirigidas às o serviço se destina.
autoridades para a resolução inerente a esses conflitos.
12

Há discussão entre os juristas se o Direito do Trabalho seria um É importante ressaltar que o conceito de bem comum, ou seja,
ramo do Direito Público ou Privado. Por muito tempo, vários autores conjunto de bens criados por uma sociedade e posto a disposição dos
entenderam se tratar de um ramo do Direito Público, pois apesar de suas indivíduos para obtenção de seus objetivos pessoais, é abarcado pela
normas disciplinarem relações privadas, a vontade das partes ficaria idéia de Justiça, pois atuando de forma justa, facilmente se chegará ao
limitada às regras pré- estabelecidas pelo Estado. Contudo com o passar bem comum.
do tempo entenderam se tratar de ramo do Direito Privado, pois Características da Justiça
predomina o interesse particular, em detrimento da natureza das regras A idéia de Justiça deve ser tida como medida de igualdade entre os
públicas. Há autores que atentam, ainda, para uma classificação mista, homens, e essa igualdade deverá ser garantida às pessoas no que diz
pois o Direito do Trabalho teria uma esfera pública, e outra privada. respeito à lei, surgindo, dessa forma, o Princípio da Isonomia, segundo o
qual, todos são iguais perante à lei.
Justiça e Eqüidade: ideais do Direito Mas deve-se lembrar que nem sempre as pessoas são e se
Justo é aquilo que é adequado, correto. A idéia de Justiça, então, encontram em igual situação, e dessa forma, tratar todos da mesma
poderá ser definida como a reunião de valores éticos e morais, que maneira não seria uma medida de Justiça, mas injustiça. Assim, a idéia
atribui, a cada um, de forma igualitária, a cada um o que lhe pertence. de Justiça, deve ser complementada pela proporcionalidade, pois se as
Há na doutrina uma discussão a cerca do caráter absoluto ou pessoas que não são e nem se encontram iguais, devem ser tratadas
relativo da palavra Justiça. desigualmente, mas na medida dessa desigualdade, sob pena de,
Na acepção relativa, a palavra Justiça possuiria significação ampla, também, não ser uma medida justa.
e que poderia divergir de tempos em tempos, pois o que estaria correto e Assim a igualdade e proporcionalidade são critérios para se chegar
adequado no presente poderia se alterar no futuro e vice versa. Por isso, à Justiça.
atentam aqueles que concordam com esse posicionamento, que a Outros critérios de Justiça seriam o mérito, a capacidade e a
colocação dessa palavra no corpo dos textos jurídicos, poderá causar necessidade de cada indivíduo, mas somente se chegará a uma conduta
distorções, pois não haverá um comando totalmente definido. A justa se feitas algumas ressalvas:
concepção de Justiça, então, seria relativa, por ser extremamente - Mérito, ou seja, atributo de cada pessoa, é subjetivo. Dessa forma
subjetiva. para tomar uma atitude justa, deve-se fazer um raciocínio de
Conceito de Justiça proporcionalidade, pois cada um deverá ser recompensado na medida de
Entretanto, há estudiosos do Direito que atentam ao fato de que a seu mérito, de acordo com o grau de intensidade de cada um. Portanto
Justiça não é uma acepção relativa, mas absoluta, pois ser esta é um estaria afastada a idéia de igualdade para aplicar a Justiça, observando o
valor, como os demais valores advindos do Direito Natural, que são mérito.
eternos, imutáveis e universais. A Justiça, dessa forma, também deverá - Capacidade, diz respeito a qualidade de alguém para satisfazer a
ser considerada dessa maneira. Assim não poderia se considerar que a determinado fim, deverá ser utilizada, pois será justo que, quem tiver
Justiça é uma terminologia sem seu conteúdo e significado definido, que melhor condição, seja melhor recompensado.
poderia se alterar diante da época. - Necessidade: dar a cada um o que é seu segundo as
A Justiça, então, deverá ser uma expressão muito ligada ao Direito necessidades é algo que tem uma conotação social, e vale dizer que
e para a qual o Direito sempre deve apontar. É importante dizer que a esse critério está sendo largamente utilizado no Direito.
busca pela Justiça se faz por meio de instrumentos, que facilitam e Classificações
reduzem o caminho a ser percorrido, que é pela elaboração de leis. Nas A Justiça se classifica em:
leis são descritos alguns valores e regras que buscam os ideais de
Justiça.
13

- Justiça Convencional: aquela que decorre da simples aplicação da arbítrio, ficando as partes à mercê dos mandos, desmandos e vontades
lei, sendo que a situação concreta se encaixa perfeitamente ao modelo de um juiz.
legal. Leis Injustas
- Justiça Substancial: aquela que decorre dos princípios de Direito
Natural, estando estes descritos ou não na lei. É a Justiça pura, Pode-se dizer que leis injustas são contrárias à Justiça, ou seja,
verdadeira e independe da lei. contrárias ao objetivo maior do Direito que, conforme já dito, é dar a cada
- Justiça Distributiva: seria sua idéia central o tratamento um o que lhe pertence.
comparativo, dar a cada um o que é seu na medida da proporcionalidade Por alguma distorção, a norma se torna inútil na função a que se
e necessidade, sendo essa uma função do Estado perante à sociedade. destina, ocorrendo uma injustiça. Pode ser que essa distorção se dê de
- Justiça Comutativa: presente nas relações sociais de troca, sendo três maneiras: por destinação, quando a intenção do legislador é
que as partes devem dar e receber numa proporção matemática. Uma exatamente a de se criar uma norma injusta, causais, que se dão em
troca é justa quando, os produtos que foram trocados eqüivalem-se virtude de incompetência política, que produz leis que desviam de sua
exatamente, quantitativamente. finalidade e eventuais, quando, diante do caso concreto, a norma poderá
- Justiça Social: atualmente muito utilizada, a Justiça Social, se se tornar injusta.
verifica na melhor a distribuição de riqueza pelos membros da sociedade. Há uma discussão dos juristas a cerca da validade ou não dessas
Objetiva-se dar àqueles que mais carecem as necessidades mínimas de leis injustas. Uns pensam que a norma não poderá valer por contrariar o
sobrevivência. Esse tipo de Justiça vai utilizar, nessa redistribuição, os ideal do Direito; já outros apontam pela validade, por receio de causar um
critérios de necessidade em relação àqueles que precisam ser ajudados mal ainda maior que seria a não observância do Direito em determinadas
e de capacidade, em relação àqueles que poderão contribuir mais para situação, sob o pretexto da injustiça. Assim, o mais plausível seria
que tal redistribuição possa ser feita. atender o disposto na lei, mas fazendo um trabalho de interpretação para
Eqüidade evitar o mal contido na norma.
Segurança Jurídica
A norma jurídica, como já visto anteriormente, é a descrição de uma A segurança jurídica existe para que a Justiça, fim maior do Direito
conduta geral e abstrata, e, por isso, pode não se vincular diretamente a se concretize.
determinado caso concreto, haja vista que os acontecimentos sociais são Vale dizer que a segurança jurídica, concede aos indivíduos a
muito mais complexos. garantia necessária para o desenvolvimento de suas relações sociais,
Dessa forma, pode-se dizer que, em alguns casos, a norma deverá tendo, no Direito, a certeza das conseqüências dos atos praticados.
ser adaptada ao caso concreto, para vislumbrar as particularidades Mas a segurança jurídica não poderá se resumir na simples idéia
trazidas em cada caso. À essa adaptação dá-se o nome de eqüidade. de certeza pela existência de um conjunto de leis, que dispõem sobre o
Assim, a eqüidade é a possibilidade do aplicador do Direito de que é permitido ou proibido.
moldar a norma no intuito de que essa seja sensível às peculiaridades de O indivíduo deverá se sentir seguro, também, por verificar no corpo
cada situação trazida pela realidade, e dessa forma, possa ser mais dos textos jurídicos, a inclusão de princípios fundamentais, fruto das
justa. Pode-se dizer, segundo alguns autores, que a eqüidade é a conquistas sociais dos homens.
aplicação da Justiça no caso particular. Princípios pertinentes
Devido a essa idéia, o Direito admite, em muitas leis, a aplicação Assim, para que a segurança jurídica se concretize no mundo do
da eqüidade pelo juiz, que teria maior liberdade no julgamento dos casos Direito, alguns princípios deverão ser respeitados, sendo esses de três
submetidos à sua apreciação. Mas ressalte-se, há de haver limites e gêneros:
regras, sob pena da eqüidade se transformar num instrumento de - Relativos à organização do Estado;
14

- Relativos ao Direito, enquanto conjunto de normas; Observação:


- Relativos à aplicação do Direito A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
determina, em seu artigo 5º, XL, uma exceção ao princípio da
- Relativos à organização do Estado Irretroatividade das Leis. No caso da lei penal, será admitida a
Para que haja segurança jurídica é fundamental que o Estado retroatividade de uma lei futura quando essa hipótese for beneficiar o réu.
tenha seus poderes divididos (Poder Executivo, Poder Legislativo e - Estabilidade Relativa do Direito: O Direito, enquanto criação
Poder Judiciário), cada qual atuando dentro de suas funções, sem que humana voltada a estabelecer a coexistência pacífica entre os homens,
um interfira nas funções dos outros. deve estar atento à realidade social a que está inserido, e com ela
Igualmente importante, seria a estrita observância, pelo Poder evoluir, sob pena de se tornar inútil.
judiciário, de uma organização interna eficaz, capaz de não prejudicar a Entretanto, esse princípio propõe alguns cuidados a serem
eficiência da aplicação das normas. observados. Por ele, a Ordem Jurídica deve conservar a característica de
- Relativos ao Direito, enquanto conjunto de normas: pode-se citar estabilidade, mantendo um equilíbrio, pois não poderá criar novas leis de
quatro princípios que devem ser observados para que o Direito seja forma impulsiva, sob o pretexto de evolução. Da mesma maneira não
juridicamente seguro: poderá ficar inerte, pois a realidade social é complexa e é enriquecida a
- Positividade do Direito: pode ser explicado como a existência de cada dia, tendo o Direito que acompanhar as principais mudanças, de
um conjunto de normas (escritas ou não, neste último caso, advinda dos forma progressiva, e não desordenada.
costumes), a ser seguido por uma sociedade, em época e local - Relativo à aplicação do Direito: entende-se os princípios
determinado, que disponha claramente sobre as condutas permitidas e relacionados às decisões judiciais, sendo que essas devem se
proibidas. Como medida para que tal positivação seja eficaz, é apresentar sempre num mesmo sentido e coerência, pois se cada
necessário que os indivíduos conheçam a norma, sendo que os tribunal entender de uma forma diversa sobre um mesmo assunto, isso
costumes seriam repassados pelo próprio povo, de geração a geração, e criaria uma atmosfera de insegurança para aquele que recorre ao Poder
as leis escritas, devidamente publicadas. Judiciário.
- Segurança de Orientação: por esse princípio tem-se que o Outro importante aspecto é o respeito a coisa julgada, pois, quando
Direito deve conter regras claras, de forma que não haja dúvida quanto esgotados os recursos previstos à disposição da parte, a decisão de
ao seu conteúdo; simples, para que qualquer pessoa do povo possa determinado juiz ou tribunal não é mais passível de modificações, e
entender o que está regulado; inequívocas, ou seja, a norma não poderia assim deverá ser mantida.
apresentar contradições, que façam nascer um conflito dentro do texto da A não observância a esse princípio causa extrema insegurança, por
norma e suficientes, sendo que o Direito deverá apresentar todas as trazer a parte que vence uma eterna dúvida sobre a manutenção de sua
soluções ao deslinde de qualquer situação que necessite de ser vitória.
resolvida.
- Irretroatividade da Lei: esse é o princípio mais importante da LEI
Segurança Jurídica. Pode ser explicado pelo fato de leis futuras não Da elaboração das leis
atingirem os fatos presentes e passados. Em outras palavras: uma lei Vale dizer que o processo de elaboração das leis se encontra
atual ou futura não poderá interferir em atos e fatos que já tenham totalmente especificado na Constituição da República, desde o momento
ocorrido, e que observaram, na época, a lei anterior. Se a retroatividade que se inicia, indicando quem poderá iniciá-lo, até como será a votação
fosse admitida, seria criado um clima de profunda instabilidade, pois os para aprovação ou reprovação do projeto de lei.
indivíduos não teriam como prever as leis futuras, e assim ficariam Cumpre salientar que o art. 59 da CF/88, fornece disposição geral
inseguros diante de qualquer relação jurídica. sobre o processo legislativo, tendo em seu parágrafo único a previsão de
15

que uma lei complementar irá dispor sobre a elaboração, redação, Autoria e fundamento legal de autoridade: apesar de já constar a
alteração e consolidação das leis. natureza do ato legislativo, não houve menção expressa sobre a autoria
Art. 59. O processo legislativo compreende a elaboração de: I - daquele ato, que deve ser feita a seguir, indicando qual o poder
emendas à Constituição; II - leis complementares; III - leis ordinárias; IV - responsável pela edição daquele ato, se executivo ou legislativo.
leis delegadas; V - medidas provisórias; VI - decretos legislativos; VII - Exemplo:O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o
resoluções. Parágrafo único. Lei complementar disporá sobre a Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: (Autoria e
elaboração, redação, alteração e consolidação das fundamento legal de autoridade)
Nesse sentido em 26 de fevereiro de 1995, foi editada a lei Causas justificativas: Atualmente se encontra em desuso. Pode-se
complementar que trata do assunto, estando a matéria regulada por essa dizer que servem para explicar os motivos que determinaram a criação
lei. do ato legislativo em questão.
Ressalta-se que o processo legislativo e algumas particularidades Normalmente se dão sob a forma de considerandos (que aparecem
já foram discutidas, de forma superficial, no presente curso, entretanto o quando o assunto a que se trata o ato legislativo reflete muito na vida
aprofundamento desses conceitos, será ministrado em outros cursos social, gerando várias conseqüências e mudanças para a população, e
específicos. sua função é dar uma satisfação para os indivíduos e garantir que a nova
Apresentação formal norma seja cumprida), ou exposição de motivos (somente são possíveis
Todos os atos legislativos devem possuir características comuns nos códigos, e consta uma visão detalhada e analítica dos diversos
que os diferenciem dos demais. Assim, qualquer ato legislativo, para se institutos novos trazidos com a codificação, bem como as teorias
apresentar no mundo jurídico, deverá se compor, obrigatoriamente, de consagradas).
algumas partes como: preâmbulo, corpo (texto), disposições Ordem de Execução ou Mandado de Cumprimento: pode ser
complementares, cláusulas de vigência e revogação, fecho, assinatura e identificado como o caráter impositivo do ato legislativo, que é
referenda. determinado o seu cumprimento. Pode-se identificar essa ordem de
O preâmbulo pode ser explicado como um relatório preliminar do execução pelas expressões que são colocadas ao final do preâmbulo,
respectivo ato legislativo, de forma a identificar do que se trata o ato em tais como: "decreta, determina, resolve", dentre outras.
questão. Encerrada a análise do preâmbulo, passa-se ao estudo das demais
Dentro do preâmbulo estão presentes: partes que compõem o ato legislativo.
Epígrafe: é a primeira parte de um ato legislativo, onde é descrita a O texto, ou corpo, é o local do ato legislativo onde se encontram as
espécie do ato que se segue, a numeração e a data. Serve para facilitar disposições propriamente ditas, organizadas em artigos.
as pesquisas e ainda aponta a natureza do ato em questão. Exemplo: '' A seguir se encontra as disposições complementares, que
Lei Complementar nº XXX, de 31 de Janeiro de 2006. normalmente aparecem quando os atos legislativos são bastante
Exemplo: Lei nº9099/95 de 26 de Setembro de 1995 (Epígrafe) extensos, divididos em capítulos, como no caso dos Códigos. Essas
Ementa (ou rubrica): é o local onde se define sobre o que se trata o disposições fornecem esclarecimentos necessários à aplicação das
ato legislativo. Não se presta a sintetizar o assunto, mas apenas destaca normas ali contidas.
sobre qual matéria irá abordar o ato legislativo. É importante dizer que a Podem ser preliminares, quando fornecem diretrizes, antes do
ementa facilita os serviços de pesquisa e busca de um determinado ato. texto, que servem para explicitar os objetivos e estabelecer distinções
Exemplo: Dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais e relevantes; finais ou gerais, que são úteis à completa compreensão do
dá outras providências. (Ementa) ato legislativo, e, como são de caráter amplo, devem vir ao final do texto;
Cumpre salientar que a epígrafe, acrescida da ementa, formam o e transitórias, que se destinam a regular um período de transição, de
título do ato legislativo. mudança, e uma vez cumprida essa função, tornam-se desnecessárias.
16

As cláusulas de vigência, por sua vez, indicam a partir de quando o as exceções e situações excepcionais serem tratadas por ocasião das
ato legislativo irá começar a surtir seus efeitos, devendo, pois ser, suas subdivisões.
obedecido. Já a cláusula de revogação indica a partir de quando o ato Os parágrafos abordam regras restritas pois guardam uma sintonia
não precisará ser observado. Vale dizer que, atualmente, essas cláusulas direta com o caput do artigo, e descrevem uma situação excepcional,
não se fazem relevantes por constar, na Lei de Introdução do Código seja uma especificação, seja uma exceção.
Civil, as disposições pertinentes ao assunto. Vale dizer que os parágrafos se representam pelo símbolo §, sendo
O fecho, que se encontra logo após às clausulas de vigência e numerados da mesma forma que os artigos.
revogação, indicam a data e o local da edição do ato legislativo, e ainda Mas, ressalta-se que, quando se tratar de um único parágrafo, não
traz a informação dos anos desde a Independência do Brasil e a se utiliza o símbolo, mas a descrição normal "parágrafo único".
Proclamação da República. Os incisos, alíneas e itens possuem, basicamente, a mesma
A assinatura do ato legislativo é tarefa da autoridade responsável função. São subdivisões do artigo que auxiliam na organização e
pela edição do ato. Vale dizer que somente depois de devidamente sistematização das normas.
assinado é que o ato possui autenticidade necessária. Vale dizer que os incisos não possuem autonomia em relação ao
A referenda, consiste na reunião de assinaturas que se seguem artigo a que se referem, ficando desprovidos de sentido caso sejam
após a assinatura daquele responsável pela edição do ato legislativo. analisados isoladamente. São representados por números romanos.
Atualmente a referenda não é imprescindível para a validade do Já as alíneas, que são subdivisões dos incisos, são representados
ato, mas constitui uma prática importante, demonstrando a convergência por letras minúsculas, enquanto que os itens, que se prestam a dividir
de interesses das autoridades. alíneas, se representam por números arábicos.
Apresentação Material Cumpre salientar que os artigos semelhantes são agrupados,
formando um grande sistema dentro dos atos legislativos extensos.
Em virtude da complexidade de alguns assuntos, foi feita uma Ressalta-se que há formação de subseções e seções, que,
divisão dos atos legislativos. posteriormente são reunidas formando os títulos.
O objetivo é reunir assuntos semelhantes, numa ordem lógica e Os títulos, por sua vez, constituem os livros, que são agrupados em
estrutural. partes.
Essa forma, os atos legislativos apresentam inúmeras divisões, que Dessa forma, todas as partes, conjuntamente, formarão os códigos.
são objeto do presente estudo. A Lei e seus efeitos
Assim, os artigos poderão se dividir em parágrafos, incisos, alíneas Como já dito anteriormente, é com a promulgação, que se verifica a
e itens. existência formal de uma lei no mundo jurídico.
Apresentação Material Mas não é apenas com a promulgação que a lei surtirá efeitos no
Os artigos representam as unidades básicas que contém os mundo jurídico. É necessário que esta tenha vigência, ou seja, que seus
enunciados das normas. São numerados por algarismos ordinais até o efeitos sejam sentidos pelos destinatários da norma.
número nove (Art. 1º, Art. 2º.... Art. 9º) e depois por números cardinais Assim, a partir da publicação (divulgação por órgão devidamente
(Art. 10, Art. 11, Art.12). Quando o artigo apresentar quaisquer divisões, a autorizado), é que a lei entrará em vigência. Contudo há regras a serem
parte que antecede a divisão se denomina caput. observadas.
Os artigos deverão apresentar uma linguagem clara e precisa, pois A Lei de Introdução ao Código Civil, art. 1º , disciplina que a lei
deverá atingir todos os destinatários da norma. É importante também, entrará em vigor 45 (quarenta e cinco dias) após a sua publicação.
abordar, de cada vez, apenas uma regra, de caráter mais geral, deixando
17

Dessa forma, esse lapso de tempo entre a publicação e a vigência, Conflito temporal de leis
é denominado vacatio legis, que, como regra geral, deverá ser O conflito de leis ocorre quando há dúvidas em relação à qual lei
respeitado. que deverá ser aplicada em determinada situação em virtude do tempo.
Entretanto, dependendo da lei, o legislador pode alterar o tempo da Em outras palavras, a dúvida se instaura pois o fato jurídico ocorreu
vacatio legis, ou até mesmo, deixar de observar qualquer prazo se assim na data X, quando uma determinada lei tinha vigência.
o definir, caso em que a vigência coincidirá com a publicação. Mas ocorre que, posteriormente, essa lei fora revogada, surgindo
Por outro lado, a revogação é o fenômeno pelo qual uma lei perde uma nova lei que disciplina o assunto em questão.
a sua vigência. Esse fenômeno deve ocorrer haja vista o dinamismo da Nesse caso haverá conflito entre qual a lei que deverá ser aplicada
vida social e a complexidade das relações, se fazendo necessárias sobre os efeitos de um fato que ocorreu na vigência de uma lei passada.
inúmeras adaptações da Ordem Jurídica. Vale dizer que a parte do Direito que trata da questão temporal
Uma lei perde sua vigência em algumas situações específicas, denomina-se Direito Intertemporal.
quais sejam: revogação por outra lei, desuso e decurso de tempo. Um dos princípios básicos desse ramo é o Princípio da
Quando for revogada por outra lei: nesse caso, a nova lei terá Irretroatividade das Leis, pelo qual uma lei presente ou futura não deverá
algumas opções, podendo revogar a totalidade do conteúdo da lei atingir fatos passados.
anterior, (resultando a ab-rogação) ou revogar tão somente alguma parte Esse princípio está consagrado pela Constituição da República
determinada (verificando a derrogação). Federativa do Brasil de 1988, no art. 5º, XXXVI, dentro dos direitos e
Poderá a nova lei, também, ser expressa quanto à revogação, garantias fundamentais do indivíduo.
dizendo claramente qual lei ou parte dela que perderá seus efeitos, ou Ressalta-se a importância desse princípio uma vez que assegura a
tácita, quando a lei nova não diz expressamente o que veio revogar, mas ordem e a Segurança Jurídica necessária a um Estado de Direito.
se mostra incompatível com a norma existente (lei posterior revoga a Salienta-se que, se uma lei presente ou futura, atingir fatos
anterior), ou a lei nova regulamenta a totalidade do assunto abordado em passados, estaria seriamente maculada a segurança dos indivíduos,
uma anterior (lei especial prevalece sobre lei geral). pois, o que antes era permitido, futuramente pode ser proibido, e o
Quando ocorre o desuso: ocorre quando a lei não é aplicada da indivíduo, que efetuou determinada relação com outro, sob o respaldo da
forma prevista, ou seja, a autoridade a quem incumbia garantir a lei, na época, ficaria prejudicado, se, futuramente a lei condenasse essa
observância da lei não a aplica. relação e seus efeitos.
Pode o desuso se dar, também, de forma espontânea, quando as Dessa forma, a regra geral é que as leis não retroagem, ou seja,
pessoas deixam, aos poucos, de observar a norma em suas relações não atingem fatos que ocorreram antes de sua vigência.
sociais. Contudo, a própria Ordem Jurídica elenca três situações em que a
As características do desuso são: a falta de observância da lei por lei poderá retroagir: em relação às leis de Direito Penal, quando forem
um considerável período de tempo, e que essa inobservância ocorra em beneficiar o réu (caso em que a lei nova não considera crime a conduta
todos os âmbitos de atuação da lei, expressando assim seu caráter pelo qual o mesmo está sendo acusado, ou esteja prevista uma pena
genérico. menor para a conduta); em relação às regras de interpretação, quando
Vale dizer que o Direito Brasileiro veda a repristinação, ou seja, auxiliarem na busca do real significado (mas se for trazer algum conceito
proíbe que uma lei que perdeu a sua vigência em virtude de outra, novo, não deverá retroagir), e, em relação às leis abolitivas, ou seja,
retorne a produzir seus efeitos se a lei que a havia revogado, por quando for excluída determinada instituição social ou jurídica, sendo
qualquer motivo, perder a sua vigência. essas, já incompatíveis com a moral e a ética social.
Em outras palavras, uma vez revogada, uma lei não mais poderá Em relação à nova lei, seus efeitos poderão ser imediatos quando
recuperar a sua vigência. se tratarem de normas processuais, relacionadas aos processos judiciais.
18

Pode-se dizer que normas cogentes são aquelas normas taxativas, local onde o indivíduo resida com ânimo definitivo, independente de sua
que devem ser cumpridas independente da vontade dos envolvidos, não nacionalidade (conforme art. 7º da Lei de Introdução do Código Civil
podendo as partes abrir mão de que quaisquer de seus preceitos sejam Brasileiro).
aplicados. Já o estatuto real, que envolve os bens e as relações decorrentes,
Já, as normas de Ordem Pública são aquelas que impõem devem se reger pela lei do local, ou seja, será aplicada a lei do Estado
aplicação obrigatória. onde os bens estiverem situados, de acordo com o princípio da
Conflito espacial de leis territorialidade (conforme art. 8º da Lei de Introdução do Código Civil
Cada Estado é soberano, ou seja, possui próprias normas que Brasileiro)
deverão ser aplicadas em todo o seu território. Art. 7° - A lei do país em que for domiciliada a pessoa determina as
Contudo, ante à complexidade das relações sociais, e a constante regras sobre o começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e
mobilidade do homem, podem surgir dúvidas a respeito de qual a norma os direitos de família.
aplicável numa determinada situação, que, por sua natureza, fez gerar
pontos de contato entre ordens jurídicas de diferentes Estados. Art. 8° - Para qualificar os bens e regular as relações a eles
Dessa forma, há normas que devem disciplinar esses conflitos, e concernentes, aplicar-se-á a lei do país em que estiverem situados.
esse ramo se denomina Direito Interespacial. Por fim o estatuto obrigacional, ou seja, aquele que se relaciona às
Os princípios basilares do Direito Interespacial são o da obrigações decorrentes das relações sociais, serão regidas pela lei do
territorialidade, ou seja, princípio pelo qual a norma de um determinado local da celebração do ato, sendo, dessa forma, considerado um estatuto
Estado deverá ser aplicada na totalidade de seu território; e o da misto (conforme art. 9º da Lei de Introdução do Código Civil Brasileiro)
extraterritorialidade, pelo qual se admitiria a aplicação da lei estrangeira Salienta-se que, o presente curso, fornece apenas uma visão geral
em situações excepcionais. desse assunto, pois que há particularidades que envolvem as regras de
Mas há de serem observados alguns critérios, pois a adoção de cada estatuto, e normas específicas de cada ramo de Direito para
quaisquer desses princípios deve ser cuidadosa, sob pena de, por um solucionar o conflito interespacial.
lado, ferir a soberania dos Estados, e por outro, inviabilizar a mobilidade Contudo, essas especificidades serão objeto de estudo mais
das relações humanas. aprofundado no ramo de Direito Internacional Privado.
Assim, existem dois critérios: o da nacionalidade, em que seria Art. 9° - Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do
utilizada a lei do Estado do estrangeiro, independente de onde ele se país em que constituírem.
encontrar, e o do domicílio, no qual a lei utilizada seria a do local onde a Hermenêutica X Interpretação
pessoa tenha domicílio, ou seja, resida com ânimo de ali permanecer. Primeiramente é importante dizer que hermenêutica e interpretação
Com base nesses critérios foi criada a Teoria dos Estatutos, são palavras distintas.
desenvolvida ao longo do tempo, e por vários Estados, afim de A hermenêutica pode ser considerada a arte de interpretar as leis,
solucionarem o conflito espacial. estabelecendo princípios e conceitos, que buscam formar uma teoria
Dessa forma, atualmente verifica-se a adoção de três estatutos: o adaptada ao ato de interpretar.
pessoal, o real e o obrigacional. Já a interpretação é de alcance mais prático, e se presta
As normas relativas às pessoas, ou seja, relacionadas ao começo e exclusivamente a entender o real sentido e significado das expressões
fim da personalidade, nome, capacidade e os direitos de família, estão no contidas nos textos da lei, utilizando os preceitos da hermenêutica.
rol das normas pertencentes ao estatuto pessoal. A hermenêutica é de grande importância para o Direito, que
Vale dizer que o estatuto pessoal determina que essas normas necessita de ser interpretado a todo o momento. O Direito não sobrevive
sigam o critério do domicílio, ou seja, que sejam aplicadas às regras do sem um bom trabalho de interpretação, baseado numa teoria sólida,
19

como a hermenêutica, haja vista que, nem sempre, as leis são totalmente Ressalta-se que há, também, a necessidade de se adaptar os
claras e precisas. velhos institutos à nova realidade, que muda a todo momento.
Ademais, o legislador, por mais perfeccionista que seja, não Dessa forma, verifica-se que o trabalho de interpretação possui,
consegue traduzir em palavras, de forma tão fiel, o espírito de uma lei, também, um caráter criativo.
seus objetivos e finalidades. Também, muitas vezes, escapa ao alcance Cumpre salientar que a interpretação pode ser de natureza prática,
do legislador o dinamismo e a complexidade presente nas relações quando se revela num contexto social concreto, auxiliando a atividade de
sociais, e dessa forma, a interpretação assume uma papel de extrema julgar, como também de cunho teórico, quando exerce um trabalho
importância. meramente elucidativo de conceitos e institutos, servindo de subsídio
Dessa forma, há de existir intérpretes que, mediante bons para o operador do Direito.
princípios, consigam buscar a vontade do legislador. Surge uma grande dúvida a respeito da atividade de interpretar,
Um bom intérprete, então, deve possuir três características para pois deverá o intérprete buscar a vontade da lei, ou deverá reconstruir a
exercer um bom trabalho, quais sejam: vontade exclusiva do legislador?
- probidade, que se explica pela integridade de caráter e Na Antigüidade o pensamento religioso era muito influente, e
imparcialidade quanto aos interesses pessoais; repercutia na sociedade, nos costumes e, também, no Direito.
- serenidade, que se revela pela tranqüilidade, necessária à Dessa forma, pensavam que a interpretação das normas deveria,
atividade de interpretar; tão somente, buscar a vontade da lei, que não era mera criação dos
- equilíbrio, que se materializa na firmeza e coerência da homens, mas fruto do pensamento divino.
interpretação. Assim, as leis, naquela época, se tornaram rígidas e imutáveis, e
- diligência, que pode ser explicada pelo cuidado despendido na esse fato colidia diretamente com a dinâmica da vida social, que
execução de determinada atividade, revelando assim a presteza na necessitava que o Direito se adaptasse às suas mudanças.
atividade de interpretar. Diante dessa dificuldade, os antigos, burlavam as normas.
Também é importante que o bom intérprete esteja sempre atento às As teorias ligadas à interpretação
mudanças que se operam, com o passar dos tempos, tanto na Passado o tempo, muito se discutiu a cerca da questão da
sociedade, quanto no Direito. interpretação, e assim, surgiram duas teorias que se baseiam em
É necessário, ainda, que esteja sempre receptivo a novas argumentos contrários para definir o trabalho do intérprete.
concepções, e não esteja preso aos velhos institutos e antigas teorias. A primeira delas é a Teoria Subjetiva, que se originou na França
A interpretação do Direito após a edição do Código de Napoleão. Essa teoria determina que, na
Pode-se dizer que interpretação do Direito se presta a uma dupla atividade de interpretar, o intérprete deve buscar a vontade do legislador,
função, vez que dedica a estabelecer o sentido das expressões, bem sendo fiel ao seu pensamento.
como aponta os limites de atuação da norma. Essa valorização ao pensamento do legislador se justificava pela
Para tal, é necessário desvendar qual a real vontade do legislador, confiança dos franceses no Código Napoleônico, que segundo eles, era
os valores e preceitos que ele quis defender, bem como a quem está perfeito e infalível.
dirigida a lei, ou seja, quais são os seus destinatários, fixando, assim, os Para isso, o intérprete deveria verificar apenas o significado das
limites de atuação da norma. palavras, para buscar o sentido do pensamento do legislador. Poderia,
Vale dizer que o intérprete não deve, exclusivamente, reconstituir o ainda, como auxílio para se chegar ao pensamento do legislador, utilizar-
pensamento do legislador, pois a lei, com seu caráter genérico, pode ser se do estudo histórico e da doutrina, de forma a revelar quais seriam as
mais abrangente que o próprio pensamento, envolvendo situações que principais influências para o legislador.
não foram, nem mesmo, imaginadas pelo o próprio autor.
20

Já a Teoria Objetiva, por sua vez, buscava a vontade da lei, pois o - Interpretação doutrinária: é aquela feita por mestres, juristas e
legislador, ao escrever uma lei, não estaria transcrevendo uma vontade especialistas do Direito. Esse tipo de interpretação normalmente é
sua, mas uma vontade maior, advinda da sociedade. encontrada em livros, obras científicas e pareceres jurídicos.
Dessa forma, o Direito não estaria preso aos velhos institutos, que - Interpretação jurisprudencial: é aquela que surge no ato de julgar,
poderiam ser facilmente adaptados à realidade, que é dinâmica e exige tendo como intérpretes os juízes e tribunais. Vale dizer que a
que o Direito a acompanhe. interpretação jurisprudencial deve se fixar em critérios, pré- estabelecidos
Outro fator que também afastou a teoria objetiva (busca da vontade pela lei, uma vez que o Poder Judiciário não poderá inovar contra os
do legislador) residia na dificuldade de determiná-la. preceitos da norma.
Isso porque é fácil descobrir a vontade do legislador num regime Elementos da Interpretação do Direito
totalitário, pois essa será única, do chefe de Governo; mas num regime Os elementos de interpretação auxiliam o intérprete, pois
democrático, no qual há a pluralidade de vontades traduzidas e apuradas estabelecem quais as prioridades que devem ser observadas quando for
em uma única lei, essa missão se torna muito mais difícil. desenvolver uma atividade de interpretação.
Afirmavam, ainda, que o legislador não poderia prever, no momento São eles: elemento gramatical, lógico, sistemático, histórico,
que faz a lei, qual será sua abrangência, pois a lei, como descreve uma teleológico.
conduta genérica, abstrata e impessoal, poderá ter um alcance muito O elemento gramatical determina que o intérprete avalie, em sua
mais amplo que as próprias intenções do legislador. atividade, o texto da lei, analisando as palavras e seus significados, para,
Interpretação quanto ao resultado e fonte assim, conseguir determinar o que a lei expressa.
A interpretação pode se classificar de acordo com o resultado Muitas críticas são feitas a esse elemento, pois, se por um lado
obtido pelo intérprete ou de acordo com a fonte da qual se originou. As pode ser benéfico à Segurança Jurídica, por outro, pode esconder o real
principais classificações são: sentido da norma, que pode estar além do sentido literal das palavras
Quanto ao resultado, a interpretação pode ser: escritas.
- declarativa, quando foi verificado que o legislador utilizou, de O elemento lógico, por sua vez, como seu próprio nome induz,
forma adequada e correta, todas as palavras contidas na lei, ocorrendo destina-se a interpretar, mediante um pensamento lógico e racional, no
exata equivalência entre os sentidos e a vontade presente na lei; qual se analisa a coerência do texto da lei.
- restritiva, quando a lei possui palavras que ampliam a vontade da É importante dizer que esse elemento procura verificar o sentido da
lei, e a interpretação acaba reduzindo esse alcance; norma, analisando a sua estrutura, sua colocação no Ordenamento
- extensiva, quando a lei carece de amplitude, ou seja, diz menos jurídico, bem como os motivos de sua edição, sendo todos esses
do que deveria dizer, devendo o intérprete verificar qual os reais limites caminhos, uma forma de subsídio para o intérprete buscar a lógica.
da norma. O elemento sistemático caracteriza-se por valorizar o Ordenamento
Já, quanto à fonte, a interpretação pode ser: Jurídico como um grande sistema, ou seja um todo unitário.
- autêntica: A interpretação autêntica ocorre quando o próprio órgão As partes do Ordenamento Jurídico (ramos, matérias, normas e
responsável pela edição da norma, edita outra, com função meramente dispositivos) não possuem sentido se analisadas isoladamente, tendo um
interpretativa. Dessa forma, essa nova norma irá surtir efeitos retroativos, significado coerente, somente se levado em conta toda a estrutura
ou seja, atingirá fatos passados, uma vez que sua função limitou-se a jurídica.
explicar o sentido da norma anterior. Já, por outro lado, se trouxer Cumpre salientar que o elemento sistemático utiliza também os
alguma alteração, ou modificação, seus efeitos não vão retroagir. pressupostos dos elementos gramatical e lógico, como forma de auxílio
para a interpretação.
21

Como resultado da interpretação sistemática, pode-se verificar a Substantivas - São aquelas que contêm uma regra de organização
existência de regras gerais, e suas exceções. Dessa forma, pode-se ou de comportamento.
verificar quais as normas impositivas ou dispositivas, principais ou São as chamadas leis de fundo, como as que compõe o Código
acessórias, e as gerais ou particulares. Civil, Código Penal, etc.
O elemento histórico, por sua vez, como o próprio nome indica, Adjetivas - São aquelas que contêm uma regra que estabelece a
compreende a idéia de interpretar verificando o contexto histórico, as forma pela qual o Estado, através do Poder Judiciário, aplica a sanção
instituições e preceitos de cada época, que levaram a formação de uma prevista nas leis substantivas. Contêm normas que determinam a forma
determinada lei. de resolver os conflitos de interesses submetidos ao Estado.
É importante, também, verificar, ao longo da história, a trajetória São normas de procedimento, como as contidas no Código de
das normas de Direito, pois o Direito resulta das adaptações e das Processo Civil, Código de Processo Penal.
mudanças sociais, objetivando satisfazer suas necessidades e anseios. 2. Quanto à origem:
Dessa forma, o estudo das antigas instituições é importante para Federais - São leis que emanam do Congresso Nacional (Senado e
uma melhor compreensão das normas atuais, que possuem em si uma Câmara dos Deputados) e têm aplicação em todo território nacional.
evolução gradativa de outros tempos. Estaduais - São leis originárias das Assembléias Legislativas
Por fim, o elemento teleológico, pode ser explicado como uma Estaduais, cuja aplicação se restringe ao território do respectivo Estado-
maneira de interpretar a lei, descobrindo suas finalidades e objetivos. Membro.
A palavra teleologia não tem nenhuma relação com qualquer Municipais - São leis originárias das Câmaras de Vereadores, cuja
preceito religioso, mas significa a doutrina a cerca das causas finais, ou aplicação se restringe ao território do respectivo Município.
seja, que busca explicar as coisas pelo fim a que são destinados. 3. Hierarquia da lei
Dessa forma, o elemento teleológico interpreta a lei em função de No caso do Brasil, um Estado Federativo constituído de unidades
suas finalidades e objetivos. É importante determinar quais os pontos que políticas autônomas agregadas à União Federal, três são as fontes
a lei pretende preservar. originárias da LEI. Por essa razão e para se evitar o conflito de leis
Entretanto, as finalidades de uma lei devem se alterar com o passar originárias de unidades diferentes, que possam disciplinar diferentemente
dos tempos, em virtude das evolução da sociedade, e assim, caberá ao um mesmo fenômeno social, é que se preconizou uma ordem de
intérprete, revelar quais seriam essas novas finalidades, contanto que importância das Leis, evitando-se, assim os possíveis conflitos de Leis.
seja um trabalho sério e responsável, dentro dos princípios do próprio Essa hierarquia da Lei obedece a seguinte ordem:
Ordenamento Jurídico. Lei Constitucional Federal
Não poderá o intérprete atuar sem limites, pois caberá a ele, Lei Complementar e Ordinária Federal
exclusivamente, atualizar as finalidades da lei, sem agir em discordância Lei Constitucional Estadual
com ela. Lei Complementar e Ordinária Estadual
Lei Orgânica do Município
Classificação das leis Lei Complementar e Ordinária Municipal
As LEIS poderão ser classificadas sob diversos aspectos. Assim, uma Lei Estadual não pode contrariar os dispositivos de
Entretanto, vamos nos deter somente em dois: 1. quanto à natureza e, 2. uma Lei Federal e se isso ocorrer ela será inaplicável, ressalvados os
quanto à origem. casos de competência exclusiva dos Estados e Municípios. Uma Lei
Substantivas Federal estabelece o princípio a ser seguido pelas Leis de hierarquia
inferior que a ela devem coadunar-se.
1. Quanto à natureza:
22

Leis inconstitucionais são aquelas que entram em choque com Esta tramitação representa a segunda fase de elaboração e é
preceitos contidos na Constituição Federal, que é a lei que ocupa o topo denominada de Discussão e Votação. Ao chegar na Câmara dos
da pirâmide da hierarquia das leis. Deputados, o projeto é submetido às Comissões Especializadas.
Comissões Especializadas - são colegiados formados por
Fases de elaboração da Lei Deputados Federais com o objetivo de analisar projeto e emitir parecer
Para que possamos melhor entender as fases de elaboração da sob determinados aspectos específicos da Lei, para o qual a Comissão
leis, tomaremos como exemplo, as fases de elaboração de uma lei foi constituída.
ordinária no âmbito federal, que comporta duas Casas Legislativas Assim, por exemplo, haverá uma Comissão com o objetivo de
(Senado e Câmara dos Deputados), diferentemente do âmbito Estadual e verificar se o projeto de Lei não contraria dispositivos contidos na Lei
Municipal, que comportam apenas uma Casa Legislativa (Assembléia hierarquicamente superior. No caso da lei ordinária federal, verifica-se
Legislativa, no Estado e Câmara de Vereadores, no Município). que ela é hierarquicamente inferior à Constituição Federal. Essa
A elaboração da Lei Ordinária compreende uma série de atos que Comissão Especializada , na Câmara dos Deputados, é denominada de
devem ser praticados por determinados órgãos para a validade formal da Comissão de Constituição e Justiça e de Redação- CCRJ. Outras
lei. comissões existem como a Comissão de Direitos Humanos - CDH,
Comissão de Educação, Cultura e Desporto- CECD , Comissão de
Iniciativa é a faculdade de propor um projeto de Lei. É atribuída à Fiscalização Financeira e Controle – CFFC., etc.
pessoas ou colegiados. Nas Comissões Especializadas, o projeto de lei poderá receber
A iniciativa da Lei Ordinária, no âmbito federal compete: emendas. Após ser submetido às Comissões Especializadas e receber
ao Presidente da República os respectivos pareceres o projeto será enviado ao plenário, quando,
aos Senadores então ocorrerão os debates (discussão) e a votação. A aprovação do
aos Deputados Federais projeto de lei ordinária se dá por maioria simples ou relativa.
ao Procurador Geral da República Vamos aqui, abrir um parênteses para esclarecer os atributos da
às Comissões especializadas Maioria:
ao Supremo Tribunal Federal Maioria Simples ou Relativa - é a simples superioridade numérica
aos Tribunais Superiores de votos. A aprovação por maioria simples se dará se o projeto obtiver
aos cidadãos mais votos favoráveis do que contrários.
Maioria Absoluta - é número igual ou superior à metade do total
Comumente, a elaboração do projeto de Lei Ordinária Federal cabe dos votos, mais um voto. A aprovação por maioria absoluta se dará se o
ao Presidente da República, aos Senadores ou Deputados Federais. projeto obtiver pelo menos 50%+1 dos votos.
No caso do projeto de lei ser de iniciativa do povo, ele deverá ser Maioria Qualificada - é o número superior de votos ao da maioria
subscrito por, pelo menos, 1% dos eleitores, distribuídos por, pelo menos, absoluta, e poderá ser representada por 2/3, 3/5 dos votos. A aprovação
5 Estados da Federação, sendo que estes Estados deverão estar por maioria qualificada de 3/5, por exemplo, só ocorrerá se o projeto
representados por, pelo menos, 0,3 % de seus eleitores. obtiver a aprovação de, pelo menos, 3/5 dos votos.
Quorum - é o número mínimo de pessoas presentes para que uma
Discussão e Votação assembléia deliberativa seja considerada válida. Assim, quando um
Se o projeto de lei for, por exemplo, de iniciativa do Presidente da colegiado for constituído para tomar qualquer deliberação é indispensável
República, será encaminhado à Câmara dos Deputados, onde iniciará a fixação do quorum. A falta de quorum invalida a deliberação que , por
sua tramitação no Poder Legislativo. ventura, tenha ocorrido.
23

O projeto aprovado no 1° Turno de Discussão e Votação, será VETO - é a não aprovação, pelo Presidente da República, do
submetido ao 2° Turno de Discussão e Votação. Se for novamente projeto de lei já aprovado no Poder Legislativo. O veto poderá ser de
aprovado por maioria simples, estará aprovado na Câmara dos duas espécies: 1. total e, 2. parcial.
Deputados. 1. Veto Total - ocorre quando o Presidente da República não
No sistema bicameral as deliberações tomadas por uma das concorda com todo projeto de lei.
câmaras deverá ser submetida a outra, que funcionará como revisora. 2. Veto Parcial - ocorre quando o Presidente da República não
Por isso, o projeto de lei ordinária aprovado na Câmara dos Deputados é concorda com parte do projeto de lei. Não concorda, por exemplo, com
enviado ao Senado, onde, após passar pelas Comissões Especializadas um ou mais artigos.
e receber os respectivos pareceres, será submetido a mais um (1) turno A competência para a elaboração da Lei é do Poder Legislativo. A
de Discussão e Votação. Se aprovado pela maioria simples, neste único participação do Poder Executivo é para possibilitar o aperfeiçoamento da
turno de revisão, estará aprovado no Poder Legislativo. Lei. Esta participação se dá através da sanção e do veto, por esse
Arquivamento do projeto - o projeto de lei será arquivado se motivo, o direito de veto é limitado à apresentação de motivos
receber pareceres contrários de todas as Comissões Especializadas. justificadores. O veto deve sempre ser acompanhado das razões que o
Este é único caso em que as Comissões Especializadas têm força motivaram e, essas razões, limitam-se a dois argumentos:
deliberativa na elaboração da lei ordinária, uma vez que sua função Inconstitucionalidade do projeto ou ser ele contrário ao interesse público.
primária é emitir pareceres. Projeto Vetado - Ocorrendo o veto, total ou parcial, as razões do
Outra forma de arquivamento do projeto de lei é a não aprovação veto serão submetidas à apreciação do Câmara dos Deputados e do
pela maioria simples em qualquer um dos três turnos de votação - dois Senado. Se a maioria absoluta (50%+1 dos votos) de Deputados e
na casa iniciadora e um na casa revisora. Senadores não concordar com as razões do veto, este cairá, ou seja,
perderá seu efeito, e o projeto de lei é considerado aprovado tal como o
Execução foi originariamente no Poder Legislativo.
O projeto de lei aprovado no Legislativo é enviado ao Poder No caso do veto ser total e as razões do veto não caírem, o projeto
Executivo, que participa na elaboração da lei ordinária. Esta fase recebe será arquivado.
a denominação de fase da execução. Se o veto for parcial, serão desconsiderados, tão somente, os
artigos ou parágrafos vetados.
SANÇÃO - é a aprovação, no Poder Executivo, do projeto de lei já
aprovado no Legislativo. Promulgação - é a declaração de que o projeto de lei já percorreu
A sanção poderá ser de duas espécies: 1. expressa e, 2. tácita. todas as fases de elaboração e está pronto para entrar em vigor.
1. Sanção Expressa - ocorre quando o Presidente da República, A promulgação é a conseqüência necessária da sanção expressa.
representante do Poder Executivo, manifesta-se expressamente no Concordando com o projeto de lei, o chefe do Poder Executivo não
sentido de concordar com o projeto de lei já aprovado no Legislativo. poderá se furtar de promulgá-lo, pois é por meio da promulgação que se
confere força executória à Lei. É por isso que a sanção expressa vem
2. Sanção Tácita - ocorre quando o Presidente da República, não sempre acompanha da promulgação. “Sanciono e promulgo a presente
se manifesta, no prazo de quinze dias, a contar do recebimento do Lei”, despacha o Presidente da República.
projeto de lei já aprovado no Legislativo. Essa omissão tem como Nas hipóteses de sanção tácita e derrubada do veto, o Presidente
conseqüência a aprovação do projeto de lei. da República tem um prazo de 48 horas para promulgar a Lei. Caso não
o faça, a promulgação será efetivada pelo Presidente do Senado ou,
ainda, pelo Vice-Presidente do Senado.
24

ordinária, na fase da discussão e votação terá três turnos na mesma


Publicação - é o ato pelo qual se dá ciência às pessoas da casa legislativa.
existência da nova Lei.
É preceito de nosso Direito que não é lícito a ninguém deixar de Execução
cumprir a Lei alegando que não a conhece. “Se fosse possível escusar- A única diferença nesta fase nas leis estaduais e municipais está no
se de cumprir a Lei com a simples alegação de ignorância, a Norma fato de que o Poder Executivo é representado, respectivamente, pelo
deixaria de ter força e perderia a sua finalidade, contrariando, portanto, a Governador e pelo Prefeito.
ordem pública”
PROCESSO LEGISLATIVO
Vigência da Lei - é de fundamental importância sabermos o O processo legislativo é o conjunto de atos pré-coordenados
momento exato do início da vigência da lei, ou seja, a partir de que realizados pelos órgão legislativos, visando a criação de normas
momento ela passa a ser obrigatória e deve ser, por todos, cumprida. jurídicas.
A lei entra em vigor na data designada em seu próprio texto. O mais O processo legislativo, no âmbito federal, compreende a
comum é encontrarmos a seguinte expressão: “A presente lei entra em elaboração de:
vigor na data de sua publicação”. 1. Emendas à Constituição.
Entretanto, uma Lei publicada hoje poderá ter vigência no dia 1º de 2. Leis complementares à Constituição.
janeiro do ano próximo. 3. Leis Ordinárias.
Assim, teremos uma Lei que foi aprovada e publicada, mas 4. Leis Delegadas.
somente no dia 1º do ano seguinte terá vigência, ou seja, passa a ser 5. Resoluções.
obrigatória. Este lapso de tempo que decorre entre a publicação de uma 6. Decretos Legislativos.
lei e o início de sua vigência chama-se “vacatio legis”. 7. Medidas Provisórias.
Se, por qualquer motivo, a lei não determinar o início de sua 1. Emenda à constituição - é a lei de elaboração de forma
vigência, ela entrará em vigor 45 dias após sua publicação no território especial que tem por finalidade acrescentar ou modificar um dispositivo
nacional e 90 dias para aplicação fora do território nacional. da Constituição.
O projeto de Emenda à Constituição poderá ser de iniciativa:
Elaboração da Lei Ordinária Estadual e Municipal a)- De 1/3, no mínimo, dos membros da Câmara de Deputados ou
Após termos examinado as fases de elaboração da lei ordinária do Senado Federal b)- Do Presidente da República
federal, fica fácil entender as fases de elaboração da lei ordinária c)- De mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades
Estadual e Municipal. da Federação, manifestando-se cada uma delas, pela maioria relativa de
A elaboração dessas leis obedece as mesmas fases da lei ordinária seus membros.
federal: 1. iniciativa; 2. discussão e votação e 3. execução, que se A Emenda à Constituição será discutida e votada em cada Casa do
subdivide em sanção, veto, promulgação e publicação. Congresso Nacional, em dois turnos. Será considerada aprovada se
obtiver, em ambas as Casas, 3/5 dos votos dos respectivos membros.
Discussão e votação A Emenda à Constituição será promulgada pelas Mesas da Câmara
Diferentemente do âmbito federal, os Estados e os Municípios dos Deputados e do Senado, com o respectivo número de ordem. Após,
possuem uma só casa legislativa, respectivamente, Assembléia será publicada e entrará em vigor.
Legislativa e Câmara de Vereadores. Por esta razão, o projeto de lei Clausulas Pétreas - Denominam-se clausulas pétreas os
dispositivos constitucionais que não podem ser alterados por Emendas à
25

Constituição. Não será objeto de deliberação a proposta tendente a Gonçalves Ferreira Filho, as resoluções cuidam, geralmente, de assuntos
abolir: de interesse interno do Legislativo. Assim, por exemplo, a Resolução
a)- a forma federativa do Estado materializa a deliberação do Poder Legislativo quando este outorga
b)- o voto direto, secreto, universal e periódico poderes ao Presidente da República para elaborar uma Lei Delegada.
c)- a separação dos Poderes “Destinam-se os projetos de resolução, em regra, a regular matéria
d)- os direitos e garantias individuais de caráter político, administrativo ou processual, sobre o que deve o
órgão legislativo, pronunciar-se em casos concretos, tais como a perda
2. Leis complementares à Constituição - são leis que têm por de mandato, concessão de licença a parlamentar para desempenhar
finalidade complementar um dispositivo contido na Constituição, missão diplomática ou cultural, criação de Comissão Parlamentar de
regulamentando assunto nela contido. A própria Constituição, portanto, Inquérito ( CPI), etc.”
estabelece os casos em que deve haver a complementação.
Tomemos por exemplo o seguinte caso. “A Constituição estabelece: 6. Decretos Legislativos - São deliberações do Poder Legislativo
Art. 7ª - São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de a respeito de matéria de sua exclusiva competência. Não estão sujeitos à
outros que visem a melhoria de sua condição social: sanção ou veto presidencial e sua promulgação é feita pelo presidente do
I- relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem Senado Federal.
justa causa, nos termos da lei complementar, que preverá indenização O Decreto Legislativo abrange as matérias de competência
compensatória, dentre outros direitos”. exclusiva do Congresso Nacional, enumeradas no artigo 49 da
A Lei complementar à Constituição possui uma única diferença com Constituição Federal. Dentre elas citamos, a título de exemplo:
relação as fases de elaboração da Lei Ordinária. Esta diferença está na a)- Autorizar o Presidente e o Vice-Presidente da República a se
Votação. Enquanto a lei ordinária é aprovada por maioria simples de ausentarem do País, quando a ausência exceder a quinze dias.
votos, a Lei Complementar será aprovada por maioria absoluta de votos.” b)- Resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos
internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao
3. Leis Ordinárias - São leis criadas com o objetivo de disciplinar patrimônio nacional;
os casos comuns, ou seja, aqueles que o legislador constitucional não c)- Autorizar o Presidente da República declarar guerra, celebrar a
determinou que fossem disciplinados por leis especiais. paz, permitir que forças estrangeiras transitem pelo território nacional ou
que nele permaneçam temporariamente, ressalvados os casos previstos
4. Leis Delegadas - São leis elaboradas pelo Presidente da em lei complementar.
República, em razão da delegação de poderes feita pelo Poder
Legislativo. 7. Medidas Provisórias - São normas criadas pelo Presidente da
Delegação é a transferência temporária e excepcional de poderes República em casos de relevância e urgência. Essas normas entram em
que um órgão faz a outro. Com a delegação legislativa, o Congresso vigor de imediato, após a publicação.
transfere ao governo (Poder Executivo) a competência de editar atos 1. quanto à matéria.
materialmente legislativos, tendo a eficácia de lei formal. Não poderão ser editadas medidas provisórias que versem sobre
As leis delegadas são equiparadas às leis ordinárias, pelas quais as seguintes matérias:
podem ser alteradas ou revogadas. a)- nacionalidade, cidadania, direitos políticos, partidos políticos e
direito eleitoral;
5. Resoluções - São atos deliberativos do poder legislativo, com b)- direito penal, processual penal e processual civil;
caráter administrativo ou político. Nas palavras do prof. Manoel
26

c)- organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a


carreira e a garantia de seus membros; RETROATIVIDADE DA LEI
d)- planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamento e Em princípio, a Lei é editada para regular situações futuras, que
créditos adicionais e suplementares, ressalvado crédito extraordinário irão ocorrer durante seu período de vigência. O passado escapa ao seu
para atender despesas imprevisíveis e urgentes, como as decorrentes de comando.
guerra, comoção interna ou calamidade pública; Contudo, em casos especialíssimos, a Lei pode retroagir, desde
e)- que vise a detenção ou seqüestro de bens, de poupança que haja disposição legislativa expressa. Para melhor compreendermos a
popular ou qualquer outro ativo financeiro; retroatividade da lei, necessário se faz dividir o conjunto de leis em dois
f)- matéria reservada à lei complementar; grupos: 1. leis penais e, 2. as demais leis.
g)- já disciplinada em projeto de lei aprovado pelo Congresso 1. Com relação à Lei Penal:
Nacional e pendente de sanção ou veto do Presidente da República. A Constituição, em seu art. 5°, item XL, estabelece:
“A lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu.”
2. quanto à eficácia. Tomando como exemplo o crime de homicídio, verificamos que o
A medida provisória não convertida em lei no prazo de sessenta art. 121 do Código Penal estabelece que matar alguém é crime e a pena
dias, contados de sua publicação, perderá sua eficácia desde a edição. A será de 6 a 20 anos de reclusão. Suponhamos que alguém tenha
contagem desse prazo fica suspensa durante os períodos de recesso do cometido um homicídio e tenha sido condenado à pena máxima de 20
Congresso Nacional. anos de reclusão. Se, no decorrer do cumprimento da pena, entrar em
Na hipótese da medida provisória não ser aprovada ou de perder a vigor uma nova lei
eficácia pelo decurso de prazo, o Congresso deverá, por Decreto que altere a pena para homicídio, estipulando reclusão de 4 a 10
Legislativo, disciplinar as relações jurídicas por ela produzida. anos, esta lei retroagirá seus efeitos por beneficiar o réu. Assim, basta ao
réu condenado anteriormente à pena máxima de 20 anos, que cumpra,
3. quanto à reedição. agora, a pena máxima de 10 anos.
A medida provisória não poderá ser reeditada na mesma sessão 2. Com relação às demais leis
legislativa que tenha sido rejeitada ou que tenha perdido sua eficácia por “A lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a
decurso de prazo. Sessão legislativa é o período do ano em que os coisa julgada.”
órgãos integrantes do legislativo realizam sessões. Resta saber, portanto, o significado de “direito adquirido”, “ato
jurídico perfeito” e “coisa julgada”. A Lei de Introdução ao Código Civil,
4. quanto ao processo de apreciação no legislativo. art. 6°, nos fornece tais conceitos.
Inicialmente a medida provisória será submetida a uma Comissão Direito Adquirido - Consideram-se adquiridos os direitos que o seu
mista de Deputados e Senadores que a examinará e emitirá um parecer. titular, ou alguém por ele, possa exercer, tais como aqueles cujo começo
Em seguida será enviada à Câmara dos Deputados onde iniciará do exercício tenha termo prefixo, ou condição preestabelecida inalterável
sua votação. Antes de se apreciar o mérito da medida provisória deverá a arbítrio de outrem.
se apreciado as condições constitucionais de sua admissibilidade, que “Direito adquirido é a vantagem jurídica, líquida, certa, lícita,
são a relevância e urgência. concreta, que a pessoa obtém na forma de lei vigente e que se incorpora
Se a medida provisória não for apreciada em até quarenta e cinco definitivamente e sem contestações ao patrimônio de seu titular, não lhe
dias contados de sua publicação, entrará em regime de urgência, em podendo ser subtraída pela vontade alheia, inclusive dos entes estatais e
ambas as Casas Legislativas, ficando assim sobrestadas todas as seus órgãos.
demais deliberações legislativas até que se ultime sua votação.
27

Ato Jurídico Perfeito - Reputa-se ato jurídico perfeito àquele já Interpretação Autêntica - É a interpretação feita pelo próprio
consumado segundo a lei vigente ao tempo que se efetuou. legislador. Essa interpretação nos é transmitida pelo próprio texto legal.
O Direito Brasileiro estabelece o princípio de que uma lei nova não Citamos, como exemplo, o crime de violação de domicílio, definido
pode alcançar um ato jurídico perfeito. Como exemplo, citamos a no art. 150 do Código Penal:
manifestação do Supremo Tribunal Federal: “Entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a
“Tratando-se de contrato legitimamente celebrado, as partes têm o vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou em
direito de vê-lo cumprido, nos termos da lei contemporânea ao seu suas dependências.”
nascimento, e regular inclusive seus efeitos.
Os efeitos do contrato ficam condicionados à lei vigente no QUANTO AO PROCESSO
momento em que foi firmado pelas partes.” Interpretação Gramatical ou literal - É aquela em que o intérprete
Coisa Julgada - Chama-se coisa julgada ou caso julgado a analisa o significado de cada uma das palavras de que é composto o
decisão judicial de que já não caiba recurso. texto interpretado.
Interpretação sistemática - É aquela em que o intérprete compara
o texto, interpretado gramaticalmente, com outros textos de lei, a fim de
INTERPRETAÇÃO DA LEI harmonizá-lo com o sistema jurídico.
Interpretar é o processo lógico pelo qual se determina o sentido da QUANTO AO RESULTADO
lei. Interpretar é procurar o pensamento, o alcance do texto, a vontade da Interpretação restritiva - A interpretação é restritiva quando o
lei. intérprete chega à conclusão que o legislador disse mais do que queria
É evidente que o legislador, por mais cauteloso e previdente, jamais dizer, por isso, deve-se restringir o alcance do texto interpretado.
poderá prever todos os possíveis casos que o juiz será chamado a Interpretação extensiva - A interpretação é extensiva quando o
resolver. O Juiz, por sua vez, ainda que a lei seja omissa, terá que decidir intérprete conclui que o legislador disse menos do que queria dizer, desta
a questão que lhe é submetida à julgamento. Deve, portanto, o Juiz suprir forma deve-se alargar o alcance do texto interpretado.
as lacunas da lei, recorrendo à várias normas. Essas normas constituem Interpretação declarativa - A interpretação é declarativa quanto o
o que se chama de hermenêutica, que é o campo do Direito que estuda a intérprete conclui que a letra da lei corresponde exatamente ao
interpretação das leis. A interpretação das leis pode ser examinada sob pensamento do legislador.
três aspectos diferentes, representados no seguinte quadro:
QUANTO ÀS SUAS FONTES
Interpretação Judiciária - É aquela que é feita pelo Poder O Estado - Conceito
Judiciário quando da solução de um conflito de interesse que lhe é Da mesma forma que o Direito, o Estado é uma criação humana
submetido. Esta interpretação nos é transmitida através das sentenças, destinada a manter a coexistência pacífica dos indivíduos, de forma que
acórdãos, súmulas etc. os seres humanos consigam se desenvolver, e proporcionar o bem estar
Interpretação Doutrinária - É a interpretação elaborada pelos a toda sociedade.
estudiosos do Direito (doutrinadores ) sem qualquer preocupação de dar É o Estado o responsável por dar força de imposição ao Direito,
solução a um conflito em particular. pois é ele que detém o papel exclusivo de aplicar as penalidades
Tomamos conhecimento dessa interpretação através dos livros previstas pela Ordem Jurídica.
editados pelos doutrinadores, artigos em revistas especializadas, Assim, o Estado pode ser definido como o exercício de um poder
conferências, etc. político, administrativo e jurídico, exercido dentro de um determinado
território, e imposto para aqueles indivíduos que ali habitam.
28

Os elementos que caracterizam o Estado são: - Lei em sentido amplo: por essa classificação a expressão lei
- População: entende-se pela reunião de indivíduos num poderia ser utilizada em sentido abrangente, pois todo e qualquer ato que
determinado local, submetidos a um poder central. O Estado vai controlar descrever e regular uma determinada conduta, mesmo que esse ato não
essas pessoas, visando, através do Direito, o bem comum. A população vier do Poder Legislativo, seria considerado como lei. É o caso das
pode ser classificada como nação, quando os indivíduos que habitam o medidas provisórias, sendo atribuição do Presidente da República, que,
mesmo território possuem como elementos comuns a cultura, língua, a diante de uma situação de urgência e relevância, edita uma norma, para,
religião e sentem que há, entre eles, uma identidade; ou como povo, somente depois, passar pela avaliação do Poder Legislativo.
quando há reunião de indivíduos num território e que apesar de se - Lei em sentido estrito: por essa classificação, a expressão lei
submeterem ao poder de um Estado, possuem nacionalidades, cultura, somente poderia ser assim considerada quando fosse fruto de
etnias e religiões diferentes. elaboração do Poder Legislativo e contasse com todos os requisitos
- Território: espaço geográfico onde reside determinada população. necessários. Esses requisitos são formais ou materiais; os primeiros se
É limite de atuação dos poderes do Estado. Vale dizer que não poderá relacionam com o processo de elaboração dentro do Poder Legislativo; já
haver dois Estados exercendo seu poder num único território, e os os segundos dizem respeito ao conteúdo, por ser uma descrição de uma
indivíduos que se encontram num determinado território estão obrigados conduta abstrata, genérica, imperativa e coerciva.
a se submeterem. - Lei em sentido formal: são aquelas leis, que, embora sejam fruto
- Soberania: é o exercício do poder do Estado, internamente e de um correto processo de elaboração, há falha de conteúdo, por não
externamente. O Estado, dessa forma, deverá ter ampla liberdade para descrever uma conduta genérica, abstrata, imperativa e coercitiva.
controlar seus recursos, decidir os rumos políticos, econômicos e sociais - Lei em sentido formal- material: são aquelas leis que respeitam
internamente e não depender de nenhum outro Estado ou órgão tanto os requisitos de forma, como os requisitos de conteúdo.
internacional. A essa autodeterminação do Estado dá-se o nome de - Lei substantiva: são aquelas que regulam os direitos e obrigações
soberania. dos indivíduos, nas relações entre estes e o Estado, e entre os próprios
Fontes do Direito indivíduos. Normalmente são do conhecimento de todos.
O estudo das fontes do Direito é importante, pois, através dele, é - Lei adjetiva: aquelas que estabelecem regras relativas aos
que se identificam quais são as origens do fenômeno jurídico, de forma a procedimentos, e devem ser de conhecimento mais específico dos
perceber como se deu o surgimento desse fenômeno. advogados e juizes por se referirem aos processos.
Pode-se fazer distinção entre os diversos tipos de fontes, que - Lei de ordem pública: regulam os principais interesses da
podem se classificar em: fontes históricas (estudo dos fatores históricos sociedade; são suas normas fundamentais e que preservam o interesse
que poderão influir no processo de formação do Direito, que se dá pela e bem comum de toda a coletividade.
verificação de documentos e textos antigos); fontes materiais (diz Devem ser respeitadas não pela vontade individual de cada
respeito ao conteúdo, existindo um estudo apurado sobre os diversos pessoa, mas pelo seu caráter fundamental e obrigatório de suas regras.
fatos sociais que influenciam na formação do Direito); e fontes formais Fontes do Direito
(estudo das principais formas de exteriorização das normas de Direito Em tempos mais antigos, os costumes, ou seja, as práticas sociais
como a lei). mais freqüentes, influenciavam de maneira concreta o Direito, sendo,
A lei, que advém de atos do Poder Legislativo, visa disciplinar inclusive, sua maior fonte.
condutas objetivando o melhor interesse da coletividade, de forma a Entretanto com o passar dos tempos, principalmente a partir do
proporcionar uma coexistência pacífica entre os membros da sociedade. século XIX, o Direito iniciou-se por um processo de intensa codificação,
Pode-se dizer que há classificações importantes, que se no qual as leis deixaram ser tidas apenas nos usos e costumes sociais,
diferenciam as leis em: para serem escritas em leis, e organizadas em Códigos.
29

