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Lucius Apuleio [125-180 d.C.

], escritor latino nascido na Argélia, classificou os


espíritos da antiguidade greco-romana em três categorias: os Manes [na Grécia, Lares,
em Roma], espíritos de ancestrais que não precisavam ser temidos se os ritos funerários
fossem observados conforme as prescrições religiosas, que incluíam a manutenção do
fogo doméstico. Os Manes poderiam, inclusive, ser um recurso de proteção no sentido
de interferir a favor dos parentes usando poderes adquiridos em sua existência no Além.

Os Lemures [Lemuri], eram uma designação mais genérica para os espíritos


desencarnados, geralmente entendidos como "espíritos da noite" que vagavam nos
cemitérios, comportamento considerado muito natural se, por qualquer motivo, não
obtinham o descanso póstumo, como no caso dos assassinos. Alguns rituais eram
realizados para aliviar o sofrimento dos espíritos, como oferendas de sangue que, na
verdade, deveriam servir somente para prolongar a permanência daquelas almas no
mundo dos vivos. As Larvas [Larvae], o terceiro tipo descrito por Apuleio, tinham
características maléficas específicas: causavam a epilepsia e a demência mas também
podiam ser brincalhões, travessos apesar de sua aparência sombria, muitas vezes
descritos como esqueletos etéreos.

Na Grécia, durante três dias, considerados desafortunados, entre fevereiro e março,


templos e casas comerciais eram fechados porque, acreditava-se, os espíritos Lemures
estavam circulando no mundo. Pela manhã, as casas eram marcadas com piche e
ornadas com ramos de espinheiro branco, cujas folhas também eram mascadas a fim de
manter longe os espíritos. No último dia desse festival, que na Grécia chamava-se
Nemesia, eram feitas oferendas a Hermes e os mortos eram formalmente convidados a
se retirar.

Em Roma, Ovídio descreve a Lemurália, que acontecia em maio. O mês que atualmente
é considerado o mês das noivas, [possivelmente por influência do calendário católico-
cristão no qual este é o mês de Maria], naquela época, era desfavorável para casamentos
por conta do retorno assombroso do fantasma de Remo, o irmão que Rômulo assassinou
no episódio da fundação de Roma. Na ocasião, o "cabeça" da família, o pater,
caminhava descalço pela casa fazendo sinais místicos que afastavam o "olho do mal".
Colocava feijões [favas] na boca e atirava outras por cima dos ombros dizendo: "Com
estas favas eu redimo a mim e aos meus". A cerimônia era repetida nove vezes. Depois,
o pater purificava-se pelo banho e convidava os espíritos a deixarem sua casa. O
procedimento tinha validade: um ano; depois disso, todo o ritual deveria ser repetido.
Havia também as Lâmias, de origem grega, que assombravam os quartos, que tinham,
então, de ser defumados com enxofre enquanto outros ritos eram feitos com ovos a fim
de exorcizar o mal.

Os mortos sem descanso pertenciam a três classes: os que tinham morrido antes do
tempo, aeroi: se tornavam errantes até que se completasse o tempo que teriam de vida;
os que tinham sofrido morte violenta, biaiothanatoi; os que ficaram sem túmulo,
ataphoi. Estes espíritos assombravam os lugares que abrigavam seus restos mortais

A Casa Assombrada de Atenas


Caio Plínio Cecílio Segundo ou Plínio, o Jovem - [61/62-114 d.C.], italiano de Como,
região da Lombardia, fornece um dos mais antigos registros escritos sobre uma casa
mal-assombrada. Existia em Atenas uma grande casa na qual ninguém queria morar
porque, nas altas horas da noite, ali eram ouvidos os barulhos de um arrastar de
correntes dos jardins ao quintal. Houve quem pudesse ver a figura esquelética e pálida
de um ancião com uma longa barba; as correntes estavam presas às suas mãos e pés. A
casa foi definitivamente abandonada e posta à venda por baixo preço; mas não havia
comprador. Foi quando o filósofo Athenodorus, chegando a Atenas, ouviu falar do lugar
e, intrigado com o caso, comprou a casa. Ele queria desvendar o mistério. Instalou sua
cama de frente para o jardim, fechou a porta principal, dispensou seus escravos e
preparou-se para passar a noite na tocaia. Distraia-se lendo e escrevendo quando
escutou as tais correntes se arrastando. Levantou-se e examinando o local viu, afinal, a
aparição que lhe fez sinais para que a seguisse. Relutante, a princípio, depois, o filósofo,
resolveu atender o pedido e munido com uma lâmpada foi atrás do fantasma, que se
movia lentamente, como que estorvado pelo peso das cadeias. Chegaram à parte mais
ampla do jardim e, então, o espectro desapareceu. Athenodorus marcou o lugar com
folhas e gravetos. No dia seguinte, o local foi escavado na presença de um magistrado.
Encontraram o esqueleto de um homem acorrentado. Os restos mortais foram sepultados
com todas as cerimônias. O fantasma nunca mais foi visto [COLLISON-MOLEY].