O costume, diferentemente do Direito, é criação espontânea da Art. 4° - Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo
sociedade, sendo o resultado dos acontecimentos sociais. Vale dizer que com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.
os costumes baseiam-se nos valores morais da sociedade, relativos ao - Costume Contra Legem: é o costume que contraria a lei, e nessa
bom senso e ao ideal de Justiça. classificação faz surgir um grande problema sobre a validade e
Cumpre salientar que o costume surge diante da prática reiterada importância dos costumes.
de uma determinada conduta, ou seja, em casos semelhantes, as Cumpre salientar que, em cada ramo do Direito, os costumes
pessoas sempre vão agir de uma determinada forma, e é na ocorrência possuem caráter mais ou menos abrangentes, dependendo das leis, que
de muitas situações parecidas é que os costumes se tornam válidos. vão definir o valor e importância dos costumes em cada matéria.
Os costumes seriam, então, paradigmas, ou seja, serviriam de Por fim, pode-se dizer que os costumes, quando alegados, poderão
modelo para os acontecimentos posteriores, e na decorrência do tempo, ser comprovados por várias formas, dentre elas verifica-se a prova
acabam por constituir um hábito. testemunhal ou documental, dependendo do que a lei estipular em cada
A força gerada pelos costumes sociais é absorvida pelo Direito, ramo.
possuindo, dessa forma, a mesma coercitividade e imposição de uma lei Registra-se, ainda, que os costumes, diferentemente das leis,
escrita, e ao Estado caberá garantir que os costumes sejam observados. conspiram contra o Princípio da Segurança Jurídica, pois os usos e
Assim, os costumes vão integrar o que se chama Direito costumes podem variar dentro de um mesmo Estado que possua
Consuetudinário, que é o Direito estabelecido com base nos costumes. grandes extensões, deixando os indivíduos sem a necessária certeza
É importante dizer que, para que os costumes possuam força que deve nortear as relações jurídicas.
jurídica, é indispensável que estejam estabelecidos na Ordem Jurídica do A jurisprudência
Estado, sendo parte do Direito, ou seja, integrando as fontes do Direito. O Poder Judiciário tem como função principal, a aplicação do
Outro aspecto é que os costumes devem se apresentar como Direito, julgando, diante de uma determinada situação, qual lei será
prática usual e freqüente, sendo essa conduta observada pelo indivíduo aplicada e de que forma ela irá influir no caso concreto. Assim, as
na crença de ser essa obrigatória, como se fosse um dever jurídico. decisões judiciais influenciam o Direito.
Em outras palavras, para que seja considerado costume, deverá a A jurisprudência, então, pode ser conceituada como as decisões
prática ser uniforme, constante, necessária e obrigatória, requisitos esses uniformes e reiteradas dos tribunais, ou seja, os tribunais (instâncias
apontados pela maioria dos autores jurídicos. superiores) entendem que situações semelhantes devem ser decididas
Classificação dos costumes da mesma maneira, tendo em vista que um grande número de situações
Os costumes podem ser: semelhantes já forma solucionadas da mesma forma.
- Costume Secundum Legem: os costumes contidos nessa Seria, pois uma tendência de decidir do mesmo jeito.
classificação seriam aqueles que retratam prática idêntica ao Vale dizer que, da mesma forma que os costumes, a jurisprudência
comportamento exigido pela lei. Seria o costume correspondente à pode ser classificada dependendo de como atua em relação à lei. Assim,
vontade da lei. a jurisprudência poderá se dar de acordo com que a lei determina,
- Costume Praeter Legem: segundo essa classificação, os poderá ser observada na falta ou omissão de lei, e ser contrária à lei.
costumes seriam utilizados no caso de lacunas na lei, ou seja, diante da Apesar da semelhante classificação, a jurisprudência em muito se
inexistência de uma lei específica para regular determinada situação, diferencia dos costumes. Enquanto que os costumes surgem
poderá ser observados os costumes correntes na região. espontaneamente e advém das práticas sociais, a jurisprudência é uma
A Ordem Jurídica brasileira prevê a observância dos costumes no criação específica do Poder Judiciário, que deve aplicar a lei ao caso
caso de omissão legal, que está descrito no art. 4º da Lei de Introdução concreto, quando for devidamente provocado, ou seja, quando as partes
ao Código Civil. solicitarem um provimento judicial.
30

Alguns autores indicam que a jurisprudência não cria o Direito, sob - Atualização dos conceitos e institutos para estar sempre em
pena de o Poder Judiciário invadir uma função que seria do Poder contato com a dinâmica realidade, que muda a todo o tempo.
Legislativo. Dessa forma, a jurisprudência teria o papel predominante e - a sistematização e organização de todo o conteúdo do Direito,
exclusivo de interpretar o Direito, auxiliar o operador do direito a entender agrupando-o em de forma coerente e lógica, pois será através da divisão
as decisões passadas, e servir de subsídio para a vida jurídica. dos vários ramos e espécies de normas, é que será possível total
Outro aspecto a ser abordado diz respeito à força da jurisprudência compreensão da Ordem Jurídica.
sobre o Poder Judiciário. Pode-se dizer que a jurisprudência é uma - Estabelecer críticas ao objeto de estudo, devido ao senso jurídico
tendência, mas não deve e nem pode aprisionar os juizes a decidirem e crítico que deve possuir o jurista; de forma que mediante debates se
conforme o que já foi decidido anteriormente. Caberá ao juiz, como chegue a uma correta proposição.
aplicador da norma jurídica, interpretá-la segundo suas próprias - Verificar maneiras para aperfeiçoar o Direito, de que forma que
impressões, livres de qualquer imposição. vez cada mais esteja voltado para os seu fim maior: a Justiça;
Já, nos tribunais, quando verificados posicionamentos contrários, Dessa forma, percebe-se que a doutrina jurídica possui uma
configurando-se, assim, divergências na jurisprudência, esse fato poderá importância fundamental para o Direito, influenciando de maneira indireta
ser questionado pelo interessado. na elaboração das leis e nos julgamentos, pois fornece pontos de apoio
Houve a idéia da súmula vinculante, que consiste na imposição, tanto ao legislador e ao juiz, em suas atividades intelectuais.
com força de lei, da jurisprudência para as instâncias inferiores, Ao defender uma causa em juízo, o advogado deve atuar de forma
impedindo, assim, as milhares de ações em andamento nos tribunais. a convencer o juiz de seus argumentos e, para isso, deve fazer uma
Contudo, essa idéia sofreu inúmeras críticas por atentar contra a disposição lógicas dos fatos e fundamentos de seu pedido.
liberdade de interpretação do Direito. Para auxiliar o advogado nessa árdua missão de convencer, poderá
A doutrina também pode ser chamada de Direito Científico, e ser utilizado o argumento de autoridade, que consiste na citação das
consiste nos estudos desenvolvidos pelos vários juristas, que objetivam opiniões e estudos de juristas conceituados, para servir de subsídio ao
entender e explicar todos os temas relativos ao Direito. juiz, demonstrando que os argumentos utilizados pelo advogado são
Buscam explicação e a correta interpretação dos vários institutos e coerentes e lógicos, haja vista não está sozinho em determinado
normas, de forma a se obter uma real compreensão de todo o mundo entendimento. A utilização do argumento de autoridade poderá auxiliar o
jurídico, servindo de auxílio e subsídio para os que se aventuram nessa juiz a decidir com maior segurança.
área do conhecimento humano. É importante lembrar que a doutrina, enquanto criação humana,
Para que se possa desenvolver esse estudo, o jurista deve ter uma poderá conter alguns equívocos, e, devido a esse fato, não é prudente se
índole livre, ou seja, deve possuir um pensamento não comprometido atribuir um caráter absoluto a tudo que se lê e se ouve, haja vista que na
com os preconceitos e pressupostos, para que, assim, possam surgir própria doutrina existem vários temas ainda sem um entendimento
concepções inéditas. consolidado.
O jurista deverá, também, contar com vasto conhecimento a cerca Formas de manifestação da doutrina jurídica
do Direito, pois somente aquele que conhece é capaz de estabelecer A doutrina poderá se manifestar, basicamente, por dois grandes
conceitos e críticas, tendo em mente a sua responsabilidade na produção modelos: modelo alemão e modelo francês.
de um trabalho sério e que contribuirá para o mundo jurídico. O modelo alemão consiste na doutrina feita mediante comentários,
A doutrina jurídica possui como funções no mundo jurídico: ou seja, a medida que se faz o estudo de determinada lei ou código, são
- o estudo aprofundado das principais normas e princípios do feitos comentários, normalmente sendo artigo por artigo, sendo indicado
Direito; o significado daquele preceito, as características e a posição da
jurisprudência a respeito do tema abordado.
31

Já o modelo francês não faz esse estudo isolado, mas, a doutrina é integração da norma, de forma que a falha será preenchida com
organizada na forma de uma abordagem sistêmica e conceitual de toda a elementos contidos na própria Ordem Jurídica ou por princípios jurídicos,
estrutura jurídica, estabelecendo os princípios e pressupostos pertinentes utilizados de acordo com a lógica e o bom senso.
ao tema. Assim o processo de integração das normas jurídicas se dará pela
Há uma exposição lógica e coerente do tema, iniciando-se com analogia e Princípios Gerais de Direito.
introdução, que serve de preparação ao aprofundamento do tema, Vale dizer que os processos de integração da norma não podem
desenvolvimento, momento em que o estudo apresenta as ser classificados como fontes do Direito, vez que não criam regras e
particularidades do assunto abordado, e a conclusão, com a opinião do normas, mas tão somente auxiliam o operador do Direito a descobrir a
jurista a respeito do tema. norma aplicável.
Na doutrina brasileira, há traços dos dois modelos citados, existindo Há várias teorias sobre a existência de lacunas ou omissões da lei,
grandes livros que exploram a totalidade de um conteúdo, explicando os mas prevalece a noção de que o Ordenamento Jurídico é pleno, ou seja,
vários institutos, e também há um vasto número de códigos e leis nele estão contidas todas as respostas para as situações, por mais
comentadas. complexas que sejam.
Pode-se dizer que há, ainda, a doutrina feita por verbetes, úteis Dessa noção nasce um princípio, de que, independente do caso
para consultas que exigem uma resposta rápida e objetiva e também na concreto que o juiz for apreciar, ele não poderá deixar de julgar alegando
forma de comentários à jurisprudência. que não há lei específica para aquele caso, ou que ela é omissa.
o próprio Ordenamento é que se encontram todas as respostas
Formas de integração do Ordenamento Jurídico para as mais variadas situações.
Apesar do processo de elaboração das normas jurídicas ser Se assim fosse permitido, não haveria Segurança Jurídica, pois as
bastante planejado e organizado, o legislador não conseguirá prever toda pessoas não teriam a certeza de que seus litígios seriam devidamente
a realidade, que é rica e dinâmica. solucionados quando recorressem ao Poder Judiciário.
Dessa forma, as leis podem apresentar algumas deficiências ou Dessa forma, diante de uma lacuna na lei, o operador do Direito
falhas, por não estarem totalmente adaptadas às novas situações que poderá utilizar os procedimentos de integração na norma, como a
surgem no dia-a-dia. analogia, que pode ser definida como a utilização de uma norma "X", que
Essas falhas se dão na forma de lacunas ou omissões na lei, que apresente semelhanças diante de um caso concreto, para o qual não
podem ser verificadas quando não há informações suficientes na lei que haja regra específica.
resolvam o caso concreto, ou quando a própria lei deixa a cargo do juiz Vale dizer que entre o caso concreto e a lei a ser utilizada, deve
decidir, com base em seus critérios e convicções. existir semelhanças essenciais, além de apresentar as mesmas
Outra situação de lacuna ou omissão pode ser verificada quando motivações.
há contradições de preceitos na própria lei, ou quando há leis que A analogia existe para dar harmonia e coerência ao Ordenamento
contrariam umas às outras, sendo essa uma situação mais difícil de Jurídico, pois, utilizando a norma numa situação semelhante ao que ela
ocorrer. descreve, o Ordenamento Jurídico apresentará, em si próprio, a solução
Assim, verifica-se lacuna ou omissão na lei quando a criação de para o caso concreto, não sendo necessário recorrer a soluções alheias
novas leis não conseguem acompanhar as mudanças sociais, ou quando à Ordem Jurídica.
as normas apresentam um acentuado grau de abstração, não se É importante dizer, também, que a analogia fornece igualdade de
encaixando em nenhuma situação concreta. tratamento, pois as situações semelhantes serão disciplinadas da mesma
A solução existente na Ordem Jurídica para resolver o problema forma.
das lacunas ou omissões da lei se dá mediante um processo de
32

É importante dizer que a analogia deverá ser utilizada somente Art. 62 (...) § 7º Prorrogar-se-á uma única vez por igual período a
após um cuidadoso estudo a respeito das semelhanças entre a norma e vigência de medida provisória que, no prazo de sessenta dias, contado
o caso concreto. de sua publicação, não tiver a sua votação encerrada nas duas Casas do
O processo de elaboração das leis Congresso Nacional.
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, a norma quando a proposta do projeto de lei for de iniciativa do cidadão, há
mais importante do país, estipula o processo de elaboração das leis, que de ser observados alguns requisitos essenciais, como a assinatura de
possui vários passos até que a lei esteja pronta. 1% (um por cento) eleitorado nacional, conforme a regra do art. 61, §2º
Essas regras estão nos artigos 59 a 69 da CF/88. da CF/88.
Primeiramente é importante identificar quem poderá apresentar um Dessa forma, cada um dos indicados no art. 61, poderá enviar seu
projeto de lei, conforme descrito na CF/88, artigo 61: projeto de lei para que seja avaliado pelas comissões do Senado Federal
- Os membros da Câmara dos Deputados, do Senado Federal e do e Câmara dos Deputados, que formam as duas casas do Congresso
Congresso Nacional; Nacional.
- O Presidente da República Art. 61 (...) § 2º - A iniciativa popular pode ser exercida pela
- O Supremo Tribunal Federal apresentação à Câmara dos Deputados de projeto de lei subscrito por, no
- Os Tribunais Superiores mínimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por
- O Procurador Geral da República cinco Estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores
- Cidadãos de cada um deles.
Pode o Presidente da República editar medidas provisórias, que Depois de avaliado, o projeto seguirá para a discussão e votação.
possuem força de lei e que deverão passar imediatamente pelo Vale dizer que as duas casas do Congresso Nacional se revezam, pois,
Congresso Nacional (art. 62 da CF/88). se um projeto for avaliado pelo Senado Federal, a Câmara dos
Deputados revisará o projeto, e, sendo avaliado pela Câmara dos
Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da Deputados, seguirá para o Senado Federal exercer o papel de revisor do
República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo projeto.
submetê-las de imediato ao Congresso Nacional. Ressalta-se que há alguns projetos que devem obrigatoriamente
Deve-se atentar ao fato de que a medida provisória somente passar primeiro pela Câmara dos Deputados, sendo esses de iniciativa
poderá ser editada em caso de relevância e urgência, e esta perderá sua do Presidente da República, do Supremo Tribunal Federal e dos
eficácia, se não for convertida em lei no prazo de 60 (sessenta) dias, Tribunais Superiores terão início na Câmara dos Deputados, conforme
conforme o art. 62, §3º da CF/88. Observa-se que caso a votação da preceitua o art. 64 da CF/88.
medida provisória não esteja encerrada até o prazo de 60 (sessenta) Art. 64. A discussão e votação dos projetos de lei de iniciativa do
dias, poderá este prazo ser prorrogado por mais 60 (sessenta) dias, regra Presidente da República, do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais
estabelecida pelo artigo 62, §7º da CF/88. Superiores terão início na Câmara dos Deputados.
Posteriormente, o projeto aprovado por uma casa e revisto pela
Art. 62 (...) § 3º As medidas provisórias, ressalvado o disposto nos outra, será enviado para ser sancionado ou vetado.
§§ 11 e 12 perderão eficácia, desde a edição, se não forem convertidas A sanção, atribuição exclusiva do Presidente da República, é a
em lei no prazo de sessenta dias, prorrogável, nos termos do § 7º, uma manifestação de sua concordância para com o projeto. O Presidente da
vez por igual período, devendo o Congresso Nacional disciplinar, por República terá o prazo de 15 (quinze) dias para manifestar (artigo 66, §1º
decreto legislativo, as relações jurídicas delas decorrentes. da CF/88).
33

Pode-se dizer que se esse prazo decorrer sem que ele se Canotilho, é a obra fundacional de um Estado, ou seja, o conjunto
manifeste, ocorrerá a sanção tácita, ou seja, considera-se que o daquelas normas que fundam um Estado.
Presidente aprovou o projeto, conforme determina o art. 66, §3º da Além disso, a Constituição indica os poderes do Estado,
CR/88. através dos quais a nação há de ser governada e ainda marca e delimita,
Art. 66 (...) § 1º - Se o Presidente da República considerar o no regime administrativo brasileiro, por exemplo, as competências dos
projeto, no todo ou em parte, inconstitucional ou contrário ao interesse três Poderes Constituídos (Executivo, Legislativo e Judiciário), as
público, vetá-lo-á total ou parcialmente, no prazo de quinze dias úteis, atribuições da União e de cada Estado-membro da Federação, bem
contados da data do recebimento, e comunicará, dentro de quarenta e como dos Municípios e do Distrito Federal.
oito horas, ao Presidente do Senado Federal os motivos do veto. Outras expressões são empregadas para designar
Uma vez vetado o projeto de lei, o mesmo retornará ao Congresso “constituição”, tais como: Carta Magna, Lei fundamental, Código
Nacional, onde será apreciado em sessão conjunta, no prazo de 30 Supremo, Estatuto Básico, Pacto Fundamental, etc.
(trinta) dias. Pode o veto presidencial ser derrubado pela maioria
absoluta dos deputados e senadores, que votarão em sigilo, conforme Estrutura e classificação das Constituições
estipulado pelo artigo 66, §4º da CF/88. .Estrutura da Constituição
No caso do Presidente da República não vetar o projeto, ou o veto Geralmente as Constituições trazem suas normas agrupadas em
presidencial ser derrubado no Congresso Nacional, haverá a TÍTULOS, os quais, de maneira sistematizada, são divididos em
promulgação da lei, que é a declaração formal de existência da lei no CAPÍTULOS, e estes em SEÇÕES e SUBSEÇÕES, que agrupam os
mundo jurídico, sendo atribuição do presidente da República. Se este ARTIGOS, com seus INCISOS (algarismos romanos) e ALÍNEAS (letras
não o fizer em 48 (quarenta e oito) horas, torna-se função do Presidente minúsculas do nosso alfabeto), em função da conexão do conteúdo
do Senado, que, também não o fazendo, passa-se à atribuição do Vice - específico que as vincula. Convém salientar que inciso de artigo faz parte
Presidente do Senado (artigo 66, §7º da CF/88). do caput (cabeça) desse artigo, já o parágrafo (§) possui uma certa
Por fim, verifica-se a publicação da lei, que é a sua divulgação para autonomia em relação ao caput.
a sociedade, devendo ser feita por órgão oficial. Quanto à estrutura de nossa Lei Maior, a Constituição Federal de
Vale dizer que os efeitos da lei iniciam-se, normalmente, 45 1988, é composta por 320 artigos, tendo 246 destes em sua parte fixa e
(quarenta e cinco) dias após a publicação, conforme o artigo primeiro da 74 dispositivos denominados de "Disposições Constitucionais
Lei de Introdução ao Código Civil. Transitórias" - ADCT. Estes dispositivos possuem vida útil curta, pois uma
Art. 1° - Salvo disposição contrária, a lei começa a vigorar em todo vez desenvolvidos, cumpridos, perdem seu valor enquanto ordem,
o país 45 (quarenta e cinco) dias depois de oficialmente publicada. restando apenas como parte histórica no texto da Constituição.
É o conjunto de normas que determinam a forma de governo, a Antes da numeração sucessiva dos seus 320 artigos,
organização dos poderes e as atribuições destes frente aos direitos e possui a CF/88 um Preâmbulo, após o qual os 246 artigos referidos
garantias dos particulares. encontram-se divididos em 9 grandes TÍTULOS, os quais por sua vez
Podemos dizer, em linguagem simples e corrente, que a dividem-se em Capítulos, Seções e Subseções, conforme o conteúdo
Constituição é o documento político-jurídico por excelência de um que agrupam, cada um deles representando um assunto específico.
Estado, que nos regimes democráticos é redigido, aprovado e publicado Os nove Títulos referidos são:
por uma Assembléia Constituinte eleita pelo povo. I - Dos Princípios Fundamentais
É a lei fundamental, a lei magna, que retrata a forma de II - Dos Direitos e Garantias Fundamentais
ser de um Estado e que confere direitos e garantias fundamentais, tanto III - Da Organização do Estado
aos indivíduos quanto à coletividade. Conforme José Joaquim Gomes IV - Da Organização dos Poderes
34

V - Da Defesa do Estado e das Instituições Atualmente são em número muito reduzido e podemos dizer que são
Democráticas "impostas" pela
VI - Da Tributação e do Orçamento Exemplos: o exemplo clássico vem da Inglaterra (que
VII - Da Ordem Econômica e Financeira entretanto também se baseia em alguns textos fundamentais escritos); a
VIII - Da Ordem Social da Hungria e a da Nova Zelândia.
IX - Das Disposições Constitucionais Gerais
. Quanto à origem
. Classificação das Constituições
Trazemos aqui as quatro grandes classificações em que 1)- Democráticas, Populares ou Promulgadas: aquelas que têm
comumente são as Constituições enquadradas. origem em órgão constitucional eleito especialmente eleito pelo povo
para tal finalidade, por meio de sufrágio universal e direto. São
Quanto à forma. elaboradas pelas Assembléias Nacionais Constituintes, como expressão
1)- Escritas ou Positivas: aquelas postas em do Poder Constituinte Originário, isto é, exprimindo o princípio político e
documentos formais, em um corpo textual único. Acompanharam o jurídico de que todo o governo deve ser legitimado pelo consentimento
processo de racionalização do Direito e tiveram origem no "Contrato dos governantes.
Social" de Rousseau, só podendo ser modificadas pela soberania Exemplos: As brasileiras de 1891, de 1934, de 1946 e de 1988,
popular. Em geral, as Constituições dos Estados modernos são escritas e embora seja esta última questionável quanto à legitimidade de sua
codificadas, por pelo menos três razões comprovadas, conforme Paulo origem, uma vez que os Deputados Federais e os Senadores da
Bonavides (1996, p. 69): a) crença na superioridade da lei escrita sobre o República eleitos em 1986 não o foram com a exclusiva finalidade de
costume; b) a imagem simbólica de que quando se criasse uma criação da Constituição e, além disso, não podemos nos esquecer que,
Constituição estar-se-ia renovando o "contrato social"; c) a concepção como a renovação do Senado Federal se dá de quatro em quatro anos,
firmada desde o século XVIII de que não há melhor instrumento de por um e dois terços, havia Senadores eleitos em 1982 (cujo
educação política do que o texto de uma Constituição. Aqui fazemos uma cumprimento do mandato de 8 anos dar-se-ia em 1990), os quais, com
crítica: esta última razão só se justifica onde a população à Constituição certeza não foram eleitos para o fim de elaborar a nova Constituição, até
tem acesso! porque em 1982 ainda nem se cogitava uma efetiva feitura de novo texto
É importante ressaltar que em relação às Constituições constitucional.
Escritas poderia haver ainda uma classificação que as dissessem 2)- Outorgadas: são aquelas impostas pelo detentor eventual do
Imutáveis ou Fixas, mas isto possui apenas valor histórico, mais poder. Assim, não resultam da manifestação da soberania popular. A
especificamente referindo-se às Leis Fundamentais antigas, como o outorga aproxima-se das formas totalitárias de governo, uma vez que
Código de Hamurabi e a Lei das XII Tábuas, que, tendo surgido com a suprime do povo o exercício do poder de fazer a Constituição, através de
pretensão de eternidade, não podiam ser modificadas sob pena de seus representantes eleitos.
maldição dos deuses. Exemplos: as brasileiras de 1824 (imposta por D. Pedro I), de 1937
(imposta pelo ditador Getúlio Vargas), de 1967 (esta é também
2)- Não-escritas, Costumeiras ou Consuetudinárias: por denominada "Atípica", por ter sido outorgada pelo Congresso Nacional,
não serem escritas, são praticamente auto-explicativas; aquelas que se mas em função ordinária, isto é, sem delegação constituinte, o que não
baseiam nos costumes e nas tradições observadas espontaneamente por lhe retira o caráter de outorga) e a de 1969.
um povo, secularmente transmitidas. Predominaram até os fins do século 3)- Pactuadas: aquelas que exprimem um compromisso entre duas
XVIII, em grande parte coincidindo com os regimes absolutistas. forças políticas rivais, como por exemplo, na época dos primórdios do
35

constitucionalismo, a realeza absoluta debilitada e a nobreza de um lado para sua mutação os procedimentos rigorosos e difíceis próprios das
e, de outro, a burguesia em franca ascenção. Desse pacto resultou a Constituições rígidas.
Monarquia Limitada ou Monarquia Constitucional. Formam uma categoria Exemplo: a Constituição Imperial brasileira (de 1824) que, pela
de Constituições históricas, pois dificilmente as veremos nos dias atuais. regra do art. 178 criou uma terceira categoria de Constituições,
integrando parte de dispositivos rígidos, parte flexíveis, isto é, vindo a ser
. Quanto à consistência, à estabilidade ou à mutabilidade semi-rígida.
Esta classificação deve-se a James Bryce, referindo-se à maior ou
menor facilidade para a modificação dos textos constitucionais, sempre Quanto à extensão
tendo como parâmetro de comparação as leis ordinárias. Assim, quanto à 1)- Concisas: são as sintéticas, breves, sumárias; as que
mutabilidade as Constituições podem ser: apresentam texto enxuto, sucinto. Abrangem somente direitos e
princípios gerais, bem como regras básicas de organização e
1)- Rígidas: as que exigem a observância de procedimento fundamento dos sistema político-jurídico estatal, deixando as
diferenciado e mais complexo para sofrerem alterações em seus textos, pormenorizações à legislação complementar ou ordinária e, por isso
sempre em relação às leis ordinárias. Assim, não podem ser alteradas mesmo, atendem à metáfora do "guarda-chuva", como se suas regras
pelo processo comum de elaboração das leis ordinárias, pois requerem básicas fossem as poucas varetas que o compõem. São as Constituições
debates mais amplos, prazos dilatados e quóruns qualificados. São do tipo "clássicas", qual seja, aquelas que contemplam apenas o
adotadas pela maioria dos países contemporâneos. Esta diferença no conteúdo básico apregoada pelo já conhecido art. 16 da Declaração
processo de reforma visa proteger a Constituição dos golpes de força das Universal dos Diretos do Homem e do Cidadão.
maiorias partidárias, de tendências oportunistas de grupos políticos Exemplo: a dos EUA, que, desde 1787, possui apenas 7 artigos e
predominantes e da exaltação dos ânimos em momentos de crise 26 emendas.
nacional.
Exemplos: a dos EUA; todas as brasileiras, exceto a 2)- Prolixas: são aquelas ditas inchadas, extensas, longas, que
Imperial. apresentam texto amplo. Também chamadas "Analíticas" por alguns
autores, devido justamente à sua extensão. Cada vez mais numerosas,
2)- Flexíveis ou Plásticas: aquelas que sofrem alterações da geralmente contemplam regras programáticas e apresentam caráter
mesma maneira pela qual se elabora ou modifica qualquer espécie polifacético por albergarem normas não apenas materialmente, mas
normativa, isto é, não exigem nenhum requisito especial de reforma. sobretudo formalmente constitucionais. Até parece que o que não está na
Certo é que só servem para nações democráticas evoluídas e de alto Constituição não está no mundo, mas isso tem uma razão de ser: as
nível cultural. matérias de natureza alheia ao Direito Constitucional propriamente dito
Exemplo: o exemplo clássico é da Constituição da Inglaterra, onde adentram nos textos das Constituições, visando garantias que só as
o Parlamento tem função de Poder Constituinte Originário permanente. próprias Constituições proporcionam em toda a amplitude.
Exemplos: a brasileira de 1988 - originalmente contendo 315
3)- Semi-rígidas: aquelas que possuem parte de seu texto rígido, artigos, atualmente está com 324; a de Portugal (de 1976), que possui
parte flexível, mas isto não quer dizer que não possam ser modificadas. 296 artigos mais a Lei do Tribunal Constitucional; a da Espanha (de
Todas as Constituições podem sofrer alterações, o que varia apenas é o 1978); a Constituição da República do Paraguai, com 311 artigos e a da
grau de dificuldade ou de facilidade para tanto. Assim, nas semi-rígidas, República da Índia, com 395 artigos. Longe estão, como vemos, de ser
parte do texto é modificado como o são as leis ordinárias, e parte requer Constituições "Clássicas".
36

Aqui vale uma observação: praticamente todas estas Constituições O preâmbulo da Constituição da República Federativa
extremamente extensas surgiram em contextos de larga desconfiança do Brasil, de 1988, refere-se à Assembléia Nacional Constituinte,
em relação a recém-extintos regimes militares ditatoriais, o que fez com formada de representantes do povo, buscando estabelecer um regime
que se quisesse pôr o máximo de direitos nos textos constitucionais democrático, ou a democracia como forma de governo, enunciando e
justamente para que aí desfrutassem da garantia de não serem garantindo os direitos individuais, políticos, sociais e econômicos, em um
suprimidos com tanta facilidade. Ocorre que isto configura uma "faca de mundo fraterno e de paz, tendo como forma de Estado o regime
dois gumes", pois, se de um lado realmente elevou vários direitos à federativo.
categoria de constitucionais, por outro lado, dá azo aos argumentos de As palavras introdutórias da nossa Constituição
"ingovernabilidade", ou seja, fortalece aqueles ataques à Constituição anunciam os propósitos fundamentais da mesma. Além disso, devemos
que afirmam que é impossível governar com uma Constituição tão esclarecer que, ao ser jurada sob a proteção de Deus, a Constituição
inchada e isso vem, paradoxalmente, apressar a sua reforma. Federal professa um teísmo, embora isso não queira significar união
entre Igreja e Estado, eis que vigente entre nós, desde 1891, o Princípio
Classificação da Constituição Federal brasileira de 1988 da Separação entre Estado e Igreja. Assim, no Preâmbulo apenas se
Aplicando as tipologias a respeito das Constituições professa um teísmo, sem se dizer qual Deus.
acima vistas, temos que a Constituição da República Federativa do Brasil
de 1988 é: escrita quanto à forma como se apresenta; promulgada,
democrática ou popular quanto à sua origem; rígida quando à sua PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS
alteração e prolixa ou analítica quanto à sua extensão. Em 1988, a instituição de um Estado Democrático de
Direito por uma Assembléia Nacional Constituinte significou a celebração
PREÂMBULO de um pacto político entre o povo brasileiro (do qual todo poder emana) e
O preâmbulo é um recurso utilizado a título de introdução ao texto um novo Estado que ali nascia, que ali se configurava e, em certa
Constitucional. João Barbalho ensina: “O preâmbulo enuncia por quem, medida, se prometia. Além de dever respeito à Constituição, o adjetivo
em virtude de que autoridade e para que fim foi estabelecida a Democrático quis evidenciar ser o Estado fundado na Soberania Popular,
Constituição. Não é uma peça inútil ou de mero ornato na construção visando a realização dos valores igualdade, liberdade e dignidade da
dela: mas simples palavras que constituem, resumem e proclamam o pessoa humana.
pensamento primordial e os intuitos dos que o arquitetam”.1 Neste sentido, José Afonso da Silva (1998, p. 1-2) diz que a
Nem todas as constituições têm preâmbulo. No entanto, ele sempre Constituição Federal brasileira de1988, ao instituir uma nova idéia de
existiu nas constituições brasileiras, e por duas vezes (1891 e 1937) nele Direito e uma nova concepção de Estado - o Estado Democrático de
omitiu-se a invocação do nome de Deus. Direito - inspirou-se em princípios e valores que incorporaram um
Não há unanimidade de opinião entre os autores a respeito do componente de transformação da situação anteriormente existente,
caráter coativo do preâmbulo. José Celso de Melo Filho afirma: “O dentre os quais refere:
preâmbulo não tem valor normativo, já que nele não se contém qualquer a) o Princípio Democrático - que há de constituir uma democracia
regra de Direito positivo. Dessa forma, os princípios que enuncia não são representativa e também participativa, pluralista, e que seja a garantia
obrigatórios. Servem como diretrizes para a ação do poder público”.2 Por geral da vigência e da eficácia dos direitos fundamentais, conforme se
outro lado, Giese, no livro “A Constituição do Estado Alemão”, afirma que depreende do art. 1º da CF/88;
o preâmbulo é parte integrante da Constituição, como uma reprodução b) o Princípio da Proteção dos Direitos Fundamentais -
sintética e popular de seu conteúdo.3 compreendendo os direitos individuais, coletivos, políticos e sociais e
procurando realizar a justiça social.
37

Após, nos cinco incisos do art. 1º encontramos os Fundamentos do desenvolvimento das atividades. Poderão perguntar os senhores: em
Estado Brasileiro: época de desemprego estrutural de que vale uma regra destas?
I - a soberania - trata-se aqui da soberania nacional, entendida V - pluralismo político - que deve ser interpretado conjuntamente
como a capacidade para fazer valer suas decisões dentro de seu com o teor do artigo 17 da Constituição. Significa a existência de pelo
território e de estar em pé de igualdade com qualquer outra nação menos mais de um partido político disputando o poder político,
soberana do universo; é o poder político supremo e independente, não especialmente para possibilitar o exercício da oposição e do controle do
limitado por nenhum outro na ordem interna e em pé de igualdade com Estado, o que nem sempre foi possível em nossa história político-
os poderes supremos dos outros povos, só acatando regras constitucional, eis que já tivemos bipartidarismo forçado e mesmo a
voluntariamente aceitas; suspensão de todos os partidos políticos, bem como das eleições.
II - a cidadania - que aí aparece em um sentido mais amplo do que No Parágrafo Único do art. 1º temos o Princípio da
o da mera titularidade de direitos políticos. Para além da soberania Soberania Popular, permitindo ao povo (governados) uma efetiva
popular (enquanto expressão da vontade popular, possibilitada pelo participação no processo de formação da vontade política (governo),
conjunto dos direitos políticos previstos no art. 14), envolve: o conceito de direta ou indiretamente. Este princípio firmou-se com o advento do
dignidade da pessoa humana e os objetivos da educação (art. 205 e art. Estado Liberal Clássico, quando realizou-se a separação entre Estado
60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias), como metas do (espaço público, do poder e da política) e Sociedade Civil (espaço da
regime democrático; vida econômica). Por esse princípio, o povo deve governar-se, mas ante
III - a dignidade da pessoa humana - este é o valor supremo que a impossibilidade de todos atuarem diretamente no poder, passa-se a
norteia e atrai o conteúdo de todos os demais direitos fundamentais governar através de alguns representantes eleitos (Democracia
humanos. Para sua efetividade requer: Representativa ou dita Indireta) ou se exerce o poder por outros
- uma ordem econômica que assegure a todos a existência digna mecanismos próprios da Democracia Direta, cujo exemplo histórico mais
(art. 170); marcante é o do povo grego reunido na praça (na Ágora), e que na CF/88
- uma ordem social que vise a realização da justiça social (art. 193); concretizam-se pela Iniciativa Popular de Lei, pelo Plebiscito e pelo
- a função social da propriedade (art. 5º, XXIII) - como combate à Referendo.
valorização especulativa (fundiária, urbana e até das empresas); Na seqüência, o art. 2º trata do Princípio da Separação
- educação e preparo da pessoa para o exercício da cidadania (art. dos Poderes - que talvez seja justamente o que a Constituição tenha de
205). mais caro, inclusive historicamente, por ser a garantia básica do cidadão
Aqui registramos uma informação supletiva, que se refere a uma contra o exercício arbitrário do poder pela autoridade pública. Pela CF/88
recente decisão do Tribunal Constitucional da Hungria, no sentido de temos a separação tripartite (Montesquieu), em Executivo, Legislativo e
excluir dos benefícios econômicos da globalização todas aquelas Judiciário, mas nem sempre foi assim, eis que na Constituição do Império
empresas (e quiçá países!) que cometem violações à dignidade da tivemos a separação quadripartita, com a presença do Poder Moderador.
pessoa humana. Violações deste tipo são comuns no Brasil, onde temos É este um princípio essencial à Democracia, pois visa
desde trabalho escravo até a exploração do trabalho infantil. E aí impedir a prepotência do Estado sobre os indivíduos e de um dos
perguntamos se com um quadro desses é possível dizer que há poderes sobre os demais e, assim, reunindo um dos Poderes mais de
dignidade para as pessoas humanas? uma função do Estado, passamos a estar à beira de uma tirania. A
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa - há que exceção mais marcante ao princípio clássico da separação dos poderes
se notar que aqui não se trata de garantia de emprego, mas sim do na CF/88 está na possibilidade de adoção de Medidas Provisórias com
Direito a uma remuneração justa e a mínimas condições para o força de lei pelo Presidente da República (art. 62).
38

O Art. 3º trata dos Objetivos Fundamentais da concessão de asilo político e a cooperação entre os povos para o
República Federativa Brasileira, pela primeira vez consignados. Por eles, progresso da Humanidade. Em seu Parágrafo Único positiva a
deve o Estado brasileiro agir no campo interno tendo em vista o autorização para a entrada no MERCOSUL, por exemplo, assim dizendo
atendimento aos seguintes objetivos: o texto: "A República Federativa do Brasil buscará a integração
"I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina,
II - garantir o desenvolvimento nacional; visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações".
III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as
desigualdades sociais e regionais; OS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de
origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de Os direitos fundamentais do homem são aqueles
discriminação". oriundos da própria condição humana, direitos contra os quais nenhuma
Quanto aos três primeiros objetivos podemos registrar lei pode prevalecer e que estão previstos pelo ordenamento
uma crítica à histórica tradição dos governantes brasileiros de reduzir a constitucional. Além desses direitos, há os remédios constitucionais-
questão nacional do subdesenvolvimento e das chagas sociais à "teoria processuais, chamados de garantias constitucionais, que são os meios
do crescimento do bolo", isto é, os marginalizados e as regiões mais oferecidos para a proteção dos direitos humanos.
pobres seriam incluídos nos bolsões de riqueza nacionais quando enfim Nossa Constituição divide os Direitos Fundamentais em
o país se desenvolvesse o bastante. E para propiciar esse cinco capítulos distintos: a)- Dos Direitos e Deveres Individuais e
desenvolvimento seletivo, investe-se pesado, inclusive com a contração Coletivos (art. 5°); b)- Dos Direitos Sociais (arts. 6° ao 11); c)- Da
de empréstimos internacionais. Mas ocorre que um tal modelo de Nacionalidade (arts. 12 e 13); d)- Dos Direitos Políticos (arts. 14 a 16) e)-
desenvolvimento acirra exponencialmente as desigualdades sociais e, Dos Partidos Políticos (art. 17).
assim, adia-se indefinidamente a resolução de problemas que foram
elevados à categoria de Princípios Constitucionais e que, portanto, são
ordens aos governos, não meros conselhos. DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS
Quanto ao quarto inciso podemos mencionar a iniciativa Art. 5°
do próprio constituinte originário em ter transformado o crime de racismo Nossa Constituição assegura a inviolabilidade de cinco
em inafiançável e imprescritível. Do mesmo modo, louvável foi o advento direitos fundamentais: a)- direito à vida; b)- direito à liberdade; c)- direito
da Lei nº 9.459/97, que amplia as hipóteses de crime por racismo, bem à igualdade; d)- direito à segurança e)- direito à propriedade.
como aumentou a pena (reclusão de 1 a 3 anos e multa) ao injuriador por Os direitos individuais e coletivos, bem como as
cor, raça, etnia, religião ou origem, além de punir a divulgação do garantias constitucionais-processuais ainda se estendem aos
nazismo. estrangeiros residentes no país. Como já vimos anteriormente o sentido
E, por fim, o Art. 4º estabelece os Princípios com os da expressão “estrangeiros residentes” deve ser interpretado
quais o Brasil deverá reger suas Relações Internacionais, definindo extensivamente para proteger não só os estrangeiros com residência fixa
assim a posição da República Federativa do Brasil frente aos demais no país, bem como todos os que estiverem em território nacional. Por
Estados estrangeiros, reafirmando sua Soberania, o respeito à outro lado, verificamos que o Supremo Tribunal Federal já reconheceu o
autodeterminação dos povos, à igualdade entre os Estados e à direito aos não-residentes no país de terem acesso às ações, ou seja, as
independência nacional, o não-intervencionismo, a solução pacífica dos garantias constitucionais-processuais. Assim, o estrangeiro não residente
conflitos internacionais (por meio da defesa da paz), o repúdio ao no país poderá lançar mão das garantias constitucionais para a defesa
terrorismo e ao racismo, a prevalência dos direitos humanos, a de seus direitos.
39

As garantias constitucionais são em número de cinco: Assistência Social); Educação, Cultura e Desporto; Ciência e Tecnologia;
a)- Mandado de Segurança (individual e coletivo); b)- Habeas corpus; Comunicação Social; Meio Ambiente; Família, Criança, Adolescente e
c)- Ação popular; d)- Mandado de injunção e e)- ou Habeas data. Idoso; Índios.
Mandado de Segurança - É o remédio jurídico que serve para
proteger direito líquido e certo não amparado por habeas corpus ou NACIONALIDADE
habeas data. Direito líquido e certo é aquele que não precisa ser Art. 12 a 14
declarado com exame de provas, pois resulta de fato certo que pode ser Os Estados, por serem soberanos, têm competência para
provado por documentos inequívocos. estabelecer normas jurídicas para determinar quem será considerado
O mandado de segurança é a defesa mais eficaz contra qualquer nacional ou estrangeiro. No entanto, existem alguns princípios
ilegalidade que possa atingir os direitos fundamentais do homem, desde observados em quase todas as legislações nos países existentes. Assim,
que não se trate da liberdade de locomoção. verificamos dois tipos distintos de nacionalidade que são comuns em
Habeas Corpus - É o remédio jurídico que tem por finalidade quase todos os Estados: 1. Originária e 2. Adquirida. Da mesma forma
garantir a liberdade física de ir, vir, ficar, a liberdade física de locomoção. existem dois critérios, que também podemos considerá-los universais,
Qualquer brasileiro, em favor de qualquer compatriota ou estrangeiro, que regulam a Nacionalidade Originária, que são: 1. O “jus soli” ou
poderá impetrá-lo. princípio da territorialidade e 2. O “jus sangüinis” ou princípio da
Mandado de Injunção - É o remédio jurídico que tem por finalidade consangüinidade.
garantir o exercício de direitos concedidos pela Constituição quando não Nacionalidade
existir leis específicas que garantam esse exercício. Ë o vínculo jurídico que une uma pessoa a um Estado.
Habeas Data - É o remédio jurídico que tem por finalidade Nacionalidade Originária
possibilitar ao indivíduo saber se tem ficha em órgão de informação, o É a nacionalidade obtida em razão do nascimento da
que dela consta e, se necessário, mandar fazer retificações. Assegura ao pessoa.
indivíduo acesso às referências e informações sobre sua pessoa em As pessoas que possuem a nacionalidade originária
entidade pública ou privada, bem como, garante a retificação de dados são denominadas de Natos.
incorretos. “Jus Soli”
Ação Popular - É o remédio jurídico que permite ao cidadão Ë o princípio através do qual a nacionalidade originária é
(pessoa no exercício dos direitos políticos) obter a invalidade dos atos determinada em razão do lugar do nascimento da pessoa. Assim, o país
lesivos ao patrimônio público e assegura a defesa da moralidade que adota este princípio considera, como sendo nacional, o nascido em
administrativa, do meio ambiente e do patrimônio histórico e cultural. seu território.
O Brasil adota, como regra geral, este princípio pois considerada
DOS DIREITOS SOCIAIS brasileiro nato o nascido em seu território. À essa regra geral se opõe
Art. 6° a 11 uma única exceção, ou seja, só não é considerado brasileiro o aqui
No artigo 6°, a Constituição estabelece que os direitos sociais são: nascido, se for filho de pai estrangeiro e que esteja no Brasil a serviço de
a)- educação; b)- saúde; c)- trabalho; d)- moradia; e)- lazer; f)- seu país. Assim, por exemplo, não seria brasileira a criança aqui nascida,
segurança; g)- previdência social; h)- proteção à maternidade e à infância filha do Embaixador dos Estados Unidos que estivesse no Brasil a
e i)- assistência aos desamparados. No entanto, esse capítulo que é serviço de seu país. (Constituição Federal, art. 12, inciso I, letra “a”).
composto pelos artigos 6° ao 11, traz tão somente normas relativas ao
trabalho, deixando para o título “Da Ordem Social” (arts. 193 a 232) as “Jus Sangüinis”
disposições relativas a Seguridade Social (Saúde, Previdência Social e
40

É o princípio através do qual a nacionalidade originária Os estrangeiros que possuírem bens imóveis no Brasil, e forem
é determinada em razão da nacionalidade dos pais. O país que adota casados com brasileira ou tiverem filhos brasileiros, contanto que
este princípio considera nacional os filhos de nacionais, não importando o residam no Brasil, salvo se manifestarem a intenção de não mudarem de
lugar (território) de seu nascimento. nacionalidade.”
O Brasil também adota o “Jus sangüinis”, embora não Nestas hipóteses previstas pela Constituição de 1891 não há a
de forma tão ampla como o “jus Soli”. A Constituição estabelece no manifestação de vontade no sentido de querer ser brasileiro, mas sim o
art.12, inciso I, letras “b” e “c”, as circunstâncias nas quais o nascido no preenchimento de certas condições e a não manifestação de conservar a
exterior é considerado brasileiro nato, pelo fato de ser filho de pai ou mãe nacionalidade estrangeira. Essa naturalização no Brasil é conhecida
brasileira. como: “a grande naturalização”.

Nacionalidade Adquirida Os Equiparados


Ë a nacionalidade obtida em razão da manifestação de vontade ou Os fortes laços históricos que unem o Brasil a Portugal, fazem com
pelo fato da pessoa preencher certas condições legais que determinam que haja um tratamento especial aos portugueses residentes no país, a
sua aquisição, mesmo sem a manifestação de vontade. ponto tal de fazer com que o legislador constituinte constasse na
As pessoas que obtiveram a nacionalidade adquirida são Constituição a regra do § 1° do art. 12, onde equipara, ao brasileiro
denominadas de Naturalizadas. naturalizado, os portugueses com residência permanente no Brasil,
desde que tal tratamento seja dispensado aos brasileiros com residência
Expressa permanente em Portugal.
Diz-se que a nacionalidade é adquirida de forma expressa quando Devemos ressaltar que os portugueses, nesta situação, não
há a manifestação de vontade no sentido de desejar naturalizar-se em adquirem a nacionalidade brasileira, sendo, tão somente, tratados como
determinado país. Quando a pessoa expressa sua vontade no sentido de brasileiros naturalizados.
obter a nacionalidade. No Brasil o conjuntos de normas que disciplinam esse tratamento
Nossa Constituição disciplina esta questão no art.12, inciso II, letras especial deferido aos portugueses recebeu o nome de Estatuto da
“a” e “b”. Abre, entretanto, uma exceção aos originários de países de Igualdade, que foi regulamentado pelo Decreto sob n° 70.436/72, que
língua portuguesa ao exigir, tão somente, residência por um ano abaixo transcrevemos:
ininterrupto e idoneidade moral.
Perda da Nacionalidade
Tácita A Lei brasileira não contempla a possibilidade do nacional renunciar
Diz-se que a nacionalidade é adquirida de forma tácita quanto é à nacionalidade, no entanto, o Estado Brasileiro poderá declarar a perda
obtida sem que haja manifestação da vontade, com o simples da nacionalidade, na forma estabelecida pelo art. 12, § 4°, itens I e II,
preenchimento de certas condições estabelecidas na lei. como penalidade.
A Lei Brasileira não prevê hoje essa hipótese. No entanto ela já foi No inciso I encontra-se a hipótese do naturalizado ter cancelado
contemplada pela Constituição de 1891 (1ª constituição Republicana), sua naturalização por atividade nociva ao interesse nacional. Esse
que assim determinava em seu art.69, itens IV e V: cancelamento somente poderá se dar por sentença judicial definitiva, ou
São brasileiros naturalizados: seja, que não comporta mais qualquer recurso. A pessoa assim
“Os estrangeiros que, achando-se no Brasil aos 15 de novembro penalizada não poderá mais ser renaturalizado.
de 1889, não declararem, dentro em seis meses depois de entrar em No inciso II encontra-se a hipótese do brasileiro, com
vigor a Constituição, o ânimo de conservar a nacionalidade de origem. nacionalidade originária, adquirir outra nacionalidade.
41

O brasileiro perderá sua nacionalidade ao adquirir outra, desde que O § 7º do artigo 14 estabelece que são inelegíveis, no
a naturalização seja voluntária. Por outro lado, se o brasileiro residir em território de jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes consangüíneos
outro país onde, por decorrência de prazo, ocorrer a naturalização ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do Presidente da República,
automática (tácita), não perderá a nossa. Quando o silêncio importar do Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de Prefeito ou
declaração unilateral de vontade positiva, não há voluntariedade e sim de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito,
imposição. Da mesma forma, não perderá a nacionalidade o brasileiro salvo se já titular de mandado eletivo e candidato à reeleição.
residente em Estado estrangeiro que ficar obrigado a se naturalizar como Portanto além do cônjuge, que não é parente, são
condição de permanência naquele Estado ou para exercício de direitos inelegíveis no território de jurisdição do titular, os parentes
civis. consangüíneos e afins, até segundo grau, e os por adoção. Por essa
razão devemos ter uma noção a respeito do parentesco e especialmente
A Dupla Nacionalidade e os Apátridas com relação as normas adotadas para a contagem dos respectivos
Com a aplicação, quase que universal, dos princípios “jus soli” e graus.
“jus sangüinis”, como determinantes para a aquisição da nacionalidade
originária, podemos encontrar casos em que a pessoa poderá ter duas Parentes consangüineos
ou mais nacionalidades originárias ou, então, não adquirir nenhuma O parentesco conta-se por linhas e graus.
nacionalidade ao nascer, que é caso do apátrida. A linha é a vinculação da pessoa com o tronco
Assim, por exemplo: ancestral comum. Divide-se em linha reta e linha colateral.
a)- Se um casal, originário de um país que adote o São parentes em linha reta as pessoas que estão umas
princípio do “jus soli”, encontrar-se a passeio num país que adote o para com as outras na relação de ascendentes e descendentes. A linha
princípio do “jus sangüinis” e ali nascer um filho seu, essa criança não reta é ascendente ou descendente, conforme se encare o parentesco,
obterá a nacionalidade do país em que nasceu. (Isto porque esse país subindo-se da pessoa a seu antepassado, ou descendo-se. São parentes
adota o princípio do “jus sangüinis”). Portanto, ele só considera nacional em linha reta o bisavô, o avô, o pai, o filho, o neto, o bisneto, etc.
os filhos de nacionais. Por outro lado, o nascituro não obterá a São parentes em linha colateral as pessoas que, tendo
nacionalidade dos pais, uma vez que seu país de origem adota o tronco comum, não descendem uma das outras. Tais são os irmãos, os
principio do “juz soli”, ou seja, só considera nacional os nascidos em seu tios, os sobrinhos.
território. Essa criança será um apátrida, por não possuir uma O grau é a distância que vai de uma geração a outra.
nacionalidade originária. Na linha reta o grau de parentesco conta-se pelo
b)- Se imaginarmos uma situação inversa, vamos número de gerações. Geração é a relação existente entre o genitor e o
verificar que uma pessoa ao nascer poderá ter duas ou mais gerado. Assim, há entre o pai e o filho um grau, entre o avô e o neto dois,
nacionalidades. Se uma criança nascer num país que adota o princípio entre o bisavô e o bisneto três.
do “jus soli” e ela for filha de pai e mãe de diferentes países que adotam Na linha colateral, o grau de parentesco também se
o princípio do “jus sangüinis”, ela terá três nacionalidades: uma do país conta pelo número de gerações, subindo-se de um parente até o tronco
em que nasceu; outra do país de origem do pai e outra do país de origem comum e descendo até encontrar o outro. Assim, os primos são parentes
da mãe. colaterais de quarto grau, porque são quatro as gerações, de um deles
para o pai ( 1º grau), do pai para o avô (2º grau) – escala ascendente -,
do avô ao tio (3º grau), do tio ao seu filho (4º grau) – escala descendente.
O parentesco e as inelegibilidades Na linha colateral, não há parentesco em primeiro grau,
porque se conta subindo ao antepassado comum e descendo ao parente.
42

Torna-se parente do adotante, mas tal parentesco não se estende aos


Parentes afins demais membros de sua família, a não ser quanto aos impedimentos
A afinidade é o vínculo jurídico que se estabelece entre matrimoniais.
um cônjuge e os parentes do outro. A afinidade entre pessoas conta-se No regime do Estatuto da Criança e do Adolescente,
da mesma forma que o parentesco por consangüinidade, ou seja, por somente se realiza a adoção do menor de 18 anos por meio de sentença
linhas e graus. Admitindo-se sua existência em linha reta e em linha judicial. Depende de consentimento dos pais ou representantes legais do
colateral. adotado e do próprio menor se tiver mais de 12 anos de idade. Exige
Os parentes consangüíneos do marido são afins da mulher e vice- estágio prévio de convivência e somente será deferida quando
versa, em iguais linhas e graus. A consangüinidade é, em suma, a base apresentar reais vantagens para o adotado e fundar-se em motivos
do cálculo. legítimos.
Pode alguém ser afim de outrem em linha reta sob tríplice ponto de Essa adoção é irrevogável e vincula o adotado à família
vista: do adotante, desligando-o por completo da família natural, salvo apenas
1)- Em virtude do casamento por ele contraído, o marido nos impedimento matrimoniais.
será afim em primeiro grau com a filha e a mãe da mulher a que se uniu; Diante da nova família, os direitos do adotado são os
2)- Em virtude de casamento contraído pelos filhos, será mesmos dos filhos de sangue, inclusive quanto a sucessão. Os genitores
afim, em primeiro grau com as esposas destes; naturais perdem o pátrio poder e todos os direitos sucessórios com
3)- Em virtude de casamento contraído por seu pai, será relação ao adotado.
afim em primeiro grau com a mulher com quem ele se uniu. Distinção relevante
No primeiro caso, a filha ( de outro casamento) de sua
mulher será sua enteada. No segundo, será sogro da mulher de cada Os procedimentos de aplicação da analogia e a interpretação
filho. No terceiro, enteado da mulher de seu pai. extensiva, normalmente, são confundidos, e por isso é importante fazer a
Na linha colateral, os afins são chamados de cunhados. exata distinção sobre esses termos.
A afinidade, nessa linha, não se estende ao terceiro grau, em direito civil, A interpretação extensiva é um processo decorrente das várias
existindo apenas com os irmãos do cônjuge. formas de interpretação de uma lei. Nesse não há lacuna na lei, mas o
que ocorre é que a lei existente possui deficiência de linguagem, e assim,
Parentes por adoção o operador do Direito vai buscar em uma outra norma, semelhante, o
Adoção é o ato jurídico pelo qual se estabelece, sentido real que a norma deficiente queria buscar.
independentemente do fato natural da procriação, o vínculo de filiação. Na interpretação extensiva a norma existe, mas possui carência de
Trata-se de ficção legal, que permite a constituição, entre duas pessoas, sentido, enquanto que, na analogia, não existe a norma específica para
do laço de parentesco do primeiro grau na linha reta. regular o caso concreto, ou não possui na norma informações suficientes
No direito brasileiro persistem duas formas de adoção: que solucionem o caso.
uma para os maiores de 18 anos ( Código Civil) e outra para menores de A Lei de Introdução ao Código Civil, em seu artigo 4º, recomenda
18 anos ( Estatuto da Criança e do Adolescente). ao juiz que no caso de omissão da lei, este recorra à analogia. Caso essa
No regime do Código Civil, a adoção realiza-se por alternativa não resolva a questão, cabe ao juiz verificar os usos e
meio de escritura pública e não depende de autorização judicial. O costumes do local. Entretanto, se, mesmo assim, a situação não for
adotado não se desvincula da família de sangue, apenas o pátrio poder solucionada, o juiz lançará mão dos Princípios Gerais do Direito.
passa para o adotante. O adotado conserva o parentesco natural,
podendo, por exemplo, reclamar alimentos de seu pai, se for o caso.
43

Os Princípios Gerais do Direito seriam as idéias basilares e Vale dizer que há muitos debates entre os autores a respeito desse
fundamentais do Direito, que lhe dão apoio e coerência, respaldados pelo exato momento em que se iniciaria a personalidade.
ideal de Justiça, que envolve o Direito. Art. 1º Toda a pessoa é capaz de direito e deveres na ordem civil.
Seriam idéias fundamentais, de caráter geral, dentro de cada área Muitos autores afirmam que a personalidade civil se iniciaria desde
de atuação do Direito. a concepção, ou seja, concedendo personalidade civil ao nascituro, ou
Cumpre salientar que, embora a expressão seja "Princípios Gerais seja, daquele que ainda está para nascer.
do Direito", essa noção vai abranger tanto os princípios gerais (comuns a Entretanto, a teoria adotada pelo legislador do Código Civil
qualquer área) quanto os específicos (relativos a uma determinada área). Brasileiro concluiu pelo início da personalidade diante do nascimento
Esses Princípios Gerais têm dupla função, vez que orientam tanto o com vida, constatada pela respiração, mesmo que, por uma única vez.
legislador na feitura das normas, quanto o aplicador do Direito, diante de Cumpre salientar que, embora a personalidade civil se inicie
uma lacuna ou omissão legal. apenas diante do nascimento com vida, a lei, desde a concepção
devido ao caráter essencialmente amplo dos Princípios Gerais do resguarda os direitos do nascituro.
Direito, tanto o aplicador do Direito, quanto o legislador, devem ter Dessa forma, não deve-se dizer que o nascituro tem direitos ou
cautela e limites para a atuação, sob pena de buscar uma solução personalidade, mas apenas expectativa de direitos, e, cabe ao Estado
incoerente para uma determinada situação. garantir que o indivíduo nasça para que ela tenha personalidade, e
Ressalta-se que, para utilizar os Princípios Gerais de Direito, há de assim, possa exercer direitos e obrigações.
existir uma perfeita identidade, entre a situação e o princípio utilizado, Essa regra encontra-se disposta no Código Civil Brasileiro, em seu
sob o aspecto da coerência e harmonia. artigo 2º.
Conceito de personalidade jurídica Art. 2º A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com
Primeiramente é importante dizer que o Direito se preocupa com o vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.
homem e com suas relações, e para tal, determina as condutas a serem É importante dizer que, mesmo que o recém nascido, respire uma
seguidas, como forma de permitir a vida social pacífica. única vez e morra, uma vez constatada a vida, como teve personalidade,
Dessa forma, é importante dizer quais são os conceitos de Direito é considerado sujeito de direitos, e, esse fato, influencia seriamente as
relacionados aos sujeitos das relações jurídicas. questões sucessórias, relacionadas à herança, pois a lei resguarda esses
Sabe-se que toda a pessoa natural possui a aptidão de exercer direitos.
direitos e deveres na Ordem Jurídica, ou seja, todas as pessoas têm a Quanto ao fim da personalidade, conforme o art. 6º, tem-se que se
possibilidade de exercê-los. A esse atributo, inerente a todas as pessoas, extingue somente com a morte, ou por declaração de ausência.
sem qualquer restrição, dá-se o nome de personalidade jurídica. Há uma regra bastante relevante a respeito do fim da
Assim, pode-se dizer que a personalidade jurídica é uma criação do personalidade, que é a regra do art. 8º do CCB.
Direito, para que o indivíduo seja considerado pessoa, e, portanto, tenha Essa regra determina que se duas ou mais pessoas forem
direitos e obrigações. encontradas mortas, para efeitos sucessórios, considera-se que ambas
Essa regra está no art. 1º do Código Civil Brasileiro, e dispõe que faleceram simultaneamente, ou seja, no mesmo momento.
toda pessoa é capaz de direitos e obrigações na vida civil. É a chamada regra da comoriência. Contudo, é admitido a
Início e fim da personalidade civil apresentação de prova em contrário.
Vale dizer que a personalidade, atributo inerente a todo e qualquer O processo de ausência, outra forma de extinção da personalidade,
indivíduo, possui início e fim. é um processo pelo qual o juiz vai declarar ausente aquela pessoa que
Dessa forma, a personalidade civil tem início diante do nascimento deixou seu domicílio, e nenhuma notícia se tem a seu respeito.
com vida.
44

Conforme a lei, haverá situações em que a morte será presumida, Vale dizer que os atos por eles praticados são considerados nulos,
conforme o art. 7º do CCB. Seriam aquelas situações em que a pessoa ou seja, tem-se como se nunca tivessem existido.
se encontrava em extremo perigo de vida, ou em casos de guerra, se Já os relativamente incapazes são aqueles que deverão exercer os
após dois anos a mesma não for encontrada. atos da vida civil, com a devida assistência. São eles: os maiores de
Capacidade de fato e de Direito dezesseis e menores de dezoito anos; ébrios habituais, viciados em
O conceito de capacidade é extrema importância para o Direito, e tóxicos e doentes mentais, com o discernimento reduzido, excepcionais
pode-se dizer que a capacidade jurídica é a medida da personalidade, ou sem o desenvolvimento completo, e os pródigos (aqueles que dissipam
seja, é o potencial de todo o indivíduo, que faz com a pessoa seja sujeito seu patrimônio).
de direitos e deveres. É importante, nesse momento, estabelecer uma distinção entre os
Dessa forma, pode-se verificar dois quatro tipos de capacidade: termos representação e assistência.
Capacidade de direito (genérica), ou seja, potencial de todos os Na representação, o absolutamente incapaz não possui nenhuma
indivíduos de serem considerados pessoas; vontade, ou seja, a vontade exercida é a do tutor ou curador.
Capacidade de fato, que é a capacidade de exercer plenamente os Já na assistência, há a vontade do assistido, que é conjugada com
atos da vida civil (nem todos possuem, por exemplo, os doentes mentais aquele que exerce a assistência.
e menores de idade não podem exercer quaisquer atos); Salienta-se que os atos praticados pelos absolutamente incapazes,
Capacidade negocial, que é a exigência da capacidade de fato, sem a representação, são nulos, ao passo que, aqueles atos nos quais
acrescida de um plus, necessária ao exercício de um ato (por exemplo os relativamente incapazes atuam sem serem assistido são anuláveis.
para vender uma casa, por procuração, além da pessoa ser maior, deve A nulidade se diferencia da anulabilidade pois trata-se como se o
ser alfabetizado para conseguir outorgar a procuração); ato nunca tivesse existido, já na anulabilidade, o ato existe, só que
E, por fim, a capacidade especial, exigida para a realização de contém um defeito.
algum ato, que está fora do Direito Privado, como no caso do alistamento Assim, caberá ao juiz, verificar a partir de qual o momento o ato
no exército ou carteira de habilitação. anulável parará de surtir seus efeitos.
Incapacidade absoluta e relativa O índio não é considerado absolutamente ou relativamente incapaz
Conforme já fora determinado, a capacidade de direito, é aquela como no Código Civil antigo, mas, conforme o art. 4º, parágrafo único, as
que todo o indivíduo possui, é um potencial inerente, que confere ao normas indígenas deverão ser tratadas por legislações específicas, e não
indivíduo a qualidade de pessoa. pelo CCB, como antes.
Dessa forma, para que exerça plenamente os atos da vida civil, a É importante dizer que, se o índio optar por viver na sociedade,
pessoa deve ser plenamente capaz. Entretanto, algumas pessoas, por como qualquer outra pessoa, deverá fazer um requerimento, via judicial,
suas características, são consideradas incapazes. que conte com a participação do Ministério Público. Salienta-se que o
Essa incapacidade pode se dar em dois graus, sendo pois, índio terá de comprovar, dentre outros requisitos, que possui 21 anos e
absoluta ou relativa. que conhece a língua portuguesa, os usos e costumes da região,
Os absolutamente incapazes são aqueles que não podem exercer conforme explica o autor Paulo Nader.
quaisquer atos da vida civil sem estarem devidamente representados. Art. 4º Art. 4º São incapazes, relativamente a certos atos, ou à
São eles os menores de dezesseis anos, os que por enfermidade maneira de os exercer: (...) Parágrafo único. A capacidade dos índios
ou doença mental, não tiverem o discernimento para exercer os atos da será regulada por legislação especial
vida civil, e os que não puderem manifestar a sua vontade, mesmo que, O nome, estado e domicílio da pessoa natural
naquela ocasião apenas. O nome, atributo da pessoa, reflete a característica mais marcante
e expressiva de um indivíduo.
45

Pode-se dizer que o nome se compõe de duas partes: o prenome, É importante lembrar que o Código Civil, juntamente com a Lei de
que é de escolha dos pais, e o nome patronímico (ou cognome), que se Registros Públicos, nº6015/73, trazem a obrigatoriedade de constar em
refere aos apelidos de família. Registro Público alguns atos, dentre eles, verifica-se os nomes das
Vale dizer que o nome deve ser considerado como um atributo que pessoas naturais.
não tem expressão patrimonial (financeira), pois está ligado a uma outra O estado da pessoa, também importante traço distintivo dos
esfera de direitos, que são os direitos relativos à personalidade. indivíduos, são designações dadas pelo Direito para delimitar as relações
Salienta-se que os direitos de personalidade, e dentro deles, o das pessoas, seja no campo familiar, social ou político.
nome, são inalienáveis e irrenunciáveis, ou seja, não poderão ser O estado pode se distinguir em: estado civil, em que a pessoa pode
comercializados financeiramente, e deles, nem mesmo o titular poderá ser classificada como casada, solteira, divorciada, ou viúva; estado
abrir mão. político, que diferencia as pessoas pelo fato de serem nacionais, ou
Salienta-se que o nome poderá ser adquirido de três formas: estrangeiros, e estado individual, que distingue os sexos feminino e
através do nascimento, reconhecimento de paternidade ou pela prática masculino, ou se refere ao fato da pessoa ser maior ou menor de idade.
de um determinado ato jurídico, como por exemplo, o casamento. Salienta-se que o estado possui características interiores e
Acrescenta-se que a lei determina que o nome, mais exteriores. No se aspecto interno, pode-se dizer que o estado da pessoa
especificamente, o prenome, deverá ser imutável. é indivisível (as pessoas não podem ter simultaneamente dois estados
Contudo, deve-se observar que, em casos que o prenome exponha civis), indisponível (o estado de cada um não pode ser repassado para
o seu portador ao ridículo, poderá haver a alteração, desde que não ninguém) e imprescritível (é um direito que poderá ser exercido a
prejudique os apelidos de família. qualquer tempo).
Haverá, então, duas formas de se alterar o nome: a extrajudicial e a Já em relação ao aspecto externo, pode-se dizer que o estado da
judicial. pessoa é geral, pois deve ser observado por qualquer pessoa, ou seja,
A alteração extrajudicial é aquela que poderá ser requerida no seu efeito é válido em relação a qualquer um, pessoal, que se refere a
primeiro ano após a maioridade (18 anos), sem que essa alteração influa um indivíduo determinado, sendo característica exclusiva de uma
no nome patronímico, ou seja, nos nomes de família, conforme o artigo pessoa, e é de Ordem Pública, ou seja, são condições impostas por lei,
56 da Lei de Registros Públicos, Lei nº6015/73. para que seja resguardadas as relações sociais, e o interesse público.
Após esse período, a alteração será judicial, sempre em situações É importante frisar que o estado é provado por meio de registros
excepcionais, devendo o juiz avaliar os motivos pelos quais se requer a públicos.
alteração, e contando com a manifestação obrigatória do Ministério Em relação ao domicílio, pode-se dizer que é necessária a
Público para opinar no processo (artigo 57 da Lei de Registros Públicos, determinação de um local certo, onde a pessoa possa ser localizada,
Lei nº6015/73). principalmente para fins processuais, ou seja, para facilitar a localização
Art. 56. O interessado, no primeiro ano após ter atingido a para que a pessoa possa ser encontrada para responder, cumprir uma
maioridade civil, poderá, pessoalmente ou por procurador bastante, obrigação, atuar como testemunha, dentre outras finalidades necessárias
alterar o nome, desde que não prejudique os apelidos de família, ao andamento de um processo.
averbando-se a alteração que será publicada pela imprensa. Mas, para desenvolver esse estudo, é importante verificar a
Art. 57 - Qualquer alteração posterior de nome, somente por diferença entre os termos domicílio e residência.
exceção e motivadamente, após audiência do Ministério Público, será Pode-se dizer que a residência é o local onde a pessoa pode se
permitida por sentença do juiz a que estiver sujeito o registro, encontrar, mas não ter a presença da vontade de ali permanecer, ou seja,
arquivando-se o mandato e publicando-se a alteração pela imprensa a pessoa não tem o intuito de transformar aquele local como o centro de
suas atividades. (Exemplo casa de praia, sítio...).
46