Batalhas-Fantasma

As assombrações que reproduzem batalhas, episódios de guerras históricas, também


estão presentes na tradição greco-romana. Como que aprisionados às suas rivalidades,
os soldados continuam lutando mesmo depois de mortos, em sua guerra eterna e sem
fim que se prolonga e se repete ao longo de séculos. São contendas travadas no céu
entre guerreiros espectrais que não assinam tratado de paz. Relata Tacitus: quando Titus
[imperador romano: 30-81 d.C.] sitiava Jerusalém, exércitos foram vistos combatendo
no céu. O mesmo acontecia nas muralhas de Roma, muito tempo depois da grande
batalha contra os Hunos de Átila; os fantasmas lutaram durante três dias e três noites e o
ruído de suas armas em confronto era ouvido claramente. A Batalha de Maratona
[Grécia, guerras médicas, 490 a.C.] também virou assombração. Segundo Pausânias, à
noite, escutava-se o tropel dos cavalos e os homens em combate. Alguns heróis gregos
também viraram fantasmas e suas histórias tornaram-se parte do folclore da região,
como Ajax e Aquiles. Ajax, por exemplo, não tolerava desrespeito com sua tumba e
certa feita, tendo a sepultura sido perturbada por pastores e seus rebanhos, admoestou-os
contra o sacrilégio proferindo suas censuras em uma voz potente e cavernosa e vinha
das profundezas da terra.

O Fantasma de Nero

O fantasma do imperador incendiário, facínora matricida e péssimo poeta foi um dos


mais famosos na Roma antiga. Acreditava-se que sua alma passeava na ruas da cidade
recusando abandonar seus antigos domínios. A igreja de Santa Maria del Popolo,
dizem, foi construída sobre sua sepultura, a fim de que seu espírito errante encontrasse
repouso.

O Fantasma de Caligula
Este outro imperador, também um tanto descompensado das idéias, andou assombrando
os romanos, especialmente os guardas dos Lamian Gardens porque tinha sido enterrado
apressadamente ali, sem as devidas cerimônias. Foi preciso que suas irmãs, que
realmente o amavam, retornassem do exílio e os rituais fossem apropriadamente
realizados. Somente assim, Calígula descansou em paz.

Evocação de Espíritos na Grécia e na Itália

Os gregos acreditavam que certos lugares eram especialmente propícios para se obter
comunicação com os mortos, verdadeiros portais do Hades que, governado por
Plutão/Hades, era o lugar ou mundo para onde iam as espíritos desencarnados. Eleusis,
Colonus, Enna, na Sicília, são alguns exemplos, além de certos lagos e mares. Locais
onde havia a emanação de gases sulforosos e, certamente, alucinógenos, não raro eram
alvo desse tipo de crença, como o Oráculo de Apolo [Delfos], onde as pítias previam o
futuro com ou sem consulta aos mortos. Numerosos templos também eram freqüentados
para ouvir os fantasmas que, acreditava-se, eram capazes de conhecer o futuro, entre
estes, o Templo de Phigalia, na Arcádia.

Os mortos somente podiam se manifestar para consultas com a permissão de Plutão e,


quando apareciam, eram conduzidos por Mercúrio [Hermes]. Somente os mortos
recentes atendiam os vivos porque ainda tinham algum interesse nas coisas terrenas.
Porém, havia exceções, como o herói Aquiles, que apareceu evocado por Apolônio de
Thiana.

Na Itália, segundo Cícero, o Lago de Avernus, próximo a Nápoles, era um "oráculo dos
mortos" onde as "sombras, os espíritos dos mortos eram chamados na densa treva da
boca do Aqueronte, o rio de sangue salgado"; e, nas palavras do historiador grego
Ephorus: "os sacerdotes que evocavam os mortos no Avernus moravam no subsolo e
comunicavam-se com os espíritos nas passagens subterrâneas posto que estes habitavam
as entranhas da terra". Não muito longe do lago, também havia cavernas-oráculo onde
os consulentes recitavam fórmulas encantadas e ofereciam sacrifícios para propiciar as
revelações. Os fantasmas apareciam como sombras insubstanciais, difíceis de ver e
reconhecer mas com uma audível voz humana.

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