A natureza jurídica desses das pessoas jurídicas é um assunto que


Já o domicílio é o local onde a pessoa reside com ânimo de ali levanta inúmeras controvérsias, e por isso várias teorias tentam explicá-
permanecer, elegendo aquele local, com o ânimo definitivo, conforme la.
estipula o art. 70, do Código Civil. Art. 28 - O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da
No caso da pessoa possuir várias residências, será considerado sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de
domicílio, qualquer uma delas. É a chamada pluralidade de domicílios. direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação
(art. 71 CCB) Art. 70. O domicílio da pessoa natural é o lugar onde ela dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será
estabelece a sua residência com ânimo definitivo. efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento
Art. 71. Se, porém, a pessoa natural tiver diversas residências, ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.
onde, alternadamente, viva, considerar-se-á domicílio seu qualquer Pela teoria da ficção, defendida pelo jurista Savigny, a
delas. personalidade da pessoa jurídica é uma criação artificial, pois um ente
Já em relação aos andarilhos, ou seja, aquelas pessoas que não desprovido de vontade não poderia possuir a personalidade, que seria
possuem residência habitual, o seu domicílio será o local onde forem própria dos indivíduos que possuem vontades.
encontradas (art. 73). Assim, a pessoa jurídica possuiria personalidade por uma ficção
Vale dizer que o art. 76, especifica o domicílio de algumas pessoas, jurídica.
que, por força de lei, são determinados. É o caso dos incapazes, presos, As críticas a essa teoria se concentram no fato de que os
servidores públicos, militares e marítimos. incapazes, absoluta ou relativamente, possuem personalidade, mesmo
Surge a pessoa jurídica, diante da vontade de um ou mais sem a vontade. Dessa forma fica insuficiente essa teoria.
indivíduos, de se criar um ente distinto da pessoa se seus membros para Já a teoria realista tem como um de seus defensores Otto Gierke,
a realização de um determinado fim. um jurista germânico. A teoria afirma que, embora a pessoa jurídica
Vale dizer que esses entes vão possuir vida e patrimônios próprios, forme um ente distinto da pessoa dos membros que a compõem, existe
e o Direito os reconhece como sujeito de direitos e deveres. uma unidade.
As pessoas jurídicas terão vida e personalidade próprias, Assim, a vontade da pessoa jurídica é própria, mas decorre da
independe de seus membros, e com as quais não se confundem; o vontade de seus membros.
patrimônio da pessoa jurídica também é próprio, e também não tem Dessa forma, acreditam os realistas que a pessoa jurídica existe
relação com o patrimônio dos membros. numa realidade objetiva pois apresenta inúmeros traços que a
A administração da pessoa jurídica sempre será coordenada por assemelham às próprias pessoas físicas.
pessoas naturais. Classificações da pessoa jurídica
Salienta-se que a pessoa jurídica poderá exercer quaisquer atos da As pessoas jurídicas podem ser pessoas jurídicas de Direito
vida civil, desde que não sejam incompatíveis com a sua condição. Da Público, ou de Direito Privado.
mesma forma, poderão ser sujeitos ativos e passivos de delitos. As pessoas jurídicas de Direito Público, podem ser de internas ou
A respeito dessa última característica, o Código de Defesa do externas.
Consumidor prevê a possibilidade de se desconsiderar a personalidade Art. 41. São pessoas jurídicas de direito público interno: I - a União;
da pessoa jurídica, para que o sócio seja pessoalmente responsabilizado. II - os Estados, o Distrito Federal e os Territórios; III - os Municípios; IV -
Assim, segundo o art. 28 do Código de Defesa do Consumidor, a as autarquias, inclusive as associações públicas; V - as demais entidades
desconsideração irá ocorrer nos casos de: abuso de direito, excesso de de caráter público criadas por lei.
poder, infração de lei, ou a constatação de algum ilícito contra o
consumidor.
47

Art. 42. São pessoas jurídicas de direito público externo os Estados Normalmente o sujeito ativo é aquele que possui o Direito subjetivo,
estrangeiros e todas as pessoas que forem regidas pelo direito enquanto que o sujeito passivo possui o dever jurídico.
internacional público. O direito subjetivo põe a disposição de seu titular uma pretensão,
Segundo o art. 41 do CCB, as pessoas jurídicas de Direito Público que é a possibilidade de recorrer ao judiciário para que exigir o
interno são a União, os Estados, Distrito Federal, Territórios, Municípios, cumprimento do dever jurídico a que a outra parte estaria obrigada.
autarquias (inclusive as associações públicas) e demais entidades de Os direitos subjetivos estão todos dispostos no Ordenamento
caráter público que a lei assim definir. Jurídico. E salienta-se que, a todo direito subjetivo, deve, corresponder
Já as pessoas jurídicas de Direito Público externas são os Estados um dever jurídico.
estrangeiros e todas as pessoas que forem regidas pelo Direito Dessa forma, é imprescindível, para a noção de direito subjetivo,
Internacional Público, como no caso ONU (organização das nações existir em contrapartida o dever jurídico, pois, uma vez violado, o seu
unidas), OMC (organização mundial do comércio), conforme depreende- titular terá a possibilidade, concedida pela lei, de exigir o cumprimento da
se do art. 42 do CCB. obrigação, ou seja, que o dever jurídico seja cumprido.
Já no âmbito do Direito Privado, as pessoas jurídicas podem ser: É importante fazer algumas distinções, vez que direito subjetivo se
associações, sociedades, fundações, organizações religiosas e partidos distancia dos termos interesse legítimo, poder e faculdade.
políticos. Por interesse legítimo, entende-se o necessário envolvimento de
As associações se caracterizam pela reunião de pessoas com fins uma parte à uma situação concreta, de forma que autorize essa pessoa a
não lucrativos; já as sociedades, se caracterizam pelo intuito do lucro, recorrer ao judiciário para a solução da questão. Há de existir uma
podendo adotar vários regimes, como: sociedade por quotas de relação de pertinência entre aquele que pede em juízo, a outra parte e o
responsabilidade limitada, sociedade anônima, etc. caso concreto, caso contrário, o interesse jurídico estará prejudicado, e o
Vale dizer que as sociedades podem ser simples ou empresárias. juiz não chegará nem a avaliar sobre o que se trata o processo. O
As sociedades simples exploram atividades intelectuais, científica, interesse legítimo é essencial para uma pessoa recorrer ao judiciário.
literária ou artística; já as sociedades empresárias, são aquelas O poder, por sua vez, pode ser explicado como a autoridade
sociedades que desempenham uma atividade empresária, ou seja, uma conferida a alguém para que haja em benefício de outrem, sem que haja,
atividade econômica voltada à produção, ou a circulação de bens e com ele relacionado um dever jurídico. Um exemplo seria poder dos pais
serviços (art. 966 CCB). de guarda e educação dos filhos até a maioridade.
As fundações, por sua vez, surgem quando é atribuída a Já a faculdade, é a possibilidade da pessoa de atuar conforme a lei,
personalidade jurídica a determinado patrimônio, para realizar um pretendendo algum resultado, mas, nem sempre, haverá um dever
determinado fim lícito. jurídico em contrapartida.
Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente Essa faculdade pode se dar para a criação, modificação ou
atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens alteração de direitos subjetivos.
ou de serviços. É importante dizer que o direito subjetivo possui algumas
classificações relevantes.
Direito Subjetivo O direito subjetivo pode ser público ou privado.
O Direito Subjetivo pode ser explicado como a possibilidade Direitos subjetivos públicos são aqueles que possuem no pólo
concedida pela lei, a uma determinada pessoa, de exigir de outrem, uma passivo, ou seja, como obrigado o poder público.
conduta. Essa conduta, imposta pelo Estado, através dos preceitos de Esses direitos se verificariam nos direitos relativos à liberdade, ao
leis, denomina-se dever jurídico. direito de ação (direito de qualquer pessoa recorrer ao poder judiciário
para pleitear um direito seu), direito de petição (referente ao direito de
48

requisitar quaisquer informações administrativas de seu interesse) e Principais, quando os direitos possuem existência autônoma,
direitos políticos (relativos à efetiva participação da sociedade no independente de outro. Já os acessórios dependem da pré existência de
exercício do poder público). outro direito, e com ele se relaciona. Exemplo: contrato de compra e
Já os direitos privados, ao contrário dos públicos, possuem como venda que possua uma cláusula de pagamento de multa diante do
sujeito obrigado um particular. inadimplemento. Nesse caso, o direito principal seria o direito ao
Podem ser patrimoniais ou não patrimoniais. pagamento do valor da dívida, enquanto que o pagamento da multa seria
Patrimoniais são direitos que podem ser quantificados um direito acessório ao contrato.
financeiramente. Se diferenciam em : reais (relativos ao direito sobre uma Por fim, os direitos podem ser renunciáveis, quando a pessoa
coisa, ou seja, um bem, que pode ser móvel ou imóvel); obrigacionais decide por não exercê-lo, mesmo que não tenha a intenção de transferi-
(que têm por objeto uma obrigação de dar, fazer, ou não fazer), lo. Exemplo: renuncia à herança.
sucessórios (decorrentes da sucessão hereditária, na qual os bens e Irrenunciáveis, quando não aceitam que o titular deixe de exercê-lo.
direitos do de cujos são repassados aos seus herdeiros) e intelectuais Exemplo: direitos personalíssimo.
(relacionados à exploração de obras e invenções por seus artistas e Dever Jurídico
inventores, sem a interferência de mais ninguém. Seriam os direitos de Vale dizer que só há dever jurídico quando há a possibilidade de
patente, direitos autorais, etc.) violação da lei. Pode-se dizer que é a conduta exigida.
Já os direitos não patrimoniais, se dividem em personalíssimos ou Afirma-se que o dever jurídico é uma determinação da lei para que
familiares. uma pessoa assuma uma conduta em favor de outra. Exemplo:
obrigação de pagar num contrato, pagamento de impostos, indenização
Os direitos personalíssimos são relativos à essência do ser humano, e por responsabilidade civil, em que a pessoa é coagida a reparar o dano
envolvem o direito à integridade física (vida, ao próprio corpo), psíquica provocado, mediante indenização em dinheiro.
(liberdade e intimidade) e moral (honra). Salienta-se que o dever jurídico, então, decorre do ordenamento
Já os direitos familiares decorrem das relações de parentesco jurídico, e não das regras morais, regras de trato social e ética.
familiar e conjugais, que disciplinam o comportamento dos pais, filhos e O dever jurídico é imposto pela lei, mas é de se verificar, que,
cônjuges. embora não decorra da moral, o dever jurídico com ela se relaciona, haja
Vale dizer que os direitos subjetivos também variam de acordo com vista que a moral, as regras de trato social e a ética influenciam o
sua eficácia, e dessa forma, podem ser: legislador na criação do Direito.
Absolutos, quando são oponíveis erga omnes, ou seja, quando são Assim, por conseqüência, o dever jurídico muito se influencia pelas
válidos para qualquer pessoa, devendo ser observado por todos. áreas da atuação humana.
Exemplo: direito de propriedade. Verifica-se que o dever jurídico pode ser: contratual, quando as
Relativos, quando dizem respeito apenas aos envolvidos em partes, mediante acordo de vontades, estabelecem direitos e deveres
determinada relação jurídica. Exemplo: contrato de locação, que vincula recíprocos, e a lei conduz os seus efeitos; ou extracontratual, quando os
apenas as partes pertencentes à relação. direitos e obrigações surgem unicamente da lei.
Transmissíveis, quando os direitos podem ser repassados a Podem ser, também, dever jurídico positivo ou negativo, sendo que
terceiros, como no caso dos direitos reais, que são suscetíveis de positivo será aquele que exige uma conduta do sujeito passivo; e o dever
transferência. jurídico negativo, exige do sujeito passivo abster-se de uma conduta, ou
Intransmissíveis, quando não permitem essa transferência a outra seja, exige uma omissão.
pessoa. É o caso dos direitos personalíssimos, que, por serem inerentes Ainda, há os deveres jurídicos permanentes ou transitórios, em que
a cada pessoa, não poderão ser repassados. permanentes seriam aqueles que não se esgotam com o cumprimento; e
49

os transitórios, que extinguem o dever jurídico, uma vez que ele é momento, ela estipula a conseqüência, ou sanção, dependendo do
cumprido. assunto.
Da noção de dever jurídico, retira-se algumas proposições lógicas Dessa forma, pode-se dizer que o suposto jurídico é a hipótese
para o estudo do Direito: abstrata prevista pela norma, enquanto que o fato jurídico é a situação
Tudo que está determinado em lei, é, por ela, permitido, ou seja, se concreta ocorrida, que se encaixou perfeitamente à hipótese.
a lei ordena uma determinada conduta, é porque essa conduta é Vale dizer que o suposto jurídico pode ser simples, quando a
permitida. hipótese prevista é pura, ou seja, não é condicionada a nenhum requisito,
Da mesma forma, se a não há proibições a cerca de uma ou complexo, quando a hipótese dispuser uma situação envolvida e
determinada conduta, o indivíduo terá ampla liberdade de fazer ou não condicionada a vários requisitos.
fazer, ou seja, será uma escolha do indivíduo realizar ou não uma Pode-se dizer, então, que os fatos jurídicos, são aqueles
conduta, pois a lei permite, mas não obriga. acontecimentos, que são relevantes para a coletividade, e, exatamente
Outra proposição seria a de que uma norma, uma vez regulada, por isso, é que o Direito irá determinar suas conseqüências.
não poderá, simultaneamente, ser permitida e proibida, sob pena de se É importante lembrar que os fatos jurídicos podem se dar mediante
encontrar no Ordenamento Jurídico evidentes contradições. Se todos são uma ação humana, ou independente desta.
iguais perante a lei, não poderá existir leis contraditórias a serem Assim, visualiza-se os fatos jurídicos naturais se dão sem a
aplicadas a cada caso concreto seguindo interesses particulares. interferência do ser humano, mas que, ainda sim, repercutem no mundo
Assim, uma vez regulada uma determinada conduta, ou ela está jurídico. Exemplo: nascimento, morte.
permitida ou está proibida. E dessa forma, o que não for proibido, será Ou fatos jurídicos humanos, ou seja, aqueles que ocorrem
permitido ao sujeito exercer. mediante atuação ou omissão humana, que cria, extingue ou modifica
Ressalta-se que uma sociedade que cumpre os deveres jurídicos direitos. Exemplo: contrato de compra e assinado entre duas partes,
impostos, possui um Direito efetivo, que cumpre, de maneira satisfatória, casamento.
a sua função. Classificações
Fatos Jurídicos Deve-se dizer que a classificação dos fatos jurídicos é assunto
As pessoas vivem em constante contato com os seus semelhantes, muito controvertido na doutrina, sendo que cada autor apresenta
surgindo, a cada dia, relações decorrentes dessa coexistência. distinções em relação a classificação a adotar.
O Direito, que deve reger as relações sociais, se ocupa dos fatos Assim, pode-se dizer que os fatos jurídico lato sensu (sentido
jurídicos, ou seja, aqueles acontecimentos da vida, que por sua amplo) abrangem o fato jurídico strictu sensu (sentido restrito) e o ato
relevância, devem ser regulamentados através de normas. jurídico.
Assim, pode-se dizer que os fatos jurídicos provocam a criação, Os fatos jurídicos strictu sensu são aqueles acontecimentos
modificação ou extinção de direitos. provocados por força da natureza, independente da ação humana, e que
É importante ressaltar que o fato jurídico se difere do suposto repercutem no mundo jurídico, criando, modificando, ou extinguindo
jurídico. direitos. Exemplos: nascimento, morte, mudança do curso de um rio, ou
Para explicar o que vem a ser suposto jurídico, primeiramente, é deslocamento de terras que pode refletir no direito de propriedade,
importante lembrar que a norma possui uma estrutura dividida em dois incêndio, etc.
momentos. Já os atos jurídicos são fruto da vontade humana. Pode-se dizer
No primeiro momento a norma descreve a hipótese normativa, ou que são expressões da vontade humana, destinada à produção de
seja, elenca a situação que será, por ela, abrangida. Num segundo efeitos. Há a vontade consciente e direcionada do homem para que o ato
50

se manifeste e produza suas conseqüências, que são relevantes para o Os negócios jurídicos se distinguem em várias classificações por
Direito. possuírem características diferenciadas.
Cumpre salientar que os atos jurídicos, podem ser ilícitos ou lícitos. Assim, podem ser unilaterais ou bilaterais. Os negócios jurídicos
São ilícitos quando a vontade humana se para a produção de unilaterais são aqueles que se realizam mediante uma única
efeitos contrários às regras Ordenamento Jurídico. manifestação de vontade. Exemplo: testamento.
São lícitos, por sua vez, os atos que decorrem da vontade humana, Já nos bilaterais, para que o negócio jurídico ocorra, há duas
que se destina a produção de conseqüências permitidas pelo manifestações de vontade, em sentidos opostos, dadas
Ordenamento Jurídico. simultaneamente. É o caso do contrato de compra e venda, em que uma
Por fim , pode-se dizer que os atos jurídicos lícitos podem ser pessoa quer vender e a outra comprar.
classificados em: ato jurídico strictu sensu e negócio jurídico. E há, ainda, os negócios jurídicos plurilaterais, em que duas ou
Nos atos jurídicos strictu sensu verifica-se que a vontade humana mais manifestações de vontade são exercidas, mas convergindo para o
se dirige aos efeitos previamente estabelecidos em lei. E assim, não há mesmo interesse.
criação de novos direitos, que são previamente previstos. Ressalta-se Exemplo: constituição de uma sociedade.
que as conseqüências não vão variar em relação às pessoas. Podem ser também negócios jurídicos onerosos, quando há uma
Já o negócio jurídico revela o papel da autonomia privada nas contraprestação (exemplo: contrato de compra e venda), ou gratuitos,
relações sociais, ou seja, é a possibilidade que o Ordenamento Jurídico quando são realizados sem qualquer tipo de contraprestação, sendo,
confere aos particulares que criem regras específicas para as suas pois, atos de mera liberalidade (exemplo: doação).
relações, desde que observados os limites gerais previstos. Outra classificação distingue os negócios jurídicos em inter vivos,
As pessoas poderão inovar, criando novos direitos nas suas quando os efeitos do negócios jurídico se produzem enquanto vivas as
relações privadas. É o espaço conferido às partes para se auto partes (exemplo: contrato de compra e venda) e causa mortis, quando os
determinarem, estabelecendo direitos e obrigações, dentro de suas efeitos do negócio jurídico somente são visíveis após a morte das partes
relações pessoais, tendo o Direito estipulado os limites. (exemplo: seguro de vida).
Negócios Jurídicos Podem ser, também, negócios jurídicos formais (solenes), quando
Os negócios jurídicos, como já dito anteriormente, são exigem, além da manifestação de vontade, uma forma pré determinada
comportamentos humanos destinados à produção de efeitos, quais em lei. (exemplo: testamento público, constante dos artigos 1864 a 1867
sejam, criar, modificar ou extinguir direitos, dentro dos limites do do Código Civil Brasileiro), ou informais (não solenes), quando não é
Ordenamento Jurídico. exigida nenhuma outra formalidade além da manifestação de vontade
Vale dizer que o Ordenamento Jurídico estabelece alguns limites (exemplo: contrato de compra e venda).
para a atuação da autonomia privada, de modo a proteger direitos Outra classificação seria: negócios jurídicos impessoais, que
essenciais dos indivíduos, mesmo em suas relações particulares. podem ser realizados por qualquer pessoa (exemplo: qualquer pessoa
Esse limite se concretiza na proibição de determinadas cláusulas pode entrar numa loja e adquirir um produto) e intuitu personae, quando
em alguns contratos do tipo abusivas, desproporcionais. se exige que o sujeito ativo ou passivo seja uma pessoa determinada
Dessa forma, o Direito e os negócios jurídicos em muito se (exemplo: procuração, em que uma pessoa vai conceder poderes a uma
relacionam, pois apesar destes se originarem, exclusivamente, de determinada pessoa).
vontades humanas, deverão observar os limites impostos pelo Podem ser constitutivos, quando criam, extinguem ou modificam
Ordenamento Jurídico. relações jurídicas (exemplo: contrato de prestação de serviços - há
Classificações criação de uma relação jurídica; se posteriormente as partes acordam
sobre um aditivo contratual - modifica a relação; e se finaliza o contrato -
51

extingue a relação); ou declaratórios, quando o negócio jurídico apenas Assim, são elementos essenciais, que tornam possível a existência
confirma a existência ou inexistência de uma relação (exemplo: ação de dos negócios jurídicos, a manifestação de vontade, o objeto e a forma.
investigação de paternidade). Mas o negócio jurídico, para surtir efeitos no mundo jurídico,
Por fim, podem ser típicos, quando o Ordenamento Jurídico prevê deverá, além de existir, ser considerado válido.
todos os efeitos do negócio jurídico (exemplo: mandato), ou atípicos, Cumpre salientar que o Código Civil de 2002, art. 104, elenca os
quando são as partes que decidem as conseqüências, dentro de um requisitos necessários para que um negócio jurídico seja válido: agente
limite fornecido pelo Ordenamento Jurídico (exemplo: liberdade de capaz, objeto lícito, possível, determinado ou determinável.
escolha aos nubentes quanto às conseqüências patrimoniais, ou seja, Nessa linha de raciocínio, vale dizer que o elemento essencial é a
relativo aos bens). existência da vontade. Mas para ser considerado válido, um negócio
Elementos dos Negócios Jurídicos jurídico deverá apresentar um agente capaz para que possa expressar
Os elementos do negócio jurídico podem ser essenciais, quando esse consentimento.
dizem respeito às condições para que determinado negócio jurídico Art. 104. A validade do negócio jurídico requer: I - agente capaz; II -
exista; elementos naturais, relacionados às conseqüências naturais da objeto lícito, possível, determinado ou determinável; III - forma prescrita
realização do negócio jurídico (exemplo: negócio jurídico de compra e ou não defesa em lei
venda, o elemento natural é a entrega do produto); e elementos Considera-se capaz toda pessoa que é apta a ser sujeito de direitos
acidentais, que decorrem da vontade das partes em incluí-los ou não em e obrigações.
seus negócios jurídicos. A lei revela que todas as pessoas são capazes, excluindo apenas
Vale dizer que os elementos essenciais e acidentais possuem os incapazes, devidamente definidos, e classificados de acordo com a
algumas particularidades, que serão objeto de maiores esclarecimentos. incapacidade, que pode ser absoluta, ou relativa.
A vontade que é manifestação do consentimento das partes para a Para que os incapazes possam exercer negócios jurídicos válidos,
realização do negócio jurídico é um dos elementos essenciais. devem estar devidamente representados (absolutamente incapazes), ou
Deve-se verificar a se a vontade foi efetivamente manifestada e se assistidos (relativamente incapazes).
coincide com a vontade real daquele que a declarou. Vale dizer que o agente capaz deverá possuir, ainda, a legitimação,
Ressalta-se que o Código Civil de 2002 consagra a idéia de que, ou seja, além de capaz, o sujeito não pode ser impedido de realizar
será mais valorizado para a interpretação do negócio jurídico, a intenção determinado negócio jurídico. Há casos que o negócio jurídico, por sua
daquele que manifestou a vontade, do que seu sentido literal, conforme natureza, exige um plus, além plena capacidade, que é tida como uma
preceitua o art. 112 do CCB. capacidade especial.
Art. 112. Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção Outro elemento essencial é a existência do objeto, mas para a
nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem. validade do negócio jurídico, impõe a lei, que esse objeto deverá ser
Ademais, também servirão de auxílio para a interpretação dos lícito, ou seja, admitido pelas regras de Direito; possível, que esteja
negócios jurídicos a boa- fé (de forma que as intenções maliciosas sejam dentro das possibilidades humanas e físicas; determinado ou
repudiadas) e os usos do local da celebração (art. 113 do CCB). determinável, ou seja, que o objeto seja do conhecimento das partes no
Outro elemento essencial é que exista um objeto, sobre o qual vai momento que surge o negócio jurídico, ou possa ser determinado até a
se referir o negócio jurídico. conclusão do referido negócio.
Art. 113 Art. 113. Os negócios jurídicos devem ser interpretados Por fim há o negócio, para existir, há de ser materializado numa
conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração. forma, e para a sua validade a forma deverá ser a prescrita, ou seja, da
Por fim o negócio jurídico deve possuir forma, ou seja, se dar maneira que a lei determine, ou não defeso em lei, que significa que o
mediante acordo escrito ou verbal. negócio jurídico não poderá possuir uma forma que a lei proíba.
52

Dessa forma, para o negócio jurídico ser válido, deverá possuir : Os termos podem ser certos, quando estipulam precisamente a
Agente capaz data do início ou fim do negócio jurídico (exemplo: Contrato de locação
Objeto lícito de 6 meses), ou incertos, quando, embora destacada a sua ocorrência,
Forma prescrita ou não defeso em lei não se tem a plena noção do dia que irá ocorrer (te empresto meu carro
Os elementos acidentais, como já dito anteriormente, são aqueles até você se formar).
que podem ou não conter num determinado negócio jurídico, O encargo, ou modo, são elementos acidentais que conferem à
dependendo da vontade das partes. parte um benefício acompanhado de um ônus, ou seja, de uma obrigação
São eles a condição, o encargo e o termo. (contraprestação).
Condição: evento futuro e incerto a qual se subordina os efeitos do Vale dizer o encargo ocorre em negócios jurídicos inter vivos ou
ato jurídico, conforme determina o art. 121 do CCB. causa mortis. Exemplo: Te deixo minha casa, mas terá de construir uma
Elas podem ser resolutivas, ou seja, são condições que, enquanto creche.
não ocorrerem vigora o negócio jurídico. Exemplo: Te empresto meu Noções fundamentais
carro enquanto eu não me mudar (a mudança é evento futuro e incerto, e Primeiramente é importante dizer que os negócios jurídicos
dessa forma o carro ficará emprestado até o implemento da condição). poderão estar viciados, ou seja, poderão conter defeitos que prejudiquem
Está disposta no art. 127 do CCB. a sua existência ou execução.
Art. 121. Considera-se condição a cláusula que, derivando Pode-se dizer que esses defeitos podem ser graves, quando
exclusivamente da vontade das partes, subordina o efeito do negócio comprometem a própria validade do negócio jurídico ou leves, quando,
jurídico a evento futuro e incerto. apesar de apresentarem defeitos, podem ser remediados.
Art. 127. Se for resolutiva a condição, enquanto esta se não Defeitos graves
realizar, vigorará o negócio jurídico, podendo exercer-se desde a Quando se verifica a existência de um vício grave nos negócios
conclusão deste o direito por ele estabelecido. jurídicos, estes negócios são considerados nulos vez que apresentam um
Suspensivas são aquelas condições que, enquanto não ocorridas, vício tão prejudicial que não poderão contar com o requisito de validade.
o negócio jurídico não produz efeitos. Exemplo: Vou te dar um São os casos dispostos no art. 166 e 167 do CCB, no qual é
apartamento se você passar no vestibular (a condição é futura e incerta, aplicada a nulidade aos atos celebrados por absolutamente incapaz,
e enquanto não ocorrer a pessoa não está obrigada a dar o quando o objeto for ilícito, impossível ou indeterminado, quando não
apartamento). Está disposta no art. 125 do CCB. respeitar a forma ou solenidade prevista em lei, quando fraudar lei
Vale dizer que as condições ainda podem ser: causais, quando o imperativa, quando a lei assim o declarar, e quando houver simulação.
evento futuro e incerto depende do acaso (por exemplo sorte- se eu Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando: I - celebrado por pessoa
ganhar na loteria...), potestativas, quando o evento futuro e incerto absolutamente incapaz; II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu
dependerá exclusivamente da parte (exemplo: se eu me mudar, te dou objeto; III - o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito;
uma casa...), ou mistas, quando dependem do acaso, como da parte. IV - não revestir a forma prescrita em lei; V - for preterida alguma
(exemplo: vendo minha casa se o vizinho vender a dele). solenidade que a lei considere essencial para a sua validade; VI - tiver
Art. 125. Subordinando-se a eficácia do negócio jurídico à condição por objetivo fraudar lei imperativa; VII - a lei taxativamente o declarar
suspensiva, enquanto esta se não verificar, não se terá adquirido o nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.
direito, a que ele visa. Art. 167. É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que
Os termos, por outro lado, não dependem de um evento futuro e se dissimulou, se válido for na substância e na forma.
incerto, mas de uma data prevista para que o negócio jurídico comece e A simulação ocorre quando as partes, maliciosamente, pactuam um
termine a surtir seus efeitos no mundo jurídico. determinado negócio jurídico, mas na verdade desejam outros efeitos,
53

visando fraudar a lei ou terceiros. Ambas as partes têm o objetivo da a terceiros ou à lei. São eles a simulação (que, conforme já visto foi
fraude. levado à condição de defeito grave), a fraude contra credores e a lesão.
A declaração de vontade das partes induz a uma situação aparente, Vale dizer que, alguns doutrinadores discutem a natureza do estado
não realmente desejada pelas partes, que, a criam, para ocultar seus de perigo e da lesão. Alguns consideram que estes vícios estariam
reais interesses que são prejudiciais a terceiros ou à lei. classificados em uma zona cinzenta, pois pertenceriam tanto aos vícios
Vale lembrar que no Código Civil de 1916, a simulação era tida do consentimento, quanto aos vícios sociais.
como defeito leve, contudo, no Código Civil de 2002, ela passou à Dessa forma é importante se estabelecer uma análise sobre cada
condição de defeito grave, gerando a sua nulidade. um dos vícios de consentimento e vícios sociais.
São casos de simulação: quando as partes confiram ou transfiram O erro ocorre quando a pessoa que fornece a declaração
direitos para pessoas diversas daquelas às quais realmente conferiram desconhece completamente a realidade (ignorância), ou possui falsa
ou transfiram; quando tiverem declarado, confessado ou produzido percepção da mesma (erro).
cláusulas ou condições falsas, e quando apresentarem instrumentos O erro, para ser motivo de anulação de um negócio jurídico, deverá
particulares ante- datados ou pós datados. ser substancial e perdoável, ou seja, deve versar sobre algo relevante
Vale dizer que a nulidade de um negócio jurídico é uma forma de dentro do negócio jurídico, e, ainda, ser admissível que a pessoa
proteção das partes, contida no Ordenamento Jurídico, pois trata-se um desconheça a realidade.
vício tão grave, em que o referido negócio contaminado não poderá surtir Pode-se dizer que o erro é essencial quando se dá em relação à
seus efeitos. natureza do negócio, identidade e qualidade de determinada pessoa ou
A nulidade atua como meio de fazer desaparecer o negócio viciado, objeto e em relação à lei (quando não significar recusa ou oposição à sua
tendo agido como se nunca tivesse existido. Seria o chamado efeito ex aplicação).
tunc, pois atinge o ato desde de seu nascimento, apagando todo e Já no vício de dolo, diferentemente do erro (em que a vítima estava
qualquer efeito decorrente do negócio nulo. enganada sobre a realidade), a vítima é enganada, ou seja, ela é
Vale dizer que esses defeitos poderão ser alegados por qualquer induzida a erro pela outra parte da relação ou por terceiro.
interessado, e pelo Ministério Público, por ofenderem as normas de No dolo estão presentes a intenção de prejudicar alguém,
Ordem Pública. E, embora, o juiz no processo somente possa atuar associada à utilização de artifício grave e malicioso. Objetiva-se a
mediante provocação, quando estiver diante de algum desses vícios, obtenção da manifestação de vontade equivocada, sendo a causa
poderá atuar de ofício, ou seja, independente de qualquer requerimento. determinante para a realização do negócio.
Pode-se dizer, ainda, que a alegação desses vícios é imprescritível, Vale dizer que o dolo poderá ser principal ou acidental.
ou seja, poderão ser alegados a qualquer tempo, pois não são passíveis O dolo principal é aquele em que fica comprovado que o negócio
de recuperação pelo decurso do tempo. não teria ocorrido sem sua participação, ou seja, quando ficar evidente
Por outro lado, há os defeitos mais leves, que se distinguem em que o negócio teve como sua causa principal, para a manifestação de
vícios do consentimento e vícios sociais. vontade, o dolo.
Os vícios do consentimento, se relacionam à manifestação da era, portanto, acidental, quando não impediria a realização do
vontade, que é desvirtuada, ou seja, se externa de maneira equivocada. negócio jurídico, ou seja, o referido negócio seria realizado de qualquer
Os vícios do consentimento são o erro, o dolo, a coação e o estado forma, embora por outro modo. Vale dizer que nesse caso, o dolo não vai
de perigo. anular o negócio jurídico, contudo, aquele responsável pelo dolo
Já nos vícios sociais não há a manifestação de vontade acidental, será obrigado à satisfação de perdas e danos, conforme
desvirtuada. O consentimento revela exatamente o que o declarante depreende-se do art. 146 do CCB.
deseja, mas, no funcionamento do negócio jurídico, verifica-se o prejuízo,
54

Cumpre salientar que o CCB consagrou, ainda, o dolo de terceiro. A devesse ter conhecimento, responderá pelos prejuízos juntamente com o
parte que se beneficia do dolo do terceiro, se dele tiver conhecimento, ou terceiro. (art. 154 do CCB).
devesse ter o negócio será anulável. Contudo se a parte de nada Art. 154. Vicia o negócio jurídico a coação exercida por terceiro, se
soubesse, o terceiro será responsável pelas perdas e danos que a parte dela tivesse ou devesse ter conhecimento a parte a que aproveite, e esta
prejudicada sofreu, conforme dispõe o art. 148 CCB. responderá solidariamente com aquele por perdas e danos.
Art. 146. O dolo acidental só obriga à satisfação das perdas e O último vício do consentimento é o estado de perigo, em que a
danos, e é acidental quando, a seu despeito, o negócio seria realizado, parte assume obrigação excessivamente onerosa em virtude da
embora por outro modo. necessidade de salvar-se a si ou pessoa de sua família.
Art. 148. Pode também ser anulado o negócio jurídico por dolo de Verifica-se a existência de dois elementos caracterizadores do
terceiro, se a parte a quem aproveite dele tivesse ou devesse ter estado de perigo: obrigação excessivamente onerosa e a situação de
conhecimento; em caso contrário, ainda que subsista o negócio jurídico, perigo que ameaça a parte ou a pessoa de sua família.
o terceiro responderá por todas as perdas e danos da parte a quem Um exemplo seria o da pessoa que promete pagar a outra
ludibriou. R$10.000,00, se ela salvar a sua filha, que caiu numa lagoa e não sabe
Ressalta-se que, se as duas partes atuarem com dolo na nadar. Nesse caso verifica-se a existência do estado de perigo, pois
pactuação do negócio jurídico, nenhuma das duas poderá alegá-lo para estão presentes os requisitos necessários à sua configuração.
anular o referido negócio ou reclamar indenização por perdas e danos. Ressalta-se que a parte deverá conhecer do estado de perigo a
A coação, outro vício de consentimento, se apresenta como a que a outra a parte está ameaçada, para configurar a anulação do
violência empregada para que alguém seja forçado a manifestar uma negócio jurídico.
vontade diversa de sua vontade real. É importante dizer que, tanto na coação, quanto no estado de
Na coação, a pessoa está pressionada, injustamente, a exercer perigo, apesar da lei se referir apenas à pessoa da família, se a ameaça
uma conduta, em virtude da violência utilizada. ocorrer com pessoa que não é da família, o juiz deverá analisar as
Vale dizer que a violência pode ser física (vis absoluta) ou moral circunstâncias do caso concreto, de forma que se convença ou não da
(vis compulsiva). existência real dos vícios.
A violência física é exercida sobre o corpo da pessoa, e por sua Os vícios sociais, por sua vez, conforme já dito, refletem a correta
natureza, pode-se dizer que exclui a própria manifestação de vontade. manifestação da vontade, mas apresentam defeitos no funcionamento do
Dessa forma, quando exercida violência física, o negócio jurídico será negócio jurídico.
considerado inexistente. A lesão, é uma novidade trazida pelo Novo Código de 2002.
Já a coação moral é aquele exercida sobre o psicológico, levando a Vale dizer que a lesão ocorre quando o negócio jurídico, embora
pessoa a possuir um fundado temor de dano iminente e considerável à tenha se originado de forma correta, durante o seu curso, surge uma
ela, à sua família, ou a seus bens. grande desproporção entre as prestações das partes. O negócio jurídico,
Vale dizer que o receio provocado deverá ser fundado, não então, perde seu equilíbrio.
podendo ser simples temor reverencial (relacionados ao respeito). alienta-se que a lesão apresenta dois elementos: um objetivo e
Também não constituirá coação a ameaça do exercício regular de outro subjetivo. O elemento objetivo será a desproporção existente entre
um direito. Por exemplo: não será coação se uma pessoa disser à outra, as prestações das partes; já o elemento subjetivo diz respeito à extrema
que se não pagar uma dívida devida, tomará as providencias judiciais necessidade ou inexperiência da parte.
cabíveis como a execução. Cumpre ressaltar que a parte que sofre a lesão não necessita
Da mesma forma que o dolo, a coação também poderá ser comprovar que a outra parte sabia da lesão, bastando, tão somente,
exercida por terceiro, e, se a parte a quem a aproveita soubesse ou comprovar a necessidade e a inexperiência.
55

Dessa forma, percebe-se que o Código de 2002 não objetiva, No art. 171, I, do CCB, dispõe que, também, podem ser anulados
nesse assunto, punir a conduta do outro, mas proteger quem foi os atos praticados por agente relativamente incapaz.
lesionado, não admitindo a quebra do Princípio da comutatividade (que Vale dizer que somente as pessoas interessadas é que poderão
preza o equilíbrio nas relações), que deverá reger os negócios jurídicos. requerer a anulação do negócio jurídico, e os efeitos do negócio jurídico
o negócio jurídico não será anulado se for feita uma revisão somente serão anulados a partir da sentença declarada pelo juiz.
contratual que restitua o equilíbrio das prestações das partes, reduzindo Assim pode-se dizer que a anulabilidade possui efeitos ex nunc (ou
o proveito ou fornecendo o suplemento suficiente para que seja o seja, somente se dão a partir da sentença, não atingindo o negócio
equilíbrio restituído na relação. desde de seu nascimento).
Já a fraude contra credores ocorre quando a pessoa, que está Art. 171. Além dos casos expressamente declarados na lei, é
devendo credores, efetua negócios jurídicos gratuitos (exemplo: doação), anulável o negócio jurídico: I - por incapacidade relativa do agente;
remissão de dívida (extinção da obrigação pelo perdão da dívida), ou Outro aspecto é que quando não houver um prazo estipulado em lei
contratos onerosos (exemplo: vende ou onera seus bens) com o intuito para que a anulação seja requerida, este será de dois anos, conforme
de prejudicar os direitos dos credores. depreende-se do artigo 179 do CCB.
Vale dizer que o devedor que faz essa disposição de bens já está A excepciona as situações que terão outro prazo no artigo 178 do
insolvente, ou esses atos ocasionarão a insolvência do devedor, que não CCB, que dispõe que será de quatro anos o prazo para requerer a
poderá mais arcar com suas dívidas. anulação, a contar: do dia que cessar a coação (no caso de vício de
Ressaltar-se que são considerados negócios fraudulentos, os coação), do dia em que se realizou o negócio jurídico (no caso de erro,
contratos onerosos, quando estiver notória a insolvência do devedor, e dolo, fraude contra credores e estado de perigo) ou do dia em que cessar
ainda, quando existir motivo para que a parte, com quem foi feito o a incapacidade relativa (nos casos dos incapazes).
negócio, sabia dessa condição. Art. 179. Quando a lei dispuser que determinado ato é anulável,
Acrescenta-se que os credores que poderão reclamar a anulação sem estabelecer prazo para pleitear-se a anulação, será este de dois
desses negócios jurídico com fraude serão apenas os quirografários, ou anos, a contar da data da conclusão do ato.
seja, somente aqueles que não possuem qualquer garantia para o Art. 178. É de quatro anos o prazo de decadência para pleitear-se a
recebimento de seu crédito se não o patrimônio do devedor (diferente anulação do negócio jurídico, contado: I - no caso de coação, do dia em
daqueles credores que possuem como garantia, por exemplo, a que ela cessar; II - no de erro, dolo, fraude contra credores, estado de
hipoteca), ou aos credores que, embora possuam garantia, tenha essa se perigo ou lesão, do dia em que se realizou o negócio jurídico; III - no de
tornado insuficiente para cobrir o crédito do devedor. atos de incapazes, do dia em que cessar a incapacidade.
Acrescenta-se que a ação cabível para que os negócios jurídicos que o negócio, embora anulável, pode ser confirmado pelas partes,
com fraude sejam anulados é denominada AÇÃO PAULIANA, ou contanto que não prejudique direitos de terceiros, tenha a essência do
REVOCATÓRIA. negócio que foi celebrado e que haja manifestação de vontade expressa
Salienta-se, oportunamente, que os negócios jurídicos ordinários nesse sentido.
indispensáveis à manutenção de estabelecimento mercantil, rural ou Por fim, é importante destacar que o art. 170 do CCB, estipula uma
industrial, ou relativos ao sustento do devedor e de sua família, são regra de conservação dos negócios jurídicos, haja vista que poderá ser
considerados negócios de boa- fé, não sendo estes passíveis de utilizada diante de atos nulos ou anuláveis.
anulação. Art. 170. Se, porém, o negócio jurídico nulo contiver os requisitos
Vale dizer que a anulação, penalidade existente contra negócios de outro, subsistirá este quando o fim a que visavam as partes permitir
jurídicos que possuam os vícios acima abordados, prevê outros casos, supor que o teriam querido, se houvessem previsto a nulidade.
como nos casos em que a lei assim determinar.
56

Contudo, essa medida será mais relevante nos casos de negócios Pode-se dizer que a conduta humana, para ser elemento do ato
nulos, pois os negócios anuláveis, como já fora visto, podem ser ilícito, deverá ser ilícita, ou seja, contrária aos preceitos de Direito, de
confirmados. forma a desrespeitar um dever jurídico.
Esse artigo dispõe que um negócio jurídico poderá ser Só pratica ato ilícito aquele que possui um dever jurídico e não
reclassificado, ou seja, poderá ser convertido em outro, que seja obedece esse dever.
considerado válido, se estiver dentro das finalidades pretendidas pelas A conduta deve ser imputável ao autor do fato, ou seja, deverá ser
partes. atribuída ao agente causador do dano.
Ressalta-se que, para que tal conversão possa ocorrer, é diferentemente do que preconiza o princípio de Direito Penal, em
necessário que os elementos fáticos do negócio sejam aproveitados, e que a pena não passará da pessoa do condenado, no âmbito da
que a intenção dos agentes seja no sentido de reclassificar o negócio responsabilidade civil, poderá existir casos em que a responsabilidade
jurídico. será indireta, ou seja, terceiros responderão pelos atos praticados por
Ato Ilícito outros.
São duas as idéias que se deve ter em mente para se definir o Essa hipótese pode ocorrer em virtude de uma determinada relação
significado de ato ilícito. jurídica, conforme estipula o art. 932 do CCB (como no caso dos pais em
Pratica ato ilícito o indivíduo que, por sua ação ou omissão, que relação aos filhos, tutores e curadores em relação aos seus tutelados e
age com culpa (em seu sentido amplo, envolvendo o dolo, ou seja, a curatelados, empregadores em relação a seus trabalhadores, e donos de
intenção de causar o dano; e a culpa, quando o agente agir de forma hotéis, hospedarias, e escolas em relação aos hóspedes, moradores e
negligente, imprudente ou com imperícia), provocando dano a outrem. alunos, e os que tiverem participado do produto do crime).
a noção de ato ilícito é a de abuso de direito, que ocorre quando a Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil: I - os pais,
pessoa, ao exercer um direito, excede os limites permitidos em razão das pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua
finalidades do direito, seu fim econômico e social, boa-fé e os bons companhia; II - o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se
costumes, tendo como resultado, também, um dano provocado a outrem. acharem nas mesmas condições; III - o empregador ou comitente, por
Dessa forma, o ato ilícito é devido àquele que agir com culpa ou em seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que
abuso de direito. lhes competir, ou em razão dele; IV - os donos de hotéis, hospedarias,
Vale dizer que o CCB impõe àquele que pratica ato ilícito a casas ou estabelecimentos onde se albergue por dinheiro, mesmo para
obrigação de reparar o dano mediante indenização, pelo instituto da fins de educação, pelos seus hóspedes, moradores e educandos; V - os
responsabilidade civil, conforme depreende-se do art. 927 do CCB. que gratuitamente houverem participado nos produtos do crime, até a
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a concorrente quantia.
outrem, fica obrigado a repará-lo. O nexo
Ato ilícito, lembrando, é ação ou omissão daquele que agiu com o nexo relaciona-se com o vínculo de causalidade entre a conduta
culpa e causou dano a terceiro. ilícita e o dano, ou seja, o dano deve decorrer diretamente da conduta
Dessa forma é importante estabelecer algumas considerações ilícita praticada pelo indivíduo, sendo, pois, conseqüência única e
sobre a configuração do ato ilícito. exclusiva dessa conduta.
Para a configuração do ato ilícito, deverá existir os requisitos: Ressalta-se que as responsabilidades apuradas no âmbito criminal
conduta humana, nexo, dano, culpa. e no âmbito cível, são independentes, vez que punem de forma distinta,
Conduta humana impondo sanções diferentes.
A absolvição no juízo criminal não impede a indenização no juízo
cível.
57

Somente impedirá a responsabilidade civil caso fique comprovado Pela imperícia verifica-se a culpa decorrente da inabilidade técnica,
no juízo criminal a inexistência do fato e ausência de autoria pelo agente, em que o agente não é apto a prestar a função a que estava obrigado a
ou seja, se aquela pessoa não for a autora da conduta ilícita, conforme exercer ou cumprir.
depreende-se do art. 935 do CCB. Teorias da culpa
O dano Diante dessa exposição é importante lembrar que, a obrigação de
a responsabilidade civil, deverá existir o dano, ou seja, o reparar o dano pode ser adotada em virtude da culpa (responsabilidade
comprovado prejuízo da vítima, que enseje, dessa maneira, a reparação. subjetiva) ou mesmo sem que esta seja verificada (responsabilidade
Salienta-se que a responsabilidade civil, e a conseqüente objetiva).
indenização, decorre da noção de compensação, ou seja de reconfortar a A teoria da responsabilidade subjetiva, a que se refere o artigo 186
vítima diante do prejuízo por ela amargado. do CCB, tem como centro de sua preocupação o ato ilícito, o sujeito
Acrescenta-se que o dano pode ser patrimonial, ou moral. causador do dano. A teoria, preconiza que o agente causador do dano
Os danos patrimoniais atingem bens jurídicos que podem ser seja devidamente punido. Dessa forma, para que essa punição seja
auferidos pecuniariamente, ou seja, relacionados a uma quantia em correta e justa, é fundamental verificar a culpa que o agente possui no
dinheiro. caso concreto.
Já os danos morais ofendem direitos que não estão na esfera Já a teoria da responsabilidade objetiva concentra seu objetivo na
patrimonial, que dizem respeito aos direitos personalíssimos, vítima, que deverá ser recompensada pelo prejuízo por ela sofrido em
relacionados com o direito à integridade física, psíquica e moral. virtude da atitude de outro. Assim independente que a pessoa tenha
Pode-se dizer que, atualmente, a indenização decorrente da agido com culpa (em sentido amplo), o mais importante é que haja a
responsabilidade do agente a reparar o dano, é medida pela extensão do responsabilidade.
mesmo, ou seja, será proporcional ao prejuízo causado. Dessa forma, mais importante nessa teoria é a reparação dos
Entretanto, a indenização poderá ser menor que o dano provocado, danos sofridos pela vítima, que deverá existir independentemente da
quando o juiz verificar que houve excessiva desproporção entre a apuração da culpa.
gravidade da culpa e o dano efetivamente provocado (art. 944, parágrafo Percebe-se que o traço distintivo dessas teorias é a existência da
único do CCB). culpa, e pode-se dizer que o Código Civil de 2002 adota a teoria da culpa
A culpa subjetiva, mas lista algumas situações em que a responsabilidade será
Já fora especificado que a culpa a que se refere o artigo 186, está objetiva, conforme dispõe o parágrafo único do art. 927.
no sentido amplo, ou seja, envolve o dolo e a culpa propriamente dita. Esse dispositivo se refere a responsabilidade objetiva quando a lei
O dolo é a intenção, ou seja, é a vontade direcionada do agente de assim determinar, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo
cometer o ato, destinado a causar o dano. autor do dano, implicar, por sua natureza, em risco para os direitos de
Já a culpa pode ser expressada em três noções: negligência, outrem.
imprudência ou imperícia. Excludentes do ilícito
A negligência é explicada como o descaso ou acomodação do Segundo o artigo 188, não constituem atos ilícitos os atos
agente, que não toma as providências necessárias ao cumprimento do praticados em:
dever jurídico a que está obrigada. - legítima defesa (quando se revelar numa conduta necessária e
Já a imprudência se verifica pelo excesso de confiança do agente, moderada no intuito de evitar um malefício injusto, grave e iminente);
que age sem o devido cuidado a que necessitava a situação. - exercício regular de um direito (quando a lei autoriza o exercício
de um direito, que é praticado dentro de suas finalidades e limites);
58

- perigo iminente (decorrente do estado de necessidade, em que o São eles :


agente, para proteger um bem jurídico seu, destrói ou deteriora coisa PRINCÍPIOS PREVISTOS NA LEI DO PROCESSO
alheia ou causa lesão a uma pessoa, no intuito repelir o perigo iminente. ADMINISTRATIVO
Art. 188. Não constituem atos ilícitos: I - os praticados em legítima
defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido; II - a PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS EXPRESSOS
deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de Constam do art. 37, caput, da Constituição da República, vejamos :
remover perigo iminente. Parágrafo único. No caso do inciso II, o ato será “Art. 37 - A administração pública direta e indireta de qualquer dos
legítimo somente quando as circunstâncias o tornarem absolutamente Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
necessário, não excedendo os limites do indispensável para a remoção obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,
do perigo. publicidade e eficiência”.
Exige-se que o perigo seja atual e inevitável, não provocado pelo Sua principal característica é serem de observância obrigatória a
agente causador do dano e que dele não se possa exigir o sacrifício do União, Estados, Distrito Federal e Municípios. São eles :
bem jurídico que se encontrava em perigo. Legalidade - determina a completa submissão da Administração
Pública a lei e ao Direito. Desde o Presidente da República, Governador,
Referências Bibliográficas Prefeito ao mais humilde dos servidores ao agirem devem observar
atenção especial a este princípio.
NADER, Paulo. Introdução ao Estudo de Direito, 24ª ed. Rio de Na célebre frase de Hely Lopes Meirelles encontra-se toda a sua
Janeiro: Forense, 2004. essência :
MACHADO, Edgar da Mata. Elementos de Teoria Geral do Direito, “na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autor
4ª ed. Belo Horizonte: UFMG, 1995. Administração privada é possível fazer o que a lei não proíbe.”
FIUZA, Cesar. Direito Civil- Curso Completo. 5ª ed. Belo Horizonte: Impessoalidade - destina-se a quebrar o velho hábito do agir em
Del Rey, 2002. razão do prestígio ou influência do administrado (particular) ou do agente
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil, 3ª ed. São Paulo: Atlas, (servidor). Decorre deste princípio que o fim visado a de ser o do
2003. interesse público. Considerar-se-á desvio de finalidade a Administração
NERY JUNIOR, Nelson. NERY, Rosa Maria de Andrade. Código utilizar de sua competência para atingir fim diferente do interesse público.
Civil Anotado, 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. Moralidade - está intimamente ligado aos conceito de probidade,
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. São Paulo: de honestidade, do que for melhor e mais útil para o interesse público.
Saraiva, 1983, 6v. Por este princípio a Administração e seus servidores têm de atuar
segundo padrões éticos de probidade, decoro e boa-fé. Assim a atividade
administrativa deve obedecer não apenas à lei, mas, também seguir
Direito ADMINISTRATIVO princípios éticos. Não se diga que se trata de princípio indeterminado
perante o qual não se poderá invalidar um ato administrativo. A própria
Conjunto de normas e princípios que regem a atuação da CF/88, no artigo 5º, inciso LXXII, dispõe que : "qualquer cidadão é parte
Administração Pública (Odete Medauar, Direito Administrativo Moderno, legítima para propor ação popular que vise anular ato lesivo à moralidade
5ª edição, 2001, editora Revista dos Tribunais, pág. 29). administrativa..."
Publicidade - A administração pública encontra-se obrigada a
PRINCÍPIOS BÁSICOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA publicar seus atos para que o público deles tenham conhecimento, e,
PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS EXPRESSOS conseqüentemente, contestá-los . Por exemplo : o ato de nomeação de
59

um candidato aprovado em concurso público, deverá ser publicado não disponibilidade é o Estado. Por essa razão há necessidade de lei para
somente para que o nomeado possa tomar conhecimento, mas para que alienar bens, outorgar a concessão de serviços públicos. "Serão
os demais candidatos possam contestar(questionar administrativamente observados critérios de atendimento a fins de interesse geral, vedada a
ou judicialmente, no caso da nomeação não obedecer rigorosamente a renúncia total ou parcial de poderes ou competências, salvo autorização
ordem de classificação. em lei" (Lei 9.784/99, parágrafo único, II).
Eficiência - Ë o mais novo dos princípios. Passou a fazer parte da
Constituição a partir da Emenda Constitucional nº 19, de 04.06.98. Exige PRINCÍPIO DA FINALIDADE
que o exercício da atividade administrativa (atuação dos servidores, Impõe que o alvo a ser alcançado pela Administração é o
prestação dos serviços) atenda requisitos de presteza, adequabilidade, atendimento ao interesse público, e não se alcança o interesse público
perfeição técnica, produtividade e qualidade. se for perseguido o interesse particular. Assim, o administrador ao
manejar as competências postas a seu encargo, deve atuar com rigorosa
obediência à finalidade de cada qual.
PRINCÍPIOS PREVISTOS NA LEI DO PROCESSO
ADMINISTRATIVO PRINCÍPIO DA AUTOTUTELA
A Lei nº 9.784, de 29.01.1999, art. 2º, prevê que A Administração "A Administração Pública deve anular seus próprios atos , quando
Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da : eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de
 supremacia do interesse público sobre o interesse particular conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos" (Lei
 indisponibilidade 9.784/99, art. 53).
 finalidade, Assim a Administração :
 motivação, a) revoga os atos inconvenientes e inoportunos, por razões de
 razoabilidade e proporcionalidade, mérito;
 ampla defesa e contraditório, b) anula os atos ilegais.
 segurança jurídica,
PRINCÍPIO DA MOTIVAÇÃO
 autotutela
Impõe à Administração Pública o dever de indicar os pressupostos
de fato e de direito que determinarem uma decisão tomada.
PRINCÍPIO DA SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO
Decorre deste princípio posição de supremacia jurídica da
PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO
Administração em face da supremacia do interesse público sobre o
Trata-se de exigência constitucional, prevista no art. 5º, inciso LV, :
interesse particular. A aplicação desse princípio não significa o total
"aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados
desrespeito ao interesse particular, já que a Administração deve
em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios
obediência ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito, nos termos do
e recursos a ela inerentes".
art. 5º, inciso XXXVI, da CF/88.
Contraditório – é a garantia que cada parte tem de se manifestar
sobre todas as provas e alegações produzidas pela parte contrária.
PRINCÍPIO DA INDISPONIBILIDADE
Ampla defesa – é a garantia que a parte tem de usar todos os
Os bens, direitos, interesses e serviços públicos não se acham à
meios legais para provar a sua inocência ou para defender as suas
livre disposição dos órgãos públicos, ou do agente público, mero gestor
alegações.
da coisa publica, a quem apenas cabe curá-los e aprimorá-los para a
finalidade pública a que estão vinculados. O detentor desta
60

PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE


Por este princípio se determina a adequação entre meios e fins, PODER HIERÁRQUICO
vedada a imposição de obrigações, restrições e sanções em medida É aquele pelo qual a Administração distribui e escalona as
superior àquelas estritamente necessárias ao atendimento do interesse funções de seus órgãos, ordena e rever a atuação de seus agentes,
público. estabelece a relação de subordinação entre os servidores públicos de
seu quadro de pessoal. No seu exercício dão-se ordens, fiscaliza-se,
PODERES ADMINISTRATIVOS delega-se e avoca-se.
Os Poderes Administrativos são inerentes à Administração Pública
e possuem caráter instrumental, ou seja, são instrumentos de trabalho PODER DISCIPLINAR
essenciais para que a Administração possa desempenhar as suas Ë aquele através do qual a lei permite a Administração Pública
funções atendendo o interesse público. Os poderes são verdadeiros aplicar penalidades às infrações funcionais de seus servidores e demais
poderes-deveres, pois a Administração não apenas pode como tem a pessoas ligadas à disciplina dos órgãos e serviços da Administração. A
obrigação de exercê-los. aplicação da punição por parte do superior hierárquico é um poder-dever,
se não o fizer incorrerá em crime contra Administração Pública (Código
CLASSIFICAÇÃO DOS PODERES Penal, art. 320).
 Poder Vinculado Ex : Aplicação de pena de suspensão ao servidor público.
 Poder Discricionário Poder disciplinar não se confunde com Poder Hierárquico. No
 Poder Hierárquico Poder hierárquico a administração pública distribui e escalona as funções
 Poder Disciplinar de seus órgãos e de seus servidores. No Poder disciplinar ela
 Poder Regulamentar responsabiliza os seus servidores pelas faltas cometidas.
 Poder de Polícia
PODER REGULAMENTAR
PODER VINCULADO Ë aquele inerente aos Chefes dos Poderes Executivos
Ë o Poder que tem a Administração Pública de praticar certos atos (Presidente, Governadores e Prefeitos) para expedir decretos e
"sem qualquer margem de liberdade". A lei encarrega-se de prescrever, regulamentos para complementar, explicitar(detalhar) a lei visando sua
com detalhes, se, quando e como a Administração deve agir, fiel execução. A CF/88 dispõe que :
determinando os elementos e requisitos necessários. “ Art. 84 - Compete privativamente ao Presidente da República:
Ex : A prática de ato (portaria) de aposentadoria de servidor público. IV - sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir
decretos e regulamentos para sua fiel execução”;
PODER DISCRICIONÁRIO
É aquele pelo qual a Administração Pública de modo explícito ou O direito brasileiro não admite os chamados "decretos autônomos", ou seja a
implícito, pratica atos administrativos com liberdade de escolha de sua matéria reservada à lei.
conveniência, oportunidade e conteúdo.
A discricionariedade é a liberdade de escolha dentro de limites PODER DE POLÍCIA
permitidos em lei, não se confunde com arbitrariedade que é ação “Considera-se poder de polícia a atividade da administração
contrária ou excedente da lei. pública que, limitando o disciplinando direito, interesse ou liberdade,
Ex : Autorização para porte de arma; Exoneração de um ocupante regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse
de cargo em comissão. público...” (Código Tributário Nacional, art. 78, primeira parte)”
61

Em resumo : através do qual a Administração Pública tem a


faculdade de condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e ELEMENTOS (Requisitos de validade) do ATO ADMINISTRATIVO
direitos individuais, em benefício do interesse público. Os ELEMENTOS ESSENCIAIS à formação do ato administrativo,
Extensão do Poder de Polícia - A extensão é bastante ampla, constituem a sua infra-estrututa, daí serem reconhecidos como
porque o interesse público é amplo. Segundo o CTN “Interesse público é REQUISITOS DE VALIDADE. As letras iniciais formam a palavra
aquele concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à COMFIFOR MOB.
disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades
econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder COMPETÊNCIA
Público, `a tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos É o poder atribuído ao agente (agente é aquele que pratica o ato)
direitos individuais” (Código Tributário Nacional, art. 78 segunda parte). para o desempenho específico de suas funções.
Ao estudarmos o gênero abuso de poder vimos que uma de suas
LIMITES DO PODER DE POLÍCIA espécies, o excesso de poder, ocorre quando o agente público excede os
Necessidade – a medida de polícia só deve ser adotada para evitar limites de sua competência.
ameaças reais ou prováveis de perturbações ao interesse público;
Proporcionalidade/razoabilidade – é a relação entre a limitação ao FINALIDADE
direito individual e o prejuízo a ser evitado; É o objetivo de interesse público a atingir. A finalidade do ato é
Eficácia – a medida deve ser adequada para impedir o dano a aquela que a lei indica explícita ou implicitamente. Os atos serão nulos
interesse público. Para ser eficaz a Administração não precisa recorrer ao quando satisfizerem pretensões descoincidentes do interesse público. Ao
Poder Judiciário para executar as sua decisões, é o que se chama de estudarmos o gênero abuso de poder vimos que a alteração da
auto-executoriedade. finalidade caracteriza desvio de poder, conhecido também por desvio de
finalidade.

ATOS ADMINISTRATIVOS. FORMA


CONCEITO É o revestimento exteriorizador do ato. Enquanto a vontade dos
É toda manifestação unilateral da Administração Pública que, particulares pode manifestar-se livremente, a da Administração exige
agindo nessa qualidade, tenha por fim imediato adquirir, resguardar, forma legal. A forma normal é a escrita. Excepcionalmente existem : (1)
transferir, modificar, extinguir e declarar direitos, ou impor obrigações aos forma verbal : instruções momentâneas de um superior hierárquico; (2)
administrados ou a si própria (Hely Lopes Meirelles). sinais convencionais : sinalização de trânsito.

ATO ADMINISTRATIVO x ATO JURÍDICO MOTIVO


A diferença essencial entre ato jurídico e ato administrativo reside É a situação de fato ou de direito que determina ou autoriza a
em que o ato administrativo tem finalidade pública. Ato administrativo é realização do ato administrativo. Pode vir expresso em lei como pode ser
uma espécie de ato jurídico. deixado ao critério do administrador.

ATO ADMINISTRATIVO x CONTRATO ADMINISTRATIVO


Diferença entre ato administrativo e contrato administrativo - o Exemplo : dispensa de um servidor ocupante de cargo em
contrato é bilateral (há duas partes com objetivos diversos) ; o ato comissão. A CF/88, diz que o cargo em comissão é aquele declarado em
administrativo é unilateral. lei de livre nomeação e exoneração. Portanto, não há necessidade de
62

motivação do ato exoneratório, mas, se forem externados os motivos, o


ato só será válido se os motivos forem verdadeiros. Assim :
Revogação - é supressão de um ato administrativo legítimo e eficaz
OBJETO realizada pela Administração - e somente por ela - por não mais lhe
É o conteúdo do ato. Todo ato administrativo produz um efeito convir sua existência.
jurídico, ou seja, tem por objeto a criação, modificação ou comprovação Anulação - invalidação de um ato ilegítimo e ilegal, realizada pela
de situações concernentes a pessoas, coisas ou atividades sujeitas à Administração ou pelo Judiciário.
ação do Poder Público. Exemplo : No ato de demissão do servidor o
objeto é a quebra da relação funcional do servidor com a Administração. EFEITOS DECORRENTES :
A revogação gera efeitos - EX NUNC - ou seja, a partir da sua
declaração. Não retroage.
ANULAÇÃO, REVOGAÇÃO E CONVALIDAÇÃO DO ATO A anulação gera efeitos EX TUNC (retroage à data de início dos
ADMINISTRATIVO efeitos do ato).

ANULAÇÃO E REVOGAÇÃO CONVALIDAÇÃO DOS ATOS ADMINISTRATIVOS


A lei 9.784, de 29.01.1999 dispõe que :
"A Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados “A convalidação é o refazimento de modo válido e com efeitos
de vícios de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência retroativos do que fora produzido de modo inválido”(Celso Antônio
ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos" (art. 53). Bandeira de Mello, 11ª edição, editora Melhoramentos, 336).
"O direito da Administração de anular os atos administrativos de
que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco A lei 9.784, de 29.01.1999, dispõe que :
anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-
fé" (art. 54) "Os atos que apresentem defeitos sanáveis poderão ser
“ A Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados convalidados pela própria Administração em decisão na qual se evidencie
de vícios que os tornem ilegais, porque deles não se originam direitos; não acarretarem lesão ao interesse público nem prejuízo a terceiros "
ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados (art. 55).
os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação Assim :
judicial”. Só é admissível o instituto da convalidação para a doutrina dualista,
que aceita possam os atos administrativos ser nulos ou anuláveis.
Principais lições : Os vícios sanáveis possibilitam a convalidação, ao passo que os
A Administração com relação aos seus atos administrativos pode : vícios insanáveis impedem o aproveitamento do ato,”
ANULAR quando ILEGAIS. Os efeitos da convalidação são ex-tunc (retroativos).
REVOGAR quando INCOVENIENTES ou INOPORTUNOS ao
interesse publico. ATOS DE DIREITO PRIVADO PRATICADOS PELA
ADMINISTRAÇÃO
O Judiciário com relação aos atos administrativos praticados pela A Administração Pública pode praticar certos atos ou celebrar
Administração pode: contratos em regime de Direito Privado (Direito Civil ou Direito
ANULAR quando ILEGAIS. Comercial). Ao praticar tais atos a Administração Pública ela se nivela ao
63

particular, e não com supremacia de poder. È o que ocorre, por exemplo, Quanto as espécies devem os atos ser agrupados de um lado sob
quando a Administração emite um cheque ou assina uma escritura de o aspecto formal e de outro lado sob o aspecto material ( ou seu
compra e venda ou de doação, sujeitando-se em tudo às normas do conteúdo). A terminologia utilizada diverge bastante entre os autores.
Direito Privado. Espécies de Atos quanto à forma de exteriorização :
Decretos – são editados pelos Chefes do Poder Executivo,
CLASSIFICAÇÃO DOS ATOS ADMINISTRATIVOS Presidente, Governadores e Prefeitos para fiel execução das leis
A classificação dos atos administrativos sofre variação em virtude (CF/88,art. 84, IV);
da diversidade dos critérios adotados. Serão apresentados abaixo os
critérios mais adotados pelos concursos. Resoluções – praticados pelos órgãos colegiados em suas
deliberações administrativas ,a exemplo dos diversos , Tribunais
Critério nº 1 – classificação quanto a liberdade de ação : (Tribunais Judiciários, Tribunais de Contas ) e Conselhos (Conselhos de
ATOS VINCULADOS - são aqueles nos quais a lei estabelece os Contribuintes, Conselho Curador do FGTS, Conselho Nacional da
requisitos e condições de sua realização. As imposições legais absorvem Previdência Social) ;
quase por completo a liberdade do administrador, pois a ação, para ser
válida, fica restrita aos pressupostos estabelecidos pela norma legal. Instruções, Ordens de serviço, Avisos - utilizados para a
Administração transmitir aos subordinados a maneira de conduzir
ATOS DISCRICIONÁRIOS - são aqueles que a administração pode determinado serviço;
praticar com a liberdade de escolha de seu conteúdo, de seu
destinatário, de sua oportunidade e do modo de sua realização. Alvarás - utilizados para a expedição de autorização e licença,
Ao praticar o ato administrativo vinculado a autoridade está presa denotam aquiescência da Administração no sentido de ser desenvolvida
à lei em todos os seus elementos - COMFIFORMOB- Ao praticar o ato certa atividade pelo particular.
discricionário a autoridade é livre - dentro das opções que a própria lei
prevê - quanto a escolha da conveniência e da oportunidade. Ofícios - utilizados pelas autoridades administrativas para
Não se confunda ato discricionário com ato arbitrário. Arbitrário é comunicarem-se entre si ou com terceiros. São as “cartas” ofícios, por
aquilo que é contrário a lei. Discricionário são os meios e modos de meio delas expedem-se agradecimentos, encaminham-se papéis,
administrar e nunca os fins atingir. documentos e informações em geral.

Critério nº 2 - classificação quanto ao modo de execução Pareceres - manifestam opiniões ou pontos de vista sobre matéria
ATO AUTO-EXECUTÓRIO - possibilidade de ser executado pela submetida a apreciação de órgãos consultivos.
própria Administração.
ATO NÃO AUTO-EXECUTÓRIO - depende de pronunciamento do Espécies de Atos quanto ao conteúdo dos mesmos :
Judiciário. Este item já foi estudado no tópico atributos do ato
administrativo. Admissão – É o ato unilateral e vinculado pelo qual a
Administração faculta a alguém a inclusão em estabelecimento
ESPÉCIES DE ATOS ADMINISTRATIVOS (estudo baseado em governamental para o gozo de um serviço público. Exemplo : ingresso
Celso Antônio Bandeira de Mello) em estabelecimento oficial de ensino na qualidade de aluno; o desfrute
dos serviços de uma biblioteca pública como inscrito entre seus usuários.
64

O ato de admissão não pode ser negado aos que preencham as um volume grande de atribuições, e permitir o seu mais adequado e
condições normativas requeridas. racional desempenho.

Aprovação – é o ato unilateral e discricionário pelo qual a CARACTERÍSTICAS DAS ENTIDADES DA ADMINISTRAÇÃO
Administração faculta a prática de ato jurídico (aprovação prévia) ou INDIRETA
manifesta sua concordância com ato jurídico já praticado (aprovação a
posteriori). AUTARQUIA
criação por lei específica :
Licença - é o ato unilateral e vinculado pelo qual a Administração CF/88, art. 37, com redação dada pela EC nº 19, de 04.06.1998 :
consente ao particular o exercício de uma atividade. Exemplo : licença XIX, : "somente por lei específica poderá ser criada autarquia" e autorizad
para edificar que depende do alvará. Por ser ato vinculado, desde que empresa pública, de sociedade de economia mista e de fundação, cabendo à lei co
cumpridas as exigências legais a Administração não pode negá-la. último caso, definir as áreas de sua atuação;
XX - depende de autorização legislativa, em cada caso, a criação de subsidiá
Autorização - e o ato unilateral e discricionário pelo qual a mencionadas no inciso anterior, assim como a participação de qualquer delas em e
Administração, analisando aspectos de conveniência e oportunidade
faculta ao particular o exercício de atividade de caráter material. Numa
segunda definição é o ato pelo qual a administração faculta ao particular pessoa jurídica de direito público;
o uso privativo de um bem público. Exemplos : autorização de porte de o seu pessoal é ocupante de cargo público (estatutário), no entanto,
arma, autorização para exploração de jazida mineral (CF, art. 146, após a Emenda Constitucional nº 19/98, poderá admitir pessoal no
parágrafo único). A diferença em relação a Licença é que a Administração regime de emprego público;
pode negar a autorização. regime tributário - imunidade de impostos no que se refere ao
patrimônio renda e serviços relacionados a suas finalidades essenciais
Homologação – é o ato unilateral e vinculado de controle pelo qual (CF/88, art. 150, VI, "a", e §2º).
a Administração concorda com um ato jurídico, ou série de atos desempenha serviço público descentralizado;
(procedimento), já praticados verificando a consonância deles com os
requisitos legais condicionadores de sua válida emissão. FUNDAÇÃO PÚBLICA
criação autorizada por lei específica e lei complementar irá definir
ADMINISTRAÇÃO INDIRETA as áreas de sua atuação - CF/88, art. 37, XIX, com redação da EC nº 19,
A Administração Indireta se constitui das entidades dotadas de de 04.06.1998;
personalidade jurídica própria e compreende as autarquias, as fundações é pessoa jurídica de direito público;
públicas, as empresas públicas e as sociedades de economia mista. o seu pessoal é ocupante de cargo público (estatutário), no entanto,
após a Emenda Constitucional nº 19/98, poderá admitir pessoal no
DESCONCENTRAÇÃO E DESCENTRALIZAÇÃO regime de emprego público;
Descentralização é a distribuição de competências entre regime tributário - imunidade de impostos no que se refere ao
Entidades de uma para outra pessoa, ou seja, pressupõe a existência de patrimônio renda e serviços relacionados a suas finalidades essenciais
duas pessoas, entre as quais se repartem as competências. (CF/88, art. 150, VI, "a", e §2º).
Desconcentração é a distribuição de competências entre Órgãos
dentro da mesma pessoa jurídica, para descongestionar, desconcentrar, EMPRESA PÚBLICA
65

tem sua criação autorizada por lei específica - CF/88, art. 37, XIX, PRINCIPAIS DIFERENÇAS ENTRE SOCIEDADE E EMPRESA
com redação dada pela EC nº 19; PÚBLICA
é pessoa jurídica de direito privado - titular de direitos e obrigações forma de organização societária : a sociedade de economia mista
próprios distintos da pessoa que a instituiu; só poderá ser Sociedade Anônima. A empresa pública poderá estruturar-
se sob qualquer das formas admitidas em direito (sociedade por cotas de
responsabilidade limitada, sociedade anônima, etc.).
Forma de organização societária - qualquer das formas admitidas em direito;
Composição do capital - a titularidade do capital é pública. No entanto, desdecomposição
que a maioriado capital : a sociedade de economia é constituída por
do capital com direito a voto permaneça de propriedade da União, admite-se capital público e de
a participação privado. A empresa pública é constituída apenas por
outras pessoas de direito público interno a exemplo de Estados e Municípios,capital
bem comopúblico.
de suas
entidades da administração indireta. foro judicial para solução dos conflitos da empresa pública federal é
Foro para solução dos conflitos - justiça federal (CF/88, art. 109,I) a justiça federal; da sociedade de economia mista é a justiça estadual
o seu pessoal é ocupante de emprego público, e necessita realizar (CF/88, art. 109, I).
concurso público para investidura.
o seu regime tributário é o mesmo das empresas privadas (CF/88, RESPONSABILIDADE CIVIL DA ADMINISTRAÇÃO
art. 173, §1º, II, e §2º);
explora predominantemente atividade econômica (art. 173, CF/88) ; Esta responsabilidade se relaciona à reparação de danos
embora também possa prestar serviços públicos (CF/88, art. 175);. causados a terceiros em decorrência das atividades ou omissões do
Estado, como por exemplo : acidente de trânsito provocado por veículo
SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA oficial, buracos em vias públicas.
A doutrina atribui outros nomes a esta matéria tais como :
tem sua criação autorizada por lei específica - CF/88, art. 37, XIX, responsabilidade extracontratual do Estado (Maria Sylvia Zanella di
com redação dada pela EC nº 19; Pietro);
é pessoa jurídica de direito privado - titular de direitos e obrigações responsabilidade patrimonial extracontratual do Estado (Celso
próprios distintos da pessoa que a instituiu; Antônio);
Forma de organização societária - unicamente sob a forma de sociedade anônima; responsabilidade civil do Estado (José dos Santos Carvalho Filho);
Composição do capital - a titularidade do capital pode ser pública e privada;
RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO NO DIREITO
não estão sujeitas a falência - mas os seus bens são penhoráveis
BRASILEIRO
executáveis, e a pessoa jurídica que a controla responde,
Trata-se de responsabilidade objetiva ou sem culpa, com base na
subsidiariamente, pelas suas obrigações (Lei 6404/76, das sociedades
teoria do risco administrativo. A Constituição da República Federativa do
anônimas, art. 242).
Brasil de 05/10/1988, no § 6º do art. 37 :
o seu pessoal é ocupante de emprego público, e necessita realizar
“ As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado
concurso público para investidura.
prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus
o seu regime tributário é o mesmo das empresas privadas (CF/88,
agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de
art. 173, §1º, II, e §2º);
regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa” (grifei).
explora predominantemente atividade econômica (art. 173, CF/88) ;
A interpretação desta regra permite vislumbrar duas
embora também possa prestar serviços públicos (CF/88, art. 175);.
responsabilidades :
66

A das pessoas jurídicas de direito público : União, Estados, Distrito b) A responsabilidade dos agentes públicos é regressiva e
Federal e Municípios, aí compreendida a Administração Direta, e as subjetiva. É regressiva porque, primeiro, as pessoas jurídicas indenizam
entidades integrantes da Administração Indireta com personalidade de os prejuízos causados a terceiros, depois, ingressam com ação judicial
direito público, tais como Autarquias e Fundações Públicas e seus contra os agentes (servidores) se estes forem ou causadores do dano. É
delegados na prestação de serviços públicos (concessionários e subjetiva, porque, o servidor só indenizará prejuízos que tenha causado
permissionários) perante a vítima do dano - responsabilidade objetiva, em caso de dolo ou de culpa.
baseada no nexo causal.
A do agente público causador do dano, perante a Administração RESPONSABILIDADES DO SERVIDOR
ou perante o seu Empregador - responsabilidade subjetiva, baseada no O servidor responde civil, penal e administrativamente pelo
dolo ou na culpa. exercício irregular das suas atribuições (art. 121, caput).
CAUSAS DE EXCLUSÃO TOTAL OU PARCIAL DA
RESPONSABILIDADE OBJETIVA RESPONSABILIDADE CIVIL
ocorrência de força maior- expressa em fatos da natureza, A responsabilidade civil decorre de ato omissivo ou comissivo,
irresistíveis tais como : terremoto, chuva de granizo, tornado, queda de doloso ou culposo, que resulte prejuízo ao erário ou a terceiros (art. 122).
raio, inundação de rio; A obrigação de reparar o dano estende-se aos sucessores
culpa exclusiva da vítima; e contra eles será executada, até o limite do valor da herança recebida
culpa de terceiros. (art. 122, §3º).

RESPONSABILIDADE PENAL
RESPONSABILIDADE DOS SERVIDORES PÚBLICOS A responsabilidade penal (criminal) abrange crimes e
Encontra-se prevista na Constituição bem como nos respectivos contravenções imputadas ao servidor, nessa qualidade (art. 123).
regimes jurídicos (estatutos) dos servidores públicos civis de cada Os prazos de prescrição previstos na lei penal aplicam-se às
pessoa política : União, Estados, Distrito Federal e Municípios. No caso infrações disciplinares capituladas como crime (art. 142, §2º). Assim, se
da União o assunto é previsto pela lei nº 8.112/90, em seus arts. 121 a servidor cometer infração administrativa que configure também infração
126. penal, não será punido administrativamente se ocorrer a prescrição
penal, a exemplo do emprego irregular de dinheiros públicos, no estatuto
TRATAMENTO DADO PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL é infração punível com demissão cujo prazo prescricional é de 5 anos
CF/88, art. 37,§ 6º - "As pessoas jurídicas de direito público e as de (art. 132, VIII, c/cart. 142, I, do Estatuto), No entanto, se aplica o prazo de
direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos prescrição da lei penal que é menor.
que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o
direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa". RESPONSABILIDADE ADMINISTRATIVA
Da análise deste dispositivo, percebemos que : A responsabilidade administrativa resulta de ato comissivo ou
a) A responsabilidade das pessoas jurídicas de direito público omissivo praticado no desempenho do cargo ou função (art. 124).
(União, Estados, Distrito Federal, Municípios, e suas respectivas
Autarquias e Fundações Públicas) e das pessoas jurídicas de direito CUMULATIVIDADE DAS SANÇÕES
privado prestadoras de serviços públicos (concessionárias e As sanções civis, penais e administrativas poderão cumular-se,
permissionárias) é objetiva. Responsabilidade objetiva é aquela que sendo independentes entre si (art. 125).
independe da verificação da ocorrência de dolo ou culpa
67

EXCLUSÃO DA RESPONSABILIDADE ADMINISTRATIVA pela lei 8.112/90, às datas das respectivas publicações de tais leis
A responsabilidade administrativa do servidor será afastada no específicas (§2º).
caso de absolvição penal que (art. 126): Comercial e Direito Empresarial
negue a existência do fato (o fato não existiu) ; Com o tempo as normas brasileiras foram adotando figuras
negue sua autoria (não foi o servidor o autor do fato) . jurídicas mais novas, algumas da escola italiana, outras desenvolvidas
pelos doutrinadores ou pela jurisprudência pátria, até que, finalmente,
Observação : a absolvição penal por insuficiência de provas não pelo novo Código Civil brasileiro instituído pela Lei 10.406/02 as regras
afasta a responsabilidade administrativa do servidor. Assim, na hipótese legais alcançaram o pensamento moderno e a teoria francesa dos atos
de insuficiência de provas, mantém-se a punição administrativa. de comércio, foi substituída pela teoria da empresa, de origem italiana.
Alguns estudiosos se perguntavam se seria correta a substituição
: REGIME JURÍDICO DOS SERVIDORES CIVIS DA UNIÃO da expressão direito comercial pela expressão direito empresarial, ou se
Regime jurídico dos servidores públicos é o conjunto de princípios seria possível e coerente a utilização de ambas as figuras
e regras referentes a direitos, deveres e demais normas que regem a sua independentemente ou, ainda, se seria adequado utilizá-las como
vida funcional. A lei que reúne estas regas é denominada de Estatuto e o expressões sinônimas.
regime jurídico passa a ser chamado de regime jurídico Estatutário. É inquestionável que hoje a expressão direito comercial é pouco
No âmbito de cada pessoa política - União, os Estados, o Distrito utilizada, todavia, grandes autores insistem em afirmar que se trata de
Federal e os Municípios - há um Estatuto. A lei 8.112/90, de 11/12/1990, uma terminologia tradicional e que o fato da adoção da teoria da empresa
com suas alterações, é o regime jurídico Estatutário aplicável aos pelo ordenamento jurídico nacional não implica na sua substituição.
Servidores Públicos Civis da União, das autarquias e fundações públicas Em meio a estas conceituações, de pouca utilidade prática, no
federais, ocupantes de cargos públicos. nosso sentir é bom não abandonar nenhuma das expressões. O direito
comercial e o direito empresarial podem conviver, como figuras
O REGIME JURÍDICO É ÚNICO ? independentes ou como sinônimas, sem que haja efetivo prejuízo para
Era, não é mais. Como já vimos, o Regime Jurídico Único existiu qualquer entendimento.
até o advento da Emenda Constitucional nº 19, de 04/06/98. A partir de observar que o Código Civil abriu espaço para inserir em meio ao
então é possível a admissão de pessoal ocupante de emprego público, seu regramento o direito empresarial como um regime jurídico especial,
regido pela CLT, na Administração federal direta, nas autarquias e nas contudo, ao lado de outras especialidades, também importantes e
fundações públicas; por isto é que o regime não é mais um só, ou seja, aparentemente autônomas.
não é mais único. Importa observar que a Constituição Federal vigente, na leitura do
No âmbito federal, a Lei nº 9.962, de 22.02.2000, disciplina o seu artigo 22, inciso I, distingue o direito civil do direito comercial,
regime de emprego público do pessoal da Administração federal direta, contudo, a nosso ver, esta separação não implica em atribuir absoluta
autárquica e fundacional, dispondo : autonomia e independência ao direito empresarial, registrando, todavia,
O pessoal admitido para emprego público terá sua relação de que inúmeros doutrinadores entendem de modo diferente.
trabalho regida pela CLT (art. 1º, caput); A tese da autonomia, respeitável, se apóia na assertiva de que, em
Leis específicas disporão sobre a criação de empregos, bem como se considerando o ponto de vista substancial ou material, o direito
sobre a transformação dos atuais cargos em empregos (§1º); empresarial gozaria de efetiva independência aos demais ramos
Vedou que se submeta ao regime de emprego público os cargos jurídicos, ainda que abrigados no mesmo diploma legal.
públicos de provimento em comissão, bem como os servidores regidos Mas parece absolutamente claro que o legislador entendeu que a
separação outrora existente entre o direito comercial e o direito civil não
68

correspondia ao fato inequívoco de que estas especialidades seriam segurança contra a negativa do registro de uma alteração contratual, por
meras faces do direito privado e que, por isso, caberiam em um único exemplo, deverá fazê-lo perante a Justiça Federal, vez que embora a
arcabouço jurídico. Junta tenha uma estrutura administrativa estadual, os serviços de registro
Na verdade o Código Civil regula somente o núcleo do direito de comércio têm natureza e subordinação federal.
empresarial já que outras normas da mesma forma importantes e A Junta Comercial exerce como função preponderante o registro
especialíssimas, também o alimentam. dos atos de registro dos empresários que são: matrícula; arquivamento e
Apenas para registrar a existência de normas extravagantes autenticação.
também influentes no direito empresarial é oportuno destacar aquelas Matrícula - registro de profissionais específicos como leiloeiros;
que dispõem sobre os títulos de crédito, direito bancário, propriedade tradutores públicos; intérpretes; trapicheiros e administradores de
industrial, direito concorrencial, etc. armazéns gerais.
a definição simples, é possível admitir que o direito empresarial Arquivamento - registro, em geral, relativo aos atos de constituição;
moderno, inserto no Código Civil como um regime jurídico especial e alteração; dissolução e extinção de firmas individuais, sociedades
ramo do direito privado, é destinado a regular as atividades econômicas; mercantis e cooperativas, bem como os atos concernentes às empresas
as relações dos sujeitos a elas vinculados e os instrumentos que as mercantis autorizadas a funcionar no Brasil; declaração de
viabilizam no mundo jurídico. microempresas, entre outros.
Inscrição perante a Junta Comercial Autenticação - registro de instrumentos de escrituração contábil do
Como visto anteriormente, a lei determina que antes do início das empresário e dos agentes auxiliares do comércio (profissionais
atividades o empresário e a sociedade empresária devem se inscrever específicos).
perante a Junta Comercial. A função das Juntas Comerciais, nestes casos, é permitir a
Importa registrar, por oportuno, que o fato do empresário por publicidade dos atos dos agentes econômicos, fazendo com que, uma
qualquer motivo deixar de se atender esta disposição legal, não quer vez regularizados conforme prescreve a lei, possam ser opostos a
dizer que ele estaria dispensado de cumprir o regime jurídico terceiros.
empresarial, aliás, é necessário observar que a inscrição perante a Junta A lei obriga as Juntas Comerciais a disponibilizar os assentamentos
Comercial é um requisito delineador da regularidade formal, mas não da e inclusive fornecer certidões para qualquer pessoa, independente da
sua caracterização. prova de possuir interesse jurídico nos documentos.
Ou seja, independentemente da inscrição perante a Junta O atraso no registro também produz efeitos jurídicos, art. 1.151, §
Comercial, o empresário, de qualquer forma, ao exercer atividade 13º. do Código Civil.
empresária, estará sujeito a todos os ônus, compromissos e A Junta Comercial, eventualmente, ao analisar o cumprimento de
responsabilidades próprios do regime empresarial. formalidades legais, poderá negar registro a algum ato se constatar a
As Juntas Comerciais, embora façam parte da estrutura existência de um vício insanável, por exemplo o desatendimento de
administrativa dos Estados, executam e administraram os registros que algum exigência legal que deveria preceder o ato, ou ainda colocá-lo em
são regidos por normas e diretrizes de âmbito federal. Portanto, as exigência quando o vício for sanável.
Juntas Comerciais mantêm subordinação hierárquica híbrida. De um lado o Código Civil dispensou o pequeno empresário de algumas
se submetem administrativamente ao governo da unidade federativa de exigências quanto à escrituração e, ainda, mais adiante, lhe assegurou
sua jurisdição, de outro, no aspecto técnico e legal, se subordinam ao um tratamento privilegiado.
Departamento Nacional de Registro de Comércio, que é órgão federal. Entretanto, a definição de pequeno empresário, com o advento da
Esta situação atípica se reflete no mundo jurídico e processual Lei Complementar 123/06, merece exame mais apurado para encontrar o
porque na hipótese de um empresário necessitar impetrar mandado de enquadramento e seus reflexos respectivos com segurança.
69

Nome Empresarial assinatura mediante a denominação o empresário assinará o próprio


Conforme dispõe o artigo 1º. da Instrução Normativa do nome sobre a denominação.
Departamento Nacional de Registro de Comércio nº. 104/07, o nome Por ficção legal as sociedades anônimas deverão operar sob a
empresarial é aquele sob o qual o empresário e a sociedade empresária denominação designativa do seu objeto social acrescida da expressão
exercem sua atividade e se obrigam nos atos a elas pertinentes. "sociedade anônima" ou "companhia". Em ambos os casos as
O nome empresarial tem duas funções de relevância no expressões poderão ser usadas por inteiro ou nas formas abreviadas.
desenvolvimento da atividade empresarial. Em primeiro lugar identifica o Exemplo: José Silva Instrumentos Cirúrgicos S A, ou Companhia
empreendimento e a sua atividade, em segundo, é um instrumento de José Silva - Instrumentos Cirúrgicos.
agregação da fama e da reputação do empresário ou da sociedade Livros Empresariais
empresária. Apesar da exigência legal de ampla publicidade com relação aos
Entretanto não se pode confundir nome empresarial com a marca, atos de registro empresariais, por outro lado, os livros empresariais
com o nome fantasia ou qualquer imagem que identifica os produtos ou ficaram protegidos pelo sigilo:
serviços do empresário. Estes, denominados de sinais de propaganda, Código Civil - art. 1.190. Ressalvados os casos previstos em lei,
são levados a registro perante os órgãos da propriedade industrial, nenhuma autoridade, juiz ou tribunal, sob qualquer pretexto, poderá fazer
embora de alguma forma também sejam elementos de identificação do ou ordenar diligência para verificar se o empresário ou a sociedade
empresário. empresária observam, ou não, em seus livros e fichas, as formalidades
o nome empresarial está vinculado à identificação do empresário prescritas em lei.
no âmbito social, fiscal, tributário e jurídico, os sinais de propaganda são Conforme consta, ficaram ressalvados os casos previstos em lei,
destinados à identificação dos produtos e serviços do empresário em principalmente com relação às autoridades fazendárias e, claro, outras
relação ao consumidor. situações excepcionais com relação aos interesses intrínsecos da
Portanto, as figuras de identificação do empresário são protegidas sociedade, dos sócios ou de sucessores dos sócios.
por normas diferentes, produzem efeitos jurídicos diversos e importam todas estas possibilidades dependem do pedido formal de um
em alcance próprio e restrito para cada qual. interessado, e mais, e somente nos casos que a lei expressamente o
A lei distingue o nome empresarial como firma ou denominação. permita.
A firma é uma espécie de nome empresarial, contudo, será sempre Empresa e Empresário
formada pelo nome civil do empresário quando se tratar de firma A empresa não é sujeito de direito, é apenas um sujeito abstrato.
individual, ou de um ou mais sócios quando se tratar de firma social. Empresa quer dizer uma atividade econômica organizada destinada a
A firma, mesmo quando individual, poderá acrescer o ramo de produção ou à circulação de bens ou de serviços. Entretanto, de forma
atividade. Por exemplo: José Antonio Braga Bombeiro Hidráulico, ou José imprópria, é comum o uso da expressão empresa como sinônimo de
dos Anzóis Secos e Molhados, etc. estabelecimento, ou de sociedade empresária.
Pode ser observado que neste caso a firma é privativa do O Código Civil de 2002 não definiu explicitamente o que seja
empresário individual e das sociedades de pessoas, e a denominação é empresa, contudo, em seu artigo 966, dispôs com objetividade o conceito
privativa de sociedades de capital. de empresário, logo, estabeleceu por extensão a definição de empresa:
A norma faculta o uso da firma pela sociedade limitada, contudo, há Os doutrinadores também enxergam a expressão empresa com
uma diferença substancial na utilização da firma e da denominação. este mesmo conceito.
Quando se assina pela firma nos atos empresariais o empresário não Luiz Tzirulnik é objetivo:
assinará o seu próprio nome e sim o nome empresarial, inclusive com a "... empresa é sinônimo absoluto de atividade econômica
atividade. Por exemplo: José dos Anzóis Secos e Molhados. Já na organizada para a produção de bens e serviços, nada tendo a ver com
70

estabelecimento empresarial, a despeito de muitas vezes poder haver Por exemplo: vender os móveis antigos da família não exige
confusão de ordem semântica." aplicação de capital, ou utilização de insumos, nenhuma tecnologia e
Considerando que a lei não contém palavras inúteis, do conceito muito menos desenvolvimento de meios para tanto. Entretanto, adquirir
legal de empresário é possível concluir que alguns elementos são móveis usados de terceiros, reformá-los para depois colocá-los à venda,
indispensáveis para que se possa caracterizar a qualidade de exige uma sequência de planejamento, investimento e estratégia que,
empresário. somados com os outros requisitos, ensejam a convicção de que se trata
O exercício da atividade como profissão é um requisito lógico, além de uma atividade empresarial.
de legal. Somente poderá ser considerado empresário aquele que exerce Agentes econômicos profissionais não empresários.
uma atividade econômica de forma habitual, como profissão. Logo, não O mesmo artigo do Código Civil de 2002 que define o empresário,
se submete aos efeitos legais da atividade empresarial aquele que no seu parágrafo único, exclui do regime jurídico empresarial os
exerce uma atividade econômica de forma apenas eventual. profissionais intelectuais, como os advogados, médicos, engenheiros,
Por exemplo: quem compra ou vende uma casa ou um veículo entre outros:
automotor esporadicamente não é um empresário, embora se sujeite aos Artigo 866 do Código Civil - parágrafo único: Não se considera
ônus tributários respectivos não está sujeito ao regime imposto ao empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica,
empresário. literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou
A atividade econômica é outro requisito que deve ser examinado colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de
com cuidados especiais. É que a atividade econômica que a lei se refere empresa.
não é apenas um fato econômico, é necessário que seja uma atividade Isso quer dizer que o profissional que atua exercendo apenas sua
econômica com objetivo de lucro. Assim, aquele que exerce uma atividade intelectual, mesmo com a ajuda de auxiliares, não é
atividade econômica sem a pretensão de obter lucro também não pode considerado um empresário para os efeitos da lei. Contudo, na hipótese
ser considerado empresário. da sua atividade implicar em manter outros profissionais, e o resultado do
Por exemplo: quem compra ou vende uma casa, um veículo trabalho não for apenas fruto do seu intelecto, ou seja, sofrer contribuição
automotor, ou ainda quem recebe ou aplica recursos sem o objetivo de também de terceiros, sua atividade será considerada empresarial.
lucro, embora se sujeite aos ônus tributários respectivos não está sujeito Exemplo: O trabalho desenvolvido por um médico, ainda que tenha
ao regime imposto ao empresário. assistente e secretária, é meramente intelectual e não o confunde com a
Uma associação que recebe mensalidade de seus associados, um figura do empresário. Vários médicos atuando em conjunto, somando
espólio que vende os bens da massa para partilhar os resultados entre seus conhecimentos intelectuais, empregados um dos outros ou não,
os herdeiros, ou uma pessoa que vende ou compra bens de seu uso, onde a relação com o consumidor não é com o profissional individual e
embora exerça atividade econômica, não o faz com o intuito de lucro. sim com o conjunto de profissionais, caracteriza uma atuação
Portanto, nenhuma destas figuras está sujeita ao regime jurídico empresarial.
empresarial. Portanto é a impessoalidade e fator organizacional da atividade
A última expressão - organizada, embora possa parecer que se econômica que caracteriza a atividade empresarial e impõe o
trata de organização formal, trata-se apenas da realização do ato de atendimento às normas de direito empresarial.
articular os fatores de produção no exercício da atividade, como a O Código Civil também criou figuras de empresários e sociedades
aplicação de capital, a utilização de insumos, a aplicação de tecnologia empresariais diferenciadas, ou seja, empresários que não estão sujeitos
ou o desenvolvimento de meios. ao atendimento dos requisitos gerais que a lei impõe aos demais
Esta organização é fundamental para que a atividade abandone a empresários.
característica do amadorismo e adentre a seara do interesse profissional.
71

É certo que os empresários de forma geral estão obrigados ao seu Até este ponto não há qualquer novidade porque a disposição é
registro, em forma individual ou sociedade empresária, perante a Junta natural, entretanto, mais adiante, as vedações avançam, inclusive para
Comercial da unidade federativa à qual pertençam. valorizar as relações de consumo.
fica absolutamente claro que o registro na Junta Comercial não é o Destarte, é bom anotar que não podem ser empresários: Os
requisito básico para que alguém possa ser considerado empresário, vez militares da ativa das Forças Armadas e das Polícias Militares; os
que há exceções, mas, constitui obrigação legal a qual os praticantes de funcionários públicos civis; os magistrados; os médicos, para o exercício
atividades econômicas se sujeitam. simultâneo da medicina e farmácia, drogaria ou laboratório; os
É importante observar que as sociedades empresárias são estrangeiros não-residentes no pais; os cônsules, salvo os não
registradas na Junta comercial de sua sede e as sociedades que não remunerados; os corretores; os leiloeiros; os falidos, enquanto não
exploram atividade empresarial são registradas no cartório de registro reabilitados, etc.
civil de pessoas jurídicas. as vedações são dirigidas aos empresários individuais e não se
Algumas atividades econômicas podem ser registradas nas Juntas aplicam aos sócios ou à sociedade mas, exclusivamente ao exercício de
Comerciais ou nos Cartórios de Registro Civil de Pessoas Jurídicas, é o empresa. Isso quer dizer que não atingem os meros sócios ou acionistas,
caso das cooperativas. A cooperativa deve ser registrada em princípio no contudo, em alguns casos, conforme previsto no Código Civil, há também
cartório, contudo, se preencher os requisitos do art.966 do Código Civil, vedação para o exercício da atividade de administrador.
ou seja, se exercer atividade econômica organizada, com ânimo Existem outros impedimentos legais que não são direcionados
profissional e com a finalidade de produção ou distribuição de bens ou apenas para os empresários ou administradores, mas que atingem a
serviços, deverá ser registrada na Junta Comercial. própria atividade desenvolvida pela empresa.
Sociedades sujeitas às normas empresariais por ficção legal A Constituição Federal, por exemplo, cria restrições às atividades
A lei pode estabelecer que algumas atividades econômicas se de pesquisa e lavra de recursos minerais e ainda para as atividades
sujeitam a um regime jurídico próprio, independente de preencher os jornalísticas e de radiodifusão, de sons e imagens. As restrições são no
requisitos anteriormente previstos nas suas disposições gerais. É o caso sentido de que estas atividades devem ser exploradas por cidadãos
das sociedades por ações. natos ou naturalizados há mais de 10 anos e por pessoas jurídicas
As sociedades anônimas, por ficção legal, independente do ramo e constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sede no país.
das características de sua atividade, são sociedades empresárias. Também deve ser observado que a restrição no que se refere ao
Portanto, ainda que não se enquadrem nos requisitos previstos no artigo incapaz, artigo 972 do Código Civil, é relativa, pois poderá o juiz,
966 do Código Civil, estarão obrigadas a cumprir as regras próprias das consideradas as circunstâncias e o fato de ser necessária a continuidade
sociedades empresárias. das atividades, autorizar que a administração do empreendimento seja
As sociedades que exploram atividade rural, e que por disposição exercida por um representante ou assistente, dependendo do grau de
legal estariam excluídas da obrigatoriedade do registro na Junta incapacidade, depois de ouvir o Ministério Público, os pais, o tutor ou
Comercial, caso optem pela forma de sociedade por ações, perdem o representantes legais do incapaz.
direito a esta faculdade e passam a ser consideradas sociedades É oportuno destacar, contudo, que estas possibilidades são
empresariais, portanto, sujeitas às regras próprias deste regime. voltadas exclusivamente para dar continuidade à atividade empresarial e
Vedações ao exercício de empresa. nunca para iniciá-la.
Repetindo a redação do Código Comercial de 1850, o Código Civil Reflexos do casamento nas atividades empresariais
cuidou de estabelecer restrições ao exercício de empresa e também O empresário, em sintonia com o art. 978 do Código Civil de 2002,
regulando a atuação do empresário casado. pode, sem autorização do cônjuge, qualquer que seja o regime de bens,
72

alienar os bens imóveis que integrem o patrimônio empresarial ou gravá- os empregados poderão fazer-se representar pelo Sindicato de sua
los de ônus real. categoria.
Código Civil - art. 978. O empresário casado pode, sem O empresário, portanto, sempre deverá ficar atento ao nível de
necessidade de outorga conjugal, qualquer que seja o regime de bens, comprometimento e efeitos que podem produzir os seus representantes
alienar os imóveis que integrem o patrimônio da empresa ou gravá-los de nomeados, e ainda aqueles simplesmente legais. De qualquer forma
ônus real. deve restringir formalmente o limite da representação, onde for possível,
Todavia, o artigo logo seguinte impõe obrigações ao empresário e providenciar a averbação do ato respectivo perante a Junta Comercial,
que podem ser graves com relação ao patrimônio familiar. sob pena de não prevalecer contra terceiros.
Representantes legais do empresário. Estabelecimento Empresarial
O Empresário, tanto pelo Código Civil, como pela Consolidação das Estabelecimento comercial não quer dizer apenas o local, sede e
Leis do Trabalho pode se fazer representar por seus auxiliares, instalações onde é exercida a atividade empresarial, é bem mais que
colaboradores, empregados, prepostos ou procurador, dependendo da isso.
instância ou organismo no qual devam se apresentar. Os doutrinadores interpretam a norma e decantam a expressão
Em algumas situações, independente de mandato, mas, com o estabelecimento empresarial sob o entendimento de que compreendem
mero contrato de serviços, o contador poderá representar o empresário, os bens móveis e imóveis; estoque; equipamentos; máquinas; marcas;
da mesma forma o seu gerente, vendedor ou empregado nas relações de patentes; direitos; pontos de vendas; arquivo de clientes e centenas de
consumo. outros itens, impossíveis de serem inteiramente relacionados, mas que
Os demais prepostos, bem como o advogado, deverão representar sejam utilizados para o exercício de empresa pelo empresário ou pela
o empresário no limite dos poderes concedidos por instrumento formal. sociedade empresária.
O certo é que a lei disciplina estas relações, mesmo porque em Considerando a eventualidade de que o patrimônio pessoal do
todos os casos, o empresário responderá pelas ações desenvolvidas empresário, pessoa física, eventualmente possa ser confundido com a da
pelos seus representantes em seu nome. empresa, importa salientar que compõe o estabelecimento empresarial
A figura do gerente, por suas características especiais, recebeu do somente os bens e direitos que são usados no exercício da atividade
legislador responsabilidades adicionais mais complexas na extensão. empresarial, não incluindo os bens particulares do empresário ou sócio
Ressalte-se, por oportuno, que as eventuais limitações aos poderes do que não afetem diretamente o desenvolvimento da atividade econômica.
gerente deverão constar do registro de averbação perante a Junta De qualquer forma é preciso diferenciar estabelecimento
Comercial. empresarial com patrimônio do empresário.
Código Civil - art. 1.169 a 1.178 – Trespasse do Estabelecimento Empresarial
a lei também não deixou conferir também ao representante legal do O exame desta questão se justifica vez que em algumas hipóteses
empresário, em algumas hipóteses, a responsabilidade solidária pelos pode haver o trespasse do estabelecimento empresarial, e nesse caso,
ônus decorrentes do exercício da representação. claro, a forma e a extensão da operação pode ser livremente pactuada
Na justiça do trabalho o depoimento do preposto pode pelos interessados. Contudo, o Código Civil, atento aos reflexos jurídicos
comprometer fortemente o empresário vez que é recebido como que possa produzir em relação a terceiros, credores, devedores ou
confissão. interessados, dispõe com clareza:
Consolidação das Leis do Trabalho - art. Art. 843 - Na audiência de Código Civil - art. Art. 1.143. Pode o estabelecimento ser objeto
julgamento deverão estar presentes o reclamante e o reclamado, unitário de direitos e de negócios jurídicos, translativos ou constitutivos,
independentemente do comparecimento de seus representantes salvo, que sejam compatíveis com a sua natureza.
nos casos de Reclamatórias Plúrimas ou Ações de Cumprimento, quando
73

Código Civil - art. 1.144. O contrato que tenha por objeto a Tal imposição legal decorre do princípio da boa-fé, que deve
alienação, o usufruto ou arrendamento do estabelecimento, só produzirá permear a relações contratuais, e que já compõe o ordenamento jurídico
efeitos quanto a terceiros depois de averbado à margem da inscrição do de inúmeros países.
empresário, ou da sociedade empresária, no Registro Público de É natural que no contrato de transferência do estabelecimento
Empresas Mercantis, e de publicado na imprensa oficial. empresarial já poderia constar cláusulas com este mesmo efeito,
Efeitos da Sucessão Empresarial contudo, entendeu o legislador que melhor seria inserir na norma um
A norma busca também definir situações e a responsabilidade de artigo que delineasse esse reflexo jurídico.
cada parte com relação à sucessão empresarial: Entretanto, como para não permitir que a disposição legal pudesse
Entretanto é necessário observar que estas disposições se aplicam criar discussão em face de aparentemente confrontar com o princípio da
apenas nas relações empresariais, próprias da atividade econômica, livre concorrência, houve por bem o legislador de limitar o tempo de
excluindo as obrigações decorrentes da sucessão trabalhista e tributária, restrição da concorrência.
vez que nestes casos dever-se-á observar os regimes jurídicos próprios, Ponto do Negócio
trabalhista e tributário, previstos nas normas respectivas. O ponto de negócio, que é um dos mais importantes elementos do
Código Tributário Nacional - art. 133 - A pessoa natural ou jurídica estabelecimento empresarial, também já recebeu do legislador, pela via
de direito privado que adquirir de outra, por qualquer título, fundo de da Lei do Inquilinato, oportuna e especial proteção quando se trata de
comércio ou estabelecimento comercial, industrial ou profissional, e imóvel alugado.
continuar a respectiva exploração, sob a mesma ou outra razão social ou A lei define os direitos e obrigações do locador e locatário,
sob firma ou nome individual, responde pelos tributos, relativos ao fundo alcançando inclusive a hipótese de sucessão do estabelecimento
ou estabelecimento adquirido, devidos até à data do ato: empresarial. Diante disso fixou condições e limites que, notoriamente,
I - integralmente, se o alienante cessar a exploração do comércio, facilita a possibilidade de continuidade da locação.
indústria ou atividade; Entretanto, o locatário original ou o seu sucessor, quando desejar
II - subsidiariamente com o alienante, se este prosseguir na postular a Renovação Compulsória da locação, deverá ficar atento para o
exploração ou iniciar dentro de seis meses a contar da data da alienação, fato de que deverá comprovar, desde a propositura da ação, o
nova atividade no mesmo ou em outro ramo de comércio, indústria ou cumprimento do contrato integralmente.
profissão. O locatário, portanto, deverá diligenciar no sentido de comprovar
Ainda, dentro da mesma identidade de propósitos da lei civil, e que pagou suas obrigações, conforme contratado, atendeu às exigências
ainda com o objetivo de facilitar e estimular a possibilidade de aquisição da convenção de condomínio, pagou sua parcela de seguros conforme
de estabelecimentos empresariais de empresários ou sociedade tenha sido previsto em contrato, quitou devidamente os impostos
empresárias em processo de falência, a Lei de Recuperação de municipais relativos ao imóvel, etc.; deverá ainda demonstrar, com
Empresas, inovando, dispôs de forma clara e precisa: clareza, as condições oferecidas para a renovação da locação, indicando
O Código Civil, acompanhando a jurisprudência dominante e fortes os fiadores com toda a sua qualificação, identidade, CPF, renda mensal,
manifestações doutrinárias, criou também um artigo, denominado pelos propriedades que possuem e os bancos ou empresas com os quais
estudiosos de cláusula de não-concorrência ou cláusula de interdição da mantém operações comerciais.
concorrência. Este artigo é destinado a proteger o empresário sucessor Empresas de Pequeno Porte e Microempresas - 1.1 -
da possibilidade do empresário sucedido se estabelecer novamente com No ano de 1984, no intuito de desburocratizar e estimular a
o mesmo ramo de negócio e fazer concorrência danosa ao adquirente do regularização das atividades econômicas informais, foi criado o primeiro
estabelecimento empresarial. Estatuto da Microempresa, Lei nº. 7.256/84, que estabeleceu alguns
74

benefícios e facilidades nos âmbitos tributário, trabalhista, previdenciário, operações em conta alheia, não incluídas as vendas canceladas e os
creditício e de desenvolvimento empresarial. descontos incondicionais concedidos.
Depois, já no ano de 1988, a Constituição Federal fez inserir no § 2o No caso de início de atividade no próprio ano-calendário, o
artigo 179, a disposição que impunha à União e aos entes da federação, limite a que se refere o caput deste artigo será proporcional ao número
além dos municípios, a responsabilidade de diferenciar o tratamento de meses em que a microempresa ou a empresa de pequeno porte
jurídico destinado às microempresas e empresas de pequeno porte de houver exercido atividade, inclusive as frações de meses.
forma a estimulá-las pela simplificação de suas obrigações. § 3o O enquadramento do empresário ou da sociedade simples ou
Assim, proliferaram as normas destinadas a criar melhores empresária como microempresa ou empresa de pequeno porte bem
condições para o desenvolvimento do pequeno empresário, bem como como o seu desenquadramento não implicarão alteração, denúncia ou
normas que simplificaram todas as etapas de procedimento para qualquer restrição em relação a contratos por elas anteriormente
abertura, fechamento e regularização fiscal das empresas de pequeno firmados.
porte e as microempresas. Por outro lado, também definiu e restringiu a amplitude de
Por fim, foi editada a Lei Complementar nº. 123/06, denominada Lei empresários habilitados a gozar dos benefícios previstos e do tratamento
Geral das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte, destinada a diferenciado.
regular o tratamento diferenciado e favorecido a ser dispensado às Pequeno empresário.
microempresas e empresas de pequeno porte, no âmbito da União, dos Com o objetivo de dirimir eventuais dúvidas com relação ao
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. pequeno empresário, figura prevista no artigo 970 do Código Civil e que é
Definição de Microempresas e Empresa de Pequeno Porte. uma subespécie de microempresa, mas, que goza também de outros
A Lei Complementar definiu as Microempresas e as Empresas de benefícios, a Lei Complementar houve por bem de defini-lo:
Pequeno Porte já atualizando a nomenclatura do Código Civil: Lei Complementar 123/06 - art. 68. Considera-se pequeno
Art. 3o Para os efeitos desta Lei Complementar, consideram-se empresário, para efeito de aplicação do disposto nos arts. 970 e 1.179 da
microempresas ou empresas de pequeno porte a sociedade empresária, Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, o empresário individual
a sociedade simples e o empresário a que se refere o art. 966 da Lei no caracterizado como microempresa na forma desta Lei Complementar que
10.406, de 10 de janeiro de 2002, devidamente registrados no Registro aufira receita bruta anual de até R$ 36.000,00 (trinta e seis mil reais).
de Empresas Mercantis ou no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, O pequeno empresário, portanto, sempre será o empresário
conforme o caso, desde que: individual, caracterizado como Microempresário, e com receita ínfima.
I - no caso das microempresas, o empresário, a pessoa jurídica, ou Privilégio para Microempresas e Empresas de Pequeno Porte
a ela equiparada, aufira, em cada ano-calendário, receita bruta igual ou O legislador cuidou de estabelecer benefícios para as
inferior a R$ 240.000,00 (duzentos e quarenta mil reais); Microempresas e Empresas de Pequeno Porte no campo da participação
II - no caso das empresas de pequeno porte, o empresário, a em licitações e acesso aos mercados.
pessoa jurídica, ou a ela equiparada, aufira, em cada ano-calendário, Lei Complementar 123/06 - art. 42. Nas licitações públicas, a
receita bruta superior a R$ 240.000,00 (duzentos e quarenta mil reais) e comprovação de regularidade fiscal das microempresas e empresas de
igual ou inferior a R$ 2.400.000,00 (dois milhões e quatrocentos mil pequeno porte somente será exigida para efeito de assinatura do
reais). contrato.
§ 1o Considera-se receita bruta, para fins do disposto no caput Não se pode deixar de observar que a lei concedeu também a
deste artigo, o produto da venda de bens e serviços nas operações de estas empresas o privilégio de preferência nas licitações em caso de
conta própria, o preço dos serviços prestados e o resultado nas empate.
75

Mas, o mais importante é que a regra de desempate criou uma jurídica que exerce atividade empresarial temos a figura da sociedade
nova situação em que o empate pode ser ficto. Ou seja, a definição de empresária.
empate não é exatamente o preço e condições iguais, no caso, mesmo Os empresários individuais, de modo geral, se dedicam aos
havendo uma pequena diferença na licitação, por ficção da lei, poderá negócios menores, de menor potencial econômico. Sempre lembrando
ser considerado o empate e a preferência será das Microempresas ou que o empresário individual não tem o privilégio de destacar um valor
Empresas de Pequeno Porte. limite para a sua responsabilidade empresarial. Ou seja, o empresário
Portanto, a simplificação do tratamento destinado às individual responde com todo o seu patrimônio pessoal, de forma
Microempresas e Empresas de Pequeno Porte evidencia o interesse ilimitada, perante terceiros.
público em tirar da informalidade os milhares de pequenos agentes As sociedades empresárias, entretanto, que se dedicam aos
econômicos que têm dificuldade de regularizar o seu negócio. empreendimentos mais expressivos, podem definir o valor do capital que
Enfim são inúmeros os benefícios concedidos aos pequenos será destacado para a atividade empresarial e estabelecer, ainda, se a
empresários, às microempresas e às empresas de pequeno porte, que responsabilidade pessoal dos sócios será limitada ou ilimitada.
começam pelas facilidades do registro de abertura e fechamento dos Nas sociedades de responsabilidade ilimitada o patrimônio dos
seus estabelecimentos e vão até aos estímulos para concessão de sócios responde ilimitadamente pelas dívidas da sociedade. Isso quer
crédito e apoio ao associativismo. dizer que uma vez esgotados os recursos da sociedade os credores
Microempreendedor poderão executar os bens pessoais dos sócios sem limite.
Nos últimos dias do ano de 2008 foi sancionada a Lei Já nas sociedades de responsabilidade limitada os sócios só
Complementar nº. 128, que instituiu a figura do MEI - Microempreendedor respondem limitadamente pelas obrigações da sociedade.
Individual. Regime das sociedades empresariais
A nova lei alterou várias disposições da Lei Complementar nº. 123, As sociedades limitadas são constituídas, alteradas e dissolvidas
chamada de Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas e deu ênfase ao conforme as partes estabelecerem no contrato social, desde que
estímulo do pequeno empreendedor. respeitado o conjunto de regras básicas previsto na norma civil. O vínculo
A regulamentação da lei deverá trazer maior definição do seu que une os sócios é de natureza contratual e são estabelecidos os
alcance e eficácia, contudo, na mesma linha da Lei Geral das Micro e parâmetros de suas relações mediante cláusulas pactuadas em
Pequenas Empresas, o objetivo da norma é o de facilitar a possibilidade conformidade com os seus interesses particulares. Nas sociedades
do pequeno empreendedor sair da clandestinidade. limitadas a interferência legal é mínima. Portanto, são sociedades
Empresários e Sociedades Empresárias contratuais.
São sociedades personificadas aquelas que, uma vez constituídas Nas sociedades anônimas, que são sociedades institucionais, o
pelo concurso de vontades individuais, adquirem personalidade jurídica vínculo que une os sócios é estatutário. Os estatutos não cuidam de
própria; se desvinculam das figuras individuais dos seus sócios; passam interesses individuais dos sócios, atuam em sintonia com o interesse
a ser regidas em com a legislação aplicável à espécie e gerida na forma geral da sociedade, e a intervenção do legislador funciona com mais rigor
e limites dos seus atos constitutivos. deixando margem mínima de autonomia da vontade individual dos
A partir do registro estas sociedades são reconhecidas legalmente sócios. Nas sociedades anônimas a interferência legal é máxima.
como sujeito de direitos e obrigações e adquirem uma identidade própria. Portanto, são sociedades estatutárias.
Como sabido, os empresários podem ser pessoas físicas ou As sociedades podem ser de pessoas ou de capital. São
pessoas jurídicas. No caso de pessoa física que exerce atividade sociedades de pessoas aquelas em que a figura pessoal de um ou mais
empresarial temos a figura do empresário individual, e no caso da pessoa sócios é intensa, e que pode ser responsável pelo próprio sucesso do
empreendimento. Nestas sociedades a entrada de um novo sócio
76

depende da aprovação dos demais, porque um estranho pode quebrar a Por fim, se não houver alteração na norma civil, os tribunais
harmonia e a confiança existente. deverão enfrentar eventuais argüições de inconstitucionalidade contra o
Já nas sociedades de capital, nas quais o importante é o valor do artigo 977 do Código Civil.
capital investido, a figura do sócio tem pouca ou nenhuma relevância e a As Sociedades Personificadas e Não-personificadas
admissão de pessoas estranhas independe do consentimento dos O legislador ao tentar simplificar o exame e compreensão dos tipos
demais sócios. de sociedades contempladas pela norma civil houve por bem de dividir as
Sociedades sujeitas à autorização governamental sociedades em dois grupos; as sociedades personificadas e as
Algumas atividades, por suas peculiaridades de interesse público, sociedades não-personificadas.
se sujeitam a um especial controle e fiscalização e dependem de São sociedades personificadas aquelas que, uma vez constituídas
autorização governamental para funcionar. Por exemplo: as sociedades pelo concurso de vontades individuais, adquirem personalidade jurídica
que exploram atividades financeiras, de seguros, e algumas áreas da própria; se desvinculam das figuras individuais dos seus sócios; passam
saúde e educação. a ser regidas em com a legislação aplicável à espécie e gerida na forma
Código Civil - art. 1.124 - Na falta de prazo estipulado em lei ou em e limites dos seus atos constitutivos.
ato do poder público, será considerada caduca a autorização se a A partir do registro estas sociedades são reconhecidas legalmente
sociedade não entrar em funcionamento nos doze meses seguintes à como sujeito de direitos e obrigações e adquirem uma identidade própria.
respectiva publicação. A sociedade limitada; a sociedade anônima; a sociedade em nome
Ainda, nestes casos, convém destacar que a hipótese de cassação coletivo; a sociedade em comandita simples e a sociedade em comandita
da autorização também está prevista. por ações, são sociedades personificadas, ou seja, têm personalidade
Sociedade entre cônjuges jurídica própria e são sujeitos de direitos e obrigações.
O Código Civil também cuidou de dar solução a um impasse legal São sociedades não-personificadas aquelas que não têm
que ainda desafiava os tribunais. Trata-se da possibilidade dos cônjuges personalidade jurídica própria; que não são identificadas sem a figura dos
poderem ou não contratar sociedade entre eles e ou com terceiros. Na seus sócios; que são ocultas ou não registradas, e ainda aquelas
tentativa de exaurir as dúvidas o legislador disciplinou a matéria: exercidas na informalidade:
Código Civil - art. 977. Faculta-se aos cônjuges contratar A sociedade em comum e a sociedade em conta de participação
sociedade, entre si ou com terceiros, desde que não tenham casado no são algumas sociedades deste grupo.
regime da comunhão universal de bens, ou no da separação obrigatória. Sociedade personificada
Na verdade a questão ainda não está definitivamente resolvida. Já Uma sociedade personificada pode ser constituída mediante um
existe projeto de lei tramitando para suprimir a parte final do dispositivo contrato escrito, particular ou público, em cujas cláusulas constem o
de forma a permitir a contratação de sociedade entre os cônjuges livre de nome, a qualificação e o endereço dos sócios, quando se tratar de
restrições. pessoa física, e a firma, a denominação, nacionalidade e sede dos
Outra questão envolve a situação das sociedades já existentes. sócios, quando se tratar de pessoa jurídica.
Alguns entendem que as situações pretéritas estariam amparadas pelo É necessário constar ainda a denominação; o objeto; a sede e o
instituto do ato jurídico perfeito previsto na Constituição Federal - art. 5º. - prazo de duração da sociedade, além do capital e as respectivas
inciso XXXVI. participações dos sócios, bem como quais sócios respondem pela
Outros entendem que a norma também prevê a obrigatoriedade administração da sociedade.
das sociedades se adaptarem às novas disposições legais. É certo que as questões que envolvem as sociedades
personificadas são muitas e merecem considerações mais detalhadas.
Por isso, são examinadas mais adiante em títulos específicos.
77

Sociedades não-personificadas As Sociedades Simples são registradas no Cartório de Registro


A norma civil, entretanto, deixou de definir as sociedades não- Civil de Pessoas Jurídicas, artigo 1.150 do Código Civil, e as Sociedades
personificadas com a mesma clareza que dedicou às sociedades Empresárias na Junta Comercial, art. 967 do Código Civil.
personificadas. A sociedade simples, que antes do Código Civil de 2002 era
Ao estabelecer os reflexos jurídicos da sociedade em comum o denominada Sociedade Civil, é a sociedade que não explora atividade
legislador ofereceu tratamento simplificado deixando de considerar, em econômica na forma empresarial.
especial, a sociedade de fato, fixando as suas diretrizes somente sobre Portanto, poderá ser uma sociedade com atividade econômica e
as sociedades irregulares. fins lucrativos, tal como a empresária, contudo, não organizada para
O entendimento corrente do que seja uma sociedade irregular funcionar empresarialmente.
repousa na assertiva de que se trata de uma sociedade formal, escrita,
mas que seus atos constitutivos não foram apresentados a registro nas DISSOLUÇÃO DAS SOCIEDADES
repartições públicas.
Assim, considerando que a sociedade de fato nem sempre é Conceito: por dissolução de sociedade, compreende-se o processo
precedida de um contrato formal, à míngua de uma disposição clara e de extinção da pessoa jurídica.
objetiva no Código Civil, deve ser examinada por analogia com as
sociedades irregulares. Fases de extinção da pessoa jurídica: são, pela ordem da sua
A sociedade em conta de participação é aquela em que existe um ocorrência, a liquidação do patrimônio social e a partilha dos lucros entre
ou mais sócios ostensivos, que representam a sociedade e por ela são os sócios.
responsáveis, e o sócio participante, que não tem poder de gestão e
somente participa e colhe os resultados da sociedade. Natureza jurídica da sociedade em dissolução: durante esse
Este tipo de sociedade funciona em paralelo, não necessita de período, não estará mais a sociedade em transações com terceiros,
contrato formal e nem sequer adquire uma personalidade jurídica exceto para a conclusão dos atos iniciados; não farão assim, novas
autônoma. A sociedade somente produz efeitos entre as partes, não negociações, mas continuam a responder pelo compromissos
atinge os terceiros. assumidos.
Este tipo de sociedade tem duas características especialíssimas
que são: Dissolução de pleno direito: é aquela que se verifica
1) o fato do terceiro sequer ter conhecimento da existência de um independentemente da vontade dos sócios, sem que haja necessidade
sócio participante, chamado de sócio oculto. de interferência judicial; são casos desse tipo de dissolução: a) expiração
2) existir um sistema de controle administrativo, em separado, o prazo ajustado para sua duração; b) quebra da sociedade, ou de
destinado a contabilizar os resultados dos empreendimento do sócio qualquer dos sócios; c) mútuo consenso entre os sócios; d) morte de um
ostensivo com o sócio oculto. dos sócios, salvo convenção em contrário dos que sobrevivem; e)
Por fim, a lei aplica às sociedades em conta de participação, no vontade de um dos sócios, caso a sociedade tenha sido celebrada por
tocante à relação societária, as disposições da sociedade simples e, no tempo indeterminado.
que se refere à liquidação da sociedade, a prestação de contas prevista
na lei processual. Dissolução judicial: é aquela que ocorre antes de findo o período de
Sociedades empresárias ou simples duração da sociedade, em virtude de sentença do juiz, mediante
São vários os tipos de sociedade que podem ser empresárias ou processo contencioso; poderá ocorrer nas seguintes hipóteses: a)
simples. mostrando-se a impossibilidade de continuação da sociedade, por não
78

preencher o intuito e fim social; b) por inabilidade de alguns sócios, ou Crédito: consiste na extensão da troca, permitindo que esta,
incapacidade moral ou civil, declarada por sentença; c) por abuso, realizada no espaço, ganhe nova dimensão, e possa ser, também,
prevaricação, violação ou falta de cumprimento das obrigações sociais, efetuada no tempo; é uma permissão para a utilização do capital alheio.
ou fuga de algum dos sócios.
Características: a) literalidade: consiste em considerar
Dissolução consensual: ocorre quando todos os sócios, por mútuo juridicamente válidas, relativamente ao título de crédito, somente as
consenso, resolvem extinguir a sociedade. obrigações nele inseridas; b) autonomia: é a desvinculação da causa do
título em relação a todos o coobrigados; c) independência: é a
Liquidação do patrimônio social: a pessoa jurídica perdura, mas a inexistência de vínculo jurídico entre quaisquer coobrigados; d)
sociedade terá de promover a processo extintivo de suas obrigações; documentalidade: o título é sempre um documento, necessário para o
entra ela no período de liquidação, realizando o seu ativo e satisfazendo exercício do direito que representa; e) força executiva: tem força idêntica
o passivo; poderá ser amigável ou judicial; a primeira ocorrerá quando os a uma sentença judicial transitada em julgado, dando direito diretamente
sócios deliberarem de comum acordo o modo por que será procedida; ao processo de execução; f) formalidade: o título é formal, deve constar
havendo desarmonia, torna-se necessário recorrer ao juiz, caso em que a nele tudo o que a lei determinar; g) solidariedade: todas as obrigações
liquidação se fará judicialmente. constantes do título são solidárias; h) circulação: é sua característica
básica, vez que têm eles por fim facilitar as operações de crédito e a
Liquidante: será o órgão da pessoa jurídica durante o período em transmissão dos direitos neles incorporados.
que essa realiza os atos que precedem a sua extinção.
. Endosso: é a assinatura do proprietário do título no verso do
Partilha: será feita proporcionalmente à quota de capital de cada documento, com o que o endossador transfere ao endossatário o título e,
sócio, se de outra formação foi pactuado no contrato social; com a consequentemente, os direitos nele incorporados; pode ser em branco,
partilha dos lucros líquidos entre os sócios, chega-se a fase final do que não traz a indicação de quem seja o favorecido, passando o título a
processo de extinção da sociedade. circular como se fosse ao portador, e em preto, que traz a indicação do
nome do favorecido, também denominado endosso pleno.
Extinção da pessoa jurídica: a pessoa jurídica se extingue depois
da partilha dos lucros líquidos aos sócios, após a liquidação; o ato de Cessão de crédito: é contrato bilateral que não exige forma
dissolução deve ser arquivado no Registro de Comércio. específica para ser considerado válido; ocorrendo nulidade de uma
cessão de crédito, todas as demais serão também atingidas; o devedor
pode opor exceção tanto contra o cessionário quanto contra o cedente, a
TÍTULOS DE CREDITO partir do momento em que tomar conhecimento da cessão.

Conceito: é um documento formal, com força executiva, Teoria da criação (sobre a natureza dos títulos de crédito): consiste
representativo de dívida líquida e certa, de circulação desvinculada do em considerar o surgimento do direito existente no título no momento de
negócio que o originou; título de crédito é um documento necessário para sua criação, e a obrigação dele constante, com sua entrada em
o exercício do direito literal e autônomo nele mencionado (Vivante). circulação; a existência do título cria a dívida nele indicada; assim, o título
roubado ou perdido leva consigo a obrigação do subscritor, pertencendo
o crédito ao portador que se apresenta para cobrar a dívida.
79

Teoria de emissão: consiste em considerar que a mera criação do Aval antecipado: consiste em firmar o aval antes do aceite ou do
título não faz surgir direito ao crédito nele contido, o que somente ocorre endosso.
após o abandono voluntário de sua posse, mediante ato unilateral ou
tradição; se o título for colocado em circulação de modo fraudulento, não Aval limitado: consiste na garantia de somente uma parte do valor
será reconhecida a obrigação nele contida. do título, dada pelo avalista.

Cláusula “não à ordem”: consiste na proibição, imposta pelo Aval simultâneo: consiste na assinatura de vários avalistas, que se
sacador ou pelo endossante, de que o título seja transmitido por meio de obrigam a garantir o pagamento, no todo ou em parte, de obrigação
endosso; a cláusula será válida desde que o título seja nominativo, e a constante de um mesmo título.
expressão “não à ordem”, ou outra equivalente, esteja escrita no verso do
título; a transmissão do título somente se fará na forma e com os efeitos Vencimento à vista: é aquele que se dá na apresentação do sacado
de uma cessão ordinária de crédito. para que pague imediatamente.

Aceite: é o reconhecimento, feito por meio de assinatura, por parte Vencimento a certo termo de vista: é aquele em que o dia do
do sacado, da validade da ordem de pagamento a favor do beneficiário, pagamento será determinado a partir da data do aceite ou, inexistindo, do
obrigando-se o sacado, por meio do aceite, a pagar o valor constante do protesto do título.
título, na data do vencimento.
Vencimento a dia certo: é aquele em que o dia do pagamento vem
Apresentação: é o ato de levar o título de crédito ao sacado, para expressamente indicado no título.
que aponha sua assinatura, caracterizando o aceite, ou proceda o
pagamento; o título deve ser apresentado até o vencimento, no domicílio Protesto: é um ato oficial, solene, extrajudicial e público, pelo qual o
do sacado. título é apresentado ao devedor, para que o aceite como válido ou para
pagamento, e que comprova a apresentação da letra de câmbio, não
Aval: é a garantia pessoal de pagamento, de que a obrigação tendo o portador do título recebido um ou outro, e que serve, também,
constante do título será paga por um terceiro ou por um dos signatários, para comprovar a insolvência do aceitante, quando não efetua o
prestada mediante simples assinatura do avalista no próprio título ou em pagamento na data do vencimento; deve ser lavrado no Cartório de
folha anexa; o avalista é solidariamente responsável com aquele em Protestos, em livro próprio, perante o oficial do lugar onde a letra de
favor de quem deu seu aval. câmbio deve ser aceita ou paga; pode ser obrigatório (tendo o objetivo de
preservação de direitos) e facultativo (cuja função é meramente a de
Natureza jurídica do aval: é obrigação formal, independente e fazer prova, sendo por exemplo, imprescindível para constituir em mora o
autônoma, que se aperfeiçoa pela simples assinatura do avalista no devedor).
título.
Cancelamento do protesto: pode ser cancelado: a) por defeito
Argüição em juízo do avalista (exceções): o poderá argüir em juízo formal do protesto; b) por defeito do título, reconhecido por sentença
somente direito pessoal próprio, defeito formal do título ou falta de judicial transitada em julgado; c) pelo pagamento da obrigação, constante
algumas condições da ação; não poderá invocar, matéria relativa a direito do título, com a concordância do credor.
do avalizado.
80

Ressaque: é um novo título à vista, sacado contra qualquer dos Remuneração do trabalho: salário, salário mínimo, salário
coobrigados, e apresentado em outra praça, pelo credor que, tendo já profissional. Adicionais.
protestado o título original, não recebeu o pagamento devido; atualmente Extinção do contrato de trabalho. Conclusão. Demissão.
não é utilizada essa prática, pois o credor pode acionar diretamente Despedida. Aviso Prévio. Indenização. Estabilidade. FGTS.
qualquer um dos coobrigados. DIREITO DO TRABALHO
Conceito de Direito do Trabalho: é o ramo da ciência do direito que
tem por objeto as normas, as instituições jurídicas e os princípios que
LETRA DE CÂMBIO disciplinam as relações de trabalho subordinado, determinam os seus
sujeitos e as organizações destinadas à proteção desse trabalho em sua
Conceito: é ordem de pagamento, à vista ou a prazo, sacada por estrutura e atividade.
um credor contra seu devedor, em favor de alguém, que pode ser um
terceiro ou o próprio sacador; sacador é o que emite a letra; aceitante é o Natureza do Direito do Trabalho: as normas do Direito do Trabalho
sacado que aceita a letra, nela apondo sua assinatura; tomador é o pertencem ao direito privado (as referentes ao contrato de trabalho) e ao
beneficiário da ordem; endossante é o proprietário do título, que o direito público (as referentes ao processo trabalhista).
transfere a alguém, chamado endossatário; o portador de uma letra,
adquirida por endosso, pode haver dos endossantes anteriores ou do Origem e evolução histórica do Direito do Trabalho no Brasil:
sacador o valor da letra, se o aceitante ou sacado não pagar (direito de abolida a escravidão, em 1888, os trabalhadores nas indústrias
regresso); prescreve contra o devedor principal em 3 anos da data do emergentes, muitos deles imigrantes, com tradição sindicalista européia,
vencimento. passaram a exigir medidas de proteção legal; até cerca de 1920, a ação
dos anarquistas repercutiu fortemente no movimento trabalhista; as
Circulação das letras de câmbio: após o aceite do sacado, o primeiras normas jurídicas sobre sindicato são do início do século XX; o
beneficiário teria de, em tese, aguardar a data do vencimento para CC de 1916 dispunha sobre locação de serviços, e é considerado o
receber o pagamento; pode ser, no entanto, que seja devedor de outrem; antecedente histórico do contrato individual de trabalho na legislação
pode saldar sua dívida entregando a letra de câmbio para aquele com posterior; na década de 30, com a política trabalhista de Getúlio Vargas,
relação ao qual é devedor, devidamente endossada; portanto, o influenciada pelo modelo corporativista italiano, reestruturou-se a ordem
beneficiário original da letra passa a ser endossante da letra, transferida jurídica trabalhista no Brasil.
a seu credor, agora endossatário e que passa a ser o novo proprietário Conceito de ordenamento jurídico: abrange não apenas as normas
da letra substituindo o primitivo beneficiário; cada endossatário poderá, jurídicas mas, também, as instituições, as relações entre as normas
por sua vez, transmitir a letra, por meio de endosso, indefinidamente, consideradas como um conjunto, e que não são unicamente estatais mas
figurando como endossante; essa seqüência de endossos, é denominada também elaboradas pelos grupos sociais, especialmente as organizações
série de endossos sindicais, os princípios e outros aspectos; o direito do trabalho situa-se
como um ordenamento abaixo do Estado, pelo Estado reconhecido, com
características próprias, pondo-se como ordenamento, relacionado com o
VIII - Direito do Trabalho Estado com o qual se coordena ou ao qual se subordina, específico das
Direito do Trabalho: origem, evolução, noção. Contrato Individual de normas, instituições e relações jurídicas individuais e coletivas de
trabalho: noção , generalidades, prova. Empregado. Empregador. natureza trabalhista.
Duração do Trabalho. Hora noturna. Hora extra. Repouso semanal.
Férias.
81

Concepção autotutelar do Direito do Trabalho: consiste na idéia que DIREITO TRIBUTÁRIO - TEORIA GERAL
a tutela jurídica do trabalhador deve ser efetuada, concomitantemente,
pelo Estado, e pelos próprios trabalhadores. 1. INTRODUÇÃO E CONCEITOS
Concepção da autonomia privada coletiva: consiste na idéia de que Direito Tributário: ramo do direito que estuda os princípio e normas
os fundamentos da ordem sindical devem basear-se em princípios de que regem a tributação.
liberdade e democracia, opondo-se à orientação corporativista, sem Cuida da tarefa de criar tributo, desde a sua estruturação pela CF
interferência da legislação estatal. até o seu desaparecimento, não se preocupa com a arrecadação ou
Concepção da desregulamentação do Direito do Trabalho: consiste distribuição do tributo.
na idéia de que o espaço legal deve ser diminuído ou suprimido, naquilo É um ramo novo ( +ou- 50 anos).
que diz respeito às relações coletivas do trabalho, inexistindo normas de A sua existência se justifica pelo estrago que o tributo faz na
organização sindical, de negociação coletiva e de greve, expressando-se liberdade e propriedade das pessoas.
em acordos tais como denominados “pactos sociais”, em que o governo, Tributação: só pode ser desenvolvida pelo Estado, representada
sindicatos e empresários estabelecem as bases de seu relacionamento. pelas pessoas políticas (União, Est. Município. E DF).
Concepção econômica da flexibilização do Direito do Trabalho: Tributo: é uma obrigação ex lege em moeda, que não se constitui
consiste em um tratamento das questões trabalhistas que leva em sanção por ato ilícito e tem como sujeito ativo, normalmente uma pessoa
consideração a situação conjuntural da economia, das empresas e dos política e, por sujeito passivo, qualquer pessoa apontada na lei da
trabalhadores, visando a preservação de postos de trabalho ou, ao entidade tributante.
menos, a minimização das dispensas dos trabalhadores, em épocas de a) é uma obrigação ex lege – Obrigação (não é algo especial,
baixa demanda do mercado; a flexibilização contempla o tratamento obrigação não é instituto exclusivo do Direito Civil) é o vínculo abstrato de
jurídico diferenciado entre pequenas, médias e grandes empresas, bem conteúdo patrimonial, pelo qual, alguém, sujeito passivo, vê-se compelido
como níveis diferenciados de empregados, cabendo a cada categoria a dar, fazer, não fazer ou suportar algo em favor de outrem, sujeito ativo.
uma série diversa de direitos. O tributo deriva direta e imediatamente da vontade da lei, por isso,
Sistemas de relações de trabalho: há mais de um ângulo de é uma obrigação ex lege.
classificação dos sistemas de relações de trabalho, alterando-se de Nasce da vontade do Estado contida na lei, em razão da ocorrência
acordo com o critério adotado, dentre outros os critérios políticos- do fato imponível, do fato gerador in concreto, ou seja, nasce do fato
econômicos e os jurídico-normativos, o primeiro partindo da concepção descrito na lei e, por ela considerado, apto a desencadear obrigações
política que preside o sistema e o segundo das fontes formais e das tributárias.
normas jurídicas trabalhistas. É diferente da obrigação ex vontate – a Fazenda não vai saber se o
Plurarismo jurídico do Direito Trabalho: nem todo o direito é contribuinte queria ou não pagar . Por esta razão que a capacidade
elaborado pelo Estado, coexistindo, ao lado do direito estatal, um tributária passiva é diferente de capacidade civil (louco tem que pagar
conjunto de normas jurídicas criadas pelos particulares entre si, toleradas tributo)
pelo Estado, daí resultando um ordenamento misto, com normas estatais b) em moeda - a lei só pode obrigar o contribuinte a pagar o
e não estatais; há um direito estatal e um direito profissional convivendo, tributo em moeda, não terá que pagar em espécie. Deve ser moeda
formando um complexo de normas jurídicas que se combinam segundo corrente - reais. É obrigação de dar – dare pecuniam.
uma hierarquia própria de aplicação, basicamente apoiada no princípio É possível, se o contribuinte quiser ou puder poderá pagar o tributo
da prevalência da norma que resultar em maiores benefícios para o com algo que, em moeda, possa se exprimir.
trabalhador, expressando-se como o princípio da norma favorável.
82

Esta oferta tem que ser aceita pela Fazenda, isto porque, ela direito privado perseguidoras de finalidades públicas (ex.: SESI, SESC,
também tem o direito de receber em moeda, mas temos leis que a SENAC, Sindicados) - são chamadas de entes paraestatais
autorizam a aceitar esta oferta. Pessoas privadas e particulares, em geral, não podem ser
Esta forma de pagamento se chama Dação (art. 3º CTN). favorecidos pela Parafiscalidade, fere o princípio da igualdade e da
Na história tivemos alguns casos de pagamento em espécie: no destinação pública do dinheiro arrecadado com tributos (o trib. deve
direito comparado as corvéias (pagamento com trabalho escravo) e no custear a coisa pública = princ. republicano)
Brasil o quinto do ouro. e) sujeito ativo: é o devedor do tributo, é a pessoa que tem o
c) não constitui sanção - O tributo além de ser uma obrigação ex dever jurídico de efetuar o pagamento do tributo, é a que tem capacidade
lege de dar moeda, não se constitui sanção por ato ilícito. O tributo não é tributária passiva.
multa. Tem por pressuposto a prática de um fato lícito qualquer, Qualquer pessoa tem capacidade tributária passiva, inclusive as
diferente de multa que pressupõe o descumprimento de um dever pessoas políticas, as jurídicas (autarquias, sociedade de economia mista,
jurídico. empresas públicas, empresas privadas) ou físicas, independentemente
Um ato ilícito sozinho não pode gerar tributo mas, ele pode existir de ter ou não capacidade civil.
remotamente na cadeia (ex. bicheiro deve pagar IR). Prevalece a teoria As pessoas políticas e as autarquias são imunes somente aos
non olet (não tem cheiro) que diz que não importa a origem do tributo, só impostos, podendo Ter que pagar outro tipo de tributo.
não pode derivar diretamente de ato ilícito. Nascimento da obrigação tributária: o tributo nasce quando se
O tributo incide sempre sobre fatos que trazem riqueza, verifica, no mundo em que vivemos (mundo fenomênico – mundo
economicamente considerando (traz ganhos para a pessoa que praticar o natural), o fato lícito (diferente de multa) e não-voluntário (decorre da
ato). vontade da lei) descrito na hipótese de incidência da norma jurídica
d) sujeito ativo: é o credor do tributo, é a pessoa que tem a tributária (é a lei da pessoa política competente)
titularidade do crédito tributário, que tem o direito subjetivo de cobrar, de
arrecadar o tributo. ELEMENTOS DO TRIBUTO
O direito subjetivo de cobrar o tributo se chama capacidade Elementos do tributo: hipótese de incidência, suj. ativo e passivo,
tributária ativa. base de cálculo e alíquota.
O sujeito ativo é, normalmente, uma pessoa política, aquela que a) hipótese de incidência: é o fato descrito na lei que acontecido
cria em abstrato o tributo (quase sempre). Normalmente a mesma faz nascer a relação jurídica tributária (o dever de pagar tributo) que tem
pessoa que exerce a competência tributária (aptidão para criar tributos) por objeto a dívida tributária. Existe no mundo abstrato, é o tipo
também tem a capacidade tributária (aptidão para cobrar o tributo). tributário, é o elemento diferenciador dos tributos (fato gerador in
O direito de criar tributo é indelegável mas, o de cobrar é delegável abstrato). Cuidado com a expressão fato gerador – é equívoca.
por lei editada pela pessoa política tributante, o que chamamos de Fato imponível: é a ocorrência do fato que já era previsto em como
parafiscalidade. apto a gerar uma obrigação tributária.
Parafiscalidade é quando terceira pessoa, diversa da que criou o É a ocorrência real da descrição abstrata, é o fato típico do tributo
tributo, venha arrecadá-lo, desde que tenha obtido autorização legal para (fato gerador in concreto).
isso. É a delegação de capacidade tributária ativa que a pessoa política, Nasce o tributo quando ocorrer o FI que se ajusto a uma HI já
por meio de lei, faz a terceira pessoa, a qual, por vontade desta mesma prevista = subsunção = tipicidade.
lei, passa a dispor do produto arrecadado. Ex.: INSS. A HI é diferente de FI. HI = tipo penal e o FI = fato típico penal
parafiscalidade pode favorecer pessoas jurídicas de direito público e de A hipótese de incidência é como se fosse uma moldura, segundo
estudos de Albert Hensel, catedrático da Universidade de Munique na
83

Alemanha - só deves pagar tributo se realizas em todos os seus É o tipo de tributo que tem por HI o comportamento de um
aspectos a hipótese de incidência. contribuinte (ICMS, ISS, ITBI) ou uma situação jurídica na qual ele se
b) base de cálculo: é a dimensão legal da materialidade do tributo. encontra (IPTU, ITR, IPVA).
Deve guardar correlação lógica com a HI (está embutida na HI), se Advém de fatos regidos pelo direito privado e que tenham
houver descompasso entre ambas nada poderá ser cobrado. (é significado econômico (adquirir imóvel – Direito Civil). Em regra são
elemento quantitativo). EX.: IR = a HI é obter rendimentos e a BC é o criados por LO.
quanto do rendimento. Tem seu fundamento de validade no poder de imperium (a pessoa
c) alíquota: é o critério legal, normalmente expresso em %, que, tributa porque a CF lhe deu esta faculdade)
conjugado à BC permite que se chegue ao quantum debeatur. O dinheiro dos impostos deveria voltar à população mas, sem uma
Não pode ser confiscatória (tributo confiscatório é o que retira do contraprestação (os mais ricos pagam mais e usam menos)
contribuinte o mínimo necessário para sua sobrevivência ( a pessoa
jurídica deve inclusive ter lucros para incentivos). - os impostos podem ser:
CLASSIFICAÇÃO JURÍDICA DOS TRIBUTOS a) federais – art. 153 e 154, I (União tem competência impositiva
Classificar - é o procedimento lógico de dividir um conjunto de explícita e implícita - residual),
seres em categorias segundo critérios preestabelecidos. b) estaduais – art. 155
I) Quanto as ordens jurídicas podem ser: c) municipais – art. 156.
a) federais (art. 153 e 154) , d) distrital - a competência impositiva é somatória da est. e
b) estaduais (art. 155), município - art. 155 caput e 147, parte final.
c) municipais (art. 156) e - a competência residual – é infinita e exige LC para sua criação
d) distritais. Esta classificação é uma garantia para que não ocorra bitributação.
- Todas devem conviver simultânea e harmonicamente, cada qual
obedecendo o seu campo de atuação, sem hierarquia (uma lei federal - classificações econômicas:
não pode criar tributo municipal e vice versa). Segundo José Roberto a) reais ( incide sobre coisa) ou pessoais (incide sobre pessoas).
Vernengo só há hierarquia entre normas jurídicas quando umas extraem Para o direito todos os tributos são pessoais, porque coisa não pode ser
das outras a validade que a legitima, não é o que acontece, todas elas polo passivo da obrigação tributária (casa não paga tributo)
tem fundamento de validade na CF (não há hierarquia) b) diretos (não repercutem – a carga econômica é suportada
II) Quanto ao fato estar ou não vinculado a atuação estatal a CF, pelo realizador do fato imponível - IR) e indiretos ( repercutem – a carga
art. 145, classifica em: econômica é, de algum modo, transferida para terceira pessoa, que é o
a) imposto, consumidor final - ICMS).
b) taxa e A restituição de impostos indiretos – art. 166 é inconstitucional
c) contribuição de melhoria. mas aplicado, a Sum. 546 STF proíbe esta restituição
Os impostos extraordinários, empréstimos compulsórios, Requisitos: I) quando o contribuinte de direito não tiver repassado
contribuição parafiscal e as do art. 149 não são modalidades específicas ao contribuinte de fato a carga econômica do tributo, ou
de tributo, se enquadram nas três acima, conforme a HI. II) quando tiver o repasse e o contribuinte de fato autorizar a
a) Impostos: é o tributo que traz maior retorno econômico, mas restituição
juridicamente tem a mesma importância dos outros - imposto extraordinário: permite que a União em caso ou na
É o tipo de tributo que tem por hipótese de incidência um fato iminência de guerra externa, crie qualquer imposto, ainda que para isso
qualquer não consistente numa atuação estatal (não vinculado).
84

invada o campo que, em época de paz, pertença a outra pessoa política a) taxa de serviço: tem por HI um serviço público específico e
- art. 154,II. Criado em 46 ainda não foi utilizado. divisível.
Não precisa respeitar as reservas de competências, tudo em razão Serviço público é a prestação de utilidade material usufruível
do estado de beligerância, esta anomalia se justifica em razão da individualmente sob regime de direito público.
proteção da soberania nacional. Exige guerra externa ou sua Temos duas modalidades:
iminência assim declarada pelo Direito Internacional. I) gerais (alcançam a comunidade como um todo, não se refere
Chamado imposto por motivo de guerra. Para sua criação exige diretamente a ninguém, a título universal, uti universi – ex. iluminação
LO. pública, segurança pública, serviço diplomático, bombeiro etc.) e os
É uma situação de bitributação constitucionalmente autorizada. II) específicos (alcançam pessoas individualmente consideradas,
Devem desaparecer quando cessada a causa que lhes gerou, não refere-se diretamente a alguém, uti singuli, dotados de divisibilidade, ex.
são perpétuos. Duas corrente: a) cessam assim que celebrada a paz ou iluminação domiciliar, água potável, telefone etc).
b) devem ser gradativamente suprimidos, sendo válido até o exercício Os serviços gerais não podem ser remunerados por taxa de
financeiro seguinte. serviço, são mantidos através das receitas gerais da pessoa jurídica
Não obedece o princ. da anterioridade. (impostos e multas), diferente dos serviços específicos que podem ser
- princ. informador dos impostos: capacidade contributiva - art. tributados por taxa.
145, § 1º, 1º p. Podemos ter o serviço efetivamente utilizado (taxa de serviço
Sempre que possível os impostos terão caráter pessoal e serão fruído) e o serviço colocado à disposição do contribuinte (taxa de serviço
graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte – é efeito fruível). A taxa de serviço fruível (taxa mínima) só pode ser cobrada
através da progressividade das alíquotas (ex.: IR tem alíquota de 15% e quando há um serviço de utilização compulsória, tem valor prestigiado
27,5%, dependendo da renda mas, é raro) e aplica o sistema de pela CF, ex: serviço domiciliar de água potável para evitar epidemias,
deduções de algumas despesas (não se abate vestuário, alimentos, diferente dos correios, do pedágio (são de fruição facultativa, serviço
lazer, transporte, moradia, remédios. Na verdade deveria incidir só sobre específico e divisível).
supérfluos). b) taxa de polícia: tributos que tem por HI atos de polícia de
O ICMS e o IPI foram estruturados pela CF de maneira que impede efeitos concretos.
a progressividade das alíquotas, aplicando a capacidade contributiva Ato de polícia é aquele que envolve o exercício do chamado Poder
quanto a essencialidade dos produtos. Ex. calçados tem alíquota zero de de Polícia, que consiste na faculdade que o Estado tem de observadas
IPI, diferente de bebidas. as diretrizes constitucionais baixar regras de nível legal ou infralegal para
Quanto ao ICMS não ocorre perfeitamente a alíquota seletiva, o art. disciplinar o exercício dos direitos à liberdade e a propriedade
155, § 2º, III, da CF diz poderá ser seletiva, o que justifica a sua não compatibilizando com o bem comum (limitações).
aplicação mas, na verdade, é um poder-dever. Ex.: taxa de fiscalização e inspeção de bebidas alcoólicas (federal),
b) Taxas: é o tipo de tributo que tem por hipótese de incidência taxa de porte de arma (estadual), taxa de licença para construir (mun.)
uma atuação estatal diretamente referida ao contribuinte. – art. 145, II. A taxa de polícia remunera as diligências necessárias para a prática
A atuação estatal pode consistir em um: serviço público = taxa de do ato pois, estes, não são economicamente considerados (ex. um “de
serviço ou um ato de polícia = taxa de polícia. acordo”, uma certidão de antecedentes).
O serviço público e ato de polícia podem ser gratuitos mas, se - princ. informador das taxas: princ. da retributividade – a finalidade
forem cobrados deve ser por taxa. da taxa é compensar a pessoa política pelo ato que presta, portanto,
deve haver uma correlação entre o custo da atuação estatal e o valor
85

cobrado a título de taxa, segundo certa dose de razoabilidade (não serve * Empréstimo compulsório: são tributos e se classificam em
para encher os cofres públicos como os impostos). imposto, taxa ou contribuição, conforme o regime jurídico que se
- art. 145, § 2º - as taxas não poderão ter base de cálculo própria constitui.
de impostos (a CVM – taxa de comissão de valores mobiliários, tinha Somente a União pode instituir e exige LC.
como base de cálculo o patrimônio líquido das empresas – típico de Poderão ser criados para:
imposto – é inconstitucional) I) atender as despesas extraordinárias decorrentes de guerra
No Direito Comparado temos: externa ou sua iminência e calamidade pública e
a) taxa de uso (uso de bens pertencentes ao domínio público – II) investimento público de caráter urgente e de relevante interesse
visita a museu) e nacional, obedecido o princ. da anterioridade (diferente do inc. I que pode
b) taxa de obras ( ex. taxa de pavimentação) incidir imediatamente).
- Tarifa = preço público = preço = é o valor devido a título de Estes são pressupostos de criação deste tributo, só é possível
serviço publico ou ato de polícia de fruição facultativa; não precisa seguir empréstimo compulsório com relação a estas matérias.
o regime jurídico tributário; pode ser criado por decreto, portaria ou ato Não importa a destinação dinheiro arrecadado, ele nunca perde sua
administrativo; não segue o princípio da anterioridade. Há muita natureza de tributo.
divergência na distinção de taxa e tarifa e quais os serviços se São restituíveis. A lei que o criou que deve estabelecer como serão
enquadram em cada uma delas. devolvidos, cria um direito subjetivo ao contribuinte. Se foi pago em
c) Contribuição de melhoria: é o tipo de tributo que tem por moeda deve restituir em moeda e no ser valor integral, incide correção
hipótese de incidência uma atuação estatal indiretamente referida ao monetária.
contribuinte. A União não pode criar empréstimo compulsório sobre tributos de
Tributo que tem por HI a valorização imobiliária causada por uma competência de outras pessoas políticas.
obra pública – art. 145, III. O contribuinte tem direito de cessar o pagamento deste tributo se
Obra pública é a edificação, ampliação ou reforma de um bem houver desvio de finalidade (art. 148, pú)
imóvel pertencente ou incorporado ao patrimônio público. Contribuições: a União por meio de LO. poderá criar contribuições
Para a cobrança da contribuição é necessário a obra pública e que tendo em vista:
esta cause valorização no imóvel do contribuinte – relação causalidade I) a intervenção na domínio econômico;
(não precisa ser absoluta). Só pode ser cobrada depois de concluída a II) interesse de categorias profissionais ou econômicas e
obra. III) custeio da seguridade social. - art. 149.
Base de calculo é o quantum da valorização e a alíquota uma % Devem obedecer o regime tributário.
deste valor (fixados por lei). São tributos qualificados pela finalidade e terão natureza de
O valor é apurado através de cálculos atuariais. O contribuinte pode imposto ou taxa, dependendo da hipótese de incidência (não serão
discordar dos cálculos feitos e pedir o seu refazimento . contrib. de melhoria)
Só pode ser cobrado uma vez para cada obra.
Os arts. 81 e 82 estabelecem os requisitos para sua cobrança, o . PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS TRIBUTÁRIOS
que a torna quase impraticável. - Princípios: são vetores das normas. As normas constitucionais
- princ. informador: princ. da proporcionalidade – o contribuinte não tem a mesma importância (ex. art. 5º, II e art. 87 – matéria infralegal).
devolve à comunidade parte do especial benefício recebido em razão da Não importa se está implícita ou explícita a sua importância se mede
obra. pela abrangência da norma.
86

Segundo Celso A. B. M. o direito é uma vasto edifício jurídico, tudo f) Princípio da Vedação de efeitos confiscatórios: o tributo deve ser
está previsto como uma obra arquitetônica. razoável, não podendo ser tão oneroso que chegue a representar um
a) Princípio da legalidade: art. 5º, II e art. 150, I, da CF - ninguém verdadeiro confisco – art. 150, IV.
será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude g) Princípio da Imunidade recíproca das esferas públicas: a União,
de lei (princ, da universalidade da legislação). os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não podem instituir
- E mais, é vedado às pessoas políticas criar ou aumentar tributo impostos sobre o patrimônio, renda ou serviço, uns dos outros - art. 150
sem lei que o estabeleça, deve ser lei da pessoa política competente (o VI, ª
sistema tributário foi redundante). h) Princípio da Imunidade de tráfego: não pode a lei tributária limitar
- Em razão deste princípio se exige que só lei reduza tributos, o tráfego interestadual ou intermunicipal de pessoas ou bens, salvo o
altere os prazos, parcelamento, obrigação acessória, enfim, tudo que for pedágio de via conservada pelo poder público – art. 150, V, da CF e art.
importante em matéria tributária deve ser previsto por lei. 9º, III, do CTN).
- Alguns definem como princ. da estrita legalidade ou da reserva i) Princípio da Uniformidade nacional: o tributo da União deve ser
absoluta da lei formal o que leva ao princ. da tipicidade fechada da igual em todo território nacional, sem distinção entre os Estados – art.
tributação, o que exige que a lei seja minuciosa, evitando o emprego da 151, I, CF.
analogia ou da discricionariedade. j) Princípio da Vedação de distinção em razão de procedência ou
- Art. 153, § 1º representa uma aparente exceção (PR por decreto destino: é vedado aos Estados, ao DF e aos Município estabelecer
poderá aumentar alíquotas de II, IE, IPI, IOF). diferença tributária entre bens e serviços, de qualquer natureza, em
b) Princípio da anterioridade: art. 150, III, b, da CF, comum do razão de sua proced6enciaou destino – art. 152, CF.
campo tributário, diz que a lei que cria ou aumenta tributo, ao entrar em k) Princípio da Não-cumulatividade: por este princípio compensa-se
vigor, fica com sua eficácia suspensa até o início do próximo exercício o tributo que for devida em cada operação com o montante cobrado nas
financeiro, quando incidirá e produzirá todos os seus efeitos no mundo anteriores. Este princípio não é geral, sendo aplicado apenas no IPI, no
jurídico (não adia a cobrança e sim suspende a eficácia, não há ICMS e em eventuais impostos que vierem a ser criados pela União, na
incidência). Este princ. e o da segurança jurídica evitam a surpresa. sua competência residual (arts. 152, § 3º, II; 155, § 2º, I; e 154, I). Na
c) Princípio da segurança jurídica (ou irretroatividade): art. 150, III, apuração contábil do IPI e do ICMS, o imposto a ser pago é lançado
a, - princ. universal do direito. A segurança jurídica em sua dupla como débito, e o que já foi pago nas operações anteriores é lançado
manifestação que é a certeza do direito e a proibição do arbítrio exigem como crédito, a diferença entre esses débitos e créditos é que
que as leis sejam irretroativas (só produzem efeitos para o futuro), salvo efetivamente deve ser recolhido em determinado período.
se para beneficiar o contribuinte (neste caso depende de previsão l) Princípio da Tipicidade: o tributo só incide no caso de fato ou
expressa, diferente do Dir. Penal). Como acontece no direito penal a lei situação típica, ou seja, de fato ou situação previamente descrita em lei
deve ser anterior ao fato imponível.
d) Princípio da Isonomia: a lei, em princípio, não deve dar INTERPRETAÇÃO DAS LEIS TRIBUTÁRIAS
tratamento desigual a contribuintes que se encontrem em situação a) quanto ao sujeito que a realiza:
equivalente. – art. 150, II, CF. I) autêntica: pelo próprio legislador;
e) Princípio da Capacidade Contributiva: faz parte do princípio da II) doutrinária: estudiosos do direito – não é fonte do direito; e
isonomia, consiste em tratar os desiguais de modo desigual, podendo III) judicial: feita pelo poder Judiciário – podem formar
assim. O tributo ser cobrado de acordo com as possibilidades de cada jurisprudência – não é fonte do direito.
um – art. 145, § 1º. b) quanto aos meios de que se vale o intérprete:
I) gramatical ou literal;
87

II) lógica: vale-se de elementos sistemáticos e teleológicos a existência de uma relação jurídica entre o responsável e o contribuinte,
c) quanto aos resultados que produz: só é possível nos impostos)
I) extensiva: a interpretação vai além da lei; A sujeição passiva indireta existe para facilitar a arrecadação, a
II) restritiva: fica aquém da lei; e necessidade da relação jurídica é para que o ressarcimento seja feito de
III) declaratória: fica nos estritos limites da lei plano. Pode se dar:
I) por transferência: que se dá quando o dever de pagar o tributo,
COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA tendo nascido na pessoa do contribuinte, desloca-se para a pessoa do
- É a aptidão para criar in abstrato tributos, descrevendo responsável, em decorrência de um fato novo prestigiado pela lei. Pode
legislativamente (lei) todos os seus elementos (hipótese de incidência, ser por:
sujeito ativo e passivo, base de cálculo e alíquota). - solidariedade (quando duas ou mais pessoas são co-obrigadas
- Exercitar a competência é dar nascimento, no plano abstrato, a pela lei a responderem pelo pagamento do mesmo tributo). Só admite
tributos. Inclui a competência para aumentá-los, isentá-los, diminuí-los, solidariedade legal, lei da pessoa política tributante (ex. IPTU dos
etc. comunheiros, não admite benefício de ordem);
- Só as pessoas políticas tem competência tributária. - sucessão (dá-se quando primitivo devedor desaparece do polo
- Características: passivo, deixando juridicamente quem lhe faça as vezes, pode ser causa
a) privativa: cada pessoa política tem seus próprios tributos; mortis ou inter vivos) ex. morre e deixa herdeiros e herança (ativo e
b) incaducável: não está submetida a prazo para ser validamente passivo) e em presa A adquire ativo e passivo da empresa B ;
exercitada (ex. imp. sobre grandes fortunas); - responsabilidade legal (dá-se quando pessoa que tinha o dever
c) exercício facultativo: a pessoa política é livre para criar ou não o de zelar pelo recolhimento do tributo por parte do contribuinte não o faz
tributo – exceção ICMS que é de exercício obrigatório; e, por isso, o tributo acaba não sendo pago) ex. tabelião antes de lavrar a
d) inampliável: não pode ir além das raias constitucionais, só é escritura de fiscalizar o pagamento do ITBI, se ele não for recolhido terá
possível alargamento por força constitucional, admite por emenda; que pagar.
e) irrenunciável (pode deixar de exercitar mas, não pode abrir mão II) por substituição: dá-se quando o dever de pagar o tributo, por
em definitivo); O legislador de hoje não pode criar entraves para o de expressa determinação legal, nasce de imediato na pessoa do
amanhã. responsável (ex. IR na fonte, nasce na pessoa do empregador)
f) indelegável (não pode delegar o que recebeu por delegação, na Obs.: os pactos celebrados entre particulares não alteram o polo
verdade, o que se delega é a capacidade tributária – art. 7º). passivo da relação tributária, não valem para a Fazenda Pública - art.
123 do CTN.
SUJEITO PASSIVO
O contribuinte pode ser: INFRAÇÕES TRIBUTÁRIAS ADMINISTRATIVAS
a) de fato: é o destinatário da carga econômica (interessa aos A responsabilidade por infrações tributárias é objetiva, independe
economistas); e da intenção com que foram praticadas e da efetividade, natureza e
b) de direito: que figura no polo passivo da obrigação tributária extensão dos efeitos do ato, salvo disposição legal em contrário – art.
(pode ser pessoa física ou jurídica) e se divide em: 136, CTN. Segundo a doutrina este princípio não é absoluto, a
I) direto (realizador do fato imponível, paga o tributo a título próprio, responsabilidade poderá ser excluída se o contribuinte ou responsável
chamado contribuinte); puder provar que não houve descuido ou negligência, nem intenção de
II) indireto (não é o realizador do fato imponível, paga o tributo a lesar o Fisco (inverte-se o ônus da prova).
título alheio e depois se ressarce, chamado responsável, é indispensável
88

O CTN permite remissão do crédito tributário atendendo ao erro ou - Deve ser levado a conhecimento do contribuinte através da
ignorância escusáveis quanto à matéria de fato – art. 172,II, CTN. notificação, que é ato administrativo que não se confunde com o
As sanções tributárias administrativas podem consistir em multa, lançamento mas, lhe dá eficácia. Deve ser na pessoa do contribuinte,
apreensão de mercadorias, veículo ou documentos, perda de salvo se esgotados os meios razoáveis se recorre ao edital. É acessório
mercadorias, proibição de contratar com o poder público, sujeição a ao ato principal que é o lançamento, portanto, segue o seu destino – nulo
sistema especial de fiscalização, prisão administrativa, etc. o lançamento, nula a notificação, a recíproca não é verdadeira.
A prisão administrativa só cabe nos casos de depositário infiel, ou - Espécies de lançamento: (de acordo com a maior ou menor
seja, de responsável que deteve o tributo e não o repassou para o Fisco, participação do fisco)
ex. IR retido na fonte. Atualmente a prisão administrativa só pode ser a) direito (feito só pelo fisco) - ex. IPTU;
decretada pelo juiz competente – art. 5º, LXI, CF. b) misto (fisco e contribuinte) – ex. IR, contribuinte entrega os
A penalidade pela infração tributária administrativa pode ser cálculos e a Fazenda confere; e
excluída por denúncia espontânea, acompanhada do pagamento devido c) por homologação (só contribuinte e o fisco confere regras
e dos juros de mora – art. 138, CTN. formais de cálculo) - ex. ICMS (se não estiver de acordo impõe multa).
- O tributo com a ocorrência do fato imponível, o lançamento e a
LANÇAMENTO TRIBUTÁRIO notificação está “em termos”, isto é, em condições de ser pago pelo
É um ato administrativo de aplicação da lei tributária material ao contribuinte e cobrado pela fazenda pública, caso não seja pago poderá
caso concreto - é a fase em que o crédito tributário se torna líquido e dar enseja ao Auto de Infração.
certo, isto é, certo quanto a sua existência e quanto ao seu valor
(diferente de quando ocorre o fato imponível em que o crédito tributário é AUTO DE INFRAÇÃO (AIN)
ainda ilíquido e incerto). Não equivale ao lançamento, é ato administrativo diferente,
- É o mecanismo jurídico que dá liquidez, certeza e exigibilidade ao vejamos os cinco elementos (segundo Hely):
crédito tributário (só depois do lançamento que ele pode ser cobrado).
- O surgimento da obrigação tributária é lógica e cronologicamente CAUSAS SUSPENSIVAS DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO - Art. 151
anterior ao lançamento. do CTN
- Responde cinco perguntas: 1) Quem é o contribuinte? 2) Quanto É o ato ou o fato a que a lei atribui o efeito de adiar a exigibilidade
ele deve ao fisco? 3) Onde ele deve efetuar o pagamento? 4) Como ele do tributo. São:
deve efetuar o pagamento? 5) Quando ele deve fazer o pagamento? a) Moratória = é a prorrogação do prazo inicial para pagamento
- Características: é ato administrativo vinculado (no estrito termo do tributo – art. 151,I
da lei – a lei vigente à data da ocorrência do fato imponível – sob pena e - exige lei ordinária. – Só a entidade tributante pode conceder
crime de desobediência e responsabilidade funcional) moratória
- É ato declaratório (não cria uma situação nova). - art. 152 do CTN é inconstitucional mas, ainda não foi objeto de
- Produz efeitos ex tunc (retroage à data da ocorrência do fato ADIN.
imponível). - Moratória é diferente de parcelamento que consiste em novação
- Goza de presunção de legitimidade e veracidade (é ato adm.) até (nova obrigação, nova data, novo valor com a extinção da obrigação
prova em contrário, o ônus é do contribuinte. anterior)
- Só é passível de anulação (não é passível de revogação, é ato - é uma medida de política fiscal (conseqüência de crises).
vinculado) - Ação anulatória de débito fiscal.
89

b) Depósito integral do montante tributado = para que seja causa c) Imunidades - é a hipótese de não incidência tributárias
suspensiva deve ser depositado o valor integral cobrado pela Fazenda constitucionalmente qualificada (diferente de isenção que é previsão de
Pública. lei).
- Se o contribuinte perder, nada será cobrado já que a conta - o desrespeito a uma imunidade leva a inconstitucionalidade, há
judicial faz atualização e se ganhar o dinheiro será devolvido com quem entenda que são clausulas pétreas e só podem ser alteradas pelo
correção monetária (a FP não que mas, o Judiciário exige). poder constituinte originário.
- o depósito é uma faculdade para o contribuinte não um dever (o - só dizem respeito a imposto (não há imunidade de taxas e
art. 38 da Lei 6830/80 que exige o depósito é considerada pelo PJ. contribuição de melhoria – o art. 5º, XXXIV é aparente exceção).
Inconstitucional, apesar de não ter decisão expressa) - as expressões de taxa para direito de petição, de certidão para
- não é possível condicionar a liminar de MS à realização do instruir processo são usados no sentido atécnico do termo taxa.
depósito, se presentes os requisitos para concessão da segurança. - As imunidades podem ser:
c) Interposição de recurso administrativo = só será causa I) genéricas: art., 150, VI, da CF e
suspensiva se o recurso tiver efeito suspensivo, sendo assim, a Fazenda II) específicas: art. 153, § 2º, II (IR); art. 153, § 2º, III (IPI);
Pública não poderá ajuizar a Execução Fiscal, enquanto não decidido o art. 153, § 4º (ITR); art. 155, § 2º, X, a, b e c (ICMS), art. 155, § 3º;
recurso. art. 156, II e § 2º, I (ITBI); art. 184, § 5º etc.
- o contribuinte não precisa esgotar as vias administrativas para ir d) Isenções - é uma hipótese de não incidência tributária
ao judiciário - é faculdade. legalmente qualificada
- decisão administrativa não faz coisa julgada, é possível a FP - admite-se a isenção feita por qualquer espécie normativa - lei
ajuizar ação judicial contra o julgamento administrativo, isto porque, o ordinária é a regra, é possível lei complementar em hipóteses restritas
judiciário é para todos, é universal. (impostos residuais e empréstimo compulsório), decreto legislativo
d) Concessão de liminar = a tutela antecipada pode ser federal (tratados) e decreto legislativo estadual (ICMS – sui generis) -
considerada como uma liminar - é também uma antecipação de tutela. não podem ser criadas por decreto, ato administrativo, medida provisória
- liminar de MS não vincula o juiz, ele pode caça-la a qualquer etc. - a lei que revoga uma isenção deve obedecer ao princípio da
momento e, por fim, denegar a segurança (não é possível denegar a anterioridade, já que recria o tributo.
segurança e não caçar a liminar). - as isenções, diferente das imunidades podem incidir sobre
- liminar pode ser restabelecida pelo tribunal ad quem, pelo relator impostos, taxas e contribuições de melhoria.
se distribuída a ação ou pelo presidente do tribunal antes da distribuição. - Podem ser:
- as obrigações acessórias persistem mesmo que suspensa a I) autonômicas (concedida pela própria pessoa política que cria o
exigibilidade do crédito tributário – art. 151, pú. tributo) e
II) heterônoma (pessoa política diferente – art. 155, § 2º, XII, “e” e
EXCLUSÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO art. 156, § 3º, II) a CF que criou estas exceções;
a) Incidência – quando ocorre o fato imponível (ocorre o fato que III) transitórias (com prazo certo) e
realizou a hipótese de incidência tributária IV) permanentes (com prazo indeterminado) é a regra;
b) Não incidência – quando não ocorre nenhum fato ou, quando V) condicionada (com encargo, chamada bilateral ou onerosa) e
ocorre um fato tributariamente irrelevante. VI) incondicionada (sem qualquer encargo, unilateral ou gratuita)
- Alguns fatos podem se tornar relevantes quando a pessoa política
cria o tributo e, outros, nunca serão relevantes porque são cobertos PROCESSO TRIBUTÁRIO
constitucionalmente pelas imunidades.
90

Instituto da Consulta - o contribuinte ou responsável pode consultar A Fazenda pode propor contra o contribuinte ou responsável as
a Fazenda sobre o modo exato de cumprir determinada obrigação. Na medidas judiciais, como, por exemplo, execução fiscal, ação cautelar
pendência da consulta não se inicia a ação fiscal, nem se aplicam fiscal, arrestos, seqüestro, etc.
penalidades. Na resposta, pode a Fazenda intimar o consulente a Pela ação cautelar fiscal, prevista na Lei 8.397/92, a Fazenda
cumprir determinada obrigação. O procedimento da consulta permite pode obter a declaração de impenhorabilidade dos bens do devedor, no
recurso e a reapreciação da matéria em segunda instância, por limite do crédito tributário.
autoridade superior. A Fazenda pode considerar a consulta ineficaz ou Ao contribuinte ou responsável é permitido opor embargos à
incabível, faculdade, essa, da Fazenda, que certamente deve execução, ação declaratória de obrigação fiscal indevida, ação
desestimular a apresentação de consultas. Não produz efeito a consulta consignação em pagamento, ação de repetição de indébito, ações
formulada, por exemplo, por quem já foi intimado a cumprir a obrigação, cautelares, ações anulatórias de débito, mandado de segurança, etc.
ou está sob ação fiscal referente ao assunto, ou quando a matéria estiver
definida em lei expressa ou ato normativo. Execução Fiscal
Processo Administrativo Nesta ação a Fazenda ingressa em juízo para a cobrança forçada
Na Administração Pública o procedimento é geralmente livre ou do crédito tributário. Podem mover execução fiscal a União, os Estados,
discricionário, só se exigindo formalismo quando determinado por lei. No o DF, os Municípios, bem como as respectivas autarquias e entidades
âmbito federal o procedimento fiscal inicia-se pela notificação de que detenham capacidade tributária por delegação. Não podem as
lançamento, pelo auto de infração ou pela apreensão de livros e empresas públicas e as sociedades de economia mista.
mercadorias. Rege-se pela Lei de Execução Fiscal (LEF), Lei n.º 6.830/80 e,
Segue-se com o pagamento do tributo devido, ou a impugnação subsidiariamente o CPC.
do interessado, dentro dos prazos fixados, geralmente 30 dias. O crédito fiscal tem preferência sobre qualquer outro, ainda que
A impugnação é julgada geralmente pelos Delegados da Receita tenha garantia real. Executa-se o crédito trabalhista, que ocupa o
Federal, na área da União, ou pelo Delegado Regional Tributário, na área primeiro lugar na ordem das preferência legais, acima da Fazenda – art.
estadual (em SP), ou por órgãos auxiliares, como Seções de Julgamento, 186 do CTN. Os credores hipotecários, pignoratícios, anticréticos, não
em decisão de primeira instância. Esta decisão pode ser revista, em podem opor ao Fisco a garantia real de que são titulares.
segunda instância, pelo Conselho de Contribuintes ou, na esfera estadual - Concurso de preferência entre Fazendas:
(em SP) pelo Tribunal de Impostos e Taxas (TIT). a) União e suas autarquias;
O processo administrativo tributário culmina com a inscrição da b) Estados, DF e suas autarquias, em conjunto e pro rata
dívida apurada no Livro da Dívida Ativa – art. 201 do CTN e art. 2º, § 5º, (proporcionalmente);
da Lei 6830/80. A dívida regularmente inscrita goza de presunção c) Municípios e suas autarquias, em conjunto e pro rata
relativa de certeza e liquidez, podendo ser atacada ou eliminada pela (proporcionalmente) – art. 29, pú, LEF e art. 187, pú, do CTN;
prova em contrário. A Certidão de Dívida Ativa constitui título executivo, - O MP não intervém nas execuções fiscais, salvo se houver
habilitando a Fazenda a ingressar em juízo, com ação de execução interesse de incapaz ou outro motivo previsto no art. 82 do CPC..
fiscal, para expropriar bens do devedor, tantos quantos bastem à - É possível a execução de uma fazenda contra a outra.
satisfação do débito tributário. - A petição inicial deve vir acompanhada pela Certidão da Dívida
Ativa (CDA), que tem presunção relativa de liquidez e certeza – art. 3º,
Processos Judiciais LEF. A execução abrange o devedor e o responsável tributário, sem que
haja necessidade do nome deste figurar na CDA.
91

- A citação é feita pelo Correio, com A.R., podendo também ser feita Não anterioridade: não se sujeita ao princípio da anterioridade – art.
por oficial de justiça, se a Fazenda assim requerer – art. 8º, LEF. Pelo 150, § 1º, da CF
correio considera-se feita na data da entrega da carta no endereço do Alíquota: 10%, podendo ser reduzida ao índice zero, ou aumentada
executado – art. 8º, II. até quatro vezes – art. 153, § 1º, da CF.
Não incidência do ICMS nas operações e prestações que destinem
IMPOSTOS ao exterior mercadorias, inclusive produtos primários e produtos
industrializados semi-elaborados, ou serviços – art. 3º, II, da LC 87/96.

IMPOSTO SOBRE IMPORTAÇÃO – II IMPOSTO SOBRE A RENDA E PROVENTOS DE QUALQUER


NATUREZA – IR
Competência – União, art. 153, I, da CF Competência: União – art. 153, III, da CF
Fato imponível – entrada no país de mercadoria a ele destinada (e Fato imponível: aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica
não apenas de passagem). - A formalização dá-se no desembaraço de renda ou proventos de qualquer natureza – art. 43, CTN. A
aduaneiro. Território aduaneiro é a área onde pode ser exigido o tributo, disponibilidade de econômica é a de fato – art. 116, I, CTN e a
ou seja, todo o território nacional. A zona primária do território aduaneiro disponibilidade jurídica é a obtida pelo preenchimento de formalidade
refere-se aos portos, aeroportos e outros locais alfandegados. A zona legal (ex. recebimento de doação de imóvel) – art. 116, II, CTN. (assunto
secundária abrange o território restante. não é pacífico). De qualquer forma não há renda nem provento sem
- Função extrafiscal – especial função como instrumento regulador acréscimo patrimonial. Por isso, pode-se dizer que o fato gerador do
do comércio exterior imposto é o acréscimo patrimonial.
Este imposto não obedece ao princípio da anterioridade – art. 150, Renda: á o produto do capital, ou do trabalho, ou da combinação de
§ 1º, CF ambos – art. 43, I, CTN.
Alíquota – pode ser específica, tendo em vista o modo de medir o Proventos: são todos os outros acréscimos patrimoniais, como
produto (ex. por quilo, metro, etc), ou ad valorem, tendo em vista apenas aposentadorias, pensões, etc.
o valor do bem – art. 20, CTN. As alíquotas podem ser alteradas pelo Sujeito passivo: é a pessoa física ou jurídica que registra
Executivo – art. 153, § 1º, da CF e art. 21 do CTN. acréscimos em seu patrimônio (contribuinte). Pode ser também quem
Na importação incidem três impostos: II, IPI, ICMS. O IPI é tem a obrigação de reter o imposto na fonte (responsável)
calculado sobre a mercadoria mais os valores do II, das taxas e dos
encargos cambiais – arts. 153, I e IV e art. 155, § 2º, IX; art. 47, I, do CTN IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS – IPI
e art. 2 º, § 1º, I, da LC 87/96. Competência: União – art. 153, IV, da CF
Consideram-se produtos industrializados os modificados ou
IMPOSTO SOBRE EXPORTAÇÃO – IE aperfeiçoados para o consumo – art. 46, pú. A industrialização consiste
em beneficiamento, transformação, montagem, acondicionamento ou
Competência: União – art. 153, II, da CF. renovação.
Fato imponível: saída de produtos nacionais ou nacionalizados, Fato imponível: dá-se com:
para o exterior. Nacionalizados são os importados que aqui foram a) o desembaraço aduaneiro do produto, quando de procedência
beneficiados ou transformados. A formalização dá-se no momento da estrangeira – art. 46, I. O IPI, no caso, incide não só sobre o preço da
expedição da guia de exportação ou documento equivalente. mercadoria, mas também sobre o que foi pago a título de imposto de
Função extrafiscal: instrumento regulador do comércio exterior; importação, taxas e encargos cambiais – art. 47
92

b) a saída do produto do estabelecimento de importador, industrial, propriedade, que pode ser destacado e entregue a outrem) ou posse de
comerciante ou arrematante. No caso de comerciante o IPI só é devido terra, fora da zona urbana, 1º de janeiro de cada ano.
nos produtos sujeitos ao imposto e se ele vender o produto para um Não importa a destinação efetiva do imóvel , agrícola ou
industrial – art. 51, III, CTN. residencial, o que vale é a sua localização fora da zona urbana. A lei
c) arrematação, em leilão, de produto apreendido ou abandonado – refere como tributável o imóvel por natureza – art. 29, CTN.
art. 46, III, CTN Seletividade: o ITR deve ser seletivo, com alíquotas fixadas de
Seletividade: o IPI tem alíquota maior ou menor, conforme a forma a desestimular a manutenção de propriedade improdutivas, não
essencialidade do produto. incidindo sobre pequenas glebas rurais, definidas em lei, quando as
Não cumulatividade: o IPI pago numa operação deduz-se explore, só ou com sua família, o proprietário que não possua outro
do IPI a ser pago na operação seguinte, na passagem da mercadoria de imóvel – art. 153, §4º, CF (consiste em uma imunidade). A lei 9393/96
uma empresa para outra (ou de um estabelecimento para outro, da esclarece algumas isenções, como no caso de imóvel rural
mesma empresa – art. 51, pú, CTN). Mas não entram no cômputo compreendido em programa de reforma agrária, dentro das condições
produtos destinados ao ativo permanente, que não fazer parte do mencionadas.
processo de industrialização. Cálculo do imposto: a apuração e o pagamento do ITR serão
Não anterioridade: o IPI não se sujeita ao princípio da efetuados pelo contribuinte, independentemente de prévio procedimento
anterioridade – art. 150, § 1º, CF da administração tributária, nos prazos e condições estabelecidos pela
Não incidência na exportação: não incide IPI nos produtos Secretaria da Receita Federal, sujeitando-se a homologação posterior –
destinados ao exterior – art. 153, § 3º, III. Tecnicamente, trata-se de Lei 9393/96.
imunidade, uma vez que a dispensa é dada pela própria CF.
SIMPLES
IMPOSTO SOBRE OPERAÇÕES DE CRÉDITO, CÂMBIO E Sistema integrado de pagamento de impostos e contribuições das
SEGURO, OU RELATIVAS A TÍTULOS OU VALO RES MOBILIÁRIOS - microempresas e das empresas de pequeno porte. – Lei 9317/96. O
IOF simples não é um novo tributo, mas apenas uma forma simplificada,
Competência: União – art. 153, V facultativa e favorecida de pagamento de impostos e contribuições.
Função extrafiscal: pode ser também usado como instrumento da A simplificação consiste no pagamento unificado de várias
política financeira. contribuições (contribuição para os Programas de Integração social e de
Incide sobre as operações mencionadas e também sobre o ouro, Formação do patrimônio do Servidor Público - PIS/PASEP, contribuição
quando definido por lei como ativo financeiro – art. 153, § 5º. social sobre o lucro líquido – CSLL, contribuição para financiamento da
Não anterioridade: o IOF não se sujeita ao princípio da Seguridade Social – COFINS, contribuições para a Seguridade Social,
anterioridade – art. 150, §1º, CF referentes às parcelas devidas pelas empresas) e de dois impostos
federais (IRPJ e IPI). O ICMS e o ISS também poderão vir integrar o
IMPOSTO SOBRE PROPRIEDADE TERRITORIAL RURAL - ITR simples, mediante convênio entre a União e o Estado ou Município
Competência: União – art. 153, VI. Mas 50% são repassados interessado.
para os Municípios, relativamente aos imóveis neles situados – art. 158, Os percentuais a serem pagos sobre o movimento de cada mês
II, CF. variam de 3% a 7%. O percentual é fixado de acordo com a receita bruta
Incide sobre a propriedade (é a soma de todos os direitos que auferida no ano-calendário até o Mês em referência – art. 5º. Se a
alguém possa ter sobre uma coisa), domínio útil (é um aspecto da empresa é contribuinte de IPI acrescenta-se 0,5%. No caso de ICMS e
ISS há também acréscimo de 0,5% até 2,5%.
93

Os participantes do simples não podem se valer de incentivos elétrica, cigarros, sorvetes, automóveis, etc. A substituição tributária
fiscais, nem de créditos relativos ao IPI e ICMS. Também não podem pode ser progressiva ou regressiva. Na progressiva ou para frente o
parcelar impostos. substituto recolhe o imposto de operações posteriores, ou futuras.
Nestes casos, os revendedores (substituídos) não destacarão o imposto
IMPOSTO SOBRE TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS E DOAÇÃO nas suas notas fiscais, limitando-se a anotar que já houve recolhimento
DE QUAISQUER BENS OU DIREITOS - ITCD antecipado, por substituição. Na substituição regressiva, ou para trás, o
Competência: Estados e Distrito Federal – art. 155,I, CF. No caso substituto recolhe o que normalmente seria devido pelo operador anterior
de imóveis o imposto é recolhido pelo Estado onde se situam. No caso (ex. papel). A substituição pode facilitar a cobrança e a fiscalização do
de móveis, pelo Estado onde se processar o inventário ou tiver domicílio tributo mas, quando impõe um ônus excessivo, pode representar uma
o doador – art. 155, § 1º, CF. modalidade de arrecadação contrária à CF.
A base de cálculo nas mercadorias é o valor da operação. A LC
IMPOSTO SOBRE OPERAÇÕES RELATIVAS À CIRCULAÇÃO DE 87/96 estabelece os critérios.
MERCADORIAS E SOBRE PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS DE Quando a mercadoria é fornecida para uso ou consumo do
TRANSPORTE INTERESTADUAL E INTEMUNICIPAL E DE destinatário (e não para comercialização), o valor do IPI, se houver entra
COMUNICAÇÃO - ICMS também na base de cálculo – art. 155, § 2º, XI, CF.
O ICMS incide sobre a circulação (movimentação da mercadoria As alíquotas podem ser internas, interestaduais e de exportação.
dentro da corrente comercial) de mercadorias (são coisas móveis Às vezes há dúvida sobre qual imposto devido, por parecer que
destinadas ao comércio) e sobre dois tipos de serviços: transporte uma parte da operação deve ser regida pelo ICMS e outra pelo ISS. O
(intermunicipal e interestadual) e comunicação. Fora desses dois problema surge principalmente no fornecimento de mercadorias
serviços, todos os demais vinculam-se ao ISS, ou são isentos, se no acompanhadas de prestação de serviços, ou vice-versa. Algumas
estiverem na lista dos serviços tributáveis por ISS. regras ajudam na solução: dois serviços pertencem ao ICMS, o restante
Competência: Estados e DF – art. 155, II. ao ISS e que para serem tributados devem constar de lei municipal,
Não cumulatividade: o ICMS é não cumulativo, compensado-se o dentro da relação. Só ICMS: o fornecimento de mercadorias com
que for devido em cada operação com o montante cobrado nas prestação de serviço não especificados na lista fica sujeito apenas ao
operações anteriores, assemelhando-se nesse ponto com o IPI – art. ICMS (ex. fornecimento de refeições em restaurantes). Só ISS: se o
155, N9 2º, I, da CF. serviço estiver na lista, incide apenas o ISS, ainda que a prestação
Seletividade: o ICMS pode ser seletivo, em função da envolva algum fornecimento de mercadoria, considera-se, no caso, a
essencialidade da mercadoria e serviços – art. 155, § 2º, III. preponderância dos serviços em relação à mercadoria (ex. serviço de
Considera-se ocorrido o fato imponível no momento da saída de dentista, incide sobre o valor somado do serviço e material). ICMS e ISS:
estabelecimento de contribuinte, ainda que para estabelecimento do se na lista do ISS ressalvar expressamente o outro imposto, incidem
mesmo titular – LC 87/96, art. 12. Considera-se autônomo cada conjuntamente o ISS e o ICMS, o primeiro pelos serviços e o segundo
estabelecimento do mesmo titular – art. 11, § 3º, II. pelas mercadorias (ex. paisagismo, jardinagem, recondicionamento de
Substituição tributária: o fisco deixa de lado o contribuinte, motores).
atribuindo, desde logo, o encargo do imposto a um substituto, que deve
ser pessoa vinculada de alguma forma ao fato - ex. na venda de gado IMPOSTO SOBRE A PROPRIEDADE DE VEÍCULOS
em pé – paga o comprador, o vendedor, contribuinte substituído, não tem AUTOMOTORES - IPVA
obrigação de pagar o ICMS. A substituição tributária vem sendo Competência: Estados e DF – art. 155, III, da CF.
aplicada em vários setores, como o de bebidas alcoólicas, energia
94

Incide sobre a propriedade de veículo automotor, abrangendo serviço, mas não deve incluir na sua lista serviço que não conste da lista
veículos terrestres, aeronaves e embarcações. Os terrestres podem ser básica.
automóveis, motocicletas, ônibus, caminhões, etc.
A base de cálculo é o valor do veículo a cada ano. COMPETÊNCIA LEGISLATIVA
Seletividade: o imposto pode ser seletivo, como por exemplo, em A competência para legislar sobre o direito tributário, financeiro e
relação combustível utilizado. sobre orçamento é concorrente da União, Estados e Distrito Federal (art.
Repartição de receitas: pertencem aos Municípios 50% da 24, I e II, da CF), embora algumas leis orgânicas municipais abordem a
arrecadação – art. 158, III, CF. matéria.
É uma obrigação propter rem, ou em razão da coisa, o imposto é Cabe à União legislar sobre normas gerais, mas o Estado mantém
vinculado ao veículo, não se exigindo nos casos de transferência novo competência suplementar. Se não houver lei federal, o Estado fica com
pagamento dentro do mesmo ano. a competência legislativa plena. Mas, sobrevindo a lei federal, somente
serão válidas as disposições estaduais que não contrariem as federais
IMPOSTO SOBRE A PROPRIEDADE PREDIAL E TERRITORIAL recém editadas.
URBANA - IPTU
A competência é dos municípios – art. 156, I, CF. PRELIMINAR: DIREITO FINANCEIRO
Incide sobre a propriedade de imóvel urbano, bem como, a posse Direito Financeiro – trata do regramento jurídico da atividade
ou o domínio útil de imóvel urbano por natureza ou por acessão física. financeira do Estado.
Imposto predial é o que incide sobre imóvel construído e o Receita – é ingresso de dinheiro aos cofres públicos. Todo
territorial é o que incide sobre imóvel sem construção. ingresso de dinheiro chama-se entrada, entretanto, nem toda entrada
A base de cálculo é o valor venal do imóvel, a cada ano, art. 33, compõe a receita do Estado. Temos:
CTN. O imposto pode ser progressivo, em razão da função social da a) entradas provisórias: que não estão destinadas a permanecer
propriedade – art. 156, § 1º, CF. O critério deve ser objetivo, vinculado nos cofres públicos (ex. caução), e
aos terrenos e edificações, e não às pessoas dos proprietários. b) entradas definitivas: que se realizam por meio da cobrança de
tributos e dos preços públicos (tarifas)
IMPOSTO SOBRE A TRANSMISSÃO INTER VIVOS DE BENS
IMÓVEIS, POR ATO ONEROSO – ITBI (também conhecido como sisa) - Modalidades de receita:
Competência é do Município – art. 156, II. a) extraordinária: auferidas nas hipóteses de anormalidade (ex.
Incide sobre a transmissão inter vivos, por ato oneroso, de bens imposto extraordinário), receitas aprovadas e arrecadadas no curso do
imóveis (ex. compra e venda) e de direitos reais sobre imóveis (uso, exercício do orçamento;
usufruto, direito de habitação), exceto os de garantia, bem como cessão b) ordinárias: de entrada regular, periódica, receitas previstas no
de direitos relativos às transmissões mencionadas. orçamento;
c) originária: (ou facultativas) – são oriundas do patrimônio do
IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS DE QUALQUER NATUREZA - ISS Estado e se traduzem no preços cobrados;
A competência é do Município – art. 156, III, CF. d) derivadas: (ou compulsórias) – advém de constrangimento do
Incide sobre prestação habitual e remunerada, por empresa ou patrimônio particular (ex. cobrança de tributos);
profissional autônomo, de serviço constante da lista de serviços instituída e) transferidas: repassadas por outro entre político, que as
pelo Município, que deve seguir a lista básica do DL 406/68, com a arrecadou, pelo sistema de cobrança de tributos, preços públicos ou
redação da LC 56/87. O município pode deixar de tributar determinado tarifas;
95

f) gratuita: é aquela que o Fisco arrecada sem nenhuma d) lei complementar – art. 165, I e § 9º, da CF, prevê que esta lei
contrapartida (ex. herança jacente) estabelecerá normas gerais para a elaboração das leis orçamentárias.
g) contratual: que deriva de um ajuste (ex. compra e venda)
h) obrigatória: é a arrecadada de forma vinculada, Processo Legislativo
obrigatoriamente, como na cobrança dos tributos. - A iniciativa é exclusiva do Chefe do Executivo – art. 61, § 1º, II, b,
- O sistema de repartição das receitas tributárias está nos arts. da CF, que deverá enviar os projetos das leis orçamentárias. O
157 e seguintes da CF. A CF regra a transferência de receitas, Judiciário faz o encaminhamento da sua proposta junto com o Executivo
determinando que é vedada a retenção ou qualquer restrição à entrega e – art. 84, XXIII e art. 99, § 1º.
ao emprego dos recursos destinados à transferência (art. 160), embora a - Se o Poder Legislativo não receber a proposta orçamentária no
União e os Estados não estejam impedidos de condicionar a entrega ao prazo fixado pela legislação, considerará como proposta a lei de
pagamento de seus créditos (art. 160, pú) orçamento vigente.
Orçamento: é a peça técnica que demonstra as contas públicas - O projeto será apreciado pelas duas Casas do Congresso
para um período determinado, contendo a discriminação da receita e da Nacional, cabendo a uma comissão mista emitir parecer. É possível a
despesa, demonstrando a política econômico-financeira e o programa de apresentação de emendas na comissão mista, que sobre elas também
trabalho do Governo, obedecidos os seguintes princípios: emitirá parecer.
- unidade (é uno, englobando as contas de todos os escaminhos da
Administração), Despesa – toda despesa deve estar prevista no orçamento, sendo
- universalidade (todas as receitas e despesas devem estar vedadas a realização de despesa ou a assunção de obrigações direitas
incluídas no orçamento), que excedam os créditos orçamentário. Evidentemente, no é possível
- anualidade (a lei orçamentária vigora por um único ano, de 01.01 esquecer a necessidade de licitação pública.
a 31.12), - É vedada a realização despesa sem prévio empenho que é o ato
- não afetação (é vedada a vinculação de receita de imposto a emanado da autoridade que cria para o Estado a obrigação de
órgão, fundo ou despesa, o Estado deve ser livre para aplicar seus pagamento. O empenho não pode exceder o limite do crédito
recursos) concedido. O pagamento da despesa somente será feito após um
- exclusividade (a lei orçamentária só deve conter dispositivos procedimentos denominado liquidação de despesa, onde se identificarão
estranhos à previsão da receita e a fixação da despesa, admitindo a a origem, o objeto, a importância e o credor. Após será emitida a ordem
inclusão de autorização para abertura de créditos suplementares e de pagamento pela autoridade competente.
contratação de operações de crédito (art. 165, § 8º, CF) - No caso de despesas que não possam subordinar-se ao
processo normal de aplicação, é permitido o regime de adiantamento,
Leis Orçamentárias: art. 165, caput, são: desde que expressamente previsto em lei. Consiste na entrega de
a) lei orçamentária anual; numerário ao servidor, que efetuará depois a despesa.
b) lei do plano plurianual: estabelece, por região, as diretrizes da
Administração para as despesas relativas aos programas de duração - Classificam-se em:
continuada. Contém o planejamento geral do Governo a médio prazo. a) correntes (de custeio e transferências corrente);
Nenhum investimento que ultrapasse um exercício financeiro poderá ser b) de capital (investimentos, inversões financeiras e
iniciado sem prévia inclusão no plano plurianual. transferência de capital;
c) lei das diretrizes orçamentárias: conterá os planos para o c) ordinárias (despesas comuns, renováveis, periódicas,
exercício seguinte balizará confecção da lei orçamentária anual amparáveis por crédito ordinários)
96

d) extraordinária (de momento, anormais) c) fundada: empréstimos de médio e longo prazo;


d) flutuante: empréstimos a curto prazo, como nas antecipações
Controle e fiscalização financeira de receita,
A CF adotou dois métodos para o controle orçamentário: e) consolidada: quando a dívida fundada passa a ser perpétua.
a) controle interno: baseia-se na hierarquia. Cumpre à autoridade
superior verificar a legalidade dos atos, a fidelidade funcional dos - O não pagamento da dívida fundada por mais de dois anos
agentes da Administração, o cumprimento do programa de trabalho. consecutivos pode provocar intervenção no Estado ou no Município.
Os responsáveis por este controle, ao tomarem conhecimento de - O Senado Federal é o órgão controlador da dívida pública,
qualquer irregularidade ou ilegalidade, dela darão ciência ao Tribunal de cabendo-lhe autorizar operações financeiras externas, fixar limites
Contas, sob pena de responsabilidade solidária. O controle pode ser globais para o montante da dívida consolidada e para as operações de
feito prévio, concomitante e posterior. crédito externo e interno, dispor sobre a concessão de garantias da
União nas operações de crédito e estabelecer limites e condições para o
b) controle externo: é exercido pelo Poder Legislativo, com o montante da dívida mobiliária.
auxílio dos Tribunais de Contas, não há previsão de controle prévio,
onde se exige o registro do ato antes da realização da despesa. Os
Tribunais de Contas podem aplicar aos responsáveis, em caso de DIREITO DO TRABALHO
ilegalidade de despesas ou irregularidade de contas, as sanções Função integrativa dos princípios segundo a CLT: a lei trabalhista
previstas em lei, como a multa proporcional ao dano causado ao erário. (CLT, art. 8º) dispõe que as autoridades administrativas e a Justiça do
Podem também assinar prazo para que o órgão adote providências e Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão,
representar ao Poder competente sobre irregularidades ou abusos. A conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros
representação é feita ao Ministério Público. Embora não julguem princípios e normas gerais do direito, principalmente do direito do
pessoas, mas apenas contas, os Tribunais de Contas poderão sustar a trabalho.
execução do ato impugnado. Suas decisões de que resulte imputação Função diretiva dos princípios: os princípios constitucionais não
de débito ou multa terão eficácia de título executivo. podem ser contrariados pela legislação infraconstitucional; não fosse
assim, ficaria prejudicada a unidade do ordenamento jurídico; a forma de
Ministério Público – as decisões e pareceres dos Tribunais de preservá-la é a aplicação dos princípios.
Contas e os julgamentos do Legislativo que dão as contas como Direitos e garantias fundamentais: são princípios gerais do direito,
irregulares, são enviados ao MP, que assumiu a função constitucional de aplicáveis no direito do trabalho, os princípios constitucionais
grande fiscal da Administração, incumbindo-lhe a defesa larga do fundamentais da Constituição, presentes no Título I; há princípios gerais
patrimônio público. Dispõe do inquérito civil e da ação civil pública para no art. 5º, o respeito à dignidade da pessoa humana e os valores sociais
apurar responsabilidades e promover o ressarcimento do erário. do trabalho e da livre iniciativa, mais inúmeros outros, todos relacionados
com questões trabalhistas.
Dívida Pública – ocorre sempre que o Estado vem ao mercado Princípios constitucionais específicos: liberdade sindical (art. 8º);
financeiro tomar dinheiro. Pode ser: não-interferência do Estado na organização sindical (art. 8º); direito de
a) interna: se os recursos foram tomados de dentro do país; greve (9º), representação dos trabalhadores na empresa (11),
b) externa: tem raízes no estrangeiro e geralmente é reconhecimento de convenções e acordos coletivos (7º, XXVII); etc.
dimensionada em moedas fortes, com reflexos na balança de Função do princípio da norma favorável ao trabalhador: é tríplice a
pagamentos.; sua função: primeiro, é princípio de elaboração de normas jurídicas,
97

significando que, as leis devem dispor no sentido de aperfeiçoar o


sistema, favorecendo o trabalhador, só por exceção afastando-se desse Contrato de Trabalho e Relação de Trabalho
objetivo; a segunda função é hierárquica, é princípio de hierarquia entre Conceito: haverá contrato de trabalho sempre que uma pessoa
as normas; é necessário estabelecer uma ordem de hierarquia na física se obrigar a realizar atos, executar obras ou prestar serviços para
aplicação destas; assim, havendo duas ou mais normas, estatais ou não outra e sob dependência desta, durante um período determinado ou
estatais, aplica-se a que mais beneficiar o empregado; a terceira função indeterminado de tempo, mediante o pagamento de uma remuneração;
é interpretativa, para que, havendo obscuridade quanto ao significado quanto à relação de emprego, dar-se-á quando uma pessoa realizar atos,
destas, prevaleça a interpretação capaz de conduzir o resultado que executar obras ou prestar serviços para outra, sob dependência desta,
melhor se identifique com o sentido social do direito do trabalho. em forma voluntária e mediante o pagamento de uma remuneração,
Princípio da condição mais benéfica: significa que na mesma qualquer que seja o ato que lhe dê origem.
relação de emprego uma vantagem já conquistada não deve ser Natureza jurídica: são 2 as teorias: Contratualismo, é a teoria que
reduzida. considera a relação entre empregado e empregador um contrato; o seu
Princípio da irrenunciabilidade dos direitos: é nulo todo ato fundamento reside numa tese; a vontade das partes é a causa
destinado a fraudar, desvirtuar ou impedir a aplicação da legislação insubstituível e única que pode constituir o vínculo jurídico;
trabalhista; só é permitida a alteração nas condições de trabalho com o anticontratualismo, ao contrário, sustenta que a empresa é uma
consentimento do empregado e, ainda assim, desde que não lhe instituição, na qual há uma situação estatutária e não contratual; o
acarretem prejuízos, sob pena de nulidade. estatuto prevê as condições de trabalho, que são prestadas sob a
autoridade do empregador, que é detentor do poder disciplinar; a Lei
Brasileira define a relação entre empregado e empregador como um
ÂMBITO DE APLICAÇÃO DA CLT contrato, mas afirma que o contrato corresponde a uma relação de
Âmbito pessoal: verificá-lo consiste em determinar a que tipo de emprego (CLT, art. 442).
pessoas a lei é aplicável; a CLT é aplicável a trabalhadores; não a todos * o contrato de trabalho é contrato de direito privado, consensual,
os trabalhadores (art. 1º), porém apenas àqueles por ela mencionados e sinalagmático (perfeito), comutativo, de trato sucessivo, oneroso e, regra
que são empregados (art. 3º); não há discrimação de empregados; todos geral, do tipo dos contratos de adesão
os trabalhadores que se enquadrem com tal serão alcançados pela CLT. Classificação: 1) Quanto à forma: pode ser verbal ou escrito, a
Trabalhadores excluídos: o trabalhador autônomo, o eventual e o relação jurídica pode ser formada pelo ajuste expresso escrito, pelo
empreiteiro. ajuste expresso verbal ou pelo ajuste tácito; 2) quanto à duração: há
Âmbito material: saber qual é o âmbito material de aplicação da contratos por prazo indeterminado e contratos por prazo determinado
CLT é o mesmo que definir quais os tipos de relações jurídicas sobre as (CLT, art. 443); a diferença entre ambos depende simplesmente de ver se
quais as suas normas atuarão; no direito do trabalho há 3 tipos de na sua formação as partes ajustaram ou não o seu termo final; se houve
relações jurídicas: as relações individuais entre empregados e o ajuste o quanto ao termo final, o contrato será por prazo determinado; a
empregadores; as coletivas entre os sindicatos de empregados e de forma comum é o contrato por prazo indeterminado.
empregadores ou entre aqueles e as empresas; as de direito Contrato de trabalho individual: é o acordo, tácito ou expresso,
administrativo entre o Estado e os empregadores ou os empregados. formado entre empregador e empregado, para a prestação de serviço
pessoal, contendo os elementos que caracterizam uma relação de
emprego.
DIREITO INDIVIDUAL DO TRABALHO E CONTRATO DE Contrato de trabalho coletivo: é o acordo de caráter normativo,
TRABALHO formado por uma ou mais empresas com entidades sindicais,
98

representativas dos empregados de determinadas categorias, visando a trabalhador assalariado, portanto, alguém que, pelo serviço que presta,
auto-composição de seus conflitos coletivos. recebe uma retribuição; e) pessoalidade: empregados é um trabalhador
Contrato de trabalho de equipe: é aquele firmado entre a empresa e que presta pessoalmente os serviços.
um conjunto de empregados, representados por um chefe, de modo que Diferença entre empregado e trabalhador autônomo: o elemento
o empregador não tem sobre os trabalhadores do grupo os mesmos fundamental que os distingue é a subordinação; empregado é
direitos que teria sobre cada indivíduo (no caso de contrato individual), trabalhador subordinado; autônomo trabalha sem subordinação; para
diminuindo, assim, a responsabilidade da empresa; é forma contratual alguns, autônomo é quem trabalha por conta própria e subordinado é
não prevista expressamente na legislação trabalhista brasileira, mas quem trabalha por conta alheia; outros sustentam que a distinção será
aceita pela doutrina e pela jurisprudência. efetuada verificando-se quem suporta os riscos da atividade; se os riscos
Contrato de trabalho e contrato de sociedade: no contrato de forem suportados pelo trabalhador, ele será autônomo.
trabalho, existe sempre troca de prestações entre o empregado e o Diferença entre empregado e trabalhador eventual: há mais de
empregador, sendo o primeiro subordinado ao segundo; no contrato de uma teoria que procura explicar essa diferença: Teoria do evento,
sociedade, há trabalho comum, e também a intenção comum dos sócios segundo a qual eventual é o trabalhador admitido numa empresa para
de compartilharem lucros e assumirem as perdas e os riscos do um determinado evento; dos fins da empresa, para qual eventual é o
empreendimento (affectio societatis), inexistindo, além disso, qualquer trabalhador que vai desenvolver numa empresa serviços não
vínculo de subordinação entre os sócios. coincidentes com os seus fins normais; da descontinuidade, segundo a
Contrato de trabalho e contrato de empreitada: no contrato de qual eventual é o trabalhador ocasional, esporádico, que trabalha de vez
trabalho, existe vínculo jurídico de subordinação, sendo o empregado em quando; da fixação, segundo a qual eventual é o trabalhador que não
supervisionado pelo empregador, seu objeto é fundamentalmente o se fixa a uma fonte de trabalho; a fixação é jurídica.
trabalho subordinado; no contrato de empreitada, a execução do trabalho Trabalhador avulso: são características do trabalho avulso a
não é dirigida nem fiscalizada de modo contínuo pelo contratante, seu intermediação do sindicato do trabalhador na colocação da mão-de-obra,
objeto é o resultado do trabalho. a curta duração do serviço prestado a um beneficiado e a remuneração
Contrato de trabalho e contrato de mandato: tanto em um como o paga basicamente em forma de rateio procedido pelo sindicato; pela
outro existem vínculos de subordinação jurídica a quem remunera o CF/88, art. 7º XXXIV, foi igualado ao trabalhador com vínculo
serviço; no entanto, o vínculo de subordinação é mais acentuado no empregatício.
contrato de trabalho; o de mandato permite maior autonomia ao Trabalhador temporário: é aquele que prestado por pessoa física a
mandatário; a distinção consiste no grau de subordinação. uma empresa, para atender à necessidade transitória de substituição de
seu pessoal regular e permanente ou acréscimo extraordinário de
Empregado serviços (art. 2º, da Lei 6.019/74); completa-se com outro conceito da
Conceito: Empregado é a pessoa física que presta pessoalmente a mesma lei (art. 4º), que diz: compreende-se como empresa de trabalho
outrem serviços não eventuais, subordinados e assalariados. “Considera- temporário a pessoa física ou jurídica urbana, cuja atividade consiste em
se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não colocar à disposição de outras empresas, temporariamente,
eventual a empregador, sob dependência deste e mediante salário” (CLT, trabalhadores devidamente qualificados, por elas remunerados e
art. 3º). assistidos.
Requisitos legais do conceito: a) pessoa física: empregado é Terceirização: é a transferência legal do desempenho de atividades
pessoa física e natural; b) continuidade: empregado é um trabalhador de determinada empresa, para outra empresa, que executa as tarefas
não eventual; c) subordinação: empregado é um trabalhador cuja contratadas, de forma que não se estabeleça vínculo empregatício entre
atividade é exercida sob dependência; d) salário: empregado é um os empregados da contratada e a contratante; é permitida a terceirização
99

das atividades-meio (aquelas que não coincidem com os fins da empresa Diretor de sociedade: para a teoria tradicional, não é empregado; é
contratante) e é vedada a de atividades-fim (são as que coincidem). mandatário; a relação jurídica que o vincula à sociedade é de mandato e
Estagiário: não é empregado; não tem os direitos previstos na CLT não de emprego; para a teoria contemporâneo, não há incompatibilidade
aplicáveis às relações de emprego. entre a condição de diretor da sociedade e a de empregado; o elemento
Empregado doméstico: é qualquer pessoa física que presta fundamental que definirá a situação do diretor de sociedade é a
serviços contínuos a um ou mais empregadores, em suas residências, de subordinação.
forma não-eventual, contínua, subordinada, individual e mediante Empregado acionista: não são incompatíveis as condições de
renumeração, sem fins lucrativos; a Lei 5.589/72, fixou, como seus empregado e acionista de sociedade anônima, desde que o número de
direitos, a anotação da CTPS, férias anuais de 20 dias e previdência ações (que lhe dê condições de infuir nos destinos da sociedade em
social; a Lei 7.195/84, prevê a responsabilidade civil da agência de dimensão expressiva) não se eleve a ponto de transformar o empregado
colocação de empregado doméstico, pelos danos que este acarretar aos em subordinante e não em subordinado.
patrões; a CF/88 ampliou os direitos atribuídos por lei ordinária, sendo os Cargo de confiança: é aquele no qual o empregado ocupa uma
seguintes: salário mínimo; irredutibilidade da remuneração; 13º salário; posição hierárquica elevada na qual tenha poderes de agir pelo
repouso semanal remunerado; aviso prévio proporcional ao tempo de empregador nos seus atos de representação externa; é aquele existente
serviço, no mínimo de 30 dias; licença maternidade (120 dias); licença na alta hierarquia administrativa da empresa, conferindo ao ocupante
paternidade; férias com remuneração acrescida em 1/3; aposentadoria. amplo poder de decisão; difere do empregado comum apenas pelas
Empregado rural: é o trabalhador que presta serviços em restrições de direitos trabalhistas que sofre.
propriedade rural, continuadamente e mediante subordinação ao
empregador, assim entendida, toda pessoa que exerce atividade Empregador
agroeconômica; o contrato de trabalho rural pode ter duração Conceito: é o ente, dotado ou não de personalidade jurídica, com
determinada e indeterminada; são admitidos contratos de safra; seus ou sem fim lucrativo, que tiver empregado; “considera-se empregador a
direitos que já eram praticamente igualados aos do urbano, pela Lei empresa. individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade
5.889/73, foram pela CF/88 totalmente equiparados; o trabalhador de econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços”
indústria situada em propriedade rural é considerado industriário e regido (CLT, art. 2º).
pela CLT e não pela lei do trabalho rural (TST, Enunciado nº 57). Tipos de empregador: há o empregador em geral, a empresa, e o
Empregado em domicílio: as relações de emprego são empregador por equiparação, os profissionais liberais, etc.; quanto à
desenvolvidas no estabelecimento do empregador e fora dele; estas são estrutura jurídica do empresário, há pessoas físicas. firmas individuais e
cumpridas em locais variados, denominando-se “serviços externos”, ou sociedades, sendo principal a anônima; quanto à natureza da titularidade,
na residência do empregado, quando têm o nome de “trabalho em há empregadores proprietários, arrendatários, cessionários,
domicílio” (CLT, art. 6º); a prestação de serviços externos não usufrutuários, etc.; quanto ao tipo de atividade, há empregadores
descaracteriza o vínculo empregatício. industriais, comerciais, rurais, domésticos e públicos.
Empregado aprendiz: surge da relação jurídica desenvolvida na Responsabilidade solidária dos grupos de empresa: sempre que
empresa, visando à formação de mão-de-obra, em que a lei admite a uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade
admissão de menores, observadas certas formalidades, para que jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de
prestem serviços remunerados recebendo os ensinamentos metódicos outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de qualquer atividade
de uma profissão; a CLT (art. 80, § único) define aprendiz como o menor econômica, serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente
de 12 a 18 anos sujeito à formação profissional metódica do ofício em responsáveis a empresa principal e cada uma das subordinadas (CLT,
que exerça o seu trabalho. art. 2º, § 2º).
100

Poder de direção: é a faculdade atribuída ao empregador de continuidade do vínculo jurídico trabalhista, declarando que a alteração
determinar o modo como a atividade do empregado, em decorrência do na estrutura jurídica e a sucessão de empresas em nada o afetará (arts.
contrato de trabalho, deve ser exercida. 10 e 448).
Poder de organização: consiste na ordenação das atividades do
empregado, inserindo-as no conjunto das atividades da produção, Admissão do empregado
visando a obtenção dos objetivos econômicos e sociais da empresa; a Natureza: a natureza do ato de admissão do empregado é
empresa poderá ter um regulamento interno para tal; decorre dele a explicado de modo diferente pelo contratualismo e pelo
faculdade de o empregado definir os fins econômicos visados pelo anticontratualismo; pelo primeiro, a admissão é um ato de vontade das
empreendimento. partes do vínculo jurídico; é um contrato de adesão, pelo qual o
Poder de controle: significa o direito de o empregador fiscalizar as empregado, sem maiores discussões sobre os seus direitos,
atividades profissionais dos seus empregados; justifica-se, uma vez que, simplesmente adere aos direitos previstos nas normas jurídicas sem
sem controle, o empregador não pode ter ciência de que, em sequer pleiteá-los ou negociá-los com o empregador; pelo segundo, o
contrapartida ao salário que paga, vem recebendo os serviços dos vínculo entre empregado e empregador não é um contrato; não há
empregados. acordo de vontades; a admissão não tem natureza negocial, contratual;
Poder disciplinar: consiste no direito de o empregador impor as partes não ajustam nada; o empregado começa simplesmente a
sanções disciplinares ao empregado, de forma convencional (previstas trabalhar.
em convenção coletiva) ou estatutária (previstas no regulamento da Forma do contrato: os ajustes serão expressos ou tácitos; os
empresa), subordinadas à forma legal; no direito brasileiro as expressos, por sua vez, serão verbais ou escritos; o contrato de trabalho
penalidades que podem ser aplicadas são a suspensão disciplinar e a é informal; pode alguém tornar-se empregado porque verbalmente fez
advertência; o atleta profissional é ainda passível de multa. um trato nesse sentido; porque assinou um contrato escrito; pode, ainda,
Sucessão de empresas: significa mudança na propriedade da alguém tornar-se empregado porque, embora nada ajustando, começou
empresa; designa todo acontecimento em virtude do qual uma empresa é a trabalhar pra o empregador sem a oposição deste.
absorvida por outra, o que ocorre nos casos de incorporação, Duração do contrato: o empregado, quando admitido de forma
transformação e fusão. expressa, o será por prazo indeterminado ou determinado (CLT, art. 443);
Princípio da continuidade da empresa: consiste em considerar que silenciando-se as partes sobre o prazo, o contrato será por prazo
as alterações relativas à pessoa do empresário não afetam o contrato de indeterminado; a CLT permite contratos a prazo, em se tratando de
trabalho e também no fato de que, dissolvida a empresa, ocorre extinção atividades de caráter transitório, de serviço cuja natureza ou
do contrato de trabalho. transitoriedade o justifique e em se tratando de contratos de experiência.
Efeitos: subroga-se o novo proprietário em todas as obrigações do Contrato de experiência: denomina-se assim, aquele destinado a
primeiro, desenvolvendo-se normalmente o contrato de trabalho, sem permitir que o empregador, durante um certo tempo, verifique as aptidões
qualquer prejuízo para o trabalhador; a contagem do tempo de serviço do empregado, tendo em vista a sua contratação por prazo
não é interrompida; as obrigações trabalhistas vencidas à época do titular indeterminado.
alienante, mas ainda não cumpridas, são exigíveis; as sentenças judiciais Carteira de trabalho e previdência social (CTPS): sua natureza é de
podem ser executadas, desde que não prescritas, respondendo o prova do contrato de trabalho; tanto nas relações de emprego
sucessor, por seus efeitos; etc. verbalmente ajustadas como naquelas em que há contrato escrito,
Alteração na estrutura jurídica da empresa: entende-se por ela toda haverá, além do contrato com as cláusulas combinadas, a carteira;
modificação em sua forma ou modo de constituir-se; ficam preservados quanto a sua obrigatoriedade, nenhum empregado pode ser admitido
os direitos dos trabalhadores; a CLT, estabelece o princípio da sem apresentar a carteira, e o empregador tem o prazo legal de 48 horas
101

para as anotações, devolvendo-a em seguida ao empregado (CLT, art. 472, § 2º) deixou à esfera do ajuste entre as partes os efeitos dos
29); as anotações efetuadas na carteira geram presunção relativa quanto afastamentos nos contratos a prazo; se ajustarem, o termo final será
à existência da relação de emprego; serão efetuadas pelo empregador, deslocado; não havendo o acordo, mesmo suspenso o trabalho,
salvo as referentes a dependentes do portador para fins previdenciários, terminada a duração do contrato previamente fixada pelas partes, ele
que serão feitas pelo INSS, bem como as de acidentes de trabalho (arts. estará extinto, apesar da suspensão ou interrupção.
20 e 30, CLT). Dispensa do empregado: o empregado pode ser sempre
Registro: a lei obriga o empregador a efetuar o registro de todo dispensado, com ou sem justa causa; há divergências quanto à
empregado em fichas, livros ou sistema eletrônico (CLT, art. 41); tem a possibilidade de dispensa do empregado cujo contrato está suspenso ou
natureza de prova do contrato, é documento do empregador, prestando- interrompido; a lei nada esclarece, assim, não a vedando; porém, o
se para esclarecimentos solicitados pela fiscalização trabalhista da DRT. empregado não poder ser prejudicado; a partir do retorno, teria direito,
Capacidade do empregado e nulidade do contrato: pode contratar mantido o contrato, interrompido ou suspenso, às vantagens,
emprego toda pessoa; os menores de 18 anos dependem de autorização especialmente reajustamentos salariais, que se positivarem durante o
do pai ou responsável legal (CLT, art. 402), visto que depende dele para afastamento; nesse caso, ressalvados os prejuízos, a dispensa pode
obter a carteira profissional; a CLT, proíbe o trabalho do menor de 12 ocorrer.
anos, a CF/88, elevou essa idade para 14, salvo em se tratando de Faltas ao serviço: justificadas são as faltas que o empregado pode
aprendiz; mesmo quando o contrato é nulo, por ser o agente incapaz, os dar, sem prejuízo da remuneração e dos demais direitos; são justificadas
direitos trabalhistas são assegurados ao trabalhador. as faltas dispostas no art. 473, da CLT; se é justificada, o empregado
receberá a remuneração do dia, ou dos dias, bem como a remuneração
Alteração nas Condições de Trabalho do repouso semanal, não sofrendo, igualmente, qualquer desconto de
Princípio legal da imodificabilidade: nos contratos individuais de dias de duração de férias; se. no entanto, é injustificada, todas as
trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo conseqüências acima mencionadas ocorrerão legalmente.
consentimento e, ainda assim, desde que não resultem, direta ou
indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da Transferência de Empregado
cláusula infringente desta garantia (art. 468, CLT). Conceito legal de transferência: a CLT (art. 469) considera
Princípio doutrinário do Jus variandi: é o direito do empregador, em transferência a ato pelo qual o empregado passa a trabalhar em outra
casos excepcionais, de alterar, por imposição e unilateralmente, as localidade, diferente da que resultar do contrato, desde que importar em
condições de trabalho dos seus empregados; fundamenta alterações mudança do seu domicílio.
relativas à função, ao salário e ao local da prestação de serviços. Transferências lícitas: é lícita a transferência do empregado, com a
sua anuência (CLT, art. 469); a concordância do empregado é que
Suspensão e Interrupção do Contrato legitimará a transferência; sem sua anuência é lícita a transferência em
Suspensão do contrato de trabalho: é a paralisação temporária dos caso de necessidade de serviço, mediante o pagamento de adicional de
seus principais efeitos. transferência de 25%, e ocorrendo a extinção do estabelecimento em que
Interrupção do contrato de trabalho: é a paralisação durante a qual trabalhar o empregado.
a empresa paga salários e conta o tempo de serviço do empregado. Empregados intransferíveis: a CLT (art. 543) impede a transferência
Contratos a prazo: há divergência quanto aos critérios que devem de empregados eleitos para cargo de administração sindical ou de
prevalecer neles; para uma teoria, a suspensão e a interrupção deslocam representação profissional para localidades que impeçam o desempenho
o termo final do contrato; retornando ao emprego, o trabalhador teria o dessas atribuições; a CLT (art. 659, IX) prevê a concessão de medidas
direito de completar o tempo que restava do seu afastamento; a CLT (art. liminares pelos juízes do trabalho, sustando transferências ilícitas.
102

Efeitos econômicos da transferência: as despesas relativas à ela,


correrão por conta do empregador (art. 470). 58) Conceito: significa, em primeiro lugar, o ajuste de vontade entre
empregado e empregador, tendo por fim legitimar a prorrogação da
Jornada de Trabalho jornada normal; em segundo lugar, significa, o documento escrito no qual
Conceito: a jornada normal de trabalho será o espaço de tempo se materializa a vontade das partes, para o fim acima mencionado.
durante o qual o empregado deverá prestar serviço ou permanecer à Forma: a forma jurídica do acordo é escrita, e se individual basta
disposição do empregador, com habitualidade, excetuadas as horas um documento assinado pelo empregado expressando a sua
extras; nos termos da CF, art. 7º, XIII, sua duração deverá ser de até 8 concordância em fazer horas extras; em se tratando de ajustes entre
horas diárias, e 44 semanais; no caso de empregados que trabalhem em sindicatos, empresas, a forma será a convenção coletiva ou o acordo
turnos ininterruptos de revezamento, a jornada deverá ser de 6 horas, no coletivo.
caso de turnos que se sucedem, substituindo-se sempre no mesmo Cabimento: á cabível para todo empregado, como regra geral;
ponto de trabalho, salvo negociação coletiva. todavia, há exceções que devem ser respeitadas; o fundamento legal é a
Redução legal da jornada: poderá ser feita pelas partes, de comum CLT, art. 59, que declara que a duração normal do trabalho poderá ser
acordo, por convenção coletiva e pela lei. acrescida de horas suplementares, em número não excedente de duas,
Classificação da jornada de trabalho: 1) quanto à duração: é mediante acordo escrito entre empregador e empregado, ou mediante
ordinária ou normal (que se desenvolve dentro dos limites estabelecidos convenção coletiva de trabalho.
pelas normas jurídicas); é extraordinária ou suplementar (que Duração: o acordo é um contrato; se é a prazo (determinado), sua
ultrapassam os limites normais); limitada (quando há termo final para sua duração terminará com o termo final previsto entre as partes; se sem
prestação); ilimitada (quando a lei não fixa um termo final); contínua prazo (indeterminado), sua eficácia estender-se-á durante toda a relação
(quando corrida, sem intervalos); descontínua (se tem intervalos); de emprego.
intermitente (quando com sucessivas paralisações); 2) quanto ao Distrato: sendo de natureza contratual, pode ser desfeito pelos
período: diurna (entre 5 e 22 horas); noturna (entre 22 horas de um dia e mesmos meios com os quais se constituiu, ou seja, o distrato, ato
5 do outro); mista (quando transcorre tanto no período diurno como bilateral e que deve ser expresso.
noturno); em revezamento (semanal ou quinzenal, quando num período Efeitos: os efeitos do acordo são salariais, isto é, a obrigação do
há trabalho de dia, em outro à noite); 3) quanto à condição pessoal do pagamento de adicional de horas extras de pelo menos 50% (CF, art. 7º)
trabalhador: será jornada de mulheres, de homens, de menores, de e materiais, isto é, a faculdade, que dele resulta para o empregador e a
adultos; 4) quanto à profissão: há jornada geral, de todo empregado, e correspondente obrigação assumida pelo empregado, de ser
jornadas especiais para ferroviários, médicos, telefonistas, etc.; 5) quanto desenvolvido o trabalho prorrogado por até 2 horas.
à remuneração: a jornada é com ou sem acréscimo salarial; 6) quanto à
rigidez do horário: há jornadas inflexíveis e flexíveis; estas últimas não Denúncia: é o ato pelo qual uma das partes da relação de emprego
são previstas pela lei brasileira; porém a lei não impede que sejam dá ciência à outra da sua decisão de não mais continuar cumprindo os
praticadas; são jornadas nas quais os empregados não tem horário fixo termos de uma obrigação estipulada; no caso do acordo de prorrogação
para iniciar ou terminar o trabalho. de horas extras, denúncia é a comunicação que uma das partes faz à
horas extras: horas extras são aquelas que ultrapassam a jornada outra, dando ciência de que não pretende mais o prosseguimento do
normal fixada por lei, convenção coletiva, sentença normativa ou contrato acordo, para o fim de limitação do trabalho às horas normais.
individual de trabalho. Recusa do cumprimento do acordo pelo empregado: os efeitos da
recusa o sujeitam à mesma disciplina de todo o contrato de trabalho; com
Acordo de Prorrogação de Horas o acordo, ele obriga-se a fazê-las quando convocado.
103

durante as quais o serviço não pode ser prestado, mediante prévia


Sistema de Compensação de Horas concordância da DRT e durante o máximo de 45 dias por ano, com até 2
Conceito: consiste na distribuição das horas de uma jornada por horas extras por dia.
outra ou outras jornadas diárias do quadrimestre (Lei 9601/98); com o Excluídos da proteção legal da jornada de trabalho: nem todo o
sistema de compensação, o empregado fará até 2 horas prorrogadas por empregado é protegido pelas normas sobre a jornada diária de trabalho;
dia. (art. 59, § 2º) as exclusões operam-se em razão da função; são os casos do gerente
A compensação de horas prevista na CLT, significa que durante o (art. 62 da CLT) e do empregado doméstico (Lei 5859/72).
quadrimestre que servirá de parâmetro as horas além das normais, serão Horas extras ilícitas: são as prestadas com violação do modelo
remuneradas sem adicional de horas extras; completados os 120 dias o legal; são as que lhe conferem disciplina prejudicial (CLT, art. 9º); a
empregador terá que fazer o levantamento do número de horas nas quais ilicitude pode caracterizar-se pelo excesso da limitação das horas, pela
o empregado trabalhou durante esse período; se esse número não falta de comunicação à DRT, e quando são prestadas em trabalho no
ultrapassar o limite normal do quadrimestre, não haverá nenhum qual é vedada a prorrogação.
pagamento adicional a ser efetuado; no entanto, se ultrapassar, o Classificação dos adicionais: classificam-se em fixos quando
empregador terá que pagar as horas excedentes com adicional; nesse invariáveis; progressivos quando variáveis de forma gradativamente
caso, como haverá reflexos sobre pagamentos já efetuados nos meses crescente na medida da elevação do número de horas extras na jornada
anteriores do quadrimestre, a empresa estará obrigada a, nessa ocasião, diária; fracionáveis quando fixadas em valores que representam um
completar as diferenças. fração daquele que é previsto, como ocorre nos sistemas de sobreaviso e
Natureza das horas compensadas: são horas extraordinárias não prontidão, do trabalho ferroviário.
remuneradas com adicional. Redução da jornada com diminuição do salário: é
Forma: a CF, art. 7º, XIII, admite compensação de horas através de inquestionavelmente lícita, uma vez que a CF/88 permite, pela
acordo ou convenção coletiva; a inobservância da forma escrita negociação, a redução da jornada.
prejudicará a eficácia do acordo (Enunciado 85 do TST). Intervalos: há intervalos especiais além dos gerais e intervalos
* os mesmos critérios adotados para o acordo de prorrogação interjornadas e intrajornadas; entre 2 jornadas deve haver um intervalo
devem ser observados no sistema de compensação quanto à duração, mínimo de 11 horas; a jurisprudência assegura o direito à remuneração
distrato, que será bilateral, e denúncia, cabível aqui também. como extraordinárias das horas decorrentes da inobservância desse
Horas extras nos casos de força maior: força maior é o intervalo pela absorção do descanso semanal, vale dizer que os
acontecimento imprevisível, inevitável, para o qual o empregador não empregados têm o direito às 24 horas do repouso semanal, mais as 11
concorreu (art. 501 da CLT); nesses casos a lei permite horas extras (art. horas do intervalo entre 2 jornadas, quando o sistema de revezamento da
61 da CLT). empresa provocar a absorção; a lei obriga o intervalo de 15 minutos
Horas extras para conclusão de serviços inadiáveis: serviços quando o trabalho é prestado por mais de 4 horas e até 6 horas; será de
inadiáveis são os que devem ser concluídos na mesma jornada de 1 a 2 horas nas jornadas excedentes de 6 horas; eles não são
trabalho; não podem ser terminados na jornada seguinte sem prejuízos; computados na duração da jornada, salvo alguns especiais.
basta a ocorrência do fato, o serviço inadiável, para que as horas extras Repouso semanal remunerado: é a folga a que tem direito o
possam ser exigidas do empregado, em número máximo de até 4 por dia, empregado, após determinado número de dias ou horas de trabalho por
remuneradas com adicional de pelo menos 50%. semana, medida de caráter social, higiênico e recreativo, visando a
Horas extras para a reposição de paralisações: a empresa pode recuperação física e mental do trabalhador; é folga paga pelo
sofrer paralisações decorrentes de causas acidentais ou de força maior; empregador; em princípio, o período deve ser de 24 consecutivas, que
o art. 61, § 3º, da CLT, autoriza a empresa, a exigir a reposição de horas
104

deverão coincidir, preferencialmente, no todo ou em parte, com o com o art. 130, na proporção de 1/12 por mês de serviço ou fração
domingo. superior a 14 dias; para empregados com menos de 1 ano de casa, a
norma aplicável é o art. 147 da CLT: “o empregado que for despedido
Férias sem justa causa ou cujo contrato se extinguiu em prazo predeterminado,
Período: o período de férias anuais deve ser de 30 dias corridos, se antes de completar 12 meses, terá direito à remuneração relativa ao
o trabalhador não tiver faltado injustificadamente, mais de 5 vezes ao período incompleto de férias, de conformidade com o artigo anterior”.
serviço. Prescrição: extinto o contrato é de 2 anos o prazo para ingressar
Período aquisitivo: admitido na empresa, o empregado precisa com o processo judicial, e durante a relação de emprego é de 5 anos; a
cumprir um período para adquirir o direito de férias; é denominado prescrição, durante o vínculo empregatício, é contada a partir do fim do
período aquisitivo; é de 12 meses (CLT, art. 130). período concessivo e não do período aquisitivo.
Perda do direito: nos casos de afastamento decorrente de Férias coletivas: podem ser concedidas a todos os trabalhadores, a
concessão pelo INSS de auxílio doença, previdenciário ou acidentário, o determinados estabelecimentos, ou somente a certos setores da
empregado perde o direito às férias quando o afastamento ultrapassar 6 empresa, para serem gozadas em 2 períodos anuais, nenhum deles
meses, contínuos ou descontínuos; no afastamento de até 6 meses, o inferior a 10 dias (CLT, arts. 134 e 135).
empregado terá integralmente assegurado o direito às férias, sem
nenhuma redução, considerando-se que não faltou ao serviço (CLT, arts. Salário
131 a 133); a licença por mais de 30 dias fulmina o direito; a paralisação Conceito: é o conjunto de percepções econômicas devidas pelo
da empresa, por mais de 30 dias, também. empregador ao empregado não só como contraprestação do trabalho,
Período concessivo: o empregador terá de conceder as férias nos mas, também, pelos períodos em que estiver à disposição daquele
12 meses subseqüentes ao período aquisitivo, período a que se dá nome aguardando ordens, pelos descansos remunerados, pelas interrupções
de período concessivo; não o fazendo, sujeita-se a uma sanção (CLT, art. do contrato de trabalho ou por força de lei; não tem natureza salarial as
134). indenizações, a participação nos lucros, os benefícios e
Remuneração: será a mesma, como se estivesse em serviço, complementações previdenciárias e os direitos intelectuais.
coincidindo com a do dia da concessão, acrescida de 1/3 (CF, art. 7º, Salário por tempo: é aquele pago em função do tempo no qual o
XVII). trabalho foi prestado ou o empregado permaneceu à disposição do
Férias vencidas: são as que se referem a período aquisitivo já empregador, ou seja, a hora, o dia, a semana, a quinzena e o mês,
completado e que não foram ainda concedidas ao empregado; “na excepcionalmente um tempo maior.
cessação do contrato de trabalho, qualquer que seja a causa, será Salário por produção: é aquele calculado com base no número de
devida ao empregado a remuneração simples ou em dobro, conforme o unidades produzidas pelo empregado; cada unidade é retribuída com um
caso, correspondente ao período de férias cujo direito tenha adquirido” valor fixado pelo empregador antecipadamente; esse valor é a tarifa; o
(art. 146 da CLT). pagamento é efetuado calculando-se o total das unidades multiplicado
Férias proporcionais: se refere ao pagamento em dinheiro na pela tarifa unitária.
cessação do contrato de trabalho, pelo período aquisitivo não Salário por tarefa: é aquele pago com base na produção do
completado, em decorrência da rescisão; em se tratando de empregados empregado; o empregado ganha um acréscimo no preço da tarefa ou é
com mais de 1 ano de casa, aplica-se o disposto no art. 146, § único da dispensado, quando cumpre as tarefas do dia, do restante da jornada.
CLT: “na cessação do contrato de trabalho após 12 meses de serviço, o Meios de pagamento do salário: pode ser pago em dinheiro (é a
empregado, desde que não haja sido demitido por justa causa, terá forma normal), em cheque ou depósito bancário e em utilidades.
direito à remuneração relativa ao período incompleto de férias, de acordo
105

Periodicidade do pagamento: deve ser pago em períodos máximos Individualmente, fato que é de toda evidência histórica, o
de 1 mês, salvo comissões, percentagens e gratificações (CLT, art. 459); trabalhador não tem a mesma força para defender os seus interesses.
a CLT fixa, como dia de pagamento, o 5º dia útil do mês subseqüente ao Em conjunto, melhora muito o seu poder de ação. O poder de ação em
do vencimento. conjunto tende a melhorar, principalmente nos acordos perante a Justiça
Inalterabilidade: não pode o empregador fazer alterações sem o do Trabalho.
consentimento do empregado; mesmo com a anuência do trabalhador,
serão consideradas nulas, se prejudiciais. A união dos assalariados (trabalhadores) teve como principal
Estipulação do valor: estipular o valor significa fixar a quantia a ser objetivo o equilíbrio entre as partes no que tange a reivindicação de
paga ao empregado; aplica-se o princípio da autonomia da vontade (CLT, direitos e buscando um equilíbrio econômico. Como?
art. 444); o princípio sofre limitações, uma vez que há um valor
Salário mínimo: é o menor valor da contraprestação devida e paga O empregador sempre terá uma vantagem exorbitante mente maior
pelo empregador a todo trabalhador, para que atenda às suas que seus funcionários, assalariados ou empregados. Nesse ínterim o
necessidades básicas e às de sua família com moradia, alimentação, Direito Coletivo busca, nos funcionários (força inferior) um equilíbrio de
saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e Previdência Social. direitos e de capital para poder lutar pelos seus direitos de forma
Salário profissional: denomina-se assim, aquele fixado como equilibrada.
mínimo que pode ser pago a uma determinada profissão.
Piso salarial: é o valor mínimo que pode ser pago em uma Um exemplo clássico desse Direito Coletivo são as greves que
categoria profissional ou a determinadas profissões numa categoria sempre existiram. Nesse momento a classe trabalhadora se une para
profissional; expressa-se como um acréscimo sobre o salário mínimo; é reivindicar seus direitos ou procurar suprir alguma insatisfação do grupo.
fixado por sentença normativa ou convenção coletiva.
Direito Coletivo do Trabalho Pode afirmar o direito de greve como um Direito Coletivo
sustentando as indagações no art. 9º da Constituição Federal:
Individuais – Existe um contrato de trabalho estabelecido entre dois “ É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores
sujeitos do direito – Empregado e Empregador. No objeto dessa relação decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que
estão os interesses individuais calcados no desenvolvimento do vínculo devam por meio dele defender.
de trabalho. 1 ‫ﺡ‬º A lei definirá os serviços ou atividades essenciais e disporá
sobre o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade.
Coletivos – As normas e condições de trabalho não resultam nem 2 ‫ﺡ‬º Os abusos cometidos sujeitam os responsáveis às penas da
estão confinadas unicamente ao contrato individual. É possível dizer lei.
mesmo que, mais importantes que as individuais, são as relação
coletivas, pelos sujeitos, pelo objeto e pelas funções que cumprem no Direito Agrário
ordenamento jurídico. A realidade social brasileira é marcada historicamente pelos
conflitos agrários. Milhões de camponeses deram e dão seu suor e seu
A razão de ser das relações coletivas está na necessidade de união sangue para sustentar a população e construir, juntamente com os
dos trabalhadores para que possam defender, em conjunto, as suas operários, as riquezas do país, mas não têm o que lhes é de direito.
reivindicações perante o poder econômico. O grito de dor e de luta do povo da terra invade as Faculdades de
Direito, pela voz dos acadêmicos comprometidos com a ciência e com a
106

justiça, e assim se desenvolve o Direito Agrário. Esse grito ultrapassa neutralidade nas categorias do Direito Agrário seria conservadora,
também as paredes rígidas e cinzentas dos tribunais. servindo à parte no momento dominante da contradição.
Fomentado pelas discussões e processo de ensino-aprendizagem Como o Direito origina-se dos fatos sociais, a principal fonte (fonte
no Curso de Especialização em Direito Agrário da Universidade Federal material, tomando-se a classificação tradicional) do Direito Agrário são os
de Goiás, aliados à pesquisa bibliográfica complementar e à vivência da conflitos de interesse (litígios), sociais e inter-individuais, decorrentes das
realidade, este artigo propõe-se à reflexão sobre as razões da existência atividades agrárias. Estes por sua vez determinam, numa relação
do Direito Agrário na sua concepção atual, reafirmando o Direito como dialética, a formação das fontes classificadas como formais: a legislação,
originado dos conflitos sociais. Nessa esteira, procura-se fazer uma a doutrina, a jurisprudência e os costumes.
discussão sobre os problemas e limitações relativos à instituição da Somos necessariamente levados a discordar, com interesse
Justiça Agrária. Em seguida, abordar-se-ão os princípios basilares desse científico, do renomado agrarista Rafael Augusto de Mendonça Lima
ramo autônomo do Direito para se atestar seu compromisso com a (apud MARQUES, 2005 p. 25), quando este diz que as fontes materiais
mudança radical da estrutura agrária brasileira. Diante de tudo, far-se-á do Direito Agrário são "a política agrária" e "os planos do poder público
uma reflexão necessária sobre o papel do jus-agrarista no contexto relativos à produção agrária". Entendemos que, assim concebendo, está-
traçado. se vendo o direito sob o prisma do monismo estatal, ou seja, de que
A metodologia utilizada teve como referência o materialismo apenas o Estado produz direitos, que o direito provém do Estado e não
dialético, a partir da exploração das contradições internas dos dos fatos sociais. Sem os conflitos sociais não haveria sequer Estado.
fenômenos, e da vinculação constante dos elementos superestruturais Mister referenciar aqui a definição dos movimentos sociais como
com a base econômico-social. As fontes de pesquisa foram bibliográficas, "sujeito coletivo de direito" nas circunstâncias em que "a carência social é
aí se incluindo livros, jornais e publicações eletrônicas. percebida como negação de um direito que provoca uma luta para
A conquista da autonomia do Direito Agrário conquistá-lo" (SOUZA JR, 1991, p. 26). "Os direitos não são percebidos a
Primeiramente, cabe a indagação sobre a definição de Direito partir do legal, mas sim da constituição de uma consciência política do
Agrário, suas fontes, bem como o processo histórico que levou ao seu social" (PINTO, 1992, p. 16)
reconhecimento no plano legislativo, científico, didático, e, Diante do clamor público que os conflitos sociais agrários vêm
embrionariamente, no plano jurisdicional. ensejando ao longo da história do país, o Direito Agrário foi se
Na definição sintética de Marcelo Dias VARELLA (1997, p. 267), constituindo como um ramo do Direito que não vê outra maneira de
"direito agrário é o conjunto de normas e princípios que visam regular e alcançar a justiça no plano do dever-ser, senão posicionando-se em tese
desenvolver a atividade agrária e promover o bem-estar da sociedade." em favor dos mais desprovidos dos direitos realizados, os pobres do
Vários respeitados jus-agraristas se empenharam em formular campo.
definições completas e científicas para o Direito Agrário, cada qual Ademais, o compromisso com as classes populares e com a
enfocando um princípio ou característica que entendesse ser a mais mudança da estrutura fundiária brasileira é exatamente o ponto em que o
importante, e outras vezes pendendo a uma suposta neutralidade. Direito Agrário alça sua autonomia, distinguindo-se do Direito Civil
Se o Direito em geral aplica-se sobre os fatos sociais (relações dos sobretudo em suas noções de posse, propriedade e contratos.
homens e mulheres entre si e sobre a natureza, aqui empregada em Nas particularidades da formação fundiária do Brasil, o principal
sentido amplo - o mundo concreto), permeados de conflitos sociais de conflito agrário é a luta pela posse da terra, que assume, nos dizeres de
diversos tipos, este ramo do Direito aplica-se sobre as atividades agrárias Sérgio Sérvulo da CUNHA (2000, p. 251), a dimensão de um "conflito
por sua vez permeadas de conflitos sociais agrários, tomando corpo macropossessório". O levantamento dos conflitos agrários em 2005, pela
contradições de classes, principalmente entre a classe latifundiária e a Comissão Pastoral da Terra (CPT) bem demonstram a que se refere
classe dos camponeses pobres. Nesse contexto, uma pretensa CUNHA: O número de conflitos em 2005 aumentou 4,4% (1.881) em
107

comparação com 2004 (1.801). Em 2005 houve 38 assassinatos de No plano da autonomia legislativa está a cobrança de uma
camponeses, diretamente em conflitos agrários, 64 mortes em legislação à altura da complexidade das relações jurídicas agrárias,
decorrência do desamparo enfrentado pelos pobres do campo (aumento adicionada das particularidades dos países explorados na ordem
de 100% em relação a 2004), aí se incluindo as 13 pessoas mortas por internacional. Essas relações sempre foram tuteladas insatisfatoriamente
excesso de trabalho no interior de São Paulo e as 28 crianças indígenas por outros ramos do direito, principalmente o Direito Civil, que tem seus
de até 3 anos de idade que faleceram por desnutrição no Mato Grosso do referenciais no individualismo e na sacralização da propriedade. A Lei n.
Sul. Tudo isso considerando-se que os próprios organizadores do 601/1850 (Lei de Terras) veio para cobrir o vácuo legislativo deixado após
relatório apontam que ele "provavelmente consegue captar apenas 20% a revogação do regime colonial de sesmarias, em 1822. Não era, porém,
a 25% do total real dos conflitos" (apud HASHIZUME, 2006). uma lei que atendia aos interesses dos camponeses pobres, pelo
Na mesma matéria, cita-se pronunciamento do Prof. Ariovaldo contrário, favorecia a concentração das terras.
Umbelino de Oliveira, da Universidade de São Paulo - USP, aqui Um projeto de Código Rural foi apresentado pelo Prof. Joaquim
transcrito: Luís Osório à Câmara dos Deputados, em 1912, o qual não foi adiante. A
O triunvirato formado por grileiros, madeireiros e pecuaristas Constituição de 1934 trouxe a competência expressa da União para
transgride a lei, ocupando áreas devolutas - dessa forma definidas desde legislar sobre "Direito Rural" (art. 5º, XIX, "c"). Em 1937, dois novos
a primeira Constituição republicana de 1891 - que nada mais são que projetos de Código Rural, o de Favorito Mércio, apresentado perante a
terras públicas que ainda não foram discriminadas. De posse ilegal da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul, arquivado diante da
terra e da conseqüente exploração da mesma, esses transgressores se competência legislativa privativa da União, e o de Borges de Medeiros à
constituem como forças políticas locais. Forma-se então o ambiente Câmara dos Deputados, que se perdeu com o fechamento do Congresso
propício para o desmando e a impunidade em nome da manutenção do no golpe do Estado Novo de Getúlio Vargas.
poder e da acumulação econômica, que estão diretamente relacionados Apenas em 1964, com a promulgação da Lei n. 4.504, o Estatuto
com a questão da violência. da Terra, que o Direito Agrário veio consolidar sua autonomia legislativa.
Portanto, é a pressão causada pelos movimentos populares, o Todas as iniciativas mencionadas foram impulsionadas pelos
sangue derramado pelos camponeses do Brasil, que veio causando conflitos pela posse da terra, culminando-se, na ocasião do Estatuto da
historicamente o desenvolvimento do Direito Agrário, ou seja, um ramo Terra, a aniquilação genocida, pelo Exército Brasileiro, após o golpe
do direito autônomo, formado pela contestação do direito posto e militar de 1964, das Ligas Camponesas, que vinham se desenvolvendo
aplicado. desde o final da década de 40.
No centro desse processo histórico, estão as reivindicações Aqui se tornam emblemáticos os dizeres de Gishkow (apud
políticas pela chamada reforma agrária e pela destruição do sistema RIBEIRO, 1997, p. 233) de que "a desvinculação do direito agrário do
latifundiário. direito civil não foi uma posição doutrinária, mas a contestação de uma
A respeito, MARQUES (2005, p. 115) diz que necessidade política e econômica, com inegável caráter jurídico".
Subsistem, todavia, os choques de interesses no meio rural entre Também são o Estatuto da Terra e sua legislação complementar
os que têm e os que não têm terra, o que se evidencia na luta que reforçam a autonomia científica do Direito Agrário. O que dá essa
permanente por justiça social no campo, encetada por ações corajosas autonomia são princípios, objeto e método próprios. E tudo isso já foi
dos movimentos sociais aguerridos, gerando, em conseqüência, uma desenvolvido no Direito Agrário. Quanto aos princípios, veremos a seguir.
constante reformulação normativa. Quanto ao objeto, tratam-se das atividades agrárias. Já o método leva
Os jus-agraristas em geral enfatizam a autonomia do Direito Agrário em conta aqueles princípios, para abordar um objeto cheio de
em vários planos, quais sejam, autonomia legislativa, científica, didática e particularidades visando um fim específico que é a justiça social.
jurisdicional.
108

O método próprio do Direito Agrário é sistematizado na sua A Justiça Agrária que se reivindica encontra paralelo de
doutrina, que aborda um programa de estudos próprio, consumando a semelhança na estrutura e processo de instalação da Justiça do
autonomia didática. Já em 1943 solicitava-se ao Congresso Nacional a Trabalho. Todavia, não segue adiante, devido às suas particularidades e
criação da cátedra de Direito Rural nas universidades brasileiras. Em ao contexto histórico atual, diferente daquela da época em que foi criada
1972, com a Resolução n. 3 do antigo Conselho Federal de Educação, o a Justiça do Trabalho. MARQUES (2005, p. 115) entende que
Direito Agrário foi incluído definitivamente nos currículos das faculdades A explicação para esse indesejável quadro reside, basicamente, na
de direito, como matéria obrigatória ou opcional. Em 1975, o I Seminário visível resistência das classes dominantes, notadamente dos que
Ibero-Americano e Brasileiro de Direito Agrário, em Cruz Alta/RS, compõem o corpo político, porque se alimentam justamente da
aprovou recomendação para que o Direito Agrário se tornasse matéria manutenção desse estado de coisas. Para estes, a má distribuição de
obrigatória na grade curricular mínima dos cursos de Direito, sendo rendas, o analfabetismo, a precariedade da saúde, a desabitação, o
cursada em dois semestres, preferencialmente nos últimos. Hoje, desemprego, a fome e a miséria que atingem milhões de brasileiros
permanece a luta por essa obrigatoriedade. constituem a garantia do seu status.
Os problemas sobre a jurisdição agrária A Constituição Federal de 1988, em seu texto original, avançou em
Não adianta uma concepção acadêmica avançada sobre o Direito perspectiva favorável, quando dispôs, no art. 126 (BRASIL, 1988), que
Agrário, se essa concepção não ultrapassar os limites das universidades Art. 126. Para dirimir conflitos fundiários, o Tribunal de Justiça
e dos encontros de jus-agraristas para chegar às mais distantes regiões designará juízes de entrância especial, com competência exclusiva para
rurais do país, onde o "conflito macropossessório", como expresso acima, questões agrárias.
toma lugar. Parágrafo único. Sempre que necessário à eficiente prestação
Ocorre que, enquanto estão sendo discutidos os avanços do Direito jurisdicional, o juiz far-se-á presente no local do litígio.
Agrário, juízes estão despachando liminares a toque de caixa contra Em 1989, o Ministério da Justiça encomendou, a uma comissão
posseiros e as forças de repressão estão cumprindo seu papel, qual seja formada por Raymundo Laranjeira, Octavio Mello Alvarenga e Otávio
o de assegurar a manutenção do status quo, leia-se defender e bajular as Mendonça, a criação de um anteprojeto de lei complementar para
classes sociais dominantes mediante a violência contra as classes regulamentar aqueles dispositivos constitucionais. Iniciativa semelhante
populares. tinha sido tomada em 1968, pelo Ministério da Agricultura. Ambas não se
A constituição de uma justiça agrária especializada (autonomia concretizaram.
jurisdicional) é uma reivindicação constante dos jus-agraristas, tida como Decorridos quase dez anos da Constituição de 1988, aqueles
pressuposto para o acesso à justiça para os pobres do campo e para um dispositivos seguiram sem cumprimento na maior parte dos Estados
trato jurídico no mínimo eficaz dos conflitos agrários, uma vez que, com brasileiros, sobrevindo, em 2004, com a badalada Emenda Constitucional
todos passos dados na autonomia do Direito Agrário, o universo dos n. 45, um avanço no texto constitucional, substituindo a exigência de
juízes que lidam com as causas agrárias continua sendo "composto de designação de "juízes de entrância especial" por varas especializadas.
conflitos idealizados pelo sistema, que são afastados sem serem Todavia, não compartilhamos do entendimento de que a criação de
resolvidos" (CINTRA JR., 1996, p. 19, grifos do original). varas especializadas seja suficiente para a solução justa dos conflitos no
Nos idos de 1910, Rui Barbosa já advogava a criação da justiça campo. Já constatando as limitações, o Prof. Paulo Torminn BORGES
agrária, como uma "justiça chã quase gratuita, à mão de cada colono, (1996, p. 145), traçava o seguinte comentário, lamentando a não
com um regime imburlável, improtelável, inchicanável. Toda a instituição da Justiça Agrária na Constituição de 1988:
formalística, em pendência entre colono e patrão, importa em delonga, Isto de Varas especializadas ou entrâncias especiais (...) é engodo.
em incerteza, em prejuízo, em desalento." (apud VARELLA, 1997, p. 410) Não resolve nem ajuda. Precisamos, isto sim, é de juízes especializados,
109

isto é, juízes com cabeça de agraristas, juízes com mentalidade fins daquele diploma quanto à promoção da Reforma Agrária e da
agrarista. Política Agrícola, do condicionamento do direito de propriedade rural à
Nota-se que a questão é bem mais ampla, envolvendo diversos função social, e das obrigações do Poder Público para assegurar a terra
problemas: a quem nela trabalha.
1º - A vara agrária está inserida na estrutura judiciária tradicional. O Essa introdução ao Estatuto da Terra, embora seja um
segundo grau de jurisdição da vara agrária é o mesmo Tribunal de delineamento dos princípios fundamentais do Direito Agrário, não exaure
Justiça habituado a julgar os conflitos patrimoniais; todos os princípios, que daqueles decorrem, estão implícitos nos demais
2º - A vara agrária continua aplicando a legislação civilista: no artigos, e, principalmente, expressos na doutrina do Direito Agrário.
âmbito estadual as ações mais comuns relativas a conflitos agrários são VARELA (1997, p. 263), após expor as características principais do
os interditos possessórios (interdito proibitório, manutenção na posse e Direito Agrário sistematizadas pelo argentino Vivanco, expõe um rol de
reintegração na posse), em que prossegue-se aplicando o Código de princípios que podem ser aqui citados:
Processo Civil, cumprindo o juiz da vara agrária o mesmo papel do juiz a) a realização da justiça social;
cível, ou seja, o de cumprir sua parte na indústria da desocupação de b) a função social da propriedade rural;
"sem-terras", uma vez que foi nisso que se tornaram as ações c) a preservação da biodiversidade;
possessórias em conflitos coletivos. A via conciliatória que a vara agrária d) o crescimento contínuo da produção e da produtividade, com o
promove nos autos da ação possessória, apenas neutraliza fortalecimento da economia nacional;
temporariamente o conflito sem resolvê-lo. E por vezes assume o efeito e) o bem-estar econômico e social do homem do campo;
de empurrar para os camponeses a responsabilidade pela sua própria f) a fixação à terra dos que a tornarem produtiva com o seu trabalho
desocupação violenta, invertendo assim as responsabilidades no jogo. e de sua família;
3º - Sem uma mentalidade consciente dos princípios norteadores g) a liberdade e a igualdade do acesso à terra;
do Direito Agrário, e, principalmente, com o comprometimento ideológico h) a penalização dos que a possuem sem cumprir sua função
e político dos juízes e demais atores da cena jurídica com as classes social;
dominantes, imbuídos dos pré-conceitos formados inclusive pelos i) a destinação produtiva das terras públicas, preferencialmente
monopólios de comunicação, somados à experiência de vida desses para promover o acesso à igualdade social;
atores alheia à experiência de vida dos seus jurisdicionados, não haverá j) a proibição do arrendamento das terras públicas;
justiça agrária eficaz. l) a eliminação de todas as formas antieconômicas e anti-sociais do
Depreende-se, portanto, que a Justiça Agrária, sendo nos marcos uso da terra agricultável, como o minifúndio e o latifúndio;
da estrutura judiciária e institucional do Estado brasileiro, será sempre m) a proteção aos que cultivam a terra, ainda que arrendatários ou
condicionada pelas opções políticas desse Estado, que não são (e nunca parceiros agrícolas;
foram) favoráveis aos injustiçados. n) o fortalecimento do espírito comunitário;
Os princípios do Direito Agrário o) combate aos mercenários da terra;
Conforme alhures mencionado, os princípios próprios do Direito p) a imposição constante de novos paradigmas para a ciência
Agrário atestam seu método e de conseqüência sua autonomia científica. jurídica;
Ademais, são frutos das ferozes lutas reivindicativas e políticas das q) ação coordenada da atividade e da legislação agrária com a
classes populares no país, sobretudo no que tange à secular luta pela ordenação do território.
posse da terra. Os princípios aqui enumerados trazem a complexidade de um ramo
O Estatuto da Terra (Lei n. 4.504/64) traz em seu Capítulo I do do Direito voltado para a constituição de uma sociedade justa e
Título I o tema "Princípios e Definições", ali tratando, expressamente, dos socialmente desenvolvida. Bem demonstram a opção do Direito Agrário
110

pelos camponeses pobres, incorporando consignas históricas do O Plano Agrícola e Agropecuário da safra 2006/2007 destinará R$
movimento camponês como "terra para quem nela trabalha" e "destruir o 50 milhões para o latifúndio de nova imagem, o agronegócio. Segundo
latifúndio" (domínio popular). este plano, cada produtor de soja poderá ter um crédito de até R$ 300
Há que se observar mais detidamente um princípio, citado por mil. O mesmo plano faz um balanço das atividades governamentais de
MARQUES (2005, p. 22), de que "o Direito Agrário é dicotômico: estímulo ao agronegócio. Na safra 2005/ 2006, além dos R$35 bilhões
compreende política de reforma (Reforma Agrária) e política de iniciais, este tipo de latifúndio recebeu uma 'alocação adicional para
desenvolvimento (Política Agrícola)". sustentar o preço da soja ao produtor' de R$1 bilhão.
Fica a questão se, dessa forma, está-se opondo a idéia de Reforma Tal Política Agrícola não promove o desenvolvimento econômico do
Agrária à de Política Agrícola, como se uma atendesse aos pobres e a país. Pelo contrário, promove o aumento da dependência econômica pela
outra atendesse aos ricos, ficando o Direito Agrário numa aparente perpetuação do modelo agroexportador, e trata-se ainda de uma violação
imparcialidade. Entendemos que não se trata disso. Afinal, a "política de da segurança nacional em virtude de uma política agrícola fomentadora
reforma" e a "política de desenvolvimento", em condições ideais (portanto da monocultura. Produz-se uma mega-safra de alimentos para
fora das condições concretas da "Reforma" Agrária e da Política Agrícola exportação, explorando o trabalhador, enquanto o povo está sem
do Brasil), andariam numa lógica complementar, ou seja, equilibrando o alimento e sem terra. Diante da superprodução, o governo subsidia os
desenvolvimento social e o desenvolvimento econômico, a correção das prejuízos da safra com recursos públicos. E, diante de uma brusca
injustiças sociais com desenvolvimento nacional. oscilação no mercado financeiro mundial, a cana, a soja, o café ou o
Todavia, tal lógica de complementaridade não suporta o crivo da gado virarão terra devastada e a produção para o consumo interno não
realidade, quando se trata da ação concreta do Estado brasileiro. Aí, será suficiente. Não se trata de previsão, mas de constatação a partir da
"Reforma Agrária" significa mera demagogia e "Política Agrícola" significa própria lógica da crise agrária brasileira, além do que o país já viu isso na
o uso da máquina do Estado em benefício da minoria latifundiária e das crise do café nos idos de 1929...
corporações estrangeiras. Dizia Marcos COELHO (1996): Portanto, os princípios do Direito Agrário vão além da legalidade
As metas estabelecidas pelo Estatuto da Terra eram basicamente estatal, de forma que não podem ser realizados nos limites dessa
duas: a execução de uma reforma agrária e o desenvolvimento da legalidade, sendo que a Política Agrícola de fato é pelo contrário um
agricultura. Três décadas depois, podemos constatar que a primeira meta entrave a tais princípios.
ficou apenas no papel, enquanto a segunda recebeu grande atenção do Os princípios de Direito Agrário têm como pressuposto mudanças
governo, principalmente no que diz respeito ao desenvolvimento de ordem estrutural, de ruptura revolucionária com o modelo vigente.
capitalista ou empresarial da agricultura. A interpretação dos princípios de Direito Agrário induz ao seu
Quanto à Reforma Agrária, fundamentando-se em dados oficiais, conteúdo peculiar, ficando assim legitimada a ação dos movimentos
aduz Ana Lúcia Nunes de SOUSA (2007) que sociais de luta pela terra, como o principal impulsionador das
São pífios os resultados. Apenas 245.061 mil famílias haviam sido transformações na estrutura agrária brasileira e da realização da justiça
assentadas até 2005. E mesmo a promessa de assentar 400 mil famílias social.
pode ser considerada uma cifra irrisória, quando existe em torno de 15 O papel do Direito Agrário na transformação democrática
milhões de trabalhadores que não possuem nenhuma terra, mas que Já ficou demonstrado que, para alcançar seus princípios, o Direito
sobrevivem do campo, ou seja, são empregados, parceiros ou Agrário não pode ser concebido nos limites da legalidade estatal, e que a
arrendatários. Isto sem contabilizar as milhares de famílias camponesas Política Agrária do Estado brasileiro, fundada na monocultura para
que se amontoam nas favelas e bairros periféricos das grandes e exportação, é um entrave lógico a uma reforma agrária no sentido próprio
pequenas cidades do país. desta expressão. Portanto, não haverá transformação democrática na
Já quanto à Política Agrícola, o mesmo artigo demonstra que
111

questão agrária senão pela luta dos movimentos populares pela terra 3. organização e exercício do Poder político das massas nas áreas
independentemente da legalidade estatal. tomadas. Organização das diversas formas da participação das massas
O sociólogo Alberto Passos GUIMARÃES (1989, p. 38), que deixou nos diferentes níveis para a tomada de decisões e do seu auto-governo
contribuição inestimável ao pensamento social brasileiro, já pugnava que (Assembléia Popular e o Comitê Popular). Organizar a vida cultural, suas
A redistribuição da terra, a divisão da propriedade latifundiária não diversas manifestações. Organizar o sistema de autodefesa de massas.
é uma simples operação aritmética, uma reparação de injustiças ou uma Organizar a nova Escola Popular baseada nos três princípios de estudar,
medida de assistência social. Uma reforma agrária democrática tem um trabalhar e lutar (investigação científica, produção e luta de classes) para
alcance muito maior: seu objetivo fundamental é destruir pela base um liquidar o analfabetismo e promover a elevação do conhecimento
duplo sistema espoliativo e opressivo; romper e extirpar, científico e técnico de todos. Organizar um sistema popular de saúde
simultaneamente, as relações semicoloniais de dependência ao preventiva e curativa (policlínicas).
imperialismo e os vínculos semifeudais de subordinação ao poder extra- 4. expropriação das grandes empresas de capital monopolista no
econômico, político e "jurídico" da classe latifundiária. E tudo isso para campo imediatamente passando sua gestão e produção ao controle dos
libertar as forças produtivas e abrir novos caminhos à emancipação trabalhadores dessas próprias empresas, na condição de patrimônio do
econômica e ao progresso do nosso país (grifo nosso). povo trabalhador.
Hodiernamente, pode-se constatar que existe uma sistematização Munido de tal programa, o movimento camponês brasileiro
substancial do caminho para a transformação da realidade brasileira, reencontra seu lastro histórico, mediante ações concretas que
sem sucumbir aos limites fatais da Política Agrícola estatal. Trata-se do materializam os princípios sistematizados no Direito Agrário.
"Programa Agrário para uma transformação radical no campo", O papel do jus-agrarista
apresentado pelo movimento social Liga dos Camponeses Pobres, a ser LARANJEIRA, ao final de sua exposição mencionada alhures
realizado pela aliança com o movimento operário e com os setores (2002,.p. 27), conclui que
progressistas da sociedade. Cabe aqui transcrever, na íntegra, seus O que ela [a doutrina agrária] mais precisa contar, a esta altura, é
fundamentos, porque se tratam de uma síntese muito esclarecedora do com o aumento de novos prosélitos e assegurar-se da certeza de que é,
caminho da chamada Revolução Agrária (apud DE PAULA, 2006): de fato, constituída por juristas que sabem manusear o arcabouço
1. destruição do latifúndio e entrega das terras aos camponeses jurídico-agrário já existente na sua pátria e que têm um potencial de
pobres sem terra ou com pouca terra; colaboração para mais um salto de qualidade dele, pois a maior
2. libertação das forças produtivas do campo nas áreas tomadas do inspiração está aí, em frente a seus olhos e emoções - a própria
latifúndio, através da eliminação de todas as relações de produção realidade brasileira que vivenciam (grifo nosso).
baseadas na exploração do homem com a adoção de formas Diferentemente de outras áreas do Direito, a maioria das pessoas
cooperadas. A organização em formas associativas das parcelas em que se dedicam ao Direito Agrário possuem preponderantemente uma
diferentes níveis de cooperação segundo sua experiência, desde os preocupação científica e social, antes de se preocuparem com o prestígio
Grupos de Ajuda Mútua, forma elementar a formas superiores de e o enriquecimento. Até porque, se o Direito Agrário tem a defesa dos
cooperação, passando por outros níveis de formas cooperativas. Adoção pobres do campo como razão de existir de maneira desvinculada dos
de meios de produção e instrumentos de trabalho mais avançados e das princípios tradicionais do Direito Civil, então não há espaço para a defesa
técnicas mais modernas. do latifúndio, a menos quando os princípios do Direito Agrário são
Organização do sistema de produção, distribuição, prostituídos de modo que essa defesa seja justificada neles, o que
comercialização, abastecimento e troca entre as diversas áreas e todavia não encontra sustentação.
regiões, da infra-estrutura como armazéns, transporte, estradas, pontes, Portanto, a geração de agraristas a que se refere LARANJEIRA é
saneamento básico, etc. formada de advogados, professores e demais profissionais do Direito
112

Agrário comprometidos com a ciência a serviço do povo e do prova contraria não for feita, presume-se que essas pessoas tiveram
desenvolvimento nacional, sem amarras econômicas e ideológicas às morte simultânea.
classes sociais dominantes e conservadoras, sobretudo ao latifúndio Capacidade Civil – No Direito Civil, presume-se que todos os
velho ou novo (agronegócio). indivíduos de uma coletividade são capazes para determinados atos, e
É de se concluir que o mais importante na atuação do jus-agrarista que alguns atos civis têm impedimento de execução, firmados na
é a consciência e assumimento do seu papel transformador na incapacidade absoluta ou relativa desses mesmos indivíduos.
sociedade. Ou seja, que o profissional do Direito Agrário seja um vetor de Incapacidade Absoluta (artigo 3º) – proibição do exercício de
força da tão esperada (e retoricamente prometida pelos diversos direito sem representação legal; o que resulta em nulidade de ato
governos) justiça nos campos brasileiros. praticado. São absolutamente incapazes: os menores de dezesseis anos;
Diferentemente de outros ramos do direito, o Direito Agrário traz em os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário
seu bojo valores progressistas, relacionados às transformações discernimento para a prática desses atos; e os que, mesmo por causa
estruturais e possíveis na sociedade brasileira. Evidentemente, não está transitória, não puderem exprimir sua vontade.
privado da confrontação de posições antagônicas, todavia a grave Incapacidade Relativa (artigo 4º) – Alguns atos podem ser
realidade social agrária do país não pode ser ocultada. praticados diretamente pela pessoa; para outros, há necessidade da
A solução dos conflitos agrários não é uma questão meramente de presença de um representante. São incapazes, relativamente a certos
vontade, portanto a abordagem do assunto se faz necessária, de modo atos, ou à maneira de os exercer: os maiores de dezesseis e menores de
que os gritos de justiça do povo da terra são ecoados nos círculos dezoito anos; os ébrios habituais; os viciados em tóxicos e os que, por
acadêmicos e institucionais. deficiência mental, tenham o discernimento reduzido; os excepcionais,
Cabe aos jus-agraristas comprometidos com as classes populares sem desenvolvimento mental completo; e os pródigos (aqueles que
colaborar para um novo salto de qualidade no arcabouço jurídico-agrário dissipam seu patrimônio de forma desregrada).
pátrio, seguindo o caminho das transformações democráticas Emancipação - Ocorre por concessão dos pais - ou apenas de um
conseqüentes na medida em que não se limitam à legalidade estatal deles, na falta do outro - mediante instrumento público,
como referência para a constituição de direitos. independentemente de homologação judicial; por sentença do Juiz,
ouvido o tutor, se o menor tiver dezesseis anos completos; pelo
DIREITO CIVIL casamento; pelo exercício de emprego público efetivo; pela colação de
DA PERSONALIDADE E DA CAPACIDADE grau em curso de ensino superior; pelo estabelecimento civil ou
Da Pessoa Natural (artigo 1º) – É o ser humano, a contar de seu comercial, ou pela existência de relação de emprego, desde que, em
nascimento, com a primeira respiração, até o término de sua vida, isto é, função deles, o menor com dezesseis anos completos tenha economia
até sua morte. própria.
Nascituro – É o ser humano que está para nascer, o qual é Pessoa Jurídica – Todas as entidades a que a lei empresta
protegido desde a concepção, para que, após seu nascimento com vida, personalidade, capacitando-as a serem sujeitos de obrigações e direitos.
possa usufruir de seus direitos e ter obrigações, individuais e coletivas. Pessoa Jurídica de Direito Público – Entidades criadas por lei, ou
Nome – Direito de ser conhecido na sociedade em que nasceu por representadas por estados, países e organismos internacionais. Podem
meio de uma identificação. ser internas ou externas.
Estado – Capacidade adquirida na sociedade pela existência em Pessoa Jurídica de Direito Privado – Criadas por lei, são
si. representadas por associações, fundações, entidades paraestatais,
Comoriência – Sempre que duas ou mais pessoas falecem ao empresas públicas ou de economia mista.
mesmo tempo, para efeitos de abertura dos direitos de sucessão, se Domicílio – Local onde a pessoa se encontra presente; sede
113

jurídica. Pode ser voluntário (fixado livremente) ou necessário (obrigação Dividem-se em: particulares (todos os bens que não pertençam às
contida em lei). pessoas jurídicas de direito público); públicos (pertencentes às pessoas
Observações – A pessoa jurídica tem seu término fixado: pela jurídicas de direito público) e “res nullius” (que não têm proprietário
vontade de seus membros; por lei; por prazo ou por decisão judicial. definido, como as coisas abandonadas e os peixes de um rio ou mar).
Existem pessoas jurídicas despersonalizadas, isto é, existem de fato ou Bens Fora de Comércio – São os de impossível apropriação (ar,
de forma irregular. Há possibilidade de os sócios responderem por atos luz solar e outros); os personalíssimos (honra, dignidade humana) e os
da empresa, inclusive com seu patrimônio pessoal, no caso da legalmente inalienáveis (gravados com cláusulas e bens de família).
desconsideração da pessoa jurídica, por determinação judicial. FATOS JURÍDICOS (artigos 104 a 232)
DOS BENS Conceito – Todo acontecimento que produz conseqüências de
Conceito – É tudo aquilo que, de forma material ou não, satisfaça à caráter jurídico.
necessidade do ser humano. Ato Jurídico (ou Negócio Jurídico) – Fato decorrente da ação
Bens Imóveis – Por sua inamovibilidade, isto é, por sua humana de forma lícita e voluntária.
incapacidade de ser transportada, essa espécie de bens se encontra fixa Fato Jurídico Natural – Decorre da natureza, e pode ser ordinário
em seus locais de origem. (nascimento, morte, maioridade e outros), ou extraordinário (provocado
Bens Móveis – Podem mover-se do seu lugar de origem por meio por fatos fortuitos ou de força maior, como: tempestades, raios, vulcões e
de transporte ou por força própria. outros).
Bens Fungíveis – Podem ser substituídos por outros de mesma Ato Ilícito – É o ato que se contradiz frente à legalidade, ou seja, é
espécie, qualidade e quantidade (exemplo: uma lata de óleo). a ação humana ilegal. O indivíduo que, por ação ou omissão voluntárias,
Bens Infungíveis – Não podem ser substituídos por outros de negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda
mesma espécie, qualidade e quantidade (como por exemplo: um quadro que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Também comete ato ilícito o
raro). titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites
Bens Consumíveis – Bens que se destroem com o uso (como os impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons
bens usados na alimentação). costumes.
Bens Inconsumíveis – Bens que possuem durabilidade após seu Exclusão de Ilicitude – Excluem a ilicitude de um ato: sua prática
uso (exemplo: os livros de uma biblioteca). em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido, e a
Bens Divisíveis – Bens que admitem divisão (como os terrenos de deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão à pessoa, a fim de
uma fazenda divididos em lotes). remover perigo iminente.
Bens Indivisíveis – Os que não admitem divisão (um carro, por Características do Negócio Jurídico – O negócio jurídico possui
exemplo). elementos que são essenciais para sua efetividade e validade. Suas
Bens Singulares – Bens que possuem individualização (como um principais características são: a capacidade do agente para o ato, o
livro). objeto lícito, e a manifestação da vontade.
Bens Coletivos - O conjunto dos bens agregados no todo (por Defeitos do Ato Jurídico – Anulam os atos jurídicos: o erro (ou a
exemplo: os livros de uma biblioteca). falsa noção sobre o objeto), que pode anular o ato se for substancial,
Bens Reciprocamente Considerados (artigos 92 a 97) – Bens estando afastada a possibilidade no caso de erro acidental; o dolo – que
cuja existência se fixa em uma reciprocidade. São divididos em: é vontade de enganar alguém, por meio de subterfúgios ou artifícios
principais (existem por si sós); e acessórios (cuja existência depende do (neste caso só anula o ato se for grave); a coação – aplicação de
principal). violência física ou moral para obrigar outrem à pratica do ato (anulável se
Bens Quanto ao Titular do Domínio (artigos 98 a 103) – grave); a simulação – vontade de burlar a lei ou iludir a outra parte
114

envolvida no ato, por meio de declaração enganosa da vontade; e ainda e danos. Deteriorada a coisa, não sendo o devedor culpado, poderá o
a fraude contra credores – que é o ato de se desfazer do patrimônio, credor resolver a obrigação, ou aceitar a coisa, abatido de seu preço o
com o fim de evitar sua possível execução por dívidas. valor perdido. Sendo culpado o devedor, poderá o credor exigir o
Modalidades dos Atos Jurídicos – Os atos jurídicos podem ser equivalente, ou aceitar a coisa no estado em que se acha, com direito a
divididos nas seguintes modalidades: condição (subordinação do ato a reclamar, em um ou em outro caso, indenização das perdas e danos.
evento futuro e incerto); termo (momento em que se iniciam ou terminam Obrigação de Dar Coisa Incerta (artigos 243 a 246) – Tipo de
os atos jurídicos); e encargo (atribuição imposta ao beneficiário do ato obrigação na qual o devedor se obriga a entregar a "coisa incerta", que
jurídico). será indicada, ao menos, pelo gênero e pela quantidade. Nas coisas
Validade Do Ato Jurídico – Os atos jurídicos têm plena eficácia determinadas pelo gênero e pela quantidade, a escolha pertence ao
quando celebrados em consonância com a lei; podendo ser: nulos devedor, se o contrário não resultar do título da obrigação; mas não
(nulidade absoluta), ou anuláveis (nulidade relativa). poderá dar coisa pior, nem será obrigado a prestar a melhor. Antes da
Decadência e Prescrição (artigos 205 a 211) – Decadência é a escolha, não poderá o devedor alegar perda ou deterioração da coisa,
extinção de um direito por falta de seu exercício no prazo legal ainda que por força maior ou caso fortuito.
estabelecido. Prescrição é a perda de um direito, ou parte deste, por Obrigação de Fazer (Artigos 247 a 249) – Tipo de obrigação
inércia do interessado durante um determinado lapso de tempo. calcada na prestação de um serviço, ou execução de ato positivo. Incorre
Responsabilidade Civil – A responsabilidade civil ou dever de na obrigação de indenizar perdas e danos, o devedor que recusar a
indenizar, prevista no Código Civil, em seus artigos 186 a 188 e 927 a prestação só a ele imposta, ou só por ele exeqüível. Se a prestação do
954, ocorre sempre que presentes os seguintes requisitos: ato ilícito – fato tornar-se impossível, sem culpa do devedor, resolver-se-á a
ato omisso ou comissivo que traga lesão a direito ou a patrimônio alheio; obrigação; se por culpa dele, responderá por perdas e danos. Se o fato
culpa – existência de um ato praticado (mesmo que sem intenção), que puder ser executado por terceiro, será livre o credor para mandar
viola um bem jurídico protegido; e nexo causal – O comportamento do executá-lo à custa do devedor, havendo recusa ou mora deste, sem
agente está diretamente relacionado ao dano provocado. prejuízo da indenização cabível. Em caso de urgência, pode o credor,
DIREITO DAS OBRIGAÇÕES (artigos 233 a 420) independentemente de autorização judicial, executar ou mandar executar
Conceito – Ato jurídico transitório, que vincula, de forma direta, o o fato, sendo depois ressarcido.
credor e o devedor a uma prestação ou contraprestação econômica. Obrigação de Não Fazer (artigos 250 e 251) – Tipo de obrigação
Estrutura – A obrigação se compõe de um sujeito ativo (o credor), em que o ato não deve ser praticado para evitar na maioria das vezes
do objeto da obrigação (a prestação) e do vínculo (que é a sujeição do prejuízo a parte contrária. Extingue-se a obrigação de não fazer, desde
devedor ao cumprimento da obrigação em favor do credor). que, sem culpa do devedor, se lhe torne impossível abster-se do ato, que
Fontes - a lei, o negócio jurídico ou contrato, o ato ilícito, a se obrigou a não praticar. Praticado pelo devedor o ato, a cuja abstenção
declaração unilateral da vontade, o abuso de direito, a responsabilidade se obrigara, o credor pode exigir dele que o desfaça, sob pena de se
civil e outros. desfazer à sua custa, ressarcindo o culpado por perdas e danos. Em
Classificação caso de urgência, poderá o credor desfazer ou mandar desfazer,
Obrigação de Dar Coisa Certa (artigos 233 a 242)- Tipo de independentemente de autorização judicial, sem prejuízo do
obrigação na qual o devedor é obrigado a dar "coisa certa" (móvel ou ressarcimento devido.
imóvel, com ou sem acessórios). Se a coisa se perder, sem culpa do Coisa Fungível – Todas as coisas que podem ser substituídas por
devedor, antes da tradição, ou quando pendente a condição suspensiva, outras de mesma espécie, qualidade e quantidade (exemplo: um quilo de
fica resolvida a obrigação para ambas as partes. Se a perda resultar de milho, uma dúzia de ovos, cinco metros de plástico).
culpa do devedor, este responderá pelo equivalente acrescido de perdas Coisa Infungível - Todas as coisas que não podem ser
115

substituídas por outras (por exemplo, o quadro da “Mona Lisa” e a Unilaterais – Existe obrigação para apenas uma das partes
espada usada por Caxias na Guerra do Paraguai). contratantes.
Coisa Certa – São todas as coisas certas e determinadas, com Onerosos - Existem obrigações patrimoniais para as partes
características de infungibilidade e individualidade. contratantes. Nos Gratuitos, apenas uma das partes se compromete
Coisa Incerta – Basicamente são as coisas fungíveis, pela falta de economicamente.
individualidade, podendo ser substituídas por outras de mesma espécie, Comutativos – As partes recebem contraprestações equivalentes
qualidade e quantidade. ou iguais. Nos Aleatórios, a contraprestação pode não existir, ou ser
Cláusula Penal – É o mesmo que multa por convenção das partes, desproporcional para uma das partes.
em que existe a obrigação do pagamento de multa por desrespeito às Formais - Têm previsão legal. Os Não-formais não possuem, para
cláusulas do contrato ou por descumprimento deste. seu estabelecimento, a rigidez contida em lei, podendo ser efetivados de
Mora – Atraso no pagamento ou cumprimento das obrigações. forma livre.
Efeitos das Obrigações - Inexecução: descumprimento da
obrigação. Pagamento: cumprimento da obrigação com a devida Principais - São aqueles que existem de forma independente; e
prestação em dinheiro ou espécie. Novação: ocorre na substituição de Acessórios, os que dependem de um contrato anterior para existirem.
uma obrigação por outra. Compensação: extinção de uma obrigação
pelo equilíbrio existente entre os deveres e as obrigações das partes Consensuais - Os que são firmados em simples proposta e
contratantes. Transação: é o puro acordo feito entre as partes. aceitação. Os Reais são os que se formam com a entrega da coisa.
Compromisso: acordo pelo qual as partes delimitam um procedimento Formação – Os contratos se formam, de maneira geral, pela
para a solução de uma divergência. Confusão: o devedor e o credor proposta e pelo aceite, e sua celebração será o lugar de sua proposição,
passam a ser uma só pessoa. Remissão: perdão dado pelo credor, no caso as partes não definam de forma diferente.
que se refere ao pagamento da dívida. Perdas e Danos: quando, Nulidades – Os contratos podem ser nulos, quando atentarem
ocorrendo ato ilícito ou descumprimento do contrato, deve uma parte contra normas de ordem pública, ou anuláveis, por defeito de formação,
indenizar a outra pelos danos causados. que poderá ser corrigido.
Efeitos – Quando celebrado dentro dos requisitos de validade, o
CONTRATOS (artigos 421 a 839) contrato estabelece um vínculo jurídico de obrigatoriedade de
Conceito – Convenção legal, formal ou não-formal, e bilateral, cumprimento das cláusulas estabelecidas (respeitadas eventuais
estabelecida por partes capazes, para constituir, regular ou extinguir nulidades).
direitos patrimoniais. Extinção - Normalmente o contrato se extingue com o seu
Elementos dos Contratos – Bilateralidade (no mínimo duas cumprimento ou por rescisão (por meio de distrato ou inadimplemento).
partes), capacidade, consentimento, objeto lícito e forma prescrita e Revisão – Os contratos podem ser revistos mediante intervenção
prevista em lei. judicial, sempre que uma parte sentir-se prejudicada.
Princípios – Autonomia da vontade (liberdade na estipulação de Arras ou Sinal – A título de garantia do contrato, pode-se fixar uma
cláusulas); supremacia da ordem pública (dever de respeitar o interesse entrada financeira, que será perdida pela parte que desistir da efetivação
coletivo sobre o particular); e obrigatoriedade do contrato (o contrato faz do contrato.
lei entre as partes contratantes). Vício Redibitório – São os eventuais defeitos da coisa, que a
Classificação tornam imprópria para o uso ou diminuem seu valor.
Bilaterais ou sinalagmáticos – Existem obrigações para ambas Evicção – Perda total ou parcial, por decisão judicial, da coisa já
as partes contratantes. adquirida, em favor de terceiro que era o verdadeiro proprietário.
116

Tipos de Contrato se destina, e a mantê-la nesse estado, pelo tempo do contrato, salvo
Contrato de Compra e Venda (artigos 481 a 532) - Pelo contrato cláusula expressa em contrário. O locador é ainda obrigado a garantir ao
de compra e venda, um dos contratantes se obriga a transferir o domínio locatário, durante o tempo do contrato, o uso pacífico da coisa. Se,
de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certa quantia em dinheiro. A compra durante a locação, deteriorar-se a coisa alugada, sem culpa do locatário,
e venda, quando pura, será considerada obrigatória e perfeita, desde que a este caberá pedir redução proporcional do aluguel, ou resolver o
as partes acordem no objeto e no preço. O contrato de compra e venda contrato, caso a coisa já não sirva para o fim a que se destinava. O
pode ter por objeto coisa atual ou futura. Nesse caso, ficará sem efeito o locador resguardará o locatário dos embaraços e turbações de terceiros,
contrato se a coisa vier a não existir, salvo se a intenção das partes era que tenham ou pretendam ter direitos sobre a coisa alugada, e
de concluir contrato aleatório. responderá pelos seus vícios, ou defeitos, anteriores à locação.
Contrato de Troca e Permuta (artigo 533) – As partes, de comum Empréstimo (artigos 579 a 592) – Entrega da coisa a uma pessoa
acordo, fazem concessões mútuas, dando alguma coisa por outra que de forma não onerosa, obrigando-se o recebedor a devolvê-la, ou
não seja dinheiro. Aplicam-se à troca as disposições referentes à devolver outra coisa da mesma espécie.
"compra e venda". Salvo disposição em contrário, cada um dos Comodato – Empréstimo não oneroso de coisas não fungíveis.
contratantes pagará a metade das despesas com o instrumento da troca. Mútuo – Empréstimo de coisa fungível, para consumo. Sua
É anulável a troca de valores desiguais entre ascendentes e devolução se faz por coisa equivalente ou do mesmo gênero.
descendentes, sem consentimento dos outros descendentes e do Depósito (Artigos 627 a 652) – O depositário recebe um objeto
cônjuge do alienante. móvel, para devida guarda, até que o depositante o requeira de volta.
Contrato Estimatório (artigos 534 a 537) - Pelo contrato Esse tipo de contrato permite a prisão do depositário pelo não-
estimatório, o consignante entrega bens móveis ao consignatário, que cumprimento do dever de guarda.
fica autorizado a vendê-los, pagando àquele o preço ajustado, salvo se Mandato (artigos 653 a 709) – Ocorre quando alguém recebe
preferir, no prazo estabelecido, restituir-lhe a coisa consignada. O poderes de representação para a prática de atos por meio de um
consignatário não se exonera da obrigação de pagar o valor da coisa, se instrumento denominado procuração.
sua restituição integral tornar-se impossível, ainda que por fato a ele não Transporte (artigos 730 a 756) – Obrigação de transportar,
imputável. mediante pagamento de uma retribuição financeira ou não.
Contrato de Doação (artigos 538 a 564) – Ato pelo qual se Seguro (artigos 757 a 802) – Mediante pagamento de uma quantia
transfere, por vontade, parte ou totalidade de patrimônio, bens ou previamente estipulada, uma pessoa se compromete com a outra a
vantagens para determinada pessoa. A doação será feita por escritura indenizá-la no caso do sofrimento de danos reparáveis.
pública ou instrumento particular. A doação verbal será válida, tratando- Fiança (artigos 818 a 839) – Forma de assegurar ao credor o
se de bens móveis e de pequeno valor. A doação feita a nascituro pagamento de uma dívida, no caso de inadimplência do devedor
valerá, desde que aceita pelo seu representante legal. Se o donatário for principal.
absolutamente incapaz, dispensa-se a aceitação, desde que se trate de
doação pura. A doação de ascendentes a descendentes, ou de um DIREITO DAS COISAS (artigos 1.196 a 1.510)
cônjuge a outro, importa em adiantamento do que lhes cabe por herança. Também chamado de Direito Real. Trata-se de normas que
Contrato de Locação (artigos 565 a 578 e 593 a 626) - Na regulamentam as relações de trato subjetivo e objetivo, existentes entre
locação de coisas, uma das partes se obriga a ceder à outra, por tempo pessoas e seus bens materiais e imateriais.
determinado ou não, o uso e o gozo de coisa não fungível, mediante Classificação - Os direitos reais são exercidos sobre coisas
certa retribuição. Na locação, o locador é obrigado a entregar ao locatário próprias (propriedade) ou alheias (gozo, uso, garantia e aquisição).
a coisa alugada, com suas pertenças, em estado de servir ao uso a que Posse (artigos 1.196 a 1.227) – É a detenção plena de uma coisa
117

em nome próprio. O Código Civil adota a posse de forma objetiva, ou Perda da Propriedade – Perde-se a propriedade mediante
seja, considera-se na posse todo aquele que tem de fato o exercício, alienação, renúncia, abandono, perecimento, desapropriação e
pleno ou não, de alguns dos poderes relacionados ao domínio ou a usucapião.
simples propriedade. Aquisição da Propriedade Móvel – Dá-se pela tradição, pela
Classificação ocupação, pela adjunção (união de um bem alheio a um bem pessoal),
Posse Direta - É exercida diretamente pelo possuidor; Posse pela confusão (os bens, após se unirem, tornam-se um só), pela
Indireta é exercida por terceiro em virtude de contrato ou dever legal. comissão (ou mistura), pela especificação, pelo usucapião, pelo
Posse Justa – Toda posse que não for clandestina, nem violenta casamento e pelo direito hereditário.
ou precária; Posse Injusta é aquela exercida de forma clandestina, Tradição – Por força de contrato, entrega-se ao adquirente a
violenta e precária. propriedade da coisa móvel.
Posse de boa-fé - É quando o possuidor ignora o vício ou o Condomínio – Propriedade em comum, onde um bem pertence a
obstáculo impeditivo do seu exercício; a Posse de Má-fé é exercida sem várias pessoas. Cada condômino pode usar da coisa conforme sua
que os vícios sejam de desconhecimento do possuidor. destinação e sobre ela exercer todos os direitos compatíveis com a
Composse - É a união de posses de forma sucessiva, pela indivisão; pode reivindicá-la de terceiro, defender a sua posse e alhear a
existência de mais de um possuidor. respectiva parte ideal ou gravá-la. Nenhum dos condôminos pode alterar
Defesa da Posse – A posse pode ser defendida sempre que a destinação da coisa comum, nem dar posse, uso ou gozo dela a
houver a ocorrência de esbulho (perda da posse), turbação (tentativa de estranhos, sem o consenso dos outros.
esbulho) ou pela ameaça de iminente agressão. Servidão (artigos 1.378 a 1.389) - A servidão proporciona utilidade
Propriedade (artigos 1.228 a 1.368) – Direito pessoal de usar, ao prédio dominante e grava o prédio serviente, pertencente a diverso
gozar, dispor ou reivindicar um bem que esteja sob posse alheia. dono, e constitui-se mediante declaração expressa dos proprietários, ou
Formas de aquisição – Registro do título de propriedade, pela por testamento, e subseqüente registro no Cartório de Registro de
acessão, pelo usucapião e pelo direito hereditário. Imóveis.
Usucapião (artigos 1.238 a 1.244) - Aquele que, por quinze anos, Usufruto (artigos 1.390 a 1.411) – Direito de uso da coisa alheia.
sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe O usufruto pode recair em um ou mais bens, móveis ou imóveis, em um
a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer patrimônio inteiro, ou parte deste, abrangendo-lhe, no todo ou em parte,
ao Juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o os frutos e utilidades. O usufruto de imóveis, quando não resulte de
registro no Cartório de Registro de Imóveis. O prazo reduz para dez usucapião, será constituído mediante registro no Cartório de Registro de
anos, se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia Imóveis.
habitual, ou nele houver realizado obras ou serviços de caráter produtivo. Penhor (artigos 1.431 a 1.472) - Constitui-se o penhor pela
Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, pelo transferência efetiva da posse que, em garantia do débito ao credor ou a
direito hereditário ou pelo usucapião, possua como sua, por cinco anos quem o represente, faz o devedor, ou alguém por ele, de uma coisa
ininterruptos, sem oposição, área de terra em zona rural não superior a móvel, suscetível de alienação.
cinqüenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua Hipoteca (artigos 1.473 a 1.505) – Direito de garantia, em que o
família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade. Aquele que devedor oferece ao credor um determinado bem como garantia, tendo o
possuir, como sua, área urbana de até duzentos e cinqüenta metros credor preferência em relação a eventuais outros credores. O bem dado
quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando- em garantia pode ser vendido mediante ordem judicial para quitação da
a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde hipoteca e de eventuais outros credores.
que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. Anticrese (artigos 1.506 a 1.510) - Pode o devedor ou outrem por
118

ele, com a entrega do imóvel ao credor, ceder-lhe o direito de perceber, aplicação de sanções de poder intimidativo maior, como a pena. Essa
em compensação da dívida, os frutos e rendimentos. prevenção é a maior finalidade da lei penal.
Afirma-se que se trata, também, de um direito constitutivo
DIREITO PENAL porque possui um ilícito próprio, oriundo da tipicidade, uma sanção
Como o Estado não pode aplicar as sanções penais peculiar (pena), e institutos exclusivos como o sursis.
arbitrariamente, na legislação penal são definidos esses fatos graves, DIREITO PENAL OBJETIVO E DIREITO PENALSUBJETIVO
que passam a ser ilícitos penais (crimes e contravenções), Denomina-se direito penal objetivo o conjunto de normas que
estabelecendo-se as penas e as medidas de segurança aplicáveis aos regulam a ação estatal, definindo os crimes e cominando as respectivas
infratores dessas normas. sanções. Somente o Estado, na sua função de promover o bem comum e
O direito penal tem um caráter fragmentário, pois não encerra combater a criminalidade, tem o direito de estabelecer e aplicar essas
um sistema exaustivo de proteção aos bens jurídicos, mas apenas elege, sanções. É, pois, o único e exclusivo titular do “direito de punir” (jus
conforme o critério do “merecimento da pena”, determinados pontos puniendi) que constitui o que se denomina direito penal subjetivo.
essenciais . DIREITO PENAL COMUM E DIREITO PENAL ESPECIAL
Pode-se dizer que o fim do direito penal é a proteção da O direito penal comum se aplica a todas as pessoas e aos atos
sociedade e, mais precisamente, a defesa dos bens jurídicos delitivos em geral.
fundamentais (vida, integridade física e mental, honra, liberdade, O direito penal especial é dirigido a uma classe de indivíduos de
patrimônio, etc.). acordo com sua qualidade especial, e a certos atos ilícitos
DIREITO PENAL é o conjunto de normas jurídicas que o particularizados.
Estado estabelece para combater o crime, através das penas e medidas Pode-se falar em legislação penal comum em relação ao código
de segurança. penal, e em legislação penal especial como sendo as normas penais que
Não se pode deixar de reconhecer, ao menos em caráter não se encontram no referido estatuto.
secundário, que o direito penal tem uma aspiração ética: deseja evitar o DIREITO PENAL SUBSTANTIVO E DIREITO PENAL ADJETIVO
cometimento de crimes que afetam de forma intolerável os bens jurídicos Direito penal substantivo (ou material) é representado pelas
penalmente tutelados (é destinado à proteção dos bens jurídicos). normas que definem as figuras penais, estabelecendo as sanções
CARACTERES DE DIREITO PENAL respectivas, bem como os princípios gerais a elas relativos (Código
Diz-se que o direito pena é uma ciência cultural e normativa. É Penal, Lei da Contravenções penais, etc.).
uma ciência cultural porque indaga o dever ser, traduzindo-se em regras Direito penal adjetivo (ou formal) constitui-se de preceitos de
de conduta que devem ser observadas por todos no respeito aos mais aplicação do direito substantivo e de organização judiciária.
relevantes interesses sociais. É também uma ciência normativa, pois seu RELAÇÕES DO DIREITO PENAL
objeto é o estudo da lei, da norma do direito positivo, como dado RELAÇÕES COM AS CIÊNCIAS JURÍDICAS FUNDAMENTAIS
fundamental e indiscutível na sua observância obrigatória. Relaciona-se o direito penal coma filosofia do direito. As
O direito positivo é valorativo, finalista e sancionador. investigações desta levam à fixação de princípios lógicos, à formulação
A norma penal é valorativa porque tutela os valores mais de conceitos básicos e à definição de categorias fundamentais e
elevados da sociedade, dispondo-os em uma escala hierárquica e indispensáveis à elaboração da lei penal.
valorando os fatos de acordo com a sua gravidade. Com a teoria geral do direito, em que são elaborados conceitos
Tem ainda a lei penal caráter finalista, porquanto visa à e institutos jurídicos válidos para todos os ramos do direito, relaciona-se
proteção de bens e interesses jurídicos merecedores da tutela mais o direito penal.
eficiente que só podem ser eficazmente protegidos pela ameaça legal de
119

Estudando o ordenamento jurídico nas suas causas e funções A Psiquiatria Forense estuda os distúrbios mentais em face dos
sociais, a sociologia jurídica tem por foco o fenômeno jurídico como fato problemas judiciários.
social, resultante de processos sociais. CRIMINOLOGIA E CIÊNCIAS PENAIS
RELAÇÕES COM OUTROS RAMOS DE CIÊNCIAS JURÍDICAS CRIMINOLOGIA
O direito penal relaciona-se com o Direito Constitucional, em A criminologia é um conjunto de conhecimentos que estudam
que se define o Estado e seus fins, bem como os direito individuais, os fenômenos e as causas da criminalidade, a personalidade do
políticos e sociais. É na carta magna que se estabelecem normas delinqüente e sua conduta delituosa e a maneira de ressocializá-lo.
específicas para resolver um conflito entre os direitos dos indivíduos e a BIOLOGIA CRIMINAL
sociedade. Pode-se dividir a criminologia em dois grandes ramos: o da
Como é administrativa a função de punir, é evidente o biologia criminal e o da sociologia criminal.
relacionamento do Direito Penal com o Direito Administrativo. A lei penal Estuda-se na Biologia Criminal o crime como fenômeno
é aplicada através dos agentes de administração (juiz, promotor de individual, ocupando-se essa ciência das condições naturais do homem
justiça, delegado de polícia, etc.). criminoso no seu aspecto físico, fisiológico e psicológico. Inclui ela os
O Direito Processual Penal, já denominado de direito penal estudos da antropologia, psicologia e endocrinologia criminais.
adjetivo, é um ramo jurídico autônomo, em que se prevê a forma de A Antropologia Criminal, criada por César Lombroso, preocupa-
realização e aplicação da lei penal, tornando efetiva a sua função de se com os diferentes aspectos do homem n que concerne à sua
prevenção e repressão dos crimes. É íntima a relação entre o Direito constituição física, aos fatores endógenos e à atuação do delinqüente no
penal e o Direito processual penal, porque é através deste que se decide ambiente físico e social.
sobre a procedência de aplicação do jus puniendi (direito penal subjetivo) A Psicologia Criminal trata do diagnóstico e prognóstico
do Estado, em conflito com o jus libertatis do acusado. criminais. Ocupa-se com o estudo das condições psicológicas do homem
Como se acentua a cooperação internacional na repressão ao na formação do ato criminoso, do dolo e da culpa, da periculosidade e
crime, fala-se em Direito penal Internacional como ramo do direito que até do problema objetivo da aplicação da pena e da medida de
tem por objetivo a luta contra a criminalidade universal. segurança.
Deve-se fazer referência também ao Direito Internacional penal, A Endocrinologia Criminal é a ciência que estuda as glândulas
ramo do direito internacional público que tem por objetivo a luta contra as endócrinas e a sua influência na conduta do homem.
infrações internacionais. FONTES DO DIREITO PENAL
Quanto ao Direito Civil um mesmo fato pode caracterizar um ANALOGIA
ilícito penal e obrigar a uma reparação civil. Diante do princípio da legalidade e da pena, pelo qual não se
Com relação ao Direito Comercial, tutela a lei penal institutos pode impor sanção penal a fato não previsto em lei, é inadmissível o
como o cheque, a duplicata, etc. emprego da analogia para criar ilícitos penais ou estabelecer sanções
RELAÇÃO COM AS DISCIPLINAS AUXILIARES criminais. Nada impede, entretanto, a aplicação da analogia às normas
Na Medicina Legal, que é a aplicação de conhecimentos não incriminadoras quando se vise, na lacuna evidente da lei, favorecer a
médicos para a realização de leis penais ou civis, verificam-se a situação do réu por um princípio de equidade. Há no caso, a chamada
existência, a extensão e a natureza dos danos à saúde e à vida, a “analogia in bonam partem”, que não contraria o princípio da reserva
ocorrência de atentados sexuais, etc. legal.
A criminalística, também chamada polícia científica, é a técnica LEI PENAL
que resulta da aplicação de várias ciência e investigação criminal, NORMA PENAL EM BRANCO
colaborando na descoberta dos crimes e na identificação de seus autores
120

Enquanto a maioria das normas penais incriminadoras é nullum crimen, nulla poena sine lege scripta ( proibição da
composta de normas completas, possuem preceito e sanções integrais fundamentação ou do agravamento da punibilidade pelo direito
de modo que sejam aplicadas sem a complementação de outras, existem consuetudinário);
algumas com preceitos indeterminados ou genéricos, que devem ser nullum crimen, nulla poena sine lege stricta (proibição da
preenchidos ou completados. As normas penais em branco são, portanto, fundamentação ou do agravamento da punibilidade pela analogia);
as de conteúdo incompleto, vago, existindo complementação por outra nullum crimen, nulla poena sine lege certa (a proibição de leis
norma jurídica (lei, decreto, regulamento, portaria, etc.) para que possam penais indeterminadas).
ser aplicadas ao fato concreto. A LEI PENAL NO TEMPO
De acordo com o princípio tempus regit actum, a lei rege, em
APLICAÇÃO DA LEI PENAL geral, os fatos praticados durante a sua vigência. Não pode, em tese,
O princípio da legalidade (da reserva legal) está inscrito no alcançar fatos ocorridos em período anterior ao início de sua vigência
artigo 1º do código penal: “Não há crime sem lei anterior que o defina. nem ser aplicada àqueles ocorridos após a sua revogação. Entretanto,
Não há pena sem prévia cominação legal”. (art. 5º, XXXIX, CF) por disposição expressa do próprio diploma legal, é possível a ocorrência
Pelo princípio da legalidade alguém só pode ser punido se, da retroatividade e da ultratividade da lei. Denomina-se retroatividade o
anteriormente ao fato por ele praticado, existir uma lei que o considere fenômeno pelo qual uma norma jurídica é aplicada a fato ocorrido antes
como crime. O também denominado princípio da reserva legal tem, entre do início de sua vigência e ultratividade à aplicação dela após a sua
vários significados, o da reserva absoluta da lei (emanada do poder revogação.
legislativo, através de procedimento estabelecido em nível constitucional) PRINCÍPIOS DA LEI PENAL NO TEMPO
para a definição dos crimes e cominação das sanções penais, o que NOVATIO LEGIS INCRIMINADORA
afasta não só outras fontes do direito como as regras jurídicas que não A primeira hipótese trata da lei nova que torna típico fato
são lei em sentido estrito, embora tenham o mesmo efeito, como ocorre, anteriormente não incriminado. Nessa hipótese a lei penal e irretroativa.
por exemplo, com a medida provisória, instrumento totalmente ABOLITIO CRIMINIS
inadequado para tal finalidade. Ocorre a chamada abolitio criminis quando a lei nova já não
Infringe o princípio da legalidade a descrição penal vaga e incrimina fato que anteriormente era considerado como ilícito penal. A
indeterminada que não possibilita determinar qual a abrangência do nova lei, que se presume ser mais perfeita que a anterior, demonstrando
preceito primário da lei penal e possibilita com isso o arbítrio do julgador.. não haver mais, por parte do estado, interesse na punição do autor de
também infringe o princípio da legalidade a cominação de penas determinado fato, retroage para alcançá-lo.
relativamente indeterminadas em margens elásticas. Em razão do Não há abolitio criminis se a conduta praticada pelo
princípio da legalidade é vedado o uso da analogia para punir alguém por acusado e prevista na lei revogada ;e ainda submissível a outra lei penal
um fato não previsto em lei, por ser este semelhante a outro por ela em vigor. Pela abolitio criminis se fazem desaparecer o delito e todos os
definido. seus reflexos penais, permanecendo apenas os civis.
O princípio da legalidade ;e obtido no quadro da denominada NOVATIO LEGIS IN PEJUS
“função de garantia penal”, que provoca o seu desdobramento em quatro A terceira hipótese refere-se à nova lei mais severa a
princípios: anterior. Vige, no caso, o princípio da irretroatividade da lei penal “a lei
nullum crimen, nulla poena sine lege praevia ( proibição da edição penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”.
de leis retroativas que fundamentam ou agravem a punibilidade); NOVATIO LEGIS IN MELLIUS
A última hipótese é a da lei nova mais favorável que a
anterior. Além da abolitio criminis, a lei nova pode favorecer o agente de
121

várias maneiras. “A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o temporária possui também o caráter de ultratividade diante do art. 3º do
agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença CP.
condenatória transitada em julgado Assim, pode-se concluir que há de se fazer uma distinção: a) se
a norma penal em branco tem caráter excepcional ou temporário, aplica-
LEI INTERMEDIÁRIA se o art. 3º do CP, sendo a norma complementar ultrativa; b)se, ao
Em caso de vigência de três leis sucessivas, deve-se ressaltar contrário, não tem ela caráter temporário ou excepcional, aplica-se o art.
que sempre será aplicada a lei mais benigna, entre elas: a posterior será 2º, parágrafo único, ocorrendo a abolitio criminis.
retroativa quando às anteriores e a antiga será ultrativa em relação TEMPO DO CRIME
àquelas que a sucederem. Se, entre as leis que se sucedem, surge ma Necessário se torna saber qual é o tempo do crime, ou seja, a
intermediária mais benigna, embora não seja nem a do tempo do crime ocasião, o momento, a data em que se considera praticado o delito para
nem daquele em que a lei vai ser aplicada, essa lei intermediária mais a aplicação da lei penal a seu autor.
benévola aplicada, segundo art. 2º do CP. Três são as teorias a respeito da determinação do tempo do
CONJUGAÇÃO DE LEIS crime. Pela teoria da atividade, considera-se como tempo do crime o
Com a aplicação hipotética das duas leis em confronto, se momento da conduta (ação ou omissão). Pela teoria do resultado (ou do
poderá escolher a mais benigna. efeito), considera-se tempo do crime o momento de sua consumação,
não se levando em conta a ocasião em que o agente praticou a ação. Por
COMPETÊNCIA PARA A APLICAÇÃO DA LEI MAIS BENÉFICA fim, a teoria mista considera como tempo do crime tanto o momento da
A aplicação da lei mais favorável cabe ao magistrado que conduta como o d resultado.
presidir o processo enquanto não houver proferido sentença, ou, se o Art. 4º “Considera-se praticado o crime no momento da ação ou
feito já estiver sentenciado, ao Tribunal que julgar eventual recurso. omissão, ainda que outro seja o momento do resultado”.
LEIS TEMPORÁRIAS E EXCEPCIONAIS Quanto ao termo inicial do prazo de prescrição, determina-se
De acordo com o art. 3º do CP, a lei excepcional ou temporária que a prescrição começa a correr do dia em que o crime se consumou.
embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as Na decadência, o prazo é contado do dia em que o ofendido veio a saber
circunstâncias que as determinaram, aplicas-se ao fato praticado ao fato quem é o autor do crime ou, em se tratando de ação privada subsidiária,
praticado durante sua vigência. do dia em que se esgota o prazo para oferecimento da denúncia.
Leis temporárias são as que possuem vigência previamente A LEI PENAL NO ESPAÇO
fixada pelo legislador. Pode um crime violar interesses de dois ou mais países, quer
Leis excepcionais são as que vigem durante situações de por ter sido a ação praticada no território de um e a consumação dar-se
emergência. em outro.
Essas espécies de lei tem ultratividade, ou seja, aplicam-se ao PRINCÍPIOS DE APLICAÇÃO DA LEI PENAL NO ESPAÇO
fato cometido sob o seu império, mesmo depois de revogadas pelo O princípio da territorialidade prevê a aplicação da lei nacional
decurso do tempo ou pela superação do estado excepcional. ao fato praticado no território do próprio país.
O princípio da nacionalidade (ou de personalidade) cogita da
A RETROATIVIDADE E A LEI PENAL EM BRANCO aplicação da lei do país de origem do agente, pouco importando o local
Revogada a norma complementar (decreto, portaria, onde o crime foi praticado. O estado tem o direito de exigir que o seu
regulamento, etc.), não desaparecerá o crime. O que foi revogado ou cidadão no estrangeiro tenha determinado comportamento
alterado é a norma complementar e não a lei. Para os que entendem a (nacionalidade ativa - somente se considera, se o autor do delito é
norma complementar integra alei penal, sendo ela excepcional ou nacional, sem se cogitar da vítima; nacionalidade passiva - exige, para a
122

aplicação da lei penal, que sejam nacionais o autor e o ofendido do ilícito se faz para o dia de pena privativa de liberdade. Extintos o cruzeiro
penal. antigo e o cruzado, o novo cruzeiro e o cruzeiro real, o real é a unidade
Pelo princípio da proteção (da competência real, de defesa), monetária nacional, devendo ser desprezados os centavos, fração da
aplica-se a lei do país ao fato que atinge bem jurídico nacional, sem nova moeda brasileira.
qualquer consideração a respeito do local onde foi praticado o crime ou
da nacionalidade do agente. FATO TÍPICO
Pelo princípio da competência universal (ou da justiça Sob o aspecto formal, podem-se citar os seguintes conceitos de
cosmopolita), o criminoso deve ser julgado e punido onde for detido, crime: ”crime é o fato humano contrário à lei”. “crime é qualquer ação
segundo as leis deste país, não se levando em conta o lugar do crime, a legalmente punível. Não penetram, contudo, em sua essência, em seu
nacionalidade do autor ou o bem jurídico lesado. conteúdo, em sua matéria.
Por fim há o princípio da representação, subsidiário, que
determina a aplicação da lei do país quando, por deficiência legislativa ou CONCEITOS MATERIAIS
desinteresse de outro que deveria reprimir o crime, este não o faz, e diz A melhor orientação para obtenção de um conceito material de
respeito aos delitos cometidos em aeronaves ou embarcações. crime, é aquela que tem em vista o bem protegido pela lei penal. Tem o
estado a finalidade de obter o bem coletivo, mantendo a ordem, a
TERRITORIALIDADE harmonia e o equilíbrio social, qualquer que seja a finalidade do estado,
Prevê o art. 5º do CP: “aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de ou seu regime político. “Crime é a conduta humana que lesa ou expõe a
convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido perigo um bem jurídico protegido pela lei penal.
no território nacional”. É evidente, portanto, que a nossa legislação
consagra, como base para a aplicação da lei penal no espaço, o princípio CONCEITOS ANALÍTICOS
da territorialidade. O conceito formal de delito com referência aos elementos que o
compõem, de caráter analítico, tem evoluído. “Ação humana, antijurídica,
CONTAGEM DE PRAZO típica, culpável e punível”. Se a conduta é um dos componentes do fato
O dia do começo inclui-se no cômputo do prazo (art. 10, típico, deve-se definir o crime como “fato típico e antijurídico”.
primeira parte, do CP). Trata-se, no dispositivo, de disciplinar a contagem
do prazo penal que tem relevância especial nos casos de duração de CARACTERÍSTICAS DO CRIME SOB O ASPECTO FORMAL
pena, do livramento condicional, do sursis, Da decadência, da prescrição, São características do crime, sob o aspecto analítico:
etc., institutos de direito penal. FATO TÍPICO - é o comportamento humano (positivo ou negativo)
Contam-se os dias, os meses e os anos pelo calendário que provoca, em regra, um resultado, e é previsto como infração penal.
comum. Há no caso imprecisão tecnológica. O calendário comum a que FATO ANTIJURÍDICO - é aquele que contraria o ordenamento
se refere o legislador tem o nome de gregoriano, em contraposição ao jurídico.
Juliano, judeu, árabe, etc.
ILÍCITO PENAL E ILÍCITO CIVIL
FRAÇÕES NÃO COMPUTÁVEIS DA PENA Entende o legislador que determinados fatos antijurídicos não
Segundo o art. 11, desprezam-se, nas penas privativas de atingem bens jurídicos tão relevantes que devam ser protegidos pela lei
liberdade nas restritivas de direitos, as frações de dia e, na pena de penal, não os eleva a categoria de ilícito penal.
multa, as frações de cruzeiro. Também se tem entendido que, por A distinção assinalada não impede que, além da sanção penal
analogia com o art. 11, deve ser desprezada a fração de dia multa, como ao autor de um crime de furto, seja imposta a sanção civil.
123

O CRIME NA TEORIA GERAL DO DIREITO CASO FORTUITO E FORÇA MAIOR


Como o crime é apenas uma conduta humana de feitos Não há fato típico na ocorrência de resultado lesivo em
jurídicos involuntários (imposição de pena, etc.) e um ato que contrasta decorrência de caso fortuito ou força maior.
com a ordem jurídica (ato ilícito), pode-se situar o crime entre os fatos FORTUITO é aquilo que se mostra imprevisível, quando não
jurídicos. inevitável; é o que chega sem ser esperado e por força estranha à
O TIPO PENAL vontade do homem que não o pode impedir. Na mesma situação estão os
A lei deve especificar exatamente a matéria de sua proibições, casos de FORÇA MAIOR. Exemplo desta, sempre citado, é o da coação
os fatos que são proibidos sob ameaça de sanção penal, ou seja, o que é física irresistível.
considerado crime. Isto é feito através dos tipos penais.
Tipo é a descrição concreta da conduta proibida, ou seja, do O RESULTADO
conteúdo ou da matéria da norma. Não basta a conduta para que o crime exista, pois é exigido,
TIPOS DOLOSOS E TIPOS CULPOSOS como vimos, o segundo elemento do fato típico, que é o resultado. É o
Dolo e culpa não integram a culpabilidade, mas fazem parte do efeito natural da ação que configura a conduta típica, ou seja, o fato
próprio fato típico. tipicamente relevante produzido no mundo exterior pelo movimento
A estrutura do tipo doloso se compõe de duas partes: tipo corpóreo do agente e a ele ligado por relação de causalidade.
objetivo e tipo subjetivo. Conceito jurídico ou normativo de resultado - resultado deve ser
O tipo objetivo (descrição abstrata de um comportamento) entendido como lesão ou perigo de lesão de um interesse protegido pela
compreende a ação delituosa descrita com todas as suas características norma penal.
descritivas e, às vezes, de elementos normativos e subjetivos. O resultado pode ser físico, fisiológico, ou psicológico.
O tipo subjetivo compreende necessariamente o dolo, como Quanto à exigência de resultado naturalístico, os crimes podem
elemento intencional e genérico, e eventualmente, outros elementos ser materiais, formais ou de mera conduta.
subjetivos especiais da conduta, chamados elementos subjetivos do tipo
(injusto). RELAÇÃO DE CAUSALIDADE
Para haver fato típico é ainda necessário que exista relação de
FATO TÍPICO causalidade entre a conduta e o resultado.
Já foi visto que o crime é um fato típico e antijurídico. Para que O conceito de causa não é jurídico, mas da natureza; é a
se possa afirmar que o fato concreto tem tipicidade, é necessário que ele conexão, a ligação que existe numa sucessão de acontecimentos que
se contenha perfeitamente na descrição legal, ou seja, que haja perfeita pode ser entendida pelo homem
adequação do fato concreto ao tipo penal. Deve-se, por isso, verificar de Para estabelecer, porém, o que se deve entender por causa em
que se compões a fato típico. São elementos do fato típico: sentido jurídico penal, várias teorias foram elaboradas: a da causalidade
conduta (ação ou omissão); adequada (causa é a condição mais adequada para produzir o
o resultado; resultado); a da relevância jurídica (é tudo que concorre para o evento
a relação de causalidade; ajustado à figura penal ou adequado ao tipo) etc.
a tipicidade. Não se distingue entre causa (aquilo que uma coisa depende
Caso o fato concreto não apresente um desses elementos, não quanto à existência) e condição (o que permite à causa produzir seus
é fato típico e, portanto, não é crime. Excetua-se, no caso, a tentativa, em efeitos, seja positivamente a título de instrumento ou meio, seja
que não ocorre o resultado. negativamente, afastando os obstáculos). As forças concorrentes
124

eqüivalem-se e sem uma delas o fato não teria ocorrido (conditio sine só de elementos objetivos, mas também de elementos normativos e
qua non). subjetivos, é indispensável para a existência da tipicidade que não só o
Para que se possa reconhecer se a condição é causa do fato objetivamente considerado, mas também a sua antijuridicidade e os
resultado, utiliza-se o processo hipotético de eliminação, segundo o qual elementos subjetivos se subsumam a ele.
causa é todo antecedente que não pode ser suprimido in mente sem O tipo penal tem duas funções: a primeira é a da garantia, já
afetar o resultado. que aperfeiçoa e sustenta i princípio da legalidade do crime. A segunda é
Não se elimina a relação de causalidade pela existência de uma a de indicar a antijuridicidade do fato à sua contrariedade ao
concausa (preexistente, concomitante ou superveniente). A concausa é ordenamento jurídico. A tipicidade é o indício da antijuridicidade do fato.
outra causa, que, ligada à primeira, concorre para o resultado. Praticado um fato típico, presume-se também a sua antijuridicidade,
Critica-se a adoção da teoria da equivalência das condições presunção que somente cessa diante da existência de uma causa que a
com a afirmação de que a corrente casual poderia ir ao infinito. exclua. Assim, se A mata B voluntariamente, há um fato típico e , em
A objeção não tem razão de ser. Mesmo estabelecida a relação princípio, antijurídico, mas se o fez, por exemplo, em legítima defesa, não
de causalidade entre o ato e o resultado, a relevância penal da existirá a antijuridicidade. Não sendo a fato antijurídico, não há crime. Há
causalidade acha-se limitada pelo elemento subjetivo do fato típico, pode fatos, porém, antijurídicos que não são típicos, como, por exemplo, a
ter o agente querido o fato ou por ter dado causa ao resultado ao não fuga de preso sem ameaça ou violência e sem a colaboração de outrem,
tomar as cautelas que dele se exigia, ou seja, só pratica conduta típica o dano culposo, etc. são eles fatos contrários ao ordenamento jurídico,
quem agiu com dolo ou culpa. A rigor, a adoção do princípio da conditio mas não fatos típicos.
sine qua non tem mais relevância para excluir quem não praticou conduta Num sentido amplo, tipo é a descrição abstrata da ação
típica do que para incluir quem a cometeu. proibida ou da ação permitida. A atipicidade é a ausência de tipicidade.

CAUSA SUPERVENIENTE PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA (OU DA BAGATELA)


A causa superveniente, sendo totalmente independente da Permite na maioria dos tipos excluir, em princípio, os danos de
primeira impede o fluxo do nexo causal entre a conduta (envenenamento) pouca importância. Não há crime de dano ou furto quando a coisa alheia
e o resultado (morte por TCE). Diante do art. 13 caput, a conduta não não tem qualquer significação para o proprietário da coisa. É preciso,
sendo condição do resultado (que existiria ainda que não tivesse sido porém, que estejam comprovados o desvalor do dano, o da ação e o da
praticada a ação), implica a responsabilidade pelos fatos ocorridos até a culpabilidade.
causa superveniente. Na hipótese, o autor do envenenamento A excludente da tipicidade (do injusto) pelo princípio da
responderia pela tentativa de homicídio, nos termos do art. 13, caput, insignificância (ou da bagatela), que a doutrina e a jurisprudência vêm
pela inexistência de relação entre essas causas. admitindo, não está inserta na lei brasileira, mas é aceita por analogia, ou
Prevê, porém, o art. 13, § 1º: a superveniência de causa interpretação interativa, desde que não contra legem.
relativamente independente exclui a imputação quando, por si só,
produziu i resultado, ; os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO MÍNIMA
os praticou. Como a intervenção do direito penal é requisitada por uma
necessidade mais elevada de proteção à coletividade, o delito deve
TIPICIDADE consubstanciar em um injusto mais grave e revelar uma culpabilidade
Como último elemento do fato típico tem-se a tipicidade, que é mais elevada; deve ser uma infração que merece a sanção penal.
a correspondência exata, a adequação perfeita entre o fato natural, Essas idéias, consubstanciadas no chamado princípio da
concreto e a descrição contida na lei. Como o tipo penal é composto não intervenção mínima, servem para inspirar o legislador, que deve buscar
125

na realidade fática o substancial deve-ser para tornar efetiva a tutela dos que alei determina, consistindo a omissão na transgressão da norma
bens e interesses considerados relevantes quando dos movimentos de jurídica e não sendo necessário qualquer resultado naturalístico. Para a
criminalização, neocriminalização, descriminalização e despenalização. existência do crime basta que o autor se omita quando deve agir.
Fala-se também em crimes de conduta mista, em que no tipo
SUJEITO ATIVO DO CRIME penal se inscreve uma fase inicial comissiva, de fazer, de movimento, e
Sujeito ativo do crime é aquele que pratica a conduta descrita uma final de omissão, de não fazer o devido.
na lei, ou seja, o fato típico. Só o homem isoladamente ou associado a Nos crimes omissivos impróprios (ou comissivos por omissão,
outros, pode ser sujeito ativo do crime. ou comissivos - omissivos), a omissão consiste na transgressão do dever
jurídico de impedir o resultado, praticando-se o crime que, abstratamente,
SUJEITO PASSIVO DO CRIME é comissivo. A omissão é forma ou meio de se alcançar um resultado (no
Sujeito passivo do crime é i titular do bem jurídico lesado ou crime doloso). Nos crimes omissivos impróprios a lei descreve uma
ameaçado pela conduta criminosa. Nada impede que, em um delito, dois conduta de fazer, mas o agente se nega a cumprir o dever de agir.
ou mais sujeitos passivos existam: desde que tenham sido lesados ou Não havendo obrigação jurídica de agir para evitar o resultado,
ameaçados em seus bens jurídicos referidos no tipo. São vítimas do não se pode falar em crime comissivo por omissão.
crime.
CRIMES UNISSUBJETIVOS E PLURISSUBJETIVOS
OBJETOS DO CRIME Crime unissubjetivo (monossubjetivo, unilateral) é aquele que
Objeto do delito é tudo aquilo contra o que se dirige a condita pode ser praticado por uma só pessoa, embora nada impeça a co-autoria
criminosa. Devem ser considerados, no seu estudo, o objeto jurídico e o ou participação.
material. Crime plurissubjetivo (coletivo, de concurso necessário) é
Objeto jurídico do crime é o bem-interesse protegido pela lei aquele que, por sua conceituação típica, exige dois ou mais agentes para
penal ou, “o bem ou interesse que o legislador tutela, em linha abstrata a prática da conduta criminosa. Essas condutas podem ser paralelas,
de tipicidade (fato típico), mediante uma incriminação penal”. conceituam- como no criem de quadrilha ou bando (art. 288), em que a atividade de
se bem como tudo aquilo que satisfaz a uma necessidade humana, todos tem o mesmo objetivo, um fim único; convergentes, como nos
inclusive as de natureza moral e espiritual, etc. crimes bilaterais, em que é possível que uma delas não seja culpável e
Objeto material os substancial do crime é a pessoa ou coisa que tem como exemplos o adultério (art. 240) e a bigamia (art. 235); ou
sobre a qual recai a conduta criminosa, ou seja, aquilo que a ação divergentes, em que as ações são dirigidas de uns contra outros, como
delituosa atinge. na rixa (art. 137).

TÍTULO E CLASSIFICAÇÃO DAS INFRAÇÕES PENAIS CRIME DOLOSO

CRIMES COMISSIVOS, OMISSIVOS PUROS E OMISSIVOS Três são as teorias que procuram estabelecer o conteúdo do
IMPRÓPRIOS dolo: a da vontade, a da representação e a do assentimento.
Crimes comissivos são os que exigem, segundo o tipo penal Para a teoria da vontade, age dolosamente quem pratica a ação
objetivo, em princípio, uma atividade positiva do agente, um fazer. No consciente e voluntariamente.
furto (art. 155) o subtrair; no rapto (art. 219) o raptar etc. Para a teoria da representação, o dolo é a simples previsão do
Crimes omissivos (ou omissivos puros) são os que resultado. Embora não se negue a existência da vontade na ação, o que
objetivamente são descritos com uma conduta negativa, de não fazer o
126

importa para essa posição é a consciência de que a conduta provocará o ao cuidado resultar lesão a um bem jurídico. Se, apesar da ação
resultado. descuidada do agente, não houver resultado lesivo, não haverá crime
Para a teoria do assentimento (ou do consentimento) faz parte culposo.
do dolo a previsão do resultado a que o agente adere, não sendo O resultado não deixa de ser um “componente de azar” da
necessário que ele o queira. conduta humana no crime culposo. Não existindo resultado, não se
Como será visto, o CP brasileiro adotou a teoria da vontade responsabilizará por crime culposo o agente que inobservou o cuidado
quanto ao dolo direto e a teoria de assentimento ao conceituar o dolo necessário, ressalvada a hipótese em que a conduta constituir, por si
eventual. mesma, um ilícito penal.
Não haverá crime culposo mesmo que a conduta contrarie os
CRIME CULPOSO cuidados objetivos e se verifica que o resultado se produziria da mesma
forma, independentemente da ação descuidada do agente. Assim, se
Tem-se conceituado na doutrina o crime culposo como a alguém se atira sob as rodas do veículo que é dirigido pelo motorista na
conduta voluntária (ação ou omissão) que produz resultado antijurídico contramão de direção, não se pode imputar a este o resultado (morte do
não querido, mas previsível, e excepcionalmente previsto, que podia, suicida). Trata-se, no caso, de mero caso fortuito.
com a devida atenção, ser evitado. Evidentemente, deve haver no crime culposo, como me todo
São assim, elementos do crime culposo: fato típico, a relação de causalidade entre a ação e o resultado,
CONDUTA obedecendo-se ao que dispõe a lei brasileira no art. 13 do CP
Enquanto nos crimes dolosos a vontade está dirigida à PREVISIBILIDADE
realização de resultados objetivos ilícitos, os tipos culposos ocupam-se O tipo culposo é diverso do doloso. Há na conduta não uma
não com o fim da conduta, mas com as conseqüências anti-sociais que a vontade dirigida à realização do tipo, mas apenas um conhecimento
conduta vai produzir; no crime culposo o que importa não é o fim do potencial de sua concretização, vale dizer, uma possibilidade de
agente (que é normalmente lícito), mas o modo e a forma imprópria com conhecimento de que o resultado lesivo pode ocorrer. Esse aspecto
que atua. Os tipos culposos proíbem assim condutas em decorrência da subjetivo da culpa é a possibilidade de conhecer o perigo que a conduta
forma de atuar do agente para um fim proposto e não pelo fim em si. O descuidada do sujeito cria para os bens jurídicos alheios, e a
elemento decisivo da ilicitude do fato culposo reside não propriamente no possibilidade de prever o resultado conforme o conhecimento do agente.
resultado lesivo causado pelo agente, mas no desvalor da ação que A essa possibilidade de conhecimento e previsão dá-se o nome de
praticou. A conduta culposa é, portanto, elemento do fato típico. previsibilidade.
DEVER DE CUIDADO OBJETIVO A previsibilidade é a possibilidade de ser antevisto o resultado,
A cada homem, na comunidade social, incumbe o dever de nas condições me que o sujeito se encontrava. A condição mínima de
praticar os atos da vida com as cautelas necessárias para que o seu culpa em sentido estrito é a previsibilidade; ela não existe se o resultado
atuar não resulte dano a bens jurídicos alheios. Assim, se o agente não vai além da previsão.
observa estes cuidados indispensáveis, causando com isso dano a um Diz-se que estão fora do tipo penal dos delitos culposos os
bem jurídico alheio, responderá por ele. É a inobservância do cuidado resultados que estão fora da previsibilidade objetiva de um homem
objeto exigível do agente que torna a conduta antijurídica. razoável, não sendo culposo o ato quando o resultado só teria sido
RESULTADO evitado por pessoa extremamente prudente
Em si mesma, a inobservância do dever de cuidado não Princípio direito risco tolerado - Há comportamentos perigosos
constitui conduta típica porque é necessário outro elemento do tipo imprescindíveis, que não podem ser evitados e, portanto, não podem ser
culposo: o resultado. Só haverá ilícito penal culposo se da ação contrária
127

tidos como ilícitos (médico que realiza uma cirurgia em circunstâncias A culpa consciente avizinha-se do dolo eventual, mas com ela
precárias podendo causar a morte do paciente). não se confunde. Naquela, o agente, embora prevendo o resultado, não
A previsibilidade também está sujeita ao princípio da confiança. o aceita como possível. Neste, o agente prevê o resultado, não se
O dever objetivo de cuidado é dirigido a todos, de comportarem-se importando que venha ele a ocorrer
adequadamente, não se podendo exigir que as pessoas ajam Distingue-se ainda, a culpa própria, em que o agente não quer
desconfiando do comportamento dos seus semelhantes. o resultado nem assume o risco de produzi-lo, da culpa imprópria,
TIPICIDADE também denominada culpa por extensão, equiparação ou assimilação.
Nos crimes culposos a ação não está descrita como nos crimes Diz-se que a culpa é presumida quando, não se indagando se
dolosos. São normalmente tipos abertos que necessitam de no caso concreto estão presentes os elementos da conduta culposa, o
complementação de uma norma de caráter geral, que se encontra fora do agente é punido por determinação legal, que presume a ocorrência dela.
tipo, e mesmo de elementos do tipo doloso correspondente.
COMPENSAÇÃO E CONCORRÊNCIA DE CULPAS
MODALIDADES DE CULPA As culpas não se compensam na área penal. Havendo culpa do
As modalidades de culpa, ou formas de manifestação da falta agente e da vítima, aquele não se escusa da responsabilidade pelo
do cuidado objetivo estão discriminadas no art. 18, inc. II: imprudência, resultado lesivo causado a esta.
negligência ou imperícia. Há concorrência de culpas quando dois ou mais agentes
A imprudência é uma atitude em que o agente atua com causam resultado lesivo por imprudência, negligência ou imperícia. Todos
precipitação, inconsideração, com afoiteza, sem cautelas, não usando de respondem pelos eventos lesivos.
seus poderes inibidores.
A negligência é inércia psíquica, a indiferença do agente que, EXCEPCIONALIDADE DO CRIME CULPOSO
podendo tomar as cautelas exigíveis, não o faz por displicência ou Nos termos do art. 18, parágrafo único, os crimes são, regra
preguiça mental. geral, dolosos. Assim, em princípio, o agente só responde pelos fatos que
A imperícia é a incapacidade, a falta de conhecimentos técnicos praticar se quis realizar a conduta típica. Ocorrerá, entretanto, crime
no exercício de arte ou profissão, não tomando o agente em culposo quando o fato for expressamente previsto na lei, na forma
consideração o que sabe ou deve saber. culposa.
CRIME PRETERDOLOSO
ESPÉCIES DE CULPA O crime preterdoloso é um crime misto, em que há ma conduta
Refere-se a doutrina à culpa inconsciente e à culpa consciente, que é dolosa, por dirigir-se a um fato típico, e que é culposa pela
também chamada culpa com previsão. acusação de outro resultado que não era objeto do crime fundamental
A culpa inconsciente existe quando o agente não prevê o pela inobservância do
resultado que é previsível. Não há no agente o conhecimento efetivo do
perigo que sua conduta provoca para o bem jurídico alheio CRIME CONSUMADO E TENTATIVA
A culpa consciente ocorre quando o agente prevê o resultado,
mas espera, sinceramente, que não ocorrerá. Há no agente a Está consumado o crime quando o tipo está inteiramente realizado,
representação da possibilidade do resultado, mas ele a afasta por ou seja, quando o fato concreto se subssume no tipo abstrato descrito na
entender que o evitará, que sua habilidade impedirá o evento lesivo que lei penal. Preenchidos todos os elementos do tipo objetivo pelo fato
está dentro de sua previsão. natural, ocorreu a consumação. Segundo o art. 14, inciso I, diz-se o crime
128

consumado “quando nele se reúnem todos os elementos de sua ocorre no crime de ameaça (art. 147), de incitação ao crime (art. 286),
definição legal”. de quadrilha ou bando (art. 288) etc.
Não se confunde a consumação com o crime exaurido, pois Os atos preparatórios são externos ao agente, que passa da
neste, após a consumação, outros resultados lesivos ocorrem. cogitação à ação objetiva, como aquisição da arma para pratica de um
Nos crimes materiais, a consumação ocorre com o evento homicídio, ou a de uma chave falsa para o delito de furto, o estudo do
(morte, lesão, dano, etc.), enquanto nos formais é dispensável o local onde se quer praticar um roubo, etc. Também escapam, regra geral,
resultado naturalístico e, nos de mera conduta este não existe. a aplicação da lei penal.
Nos crimes permanentes, deve-se observar que a consumação Atos de execução (ou atos executórios) são os dirigidos
se protrai, prolonga no tempo, dependente do sujeito ativo. diretamente à pratica do crime, “quando o autor se põe em relação
A tentativa do crime complexo configura-se com o começo da imediata com a ação típica. A distinção entre atos preparatórios -
execução do crime que inicia a formação do todo unitário, a consumação usualmente impunes - e atos de tentativa é um dos problemas mais
somente ocorre quando os crimes componentes estejam integralmente árduos da dogmática e, seguramente, o mais difícil da tentativa. Vários
realizados. critérios são propostos para a diferenciação.
Nos delitos habituais, a consumação somente existe quando Os critérios mais aceitos são os de ataque ao bem jurídico,
houver a reiteração dos atos, com a habitualidade, já que cada um deles, critério material, quando se verifica se houve perigo ao bem jurídico, e o
isoladamente, é indiferente à lei penal. do início da realização do tipo, critério formal, em que se dá pelo
Nos crimes culposos, só há consumação com o resultado; se reconhecimento da execução quando se inicia a realização da conduta
houver inobservância do dever de cuidado, mas o evento não se realizar, núcleo do tipo: matar, ofender, subtrair etc.
não haverá crime. O código brasileiro adotou a teoria objetiva (formal) e exige que
Nos crimes omissivos, a consumação ocorre no local e no o autor tenha realizado de maneira efetiva uma parte da própria conduta
momento em que o sujeito ativo deveria agir, mas não o fez. Tratando-se típica, penetrando, assim, no “núcleo do tipo”.
de crime omissivo impróprio, como a omissão é formada ou meio de se A tentativa é a realização incompleta do tipo penal, do modelo
alcançar um resultado, a consumação ocorre com o resultado lesivo e descrito na lei penal com o dispositivo que a define e prevê sua punição.
não com a simples inatividade do agente, como nos delitos omissivos Sob o ângulo estritamente objetivo, o crime não pode, em
puros. hipótese alguma, , ser considerado como tentado com relação a um
Nos crimes qualificados pelo resultado, a consumação ocorre agente e consumado com relação à outro, nos casos em que haja
quando estiver concretizado o resultado acrescido do tipo fundamental. concurso de pessoas.
Não havendo este, responde o agente pelo tipo doloso antecedente.
INTER CRIMINIS E TENTATIVA DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA
Na realização do crime há um caminho, um itinerário a Prevê o artigo 15 as hipóteses de desistência voluntária e
percorrer entre o momento da idéia da sua realização até aquele em que arrependimento eficaz: “O agente que, voluntariamente, desiste de
ocorre a consumação. A esse caminho se dá o nome de inter criminis, prosseguir na execução ou impede que o resultado se produza, só
que é composto de uma fase interna (cogitação) e de uma fase externa responde pelos atos já praticados”.
(atos preparatórios, atos de execução e consumação). A desistência voluntária e o arrependimento eficaz traduzem a
A cogitação não é punida, segundo a lei: cogitationis poenan exclusão da tipicidade; no fato não há tentativa típica. Interrompida a
nemo patitutur. Nem mesmo a cogitação externada a terceiros levará a execução “por vontade do agente” ou se por vontade deste não há
qualquer punição, a não ser que constitua, de per si, um fato típico, como consumação, é evidente que a falta de adequação típica pelo não
129

preenchimento do segundo elemento da tentativa que é a “não Como na desistência voluntária, o agente responderá pelos
consumação por circunstâncias alheias à vontade do agente”. atos já praticados, ou seja, pelos resultados já ocorridos (lesões
Na desistência voluntária, o agente, embora tenha iniciado a corporais, violação de domicílio, etc.).
execução, não a leva adiante, desistindo da realização típica. Para que ARREPENDIMENTO POSTERIOR
ocorra a hipótese prevista no dispositivo, a desistência deve ser Prevê o artigo 16 que, “nos crimes cometidos sem violência ou
voluntárias, ou seja, que o agente não tenha sido coagido, moral ou grave ameaça à pessoa, reparado o dano ou restituída a coisa, até o
materialmente, à interrupção do inter criminis. Não há desistência recebimento da denúncia ou da queixa pelo ato voluntário do agente, a
voluntária e sim tentativa punível se, por exemplo, o agente desiste pelo pena será reduzida de um a dois terços”.
risco de ser surpreendido em flagrante diante do funcionamento do
sistema de alarma. CRIME IMPOSSÍVEL
Embora alei exija que a desistência seja voluntária, pode não Trata o artigo 17 do crime impossível (tentativa impossível,
ser ela espontânea. Voluntária é a desistência em que não há coação tentativa inidônea, tentativa inadequada ou quase crime), ao prever: “Não
física ou moral, e não espontânea é apenas aquela desistência em que a de pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por
idéia inicial não partiu do agente e sim de outrem. De outro lado, a absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime”.
desistência voluntária prescinde dos motivos do desistente: medo ou Há, portanto, duas espécies diferentes de crime impossível, em
piedade, receio de ser descoberto ou repugnância pela própria conduta, que de forma alguma o agente conseguiria chegar à consumação, motivo
etc. pelo qual a lei deixa de responsabilizá-lo pelos atos praticados.
Existirá a desistência voluntária sempre que o agente pode Na primeira parte, o dispositivo refere-se à ineficácia absoluta
prosseguir, mas não quer; se ele quer, mas não pode, há tentativa. do meio empregado pelo agente para conseguir o resultado. O meio é
Responde o agente, conforme o dispositivo determina, pelos inadequado, inidôneo, ineficaz para que o sujeito possa obter o resultado
atos já praticados que, de per si, constituem tipos penais. pretendido. Exemplos clássicos são os da tentativa de homicídio por
Não há desistência voluntária quando o agente suspende a envenenamento com substâncias inócua ou com a utilização de revólver
execução e continua a praticá-la posteriormente, aproveitando-se dos desmuniciado.
atos já executados. Quanto à punibilidade ou não do crime impossível, existem
ARREPENDIMENTO EFICAZ duas teorias. Para a teoria subjetiva o agente deve ser punido com a
No arrependimento eficaz, também hipótese de inadequação pena da tentativa porque se tem em conta a intenção do delinqüente;
típica de tentativa, após Ter esgotado os meios de que dispunha para a para a teoria sintomática, a medida penal deve ser aplicada se há indício
prática do crime, o agente arrepende-se e evita que o resultado ocorra de periculosidade do agente; para a teoria objetiva, como não há no
(ministra antídoto à pessoa envenenada, retira da água a vítima que crime impossível os elementos objetivos da tentativa e o bem jurídico não
pretendia afogar, leva para o hospital o ofendido moralmente ferido, corre risco, não há tentativa e o agente não pode ser punido. A nova lei
entrega a coisa que está subtraindo à vítima antes de estar fora da esfera adotou a teoria objetiva pura, tal como os códigos penais da Alemanha e
de vigilância desta, etc.). Como na desistência, o arrependimento Iugoslávia.
também deve ser voluntário (sem coação), embora não necessariamente
espontâneo. O agente pratica nova atividade para evitar o resultado. CRIME PUTATIVO
É imprescindível, para a caracterização do arrependimento Crime putativo ou imaginário é aquele em que o agente supõe,
eficaz, que a ação do agente seja coroada de êxito; que efetivamente por erro, que está praticando uma conduta típica quando o fato não
impeça ele a consumação. constitui crime. Só existe, portanto, na imaginação do agente.
130

CRIME PROVOCADO Há uma distinção doutrinária entre antijuridicidade e injusto.


Fala-se em crime provocado quando o agente é induzido à Neste sentido, a antijuridicidade é a contradição que se estabelece entre
prática de um crime por terceiro, muitas vezes policial, para que se efetue a conduta e uma norma jurídica, enquanto o injusto é a conduta ilícita em
a prisão em flagrante. si mesma, é a ação valorada como antijurídica.

ERRO DE TIPO EXCLUSÃO DA ANTIJURIDICIDADE


Um erro que recai sobre elemento normativo do tipo também é O direito prevê causas que excluem a antijuridicidade do fato
erro de tipo excludente do dolo. Não age com dolo, por exemplo, o típico (causas excludentes da criminalidade, causas excludentes da
agente que, ao se retirar de um restaurante, leva consigo o guarda chuva antijuridicidade, causas justificativas, causas excludentes da ilicitude,
de outrem, supondo ser o seu, pois não se sabe que se trata de “coisa eximentes ou descriminantes). São normas permissivas, também
alheia móvel”. chamadas tipos permissivos, que excluem a antijuridicidade por
O erro é uma falsa representação da realidade e a ele se permitirem a prática de um fato típico.
equipara a ignorância, que é o total desconhecimento a respeito dessa Segundo o entendimento adotado, a exclusão da
realidade. No caso de erro de tipo, desaparece a finalidade típica, ou antijuridicidade não implica o desaparecimento da tipicidade e, por
seja, não há no agente a vontade de realizar o tipo objetivo. Como o dolo conseguinte, deve-se falar em “conduta típica justificada”. De acordo,
é querer a realização do tipo objetivo, quando o agente não sabe que porém, com a teoria dos elementos negativos do tipo, as causas de
está realizando um tipo objetivo, porque se enganou a respeito de um justificação eliminam a tipicidade.
dos seus elementos, não age dolosamente: há erro de tipo. São casos A lei penal brasileira dispõe que “não há crime” quando o
em que há tipicidade objetiva (nos exemplos, os tipos de homicídio, lesão agente pratica o fato em estado de necessidade, em legítima defesa, em
corporal, aborto, furto, corrupção ativa), mas não há tipicidade subjetiva estrito cumprimento do dever legal ou no exercício regular do direito (art.
por estar ausente o dolo. 23). Além das normas permissivas da parte geral, todavia, existem
algumas na parte especial, como por exemplo, a possibilidade de o
ANTIJURIDICIDADE médico praticar aborto se não há outro meio de salvar a vida da gestante
ou se a gravidez resulta de estupro (art. 128).
A antijuridicidade é a contradição entre uma conduta e o O autor, para pratica fato típico que não seja antijurídico, deve
ordenamento jurídico. O fato típico, até prova em contrário, é um fato agir no conhecimento da situação de fato justificante e com fundamento
que, ajustando-se a um tipo penal, é antijurídico. Existem, entretanto, na em uma autorização que lhe é conferida através disso, ou seja, querer
lei penal ou no ordenamento jurídico em geral, causas que excluem a atuar juridicamente.
antijuridicidade do fato típico. Por essa razão, diz-se que a tipicidade é o
indício da antijuridicidade, que será excluída se houver uma causa que ESTADO DE NECESSIDADE
elimine e sua ilicitude. “Matar alguém” voluntariamente é fato típico, mas
não será antijurídico, por exemplo, se o autor do fato agiu em legítima Para alguns doutrinadores o estado de necessidade configura
defesa. Nessa hipótese não haverá crime. A antijuridicidade, como uma faculdade e não um direito, pois o todo direito corresponde uma
elemento da análise conceitual do crime, assume, portanto, o significado obrigação, o que não corre com relação àquele que tem lesado o seu
de “ausência de causas excludentes de ilicitude”. A antijuridicidade é um bem jurídico por um caso fortuito. Para outros, com os quais
juízo de desvalor que recai sobre a conduta típica, no sentido de que concordamos, trata-se de um direito, não contra o interesse do lesado,
assim o considera o ordenamento jurídico. mas em relação ao estado, que concerne ao sujeito esse direito subjetivo
da norma penal.
131

O estado de necessidade pressupõe um conflito entre titulares ESTRITO CUMPRIMENTO DE DEVER LEGAL E EXERCÍCIO
de interesses lícitos, legítimos, em que um pode parecer licitamente para REGULAR DE DIREITO
que outro sobreviva. Não podendo o estado acudir aquele que está em Não há crime quando o agente pratica o fato no “estrito
perigo, nem devendo tomar partido a priori de qualquer dos titulares dos cumprimento do dever legal”(art. 23, inc. III, primeira parte). Quem
bens em conflito, concede o direito de que se ofenda bem alheio para cumpre regularmente um dever não pode, ao mesmo tempo, praticar
salvar direito próprio ou de terceiro ante um fato irremediável. ilícito penal, uma vez que a lei não contém contradições. Falta no caso a
São requisitos do estado de necessidade perante a lei penal antijuridicidade da conduta e, segundo os doutrinadores, o dispositivo
brasileira: seria até dispensável. A excludente, todavia, é prevista expressamente
a ameaça a direito próprio ou alheio; para que se evite qualquer dúvida quanto à sua aplicação, definindo-se
a existência de um perigo atual e inevitável; na lei os termos exatos de sua caracterização.
a inexigibilidade do sacrifício do bem ameaçado; A excludente pressupõe no executor um funcionário ou agente
uma situação não provocada voluntariamente pelo agente; e público que age por ordem da lei, não se excluindo o particular que
o conhecimento da situação de fato justificante. exerça função pública (jurado, perito, mesário da justiça eleitoral, etc.).
Tratando-se do dever legal, estão excluídas da proteção as
LEGÍTIMA DEFESA obrigações meramente morais, sociais ou religiosas. Haverá violação de
Várias teorias foram expostas para explicar os fundamentos da domicílio, por ex., se um sacerdote forçar a entrada em domicílio para
legítima defesa. As teoria subjetivas, que a consideram como causa ministrar a extrema-unção.
excludente da culpabilidade, fundam-se na perturbação de ânimo da Não se admite estrito cumprimento do dever legal nos crimes
pessoa agredida ou nos motivos determinantes do agente, que conferem culposos. A lei não obriga a imprudência, negligência ou imperícia.
licitude ao ato de quem se defende, etc. as teoria objetivas, que Entretanto poder-se-á falar em estado de necessidade na hipótese de
consideram a legítima defesa como causa excludente da antijuridicidade, motorista de uma ambulância que dirige velozmente e causa lesão a bem
fundamentam-se na existência de um direito primário do homem de jurídico alheio.
defender-se, na retomada pelo homem da faculdade de defesa que Não há crime na injúria ou difamação proferida por testemunha
cedeu ao estado, na delegação de defesa pelo estado, na colisão de em resposta a perguntas, já que a lei obriga a dizer a verdade.
bens em que o mais valioso deve sobreviver, na autorização para Reconhecendo-se o estrito cumprimento do dever legal em
ressalvar o interesse do agredido, no respeito à ordem jurídica, relação a um autor, o co-autor ou partícipe do fato também não pode ser
indispensável à convivência ou na ausência de injuridicidade da ação responsabilizado.
agressiva. É indiscutível que mais acertadas são as teorias objetivas, VIOLÊNCIA ESPORTIVA
cada uma delas ressaltando uma das características do fenômeno Há esportes que podem provocar danos à integridade corporal
jurídico em estudo. ou à vida (boxe, luta livre, futebol, etc.) havendo lesões ou mortes, não
São requisitos para a existência da legítima defesa: ocorrerá crime por ter o agente atuado em exercício regular de direito.
a reação a uma agressão atual ou iminente e injusta; Haverá crime apenas quando ocorrer excesso do agente, ou seja,
a defesa de um direito próprio ou alheio; quando a pessoa intencionalmente desobedecer às regras esportivas,
a moderação no emprego dos meios necessários à repulsa; e causando resultados lesivos.
o elemento subjetivo.
INTERVENÇÕES MÉDICAS E CIRÚRGICAS
Apontam-se como exercício regular de direito as intervenções
médicas e cirúrgicas, por se tratar de atividades autorizadas pelo Estado,
132

que reconhece, estimula, organiza e fiscaliza a profissão médica. Mas, do princípio da culpabilidade se depreende que, em
Segundo a teoria social da ação, a intervenção médica ou cirúrgica primeiro lugar, toda pena supõe culpabilidade, de modo que não pode ser
constitui fato atípico, uma vez que só impropriamente se poderá dizer castigado aquele que atua com culpabilidade (exclusão da
que há ofensa à integridade física da pessoa quando se amputa, por responsabilidade pelo resultado) e, em segundo lugar, que a pena não
exemplo, a perna do paciente atacado de gangrena, quando se faz um pode superar a medida da culpabilidade (dosagem da pena no limite da
transplante de órgão etc. culpabilidade).
Para que exista o exercício regular de direito é indispensável o Para que se possa dizer que uma conduta é reprovável, ou
consentimento do paciente ou de seu representante legal. Inexistente seja, que há culpabilidade, é necessário que o autor da ação tivesse
este, poderá haver o estado de necessidade em favor de terceiro (o podido agir de acordo com a norma, de acordo com o direito.
próprio paciente), como dispõe o art. 146, § 3º, I. 1. Em primeiro lugar, é preciso estabelecer se o sujeito tem
certo grau de capacidade psíquica que lhe permitia ter consciência e
vontade dentro do que se denomina autodeterminação, ou seja, se tem
CULPABILIDADE ele a capacidade de entender, diante de suas condições psíquicas, a
As palavras culpa e culpado têm sentido léxico e comum de antijuridicidade de sua conduta e de adequar essa conduta à sua
indicar que uma pessoa é responsável por uma falha, uma transgressão, compreensão. A essa capacidade psíquica denomina-se imputabilidade.
ou seja, por ter praticado um ato condenável. Esta é, portanto, a condição pessoal de maturidade e sanidade mental
No Direito Penal da antigüidade, a responsabilidade penal que confere ao agente a capacidade de entender o caráter lícito do fato e
decorria, contudo, do simples fato lesivo, sem que se indagasse da de determinar-se segundo esse entendimento.
“culpa" do autor da conduta. percebeu-se, porém no decorrer da 2. Não basta, porém, a imputabilidade. É indispensável, para o
evolução cultural, que somente podem ser aplicadas sanções ao homem juízo de reprovação, que o sujeito possa conhecer, mediante algum
causador do resultado lesivo se, com o seu comportamento poderia tê-lo esforço de consciência, a antijuridicidade de sua conduta. É
evitado. imprescindível apurar se o sujeito poderia estruturar, em lugar da vontade
Torna-se indispensável para se falar em culpa, verificar se no antijurídica da ação praticada, outra conforme o direito, ou seja, se
fato estavam presentes a vontade ou a previsibilidade. Desses elementos conhecia a ilicitude do fato ou se podia reconhecê-la. Só assim há falta
(vontade e previsibilidade) construíram dois conceitos jurídico-penais ao dever imposto pelo ordenamento jurídico. Essa condição intelectual é
importantes: o dolo (vontade) e a culpa em sentido estrito chamada impossibilidade de conhecimento da antijuridicidade do fato (ou
(previsibilidade). O crime pode, pois, ser doloso (quando o agente quer o da ilicitude do fato).
fato) ou culposo(quando o sujeito não quer, mas dá causa ao resultado 3. É também necessário que, nas circunstâncias do fato, fosse
previsível). Com isso chegou-se à teoria psicológica da culpabilidade: a possível exigir-se do sujeito um comportamento diverso daquele que
culpabilidade reside numa ligação de natureza psíquica (psicológica, tomou ao praticar o fato típico e antijurídico, pois há circunstâncias ou
anímica) entre o sujeito e o fato criminoso. Dolo e culpa, assim, seriam as motivos pessoais que tornam inexigível conduta diversa do agente. É o
formas da culpabilidade. que se denomina exigibilidade da conduta diversa.
Chegou-se à teoria da culpabilidade, ou teoria normativa pura: o Assim, só há culpabilidade se o sujeito, de acordo com as sua
dolo e a culpa pertencem à conduta; os elementos normativos formam condições psíquicas, podia estruturar sua consciência e vontade de
todos a culpabilidade, ou seja, a reprovabilidade da conduta. acordo com o direito (imputabilidade); se estava em condições de poder
A culpabilidade é, assim, a reprovabilidade da conduta típica e compreender a ilicitude da sua conduta (possibilidade de conhecimento
antijurídica. da ilicitude); se era possível exigir-se, nas circunstâncias, conduta
133

diferente daquela do agente (exigibilidade da conduta diversa). São esse, Evoluiu, entretanto, a doutrina, estabelecendo-se outra
portanto, os elementos da culpabilidade. distinção, mais concisa e técnica, entre erro de tipo e erro de proibição. O
erro de tipo é o que incide não sobre o fato, mas sobre os elementos do
EXCLUSÃO DA CULPABILIDADE tipo penal. Assim, o erro sobre um elemento do tipo exclui o dolo e,
Foi visto que a lei prevê a existência de crime quando ocorre portanto, o próprio fato típico. O erro de proibição, por sua vez, não diz
uma causa que exclui a antijuridicidade. Existente a antijuridicidade do respeito à tipicidade, ao tipo penal, mas à sua antijuridicidade. Não
fato típico, ocorre crime. É necessário, porém, para se impor pena, que existe, na hipótese de erro de proibição, a consciência da ilicitude (atual
se verifique se há culpabilidade, ou seja, se existem os elementos que ou parcial) do fato, que é um pressuposto ou elemento da culpabilidade.
compõem a reprovabilidade da conduta. inexistente um deles, não há Desde que inevitável o erro, o agente não pode merecer censura pelo
culpabilidade, condição indeclinável para a imposição da pena. fato que praticou ignorando sua ilicitude. O erro de proibição, portanto,
A lei prevê as causas que excluem a culpabilidade pela não elimina o dolo; o agente pratica um fato típico, mas fica excluída a
ausência de um dos seus elementos reprovabilidade da conduta.
Casos de imputabilidade do sujeito: Foi visto que, para existir culpabilidade, necessário se torna que
Doença mental, desenvolvimento mental incompleto e haja no sujeito ao menos a possibilidade de conhecimento da
desenvolvimento menta retardado (art. 26); antijuridicidade do fato. Quando o agente não tem ou não lhe é possível
Desenvolvimento mental incompleto por presunção legal, do menor esse conhecimento, ocorre o denominado erro de proibição. Há, portanto,
de 18 anos (art. 27); erro de proibição quando o autor supõe, por erro, que o seu
Embriaguez fortuita completa (art. 28, § 1º). comportamento é lícito.
Há ausência de culpabilidade também pela inexistência da O agente no erro de proibição, faz um juízo equivocado sobre
possibilidade de conhecimento do ilícito nas seguintes hipóteses. aquilo que lhe é permitido fazer na vida em sociedade.
Erro inevitável sobre a ilicitude do fato (art. 21); Espécies de erro de proibição:
Erro inevitável a respeito da fato que configuraria uma ignorância ou errada compreensão da lei penal;
descriminante - descriminantes putativas (art. 20, § 1º). erro sobre a existência de uma causa que excluiria a
Obediência à ordem, não manifestamente ilegal, de superior antijuridicidade da conduta;
hierárquico (art. 22, segunda parte). erro que incide sobre a norma proibitiva (não sobre a lei);
Por fim exclui-se a culpabilidade pela inexigibilidade de conduta erro sobre a posição do garantidor;
diversa na coação moral irresistível (art. 22, primeira parte). erro sobre os limites de uma causa de justificação;
erro sobre os pressupostos fáticos das causas de exclusão da
ERRO DE PROIBIÇÃO antijuridicidade etc.
Desde o direito romano, sempre se dividiu o erro em duas
espécies: o erro de fato, que incide sobre o fato que constitui o crime; e o DESCONHECIMENTO DA LEI
erro de direito, que se relaciona com a ignorância ou falsa interpretação Dispõe o artigo 21, em sua primeira parte: “O desconhecimento
da lei. da lei é inescusável.” Sintomaticamente , o legislador refere-se apenas
O CP de 1940, a distinção foi mantida. Previa-se no art. 16 que ao “desconhecimento da lei” e não sobre a errada compreensão da lei,
a ignorância ou a errada compreensão da lei não isentavam o agente da como no art. 16. Ignorância é o completo desconhecimento a respeito da
responsabilidade penal. No art. 17 previa-se a relevância do erro de fato, realidade. O erro é o conhecimento falso, equivocado, a respeito dessa
isentando-se o autor da pena s dispondo o § 1º do citado artigo a respeito realidade. Embora a palavra desconhecer possa ser interpretada também
das descriminantes putativas. como um falso conhecimento, é visível o intuito do legislador em
134

distinguir a mera ausência de conhecimento da lei, inescusável, do erro Existe na coação moral uma ameaça, e a vontade do coacto
de proibição, que pode ser escusável. não é livre, embora possa decidir pelo que considere para si um mal
O agente supõe ser lícito seu comportamento, porque menor; por isso trata-se de hipótese em que se exclui não a ação, mas a
desconhece a existência da lei penal que o proíba. Trata-se do princípio culpabilidade, por não lhe ser exigível comportamento diverso. É
ignorantia legis neminem excusat: promulgada e publicada uma lei, torna- indispensável, porém, que a coação seja irresistível, ou seja, inevitável,
se ela obrigatória em relação à todos, não sendo pensável que, dentro do insuperável, inelutável, uma força de que o coacto não se pode subtrair,
mesmo estado, as leis possam ter validade em relação a uns e não em tudo sugerindo situação à qual ele não se pode opor, recusar-se ou fazer
relação a outros que eventualmente a ignorem. face, mas tão somente sucumbir, ante o decreto do inexorável. É
Não pode escusar-se o agente com a simples alegação formal indispensável que a acompanhe um perigo sério e atual de que o coagido
de que não sabia haver uma lei estabelecendo punição para o fato não é possível se eximir, ou que lhe seja extraordinariamente difícil
praticado. suportar. Nesta hipótese não se pode impor ao indivíduo a atitude heróica
de cumprir o dever jurídico, qualquer que seja ao dano a que se arrisque.
COAÇÃO IRRESISTÍVEL E OBEDIÊNCIA HIERÁRQUICA A ameaça geradora da coação moral irresistível pode ter por
São excludentes da culpabilidade a coação irresistível e a objeto não a pessoa do coacto, mas outras que estejam
obediência hierárquica nos termos previstos pelo art. 22: “se o fato é sentimentalmente ligadas a este (esposa, filhos, amigos etc.).
cometido sob coação irresistível, ou em estrita obediência à ordem não A coação pressupõe sempre três pessoas: o agente, a vítima e
manifestamente ilegal, de superior hierárquico, só é punível o autor da o coator.
coação ou da ordem.” Pode-se supor a hipótese de coação moral irresistível putativa.
A coação existe quando há o emprego da força física ou de Suponha-se que um empregado receba um bilhete em que se ameaça
grave ameaça para obrigar o sujeito a praticar um crime. Pode ser assim exterminar seu filho que foi seqüestrado, obrigando-o a colaborar num
física (vis corporalis ou vis absoluta) ou moral ( vis compulsiva). Na roubo contra a empresa; posteriormente, descobre-se que o bilhete era
coação física, o coator emprega meios que impedem o agente de endereçado a um colega. Há coação moral irresistível porque o sujeito,
desistir porque seu movimento corpóreo ou sua abstenção do movimento por erro, estava submetido ao constrangimento e também não se lhe
(na omissão) estão submetidos fisicamente ao coator. Não existe na podia exigir comportamento diverso.
coação física, ação voluntária do coacto e não se pode, falar em conduta,
o que leva à afirmação na doutrina da inexistência do próprio fato típico. OBEDIÊNCIA HIERÁRQUICA
Pode a força física, porém não eliminar a ação como na A segunda causa excludente da culpabilidade do art. 22 refere-
hipótese de torturar-se o gerente de uma agência bancária para que se à prática do crime “em estrita obediência à ordem, não
forneça a combinação do cofre ou assine uma autorização para retirada manifestamente ilegal, de superior hierárquico”. Trata-se, segundo a
de dinheiro, obtendo o coator a sua colaboração na prática do roubo ou doutrina, de uma caso especial de erro de proibição. Supondo obedecer
extorsão. A atividade do gerente, ao declinar o número da combinação do a uma ordem legítima do superior, o agente pratica o fato incriminado.
cofre ou assinar a autorização, constitui-se em ação porque há vontade A dirimente exige que a ordem não seja manifestamente ilegal
(embora não vontade livre), excluindo-se a culpabilidade pela coação uma vez que, se flagrante a ilicitude do comando da determinação
moral. O coacto pratica a ação, não pela violência que foi empregada, superior, o sujeito não deve agir.
mas pelo temor de que ela se repita e por não lhe sobrarem forças ara Não sendo a ordem manifestamente ilegal, se o agente não tem
resistir. condições de se opor a ela em decorrência das conseqüências que
podem advir no sistema de hierarquia e disciplina a que está submetido
COAÇÃO MORAL IRRESISTÍVEL inexistirá a culpabilidade pela coação moral irresistível, estando a
135

ameaça implícita na ordem ilegal. Em vez de erro de proibição, há se indagando se essa anomalia causou qualquer perturbação que retirou
inexigibilidade de conduta diversa. do agente a inteligência e a vontade do momento do fato.
Para que o subordinado cumpra a ordem e se exclua a O segundo é o sistema psicológico, em que se verificam
culpabilidade é necessário que aquela: apenas as condições psíquicas do autor no momento do fato, afastada
seja emanada de autoridade competente; qualquer preocupação a respeito da existência ou não de doença mental
tenha o agente atribuições para a pratica doa to; e ou distúrbio psíquico patológico.
não seja a ordem manifestamente ilegal. O terceiro critério é denominado sistema biopsicológico (ou
biopsicológico normativo ou misto), adotado pela lei brasileira no artigo
Não se escusará, pois, aquele que obedecer ordem de 26, que combina os dois anteriores. Por ele, deve verificar-se, em
autoridade incompetente ou o que praticar a conduta fora de suas primeiro lugar, se o agente é doente mental ou tem desenvolvimento
atribuições. mental incompleto ou retardado, e averiguar-se se era ele capaz de
Refere-se a lei apenas à subordinação hierárquica, que é de entender o caráter ilícito do fato
direito administrativo, sendo subordinados os funcionários de menor
graduação em relação aos chefes, o soldado ao cabo ou sargento, etc. INIMPUTABILIDADE POR DOENÇA MENTAL OU
estão excluídas do dispositivo, evidentemente, as relações familiares DESENVOLVIMENTO MENTAL INCOMPLETO OU RETARDADO
(pai-filho), de emprego (patrão-empregado), religiosas (sacerdote-fiéis) Dispõe o art. 26: “É isento de pena o agente que, por doença
etc. que não implicam subordinação hierárquica. mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao
tempo da ação ou omissão, inteiramente incapaz de atender o caráter
IMPUTABILIDADE ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento”.
Foi visto que a culpabilidade é um juízo de reprovação e que Trata-se da primeira hipótese de causa de exclusão da
somente pode ser responsabilizado o sujeito quando poderia ter agido imputabilidade. Menciona a lei a doença mental. A expressão abrange
em conformidade com a norma penal. É necessário saber, portanto, todas as moléstias que causam alterações mórbidas à saúde mental.
quando se pode atribuir ao agente a pratica do crime, para se poder falar Entre elas, têm-se as chamadas psicoses funcionais: a esquizofrenia, a
em censurabilidade da conduta. de acordo com a teoria da PMD, a paranóia, etc. são também doenças mentais a epilepsia, a
imputabilidade moral (livre arbítrio), o homem é um ser inteligente e livre, demência senil, a psicose alcoólica, a paralisia progressiva, a sífilis
podendo escolher entre o bem e o mal, entre o certo e o errado, e por cerebral, a arteriosclerose cerebral, a histeria, etc.
isso a ele se pode atribuir a responsabilidade pelos atos ilícitos que Alguns doutrinadores incluem do dispositivo os estados
praticou. Essa atribuição é chamada imputação, de onde provém o termo crepusculares não patológicos, como o sono normal crepuscular, a febre,
“imputabilidade”, elemento (ou pressuposto) da culpabilidade. a sonambulismo, o desmaio, a hipnose por sugestão, etc.
Imputabilidade é, assim, a aptidão para ser culpável. As doenças mentais podem ser orgânicas (paralisia
Há imputabilidade quando o sujeito é capaz de compreender a progressiva, sífilis cerebral, tumores cerebrais, etc.), tóxicas (psicose
ilicitude de sua conduta e de agir de acordo com seu entendimento. alcoólica ou por medicamentos) e funcionais (psicose senil). De acordo
Há vários sistemas ou critérios nas legislações para determinar com a duração da moléstia pode ser crônica ou transitória.
quais os que, por serem inimputáveis, estão isentos de pena pela Refere-se o art. 26 ainda ao desenvolvimento mental
ausência de culpabilidade. incompleto ou retardado. Têm desenvolvimento mental incompleto, os
O primeiro é o sistema biológico (ou etiológico), segundo o qual silvícolas não adaptados à civilização, e os surdos mudos que não
aquele que apresenta uma anomalia psíquica é sempre inimputável, não receberam instrução adequada.
136

O desenvolvimento mental retardado é o estado mental dos terra, minando o obstáculo que, afinal, vem a ruir. São paixões o amor, o
oligofrênicos (nos graus de debilidade mental, imbecilidade e idiotia). ódio, a avareza, a ambição, o ciúme, o patriotismo, a piedade, etc.
Só é inimputável aquele que, ao tempo da conduta (ação ou Pode-se dizer que a diferença entre a emoção e a paixão reside
omissão). Era inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato: o no fato de ser a primeira aguda e de curta duração e a segunda crônica e
agente pode entender o fato, mas não o caráter ilícito de sua conduta e, de existência mais estável.
nessa hipótese, é inimputável.
É imputável aquele que, embora portador de doença mental ou EMBRIAGUEZ
desenvolvimento mental incompleto ou retardado, tem capacidade de A embriaguez pode ser conceituada como a intoxicação aguda
entender a ilicitude de seu comportamento e de se autodeterminar. e transitória causada pelo álcool ou substância de efeitos análogos que
A prova da inimputabilidade do acusado é fornecida pelo exame privam o sujeito da capacidade normal de entendimento. Nos termos
pericial. legais, quanto à sua origem, pode ser classificada em voluntária, culposa
e fortuita.
MENORIDADE A embriaguez voluntária é a que existe quando o agente
São inimputáveis os menores de 18 anos por expressa pretende embriagar-se, procurando intencionalmente o estado de
disposição do art. 27: “Os menores de dezoito anos são penalmente ebriedade.
inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação Será preordenada se o agente bebe para melhor cometer o
especial”. Trata-se de uma presunção absoluta de inimputabilidade. crime.
É considerado imputável aquele que comete o fato típico aos A embriaguez culposa ocorre quando o agente, não
primeiros momentos do dia em que completa 18 anos, pouco importando pretendendo embriagar-se, bebe demais, imprudentemente, chegando
a hora exata de seu nascimento. O art. 1º da Lei nº 810, de 6-9-1949, assim ao estado etílico.
que define o ano civil, considera ano e período de doze meses contados A embriaguez fortuita (ou acidental) decorre de caso fortuito ou
do dia do início ao dia e mês correspondentes do ano seguinte, sendo força maior, situações em que o sujeito não quer embriagar-se nem fica
impossível que alguém tenha 18 anos pela lei civil e ainda não tenha embriagado por culpa sua.
para a lei penal.
Não há que se falar em inimputabilidade, também, se a CONCURSO DE PESSOAS
execução do crime se iniciou numa noite e se prolongou até o dia
seguinte, em que o agente atingia a maioridade. Um crime pode ser praticado por uma ou várias pessoas em
Comprovada a menoridade penal do réu, o processo deve ser concurso. Pode o sujeito, isoladamente, matar, subtrair, falsificar
anulado ab initio por ausência de legitimidade passiva. documento, omitir socorro a pessoa ferida etc. freqüentemente, todavia, a
Não excluem a imputabilidade penal a emoção ou a paixão (art. infração penal é realizada por duas ou mais pessoas que concorrem para
28, I). Emoção é um estado afetivo que, sob uma impressão atual o evento. Nesta hipótese, está-se diante de um caso de concurso de
produz repentina e violenta perturbação do equilíbrio psíquico. São pessoas, fenômeno conhecido como concurso de agentes, concurso de
emoções a ira, o medo, a alegria, a surpresa, a vergonha, o prazer delinqüentes, co-autoria, co-deliqüência ou participação.
erótico etc. O concurso de pessoas pode ser definido como a ciente e
A paixão é uma profunda e duradoura crise psicológica que voluntária participação de duas ou mais pessoas na mesma infração
ofende a integridade do espírito e do corpo, o que pode arrastar muitas penal. Há, na hipótese, convergência de vontades para um fim comum,
vezes o sujeito ao crime. É duradoura como uma força que se infiltra na que é a realização do tipo penal sendo dispensável a existência de um
acordo prévio entre as várias pessoas; basta que um dos delinqüentes
137

esteja ciente de que participa da conduta de outra para que se esteja lei, que torna relevante qualquer modo de concurso, que transforma em
diante do concurso. típica uma conduta de per si atípica. Há na participação uma contribuição
Deve-se distinguir o concurso de pessoas, que é um concurso causal, embora não totalmente indispensável, ao delito e também a
eventual, e assim pode ocorrer em qualquer delito passível de ser vontade de cooperar na conduta do autor ou co-autores.
praticado por uma só pessoa (crimes unissubjetivos), do chamado Instiga aquele que age sobre a vontade do autor, fazendo
concurso necessário.. existem numerosos delitos que, por sua natureza nascer neste a idéia da prática do crime ou acoroçoando a já existente,
intrínseca, só podem ser cometidos por duas ou mais pessoas, como o de modo determinante na resolução do autor, e se exerce através do
adultério a bigamia, a rixa, o crime de quadrilha ou bando, etc. são estes mandato, persuasão, conselho, comando, etc.
chamados crimes de concurso necessário ou crimes plurissubjetivos. Cúmplice é aquele que contribui para o crime prestando auxílio
ao autor ou partícipe, exteriorizando-se a conduta por um comportamento
CO-AUTORIA ativo (o empréstimo da arma, a revelação do segredo de um cofre etc.).
O concurso de pessoas pode realizar-se através da co-autoria e não se exclui, porém, a cumplicidade por omissão nas hipóteses em que
da participação. Co-autor é quem executa, juntamente com outras o sujeito tem o dever jurídico de evitar o resultado. Cita-se como exemplo
pessoas, a ação ou omissão, que configura o delito. Assim, se duas a omissão do empregado que não tranca o cofre para que seja facilitado
pessoas disparam suas armas, alvejando a vítima e causando-se a a ação do autor do furto com o qual colabora o partícipe.
morte, responderão como co-autores.
Há, na co-autoria, a decisão comum para a realização do QUALIFICADORAS E AGRAVANTES
resultado da conduta. O concurso de pessoas pode ser uma qualificadora de delito.
Inexistente a consciência de cooperação na conduta comum, Em razão da maior facilidade para a execução do crime e a conseqüente
não haverá concurso de pessoas, restando a autoria colateral (ou co- diminuição do risco do agente, a lei reforça a garantia penal quando, em
autoria colateral ou imprópria). Caso duas pessoas, ao mesmo tempo, determinados delitos, há associação de delinqüentes.
sem conhecerem a intenção uma da outra, dispararem sobre a vítima,
responderão cada uma por um crime se os disparos de ambas forem CONCURSO E CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME
causas da morte. Se a vítima morreu apenas em decorrência da conduta Dispõe o art. 30: “Não se comunicam as circunstâncias e as
de uma, a outra responderá por tentativa de homicídio. Havendo dúvida condições de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime”.
insanável quanto à causa da morte, ou seja, sobre a autoria, a solução Em primeiro lugar, estabeleceu a lei nova a distinção entre
deverá obedecer ao princípio in dubio pro reu, punindo-se ambos por circunstâncias e condições pessoais. Enquanto as condições referem-se
tentativa de homicídio. às relações do agente com a vida exterior, com outros seres e com as
coisas (menoridade, reincidência etc.), além de indicar um estado
PARTICIPAÇÃO (parentesco, casamento), as circunstâncias são elementos que, embora
Fala-se em participação, em sentido estrito, como a atividade não essenciais à infração penal, a ela se integram e funcionam para
acessória daquele que colabora para a conduta do autor com a prática de moderar a qualidade e quantidade da pena (motivo do crime,
uma ação que, em si mesma, não é penalmente relevante. Essa conduta desconhecimento da lei, confissão espontânea, etc.).
somente passa a ser relevante quando o autor, ou co-autores, iniciam ao Refere-se a lei às condições pessoais (ou subjetivas) em
menos a execução do crime. O partícipe não comete a conduta descrita oposição às condições reais (ou objetivas). São estas as circunstâncias
pelo preceito primário da norma, mas pratica uma atividade que contribui referentes ao fato objetivamente considerado, em que não se incluem as
para a realização do delito. Trata-se de uma das hipóteses de condições ou particularidades do agente.
enquadramento de subordinação ampliada ou por extensão, prevista na
138

As condições e circunstâncias pessoais não se comunicam resultado, ainda que não se possa saber quem praticou a ação prevista
entre os co-autores ou partícipes. Assim, cada sujeito responderá de no núcleo do tipo.
acordo com as suas condições (menoridade, reincidência, parentesco) e A exceção encontra-se no art. 29, § 2º, que determina seja o
circunstância (motivo fútil, de relevante valor social ou moral, de agente punido pelo crime menos grave, de que queria participar, mas a
prescrição etc.). ressalva vale apenas para as hipóteses de participação.
Entretanto, dispõe a lei que as circunstâncias de caráter MULTIDÃO DELINQÜENTE
pessoal “elementares” do crime comunicam-se entre os agentes. Não se Afastada a hipótese de associação criminosa (quadrilha ou
trata na espécie, de verdadeiras “circunstâncias”, mas de “elementos” bando), é possível o cometimento de crime pela multidão delinqüente,
que, necessariamente, fazem parte do tipo penal. Assim, aquele que como nas hipóteses de linchamento, depredação, saque, etc.
auxilia, por exemplo, o funcionário público na prática do peculato responderão todos os agentes por homicídio, dano, roubo, nesses
responde por esse crime ainda que não exerça função pública. exemplos, mas terão as penas atenuadas aqueles que cometerem o
Não se comunicam porém, as causas pessoais de exclusão de crime sob a influência de multidão em tumulto, se não o provocaram. A
pena (como as imunidades diplomáticas) ou algumas espécies de causas pena, por sua vez, será agravada para os líderes, os que promoveram ou
de extinção da punibilidade (indulto, retratação etc.). organizaram a cooperação no crime ou dirigiram a atividade dos demais
Determinando a lei que não se comunicam as circunstâncias de agentes (art. 62, I).
caráter pessoal, a contrario sensu determina que são comunicáveis as de
caráter objetivo. AS PENAS
Pelas mesmas razões, não se comunicam as circunstâncias CARACTERÍSTICAS E CLASSIFICAÇÃO
elementares de caráter pessoas quando conhecidas do partícipe. Devem existir na penas várias características: legalidade,
personalidade, proporcionalidade e inderrogabilidade.
CONCURSO E EXECUÇÃO DO CRIME As penas corporais atingem a própria integridade física do
Art. 31: “O ajuste, a determinação e o auxílio, salvo disposição criminoso. São os açoites, as mutilações e a morte.
expressa em contrário, não são puníveis, se o crime não chega, pelo As penas privativas de liberdade são as mais utilizadas nas
menos, a ser tentado”. legislações modernas, apesar do consenso da falência do sistema
Ajuste é o acordo feito para praticar crime. prisional. Podem ser divididas em prisão perpétua e prisão temporária,
Determinação é a provocação para que surja em outrem a sendo a primeira vedada em dispositivo constitucional brasileiro (art. 5º,
vontade de praticar o crime. XLVII, “b”). Originaram-se as penas privativas de liberdade de outras
Instigação é a estimulação de idéia criminosa já existente. penas: enquanto aguardavam a execução (pena de morte, desterro,
Auxílio é a ajuda material, prestada na preparação ou execução galés etc.), os sentenciados ficavam privados da liberdade de locomoção,
do crime. passando a ser a prisão, depois, a própria sanção penal. Tem sido
O planejamento de duas ou mais pessoas para a prática do bastante combatida, afirmando-se ser ela instrumento degradante,
crime (exceto o caso do crime de quadrilha ou bando), o mandato, ou destruidora da personalidade humana e incremento à criminalidade por
conselho, a ajuda, o induzimento, etc. não incidem na esfera penal imitação e contágio moral.
enquanto não se puder caracterizar a tentativa. As penas restritivas de liberdade limitam em parte o poder de
AUTORIA INCERTA locomoção do condenado, embora não sejam eles recolhidos à prisão.
Aceita a teoria monista, o código resolve qualquer problema Exemplos são o banimento (perda dos direitos políticos e de habitar o
com relação à autoria incerta, determinando que todos respondem pelo país), degredo ou confinamento (residência em local determinado pela
139

sentença), desterro (saída obrigatória do território da comarca e do hediondo, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins
domicílio da vítima) etc. e de terrorismo uma vez que, nesses casos, a pena deve ser cumprida
As penas pecuniárias são as que acarretam diminuição do integralmente em regime fechado.
patrimônio do condenado ou o absorvem totalmente, sendo suas Por outro lado, instituiu-se também a regressão, ou seja, a
modalidades a multa e o confisco. (confisco é o perdimento dos bens do transferência de um regime para outro mais rigoroso. O condenado que
agente). cumpre pena em regime aberto pode ser transferido para o regime semi-
As penas privativas e restritivas de direitos retiram ou diminuem aberto ou fechado, e o que cumpre a sanção no regime semi-aberto será
direitos dos condenados. recolhido a estabelecimento de segurança máxima ou média. Estabelece
o art. 118 da LEP, obrigatoriamente, a regressão para qualquer dos
REGIMES regimes mais rigorosos quando o sentenciado pratica fato definido como
São três os regimes de cumprimento das penas privativas de crime doloso ou falta grave, ou sofre condenação, por crime anterior, cuja
liberdade. pena, somada ao restante da pena em execução, torna incabível o
regime.
Regime fechado, com a execução em estabelecimento de Comete falta grave o condenado à pena privativa de liberdade
segurança máxima ou média. A pena é cumprida em penitenciária e o que: incitar ou participar de movimento que subverter a ordem ou a
condenado fica sujeito a trabalho no período diurno e a isolamento disciplina; fugir; possuir, indevidamente, instrumento capaz de ofender a
durante o repouso noturno em cela individual com dormitório, aparelho integridade física de outrem; provocar acidentes de trabalho; descumprir,
sanitário e lavatório. no regime aberto, as condições impostas; inobservar os deveres
Regime semi-aberto - a pena deve ser cumprida em colônia referentes à obediência ao servidor e respeito a qualquer pessoa com
agrícola, industrial ou similar, podendo ser o condenado alojado em quem deva relacionar-se à execução do trabalho, das tarefas e das
compartimento coletivo ordens recebidas.
Regime aberto - fundado na autodisciplina e senso de
responsabilidade do condenado, deverá ele, fora do estabelecimento e TRABALHO DO PRESO
sem vigilância, trabalhas, freqüentar curso ou exercer outra atividade Impõe-se ao preso o trabalho obrigatório, remunerado e com as
autorizada, permanecendo recolhido durante o repouso noturno e nos garantias dos benefícios da previdência social (art. 39). Trata-se de um
dias de folga na casa do albergado, que deverá conter, além dos dever social e condição de dignidade humana, tendo finalidade educativa
aposentos para os presos, lugar adequado para cursos e palestras e e produtiva.
instalações para os serviços de fiscalização e orientação dos Tratando-se do regime fechado, o trabalho será em comum
condenados. dentro do estabelecimento, na conformidade das aptidões ou ocupações
PROGRESSÃO E REGRESSÃO anteriores do condenado, desde que compatíveis com a execução da
Iniciado o cumprimento da pena no regime estabelecido na pena, sendo admissível o trabalho externo em serviços e obras públicas
sentença, possibilita-se ao sentenciado, de acordo com o sistema (art. 34, § 3º). Para o trabalho externo exige-se, além disso, o
progressivo, a transferência para regime menos rigoroso, desde que cumprimento mínimo de um sexto da pena (art. 37 da LEP).
tenha cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e o Em regime semi aberto, o trabalho é realizado em colônia
mérito do condenado recomendar a progressão. A decisão do juiz do agrícola, industrial ou estabelecimento similar, sendo admissível o
processo é provisória e, a partir do regime fechado, pode-se transferir o trabalho externo, bem como a freqüência a cursos supletivos,
sentenciado para o regime semi-aberto e deste para o regime aberto. profissionalizantes, de instrução de segundo grau ou superior (art. 35).
Não cabe a progressão, evidentemente, nas hipóteses de crime
140

Embora o trabalho do preso não esteja sujeito ao regime de criminoso é recolhido à prisão antes da prolação da sentença
CLT, será ele remunerado, mediante prévia tabela, não podendo a condenatória definitiva que autoriza a execução da pena.
remuneração ser inferior a três quartos do salário mínimo. Computa-se, também, por razões humanitárias, o tempo em
O condenado por crime político não está obrigado ao trabalho que o condenado esteve internado em estabelecimento destinado ao
(art. 200 da LEP). desconto de medida de segurança, inclusive quando a transferência para
este estabelecimento decorreu da superveniência de doença mental (art.
REMIÇÃO 41). Quando, todavia, a doença mental ou a perturbação da saúde
A remição é uma nova proposta inserida na legislação penal mental eclodir durante a execução da pena privativa de liberdade, o juiz
pela Lei nº 7219/84, tendo como finalidade mais expressiva a de abreviar, poderá determinar a substituição dessa pena por medida de segurança
pelo trabalho, parte do tempo da condenação. Prevê o art. 126 da LEP: (art. 183 da LEP). Nessa hipóteses o prazo de recolhimento do
“O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semi aberto sentenciado passará a ser regulado de acordo com as normas que
poderá remir, pelo trabalho, parte do tempo de execução da pena”. O regem a medida de segurança e não mais de acordo com os dispositivos
instituto de remição está consagrado no código penal espanhol (art. 100) relativos à execução da pena.
e sua origem remonta ao direito penal militar da guerra civil espanhola, Inovando, inclui a lei nova na detração o tempo em que o
estabelecido que foi pelo decreto de 28 de maio de 1937 para os condenado esteve submetido à prisão administrativa.
prisioneiros de guerras e os condenados por crimes especiais. Classifica-se a prisão em dois ramos: a prisão penal, decorrente
A contagem do tempo será feita, nos termos do art. 126, § 1º, da prática de crime ou contravenção, e a prisão civil em sentido amplo,
da LEP, à razão de um dia de pena por três de trabalho, e alcançará, que não decorre da prática do ilícito penal. Esta última subdivide-se em
conforme o disposto no § 2º do mesmo dispositivo, o preso prisão administrativa e prisão civil em sentido estrito.
impossibilitado de prosseguir no trabalho por ter sido vítima de acidente A prisão civil em sentido estrito, ou seja, a prisão por dívida civil,
durante o trabalho prisional. É praticamente pacífico na jurisprudência somente é permitida ao depositário infiel e ao responsável pelo
que o tempo remido deve ser computado como de pena privativa de inadimplemento da obrigação alimentar voluntário e inescusável.
liberdade cumprida pelo condenado e não simplesmente abatido do total Questão discutida e não resolvida pela lei nova é a de saber se,
da sanção aplicada. para a aplicação do art. 42, deve existir ou não o nexo entre o motivo da
Como a remição é instituto criado pela LEP, tem ela caráter prisão e a pena que cumpre o sentenciado.
geral, abrangendo todos os condenados sujeitos a esse diploma legal. São várias as correntes a respeito do assunto. Em uma
orientação mais restrita, e atualmente em declínio, afirma-se que a prisão
DETRAÇÃO computável na duração da pena deve relacionar-se com o fato que é
Com a rubrica de “detração”, determina o art. 42: “Computam- objeto de condenação.
se, na pena privativa de liberdade e na medida de segurança, o tempo de A orientação mais liberal é a mais aceitável sendo de boa
prisão provisória, no Brasil ou no estrangeiro, o de prisão administrativa e política criminal que seja computado em favor do condenado o tempo de
o de internação em qualquer dos estabelecimentos referidos no artigo prisão que, afinal, não deveria ter cumprido. Aliás a CF prevê que deve
anterior”. ser indenizado o condenado por erro judiciário, assim como aquele que
A prisão provisória a que se refere a lei é a prisão processual ficar preso além do tempo fixado na sentença (art. 5º, inc. LXXV) e não
que pode ocorrer em virtude de atuação em flagrante delito, de prisão há indenização mais adequada para o tempo de prisão provisória que se
temporária, de prisão preventiva, de sentença de pronúncia e de decisão julgou indevida pela absolvição, do que ser ele computado n tempo da
condenatória recorrível, ou seja, em todas as hipóteses em que o pena imposta por outro delito.
141

Tem-se decidido também que é computado o prazo de prisão As tarefas serão atribuídas conforma as aptidões do condenado
albergue ou de regime de semiliberdade ainda que irregularmente e devem ser cumpridas durante oito horas semanais, aos sábados,
concedido o benefício. Evidentemente não se computa o prazo em que o domingos e feriados ou em dias úteis, de modo a não prejudicar a
condenado esteve sob sursis, já que nessa hipótese não esteve ele jornada normal de trabalho (art. 46, parágrafo único, do CP e 149, § 1º,
recolhido à prisão e a execução da pena esteve suspensa. Por falta de da LEP). Permite-se o desdobramento dos horários, conforme a
previsão legal, não há que se falar em detração quando é aplicada pena determinação do juiz, a fim de não ser prejudicada a atividade laborativa
de multa. normal do condenado. Não há limitação ao número mínimo de horas por
dia de trabalho, obedecendo-se apenas ao tempo exigido semanalmente.
PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS
No que tange à sua aplicabilidade, as penas podem ser INTERDIÇÃO TEMPORÁRIA DOS DIREITOS
classificadas como: As penas de interdição temporária de direitos são:
únicas, quando existe uma só pena e não há qualquer opção para o proibição do exercício do cargo, função ou atividade pública, bem
julgador; como de mandato eletivo;
conjuntas, nas quais se aplicam duas ou mais penas (prisão e proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício que
multa) ou uma pressupõe a outra (prisão com trabalhos forçados); dependem de habilitação especial, de licença ou autorização do poder
paralelas, quando se pode escolher entre duas formas de aplicação público;
da mesma espécie de pena (por exemplo, reclusão e detenção); suspensão da autorização ou de habilitação para dirigir veículos
alternativas, quando se pode eleger entre penas de naturezas (art. 47).
diversas (reclusão ou multa por exemplo). O legislador elevou as antigas penas acessórias de interdições
A lei nº 7209, como será visto, deu ênfase ao sistema de penas de direitos à categoria de penas principais e autônomas, com categoria
alternativas, abrindo ao julgador um leque de possibilidades na aplicação de alternativas às penas privativas de liberdade inferiores a um ano ou as
das sanções. que seriam aplicadas aos autores de crimes culposos. Entende-se que
A Lei nº 7209 inseriu no CP o sistema de penas alternativas (ou essa espécie de sanção atinge todos os interesses econômicos do
substitutivas) de caráter geral, em vez de se propor a alternatividade condenado sem acarretar os males representados pelo recolhimento à
apenas para determinados delitos na parte especial do estatuto prisão por curto prazo e que os interditos sentirão de modo muito mais
repressivo. As penas substitutivas foram denominadas penas restritivas agudo os efeitos da punição do tipo restritivo ao patrimônio. Ademais,
de direitos e classificadas no art. 43 em: tem maior significado na prevenção, já que priva o sentenciado da prática
prestação de serviços à comunidade; de certas atividades sociais em que se mostrou irresponsável ou
interdição temporária dos direitos; perigoso.
limitação de fim de semana.
A multa passou também a ser substitutiva da pena privativa de LIMITAÇÕES DE FIM DE SEMANA
liberdade, quando esta, aplicada, não for superior a seis meses. A última das penas restritivas de direitos previstas nos art. 43,
III, e 48 é a limitação de fim de semana. Originariamente instituído na
PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE Alemanha Ocidental, o confinamento de fim de semana foi adotado, quer
Dispõe o art. 46: “a prestação de serviços à comunidade como pena sui generis, quer como forma de execução, na Bélgica, na
consiste na atribuição ao condenado de tarefas gratuitas junto a Espanha, Portugal (prisão por dias livres), Mônaco, França e África do
entidades assistenciais, hospitais, escolas, orfanatos e outros Sul. No Brasil, é uma das penas substitutivas e consiste na obrigação de
estabelecimentos congêneres, em programas comunitários ou estatais”. permanecer, aos sábados e domingos, por cinco horas diárias, em casa
142

de albergado ou outro estabelecimento adequado, podendo ser seus parágrafos (art. 58), e o mesmo ocorre quando é aplicada em
ministrado aos condenados durante essa permanência cursos e substituição à pena privativa de liberdade, nos termos do art. 44, 58,
palestras, ou atribuídas a eles atividades educativas (art. 48 e parágrafo parágrafo único, e 60, § 2º.
único). A partir do art. 54, porém, o código prevê a cominação e
Em sua essência, foi essa pena criada para o fracionamento da aplicação das penas restritivas de direitos. Não estão elas cominadas
pena privativa de liberdade de curta duração, de tal forma que a sanção abstratamente para cada tipo penal, mas são aplicáveis a qualquer deles,
fosse cumprida apenas nos fins de semana. Em termos da lei pátria, independentemente de cominação na parte especial, em substituição à
porém, como deve ter “a mesma duração da pena privativa de liberdade pena privativa de liberdade fixada em quantidade inferior a um ano, ou
substituída”, a limitação de fim de semana corresponderá apenas a dois nos crimes culposos, qualquer que seja sua duração. É o que determina
dias de cada semana do prazo estipulado para a pena privativa de o art. 54. Assim, após aplicada pelo juiz a pena privativa de liberdade,
liberdade aplicada inicialmente pelo juiz na sentença condenatória. conforme cominação específica do crime pelo qual o réu foi condenado,
Vantagens do instituto: poderá o magistrado do processo substituí-la pela pena restritiva de
a permanência do condenado junto à sua família, ocorrendo o seu direito aplicável na espécie. Essa substituição se dá de tal forma que a
afastamento apenas nos dias dedicados ao repouso semanal; duração da pena restritiva de direito é a mesma da pena privativa de
a possibilidade de reflexão sobre o ato cometido, no isolamento a liberdade fixada inicialmente e substituída, ex vi do disposto no art. 55.
que é mantido o condenado; Somente após o trânsito em julgado da sentença que aplicou a
a permanência do apenado em seu trabalho, evitando, assim, prestação de serviços ou de limitação de fim de semana é que se
dificuldades materiais para a sua família, decorrentes da ausência do determinará, no juízo da execução, a forma de cumprimento dessas
chefe; sanções, ajustadas às condições pessoais do condenado, às
ausência dos malefícios advindos do contato do apenado com características do estabelecimento da entidade ou programa comunitário
condenados mais perigosos, o que fatalmente ocorreria, na hipótese de ou estatal (art. 46, parágrafo único, do CP, e 147 a 155 da LEP).
execução da pena de forma contínua em isolamento celular; Permiti-se ainda a substituição da pena privativa de liberdade
o abrandamento da pena acessória de ‘rejeição social’ que pela multa, que passa a ser nessa hipótese também uma pena
normalmente marca o condenado recolhido a um estabelecimento alternativa. Determina a lei a faculdade do juiz de impor a pena
penitenciário; pecuniária quando for aplicada a pena privativa de liberdade não superior
a oportunidade de se apenas determinados delinqüentes, a seis meses, observando-se, no caso, os critérios estabelecidos no
chamados de ‘colarinho branco’, que por via de regra se furtam à ação da artigo 44, II e III, ou seja, desde que o sentenciado não seja reincidente e
justiça. que as condições judiciais indiquem ser ela suficiente (art. 60, § 2º).
Assim, a aplicação da pena de multa, nessas hipóteses, independe de
COMINAÇÃO cominação no tipo penal específico.
Diante da criação do sistema de substituição das penas
privativas de liberdade pelas penas alternativas, obrigou-se o legislador a SUBSTITUIÇÃO
inserir um capítulo referente ao seu mecanismo, que não poderia situar- A substituição da pena privativa de liberdade por uma ou mais
se repetitivamente em cada modalidade se delito. restrição de direitos ou de multa depende da existência dos requisitos
Quanto às penas privativas de liberdade continuam elas a mencionados no artigo 44.
terem seus limites estabelecidos na sanção correspondente a cada tipo Em primeiro lugar, como pressuposto objetivo, o juiz só poderá
legal (art. 53), como aliás ocorria na legislação anterior. A pena de multa, proceder à substituição se a pena privativa de liberdade aplicada
porém, prevista em cada tipo legal, tem os limites fixados no art. 49 e inicialmente for inferior a um ano (para as penas restritivas de direitos) ou
143

até seis meses (para pena de multa) (art. 44, e 60, § 2º). Tratando-se de prisão simples fixada em princípio. Também não pode o juiz fixar
crimes culposos, a pena privativa de liberdade aplicada, igual ou superior diretamente a pena restritiva de direito, que embora autônoma, tem
a um ano, pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos e multa caráter substitutivo da pena privativa de liberdade.
ou por duas penas restritivas de direitos, exeqüíveis simultaneamente
(art. 44, parágrafo único). Nessa hipótese, obrigatoriamente, o juiz, se EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE
efetuar a substituição, deverá aplicar duas penas cumulativas que podem A prescrição é a perda do direito de punir do Estado pelo
ser executadas ao mesmo tempo (suspensão da habilitação para dirigir decurso do tempo. Justifica-se o instituto pelo desaparecimento do
veículo e multa; limitação de fim de semana e suspensão de habilitação interesse estatal na repressão do crime, em razão do tempo decorrido,
para dirigir veículo, etc.). que leva ao esquecimento do delito e à superação do alarma social
Havendo concurso de crimes, a substituição é possível quando causado pela infração penal. Além disso, a sanção perde sua finalidade
o total das penas não ultrapassa os limites acima mencionados (com quando o infrator não reincide e se readapta à vida social.
exceção dos crimes culposos). Quando se trata de concurso formal ou Escoado esse prazo, que é submetido a interrupções e
crime continuado em ilícitos dolosos, a substituição far-se-á por uma suspensões, ocorre a suspensão da pretensão punitiva, chamada
pena só restritiva de direito ou multa mas, no caso de concurso material, impropriamente de prescrição da ação penal. São totalmente apagados
a substituição poderá ser efetuada por duas ou mais penas alternativas todos os seus efeitos, tal como se jamais tivesse sido praticado o crime
idênticas (quando os crimes forem idênticos), ou mesmo por penas ou tivesse existido sentença condenatória.
substitutivas diversas (se não o forem). Quando forem aplicadas penas Transitado em julgado a sentença condenatória para ambas as
restritivas de direitos, o condenado cumprirá simultaneamente as que partes, surge o título penal a ser executado dentro de um certo lapso de
forem compatíveis entre si e sucessivamente as demais (art. 69, § 2º). tempo, variável de acordo com a pena concretamente aplicada. Tal título
Quando, porém, tiver sido aplicada pena privativa de liberdade sem a perde sua força executória se não for exercitado pelos órgãos estatais o
concessão da sursis, por um dos crimes, para os demais será incabível a direito dela decorrente, verificando-se então a prescrição da pretensão
substituição (art. 69, § 1º). executória, também denominada prescrição da pena, da condenação, ou
Não basta porém o requisito referente à quantidade da pena da execução da pena.
privativa de liberdade imposta para que se permita a substituição pela Não se confunde a prescrição, em que o direito de punir é
pena alternativa. Indispensável são também os requisitos subjetivos diretamente atingido, com a decadência, em que é atingido o direito de
previstos no art. 44, incisos II e III, que se referem às condições pessoais ação e, indiretamente, o direito de punir do Estado. Também não se
do sentenciado. confunde ela com a perempção que atinge diretamente direito de
O primeiro deles é não ser o condenado reincidente, ou seja, prosseguir na ação e, apenas indiretamente, o direito de punir.
que na época do crime, não fora condenado em sentença transitada em A prescrição em matéria criminal é de ordem pública, devendo
julgado por crime, no País ou no estrangeiro (art. 63). ser decretada de ofício ou a requerimento das partes, em qualquer fase
É necessário também que esteja necessário o último do processo.
pressuposto, ou seja, que a culpabilidade, os antecedentes, a conduta
social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as PRAZOS DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA
circunstâncias, indiquem que a substituição é suficiente (art. 44, III). Dispõe o artigo 409, caput: a prescrição, antes de transitar em
De acordo com o art. 55 do CP, como já visto, a pena restritiva julgado a sentença final, salvo o disposto nos § 1º e 2º do artigo 110
de direitos deve ter a mesma duração da pena privativa de liberdade por deste código, regula-se pelo máximo de pena privativa de liberdade
ela substituída, não podendo o juiz dar-lhe uma duração maior ou menor cominada ao crime, verificando-se:
daquela estabelecida na fixação do tempo de reclusão, detenção ou em 20, se o máximo da pena é superior a 12;
144

em 16 anos, se o máximo da pena é superior a 8 anos e não estando em liberdade condicional e revogado o benefício, deverá o prazo
excede a 12; prescricional ser calculado com base na pena que o sentenciado tem a
em 12 anos, s o máximo da pena é superior a 4 anos e não excede cumprir, observado o disposto no artigo 88. Nessas hipóteses não se
8; calcula mais o prazo com base na pena aplicada na sentença.
em 8 anos, se o máximo da pena é superior a 2 anos e não excede Imposta medida de segurança, o prazo da prescrição da
4; pretensão executória regula-se pela pena em abstrato cominada ao
em 4 anos, se o máximo da pena é igual a um ano, ou sendo crime.
superior, não excede a 2; REDUÇÃO DOS PRAZOS
em dois anos, se o máximo da pena é inferior a um ano. São reduzidos de metade os prazos de prescrição quando o
criminoso era, ao tempo do crime, menor de vinte e um anos, ou, na data
Para o cálculo do prazo prescricional são levadas em da sentença, maior de setenta.
consideração as causas de aumento de pena, bem como as de Em sendo o agente menor de vinte e um anos deve ser
diminuição, quando sejam compulsórias e se achem expressamente considerada a data do tempo do crime, ou seja, a da conduta criminosa.
enquadradas na acusação, incluindo-se a exacerbação correspondente à Ao contrário, quando se trata de maior de setenta anos, examina-se a
forma qualificada. idade do Réu no momento da sentença.
No concurso de crimes a extinção da punibilidade incidirá sobre INÍCIO DO PRAZO DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA
a pena de cada um dos delitos, isoladamente. O prazo de prescrição da Dispõe o artigo quanto ao tempo inicial da prescrição antes de
pretensão punitiva deverá ser calculado sempre para cada um dos transitar em julgado a sentença final. Art. 111. A prescrição, antes de
crimes componentes e não pela soma ou pela pena exacerbada pelo transitar em julgado a sentença, começa a correr:
concurso. do dia em que o crime consumou;
no caso de tentativa, do dia em que cessou a atividade criminosa;
PRAZOS DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA nos crimes permanentes, do dia em que cessou a permanência;
A prescrição, depois de transitar em julgado a sentença nos de bigamia e nos de falsificação ou alteração de assentamento
condenatória, regula-se pela pena aplicada e verifica-se nos prazos do registro civil, da data em que o fato se tornou conhecido.
fixados no artigo anterior, os quais s e aumentam de um terço, se o A regra geral para o início da contagem do prazo prescricional é
condenado é reincidente. de que começa a ser contado do dia da consumação do delito. Nos
No caso de concurso material de crimes, a extinção da crimes qualificados pelo resultado o prazo é computado a partir do
punibilidade incide sobre a pena de cada um, isoladamente, e não sobre evento lesivo qualificador.
a soma das penas. Da mesma forma, no concurso formal e no crime Na hipótese de tentativa, a prescrição começa a correr do dia
continuado, a prescrição é calculada sobre a pena de um dos crimes. em que se praticou o último ato executório, já que não há consumação.
Trata o artigo 113 do prazo de prescrição em caso de evasão No crime permanente, a ação é contínua, indivisível e o estado
do condenado ou de revogação do livramento condicional. Dispõe: no violador da lei se prolonga enquanto durar a consumação, dependente da
caso de evadir-se o condenado ou de revogar-se o livramento conduta do agente.
condicional, a prescrição é regulada pelo tempo que resta da pena. Sendo a prescrição matéria de Direito Penal, inclui-se na
Assim, se o sentenciado cumpriu três anos e dois meses de uma pena contagem do prazo, qualquer, que seja, o dia do começo.
imposta em um total de cinco anos, evadindo-se a seguir, a partir da data
da fuga passa a correr o lapso prescricional sobre o restante da pena, um INÍCIO DO PRAZO DE PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO
ano e dez meses, ou seja, prescreverá em 4 anos (art. 109, inc. V). EXECUTÓRIA.
145

O termo inicial da prescrição após a sentença condenatória pela decisão confirmatória da pronúncia;
irrecorrível é fixado pelo art. 112: no caso do artigo 110 deste código, a pela sentença condenatória recorrível;
prescrição começa a correr: pelo início ou continuação do cumprimento da pena;
no dia em que transita em julgado a sentença condenatória, para a pela reincidência.
acusação, ou a que revoga a suspensão condicional da pena ou o
livramento condicional.; O recebimento da denúncia ou da queixa é causa interruptiva.
do dia em que se interrompe a execução salvo quando o tempo da Tem-se considerado a data do despacho de recebimento como o dia da
interrupção deve computar-se na pena. interrupção, mas, na dúvida, deve prevalecer a data da entrega dos autos
Deixou-se expresso com a reforma penal que o termo inicial da em cartório pelo juiz, salvo se prejudicar o agente.
prescrição da pretensão executória não é o trânsito em julgado para Nos crimes cuja apuração é da competência do Tribunal do Júri
ambas as partes, mas para a acusação. Tratando-se de prazo da (crimes dolosos contra a vida e infrações que lhe forem conexas), o
prescrição da pretensão executória só pode ele ser interrompido pelo prazo prescricional sofre nova interrupção pela pronúncia.
início do cumprimento da pena. Tendo sido concedido o sursis, o prazo Havendo diferença entre a data da pronúncia (do despacho) e a
da prescrição, iniciado na data do trânsito em julgado da sentença para a da sua publicação, prevalece esta última.
acusação, só se interromperá pela audiência de advertência, já que o Também há interrupção quando a Superior Instância pronuncia
prazo não corre durante o período de prova do benefício. o Réu em razão de recurso da acusação e quando a sentença de
Inicia-se o prazo da prescrição da pretensão executória também pronúncia for confirmada pela corte. Evidentemente, a sentença de
da data em que se revoga a suspensão condicional da pena ou o impronúncia e a sentença de absolvição sumária não interrompem o
livramento condicional. prazo prescricional.
Também começa a ser contado o prazo da prescrição da É também causa interruptiva a sentença condenatória
pretensão executória do dia em que se interrompe a execução, salvo recorrível.
quando o tempo da interrupção deva computar-se na pena.
Não há mais que se falar no início do prazo de prescrição da SUSPENSÃO DO PRAZO
pretensão executória da pena de multa já que, transitada em julgado a Trata o artigo 116 das causas impeditivas da prescrição, ou
sentença, não é ela mais sanção penal mas dívida de valor, submetida às seja, das causas em que há suspensão do prazo da prescrição, que não
regras extrapenais. corre:
enquanto não resolvida, em outro processo, questão de que
INTERRUPÇÃO DO PRAZO DE PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO dependa o reconhecimento da existência do crime.
PUNITIVA Enquanto o agente cumpre pena no estrangeiro.
Estando em curso a prescrição, pode vir ela a ser obstada pela Nessas hipóteses há um hiato, uma parada momentânea: o
superveniência de determinadas causas, previstas no art. 117. Ocorrendo curso da prescrição se suspende para recomeçar a correr depois que
uma delas, o prazo anteriormente vencido, perde sua eficácia, passando cessa a causa impeditiva.
a fluir, a partir da interrupção, novo e independente prazo prescricional. A primeira causa suspensiva é a existência de questão
As causas interruptivas da prescrição da pretensão punitiva são prejudicial. Se a decisão sobre a existência da infração depender da
as enumeradas nos incisos I a IV do art. 117. Dispõe o referido artigo: O solução de controvérsia, que o juiz repute séria e fundada, sobre o
curso da prescrição interrompe-se: estado civil das pessoas, o curso da ação penal ficará suspenso
pelo recebimento da denúncia ou da queixa; obrigatoriamente, e se depender de decisão sobre questão diversa, a
pela pronúncia; suspensão é facultativa.
146

A segunda causa é o cumprimento da pena pelo agente no regula-se pelo mínimo da pena que poderia ser aplicada, em
estrangeiro. Não se podendo desenvolver o processo no Brasil, não deve abstrato, ao ilícito praticado;
correr a prescrição nessa hipótese. regula-se pelo máximo da pena em abstrato prevista para o crime.
Embora não contenha o Código Penal dispositivo a esse
respeito, durante a suspensão condicional da pena não tem curso a Deve-se aceitar a primeira orientação, já que não pode ser
prescrição da pretensão executória. Nesse período, está suspenso o maior o prazo de prescrição quando não se aplica a pena do que o
poder de execução do estado, que não pode, assim, ser atacado pela previsto nos casos em que é imposta qualquer sanção.
prescrição. O mesmo se diga com relação ao livramento condicional.
Entretanto, nada impede o curso do prazo da prescrição da pretensão PRAZOS PARALELOS
punitiva, durante o livramento condicional, por outra ação. Condenado o Réu, podem ocorrer paralelamente dos prazos de
prescrição: a prescrição da pretensão intercorrente (da pretensão
punitiva), em caso de não haver recurso da acusação, a contar da data
RECURSO DA ACUSAÇÃO da publicação da sentença (art. 110, § 1º); a prescrição de pretensão
Aplicada a pena na sentença, o recurso da acusação, ao menos executória, não havendo recurso da acusação, a contar da data do
provisoriamente, susta o reconhecimento da prescrição intercorrente, trânsito em julgado para a acusação.
pois, se provido e elevada a pena, não se opera a extinção da
punibilidade. PRESCRIÇÃO E LEGISLAÇÃO ESPECIAL
Nos termos do artigo 12, as regras da prescrição, como normas
CONDENAÇÃO EM PRIMEIRA INSTÂNCIA gerais que são, aplicam-se aos fatos incriminados por lei especial, se
Quando o Réu é absolvido e recorre com sucesso a acusação, esta não dispuser de modo diverso.
obtendo a condenação em Segunda instância, também pode ocorrer a
prescrição retroativa, que incide entre a data do fato e a do recebimento
da denúncia ou entre esta e o dia do julgamento do recurso.

PRESCRIÇÃO E MÉRITO
Julgada extinta a punibilidade pela prescrição da pretensão
punitiva, inclusive intercorrente ou retroativa, não se pode mais discutir,
em qualquer instância, sobre o mérito do processo.

PRESCRIÇÃO E PERDÃO JUDICIAL


Concedido o perdão judicial, deve-se indagar qual o prazo da
prescrição da pretensão punitiva intercorrente. A razão prende-se na
existência dos efeitos penais secundários da sentença concessória do
perdão (inscrição no rol dos culpados, pagamento de custas, etc.), que
ficarão extintos se ocorrida essa espécie de prescrição.
Três são as orientações a respeito do prazo.
regula-se pelo prazo mínimo previsto em lei, ou seja, dois anos;

Você também pode gostar