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Livro: Planejamento: Como Prética Educative Autor: Danilo Gandin APRESENTAGAO © conhecimento no seja um rio, reto e perigoso, mas intricade rede de cérregos empapando a terra que povoam. Este livro pretende situar-se num contexto bem definido: para o pessoal que trabalha em educago no Brasil, nests época, fins do século XX. Os que trabalham, em geral, com tarefas ligadas 20 social poderio, também, tirar proveito dele. Servir para outras circunsténcias no constitui seu objetivo, embora isso também possa ocorrer. Nao € um livro académico, que busque encher paginas com lindas conjungées de ideias, aquelas constelagdes que nos encantam, mas que ndo servem pars muita coisa. Pretende ser um texto que impulsione & ago. Por outro lado, é um texto tedrico e doutrinério. Pretende esclarecer a aco, compreendé-la, ajudar a explicé-la, torné-la mais eficiente e mais eficaz: isto € ser teérico. Pretende fazer isto 8 fim de motivar para um tipo de aco condizente com a teoria: isso é ser doutrinario. A inspiracdo basica de ser 0 planejamento um processo de crescimento humano e no apenas, técnica de melhorar as ages, firmei-a em contato com Miguel Cabello, pertencente 20 grupo denominado Equipe Latino-Americana de Planejamento (ELAP), com sede no Chile. Hé, porém, neste livro, um modo préprio, brasileiro, de encarar o planejamento e uma perspectiva tedrica alargada. Quero ressaltar que uma viséo global do texto é necessérie para a correte compreensio de cada parte: 05 capitulos se entrelacam e, as vezes, se superpdem, esclarecendo-se uns 20s, outros. Primeira Parte Que Deus nos dé forcas pera mudar as coisas que podem ser mudadas; serenidade pare aceitar as coisas que no podem mudar; ¢ sabedoria para perceber a iferenca. Mas Deus nos da, sobretudo, coregem para no desistir daquilo que pensamos estar certo. Chester W Nimitz POR QUE NAO GOSTAMOS DE PLANOS? ‘A experiéncia néo vem de se ter vivido muito, mas de se ter refletido intensamente sobre 0 que se fez e sobre as coisas que aconteceram. Existe um relacionamento quase cémico entre @ atividade de planejar e a de arquivar: as pessoas que se envolvem em planejamento ortodoxo no Brasil necessitam, rapidamente, de ‘algumas ligSes de arquivistica. [sso porque a maioria dos planos alcanca, nums boa hipotese, um lugar respeitavel no arquivo da instituico @ que se ligam ou no de outras, cujos membros se interessam pelo estudo desses pretensiosos filhos da burocracia. Num ano qualquer da década de 60, participando de elaboragdo de um audacioso plano, coube-nos, a mim € a um colega de trabalho, rever tipograficamente o texto definitivo. A penosa tarefa (eram mais de 200 paginas) interrompia-se por seguides pausas, necessarias & nossa sanidade mental. Numa delas, durante um cafezinho, disse-me o amigo: "Vamos trabalhar com muito cuidado, pois nés seremos os diltimos a ler este plano" Nossa risada foi uma participacdo festiva na crenca geral de que fazer plenos é urna tarefa com valor em si mesma, da qual nada se espere realmente. Por que teriam os planos chegado a tal descrédito? Porque, de fato, eles ndo tém servido para nada e porque, como atividade liidica, eles s80 quase sem graca. Essa inefica: simples, dos planos € consequéncia de alguns fatores dbvios cuja compreenséo ¢ Em primeiro lugar, a prépria existéncia do "planejador" bloqueia a execugo do plano. Parece claro que, se ha "planejadores", hé "executores" e, depois, "avaliadores". Em geral, os “planejedores’ so poucos e os “executores", uma porgéo. Como resultado, temos uma pessoa, ou algumas, apontando a diregdo para todo um grupo que, se tiver consciéncia critica, no aceita tal situaco e que, se tiver consciéncia ingénua ou mitica, pode ser levado pela forga ou pelo engodo, Em qualquer destes casos, desprestigie-se o planejamento, que tem a dificil funcdo de organizar @ aco sem ferir a liberdade e a riqueza dos participantes de um grupo. Em segundo lugar, quase como consequéncia, o fato de se pensar planejamento como uma “fabricago de planos", como um reunir ideias, como "bolar” algo - o que é uma compreenséo parcial do planejamento-limita as preocupagdes @ uma etapa, a da elaborago, deixando completamente esquecidas as etapas de execucio e de avaliacdo. Diante desta concepcéo, cumpre-se @ miss8o assim que se escreveu o plano. Quem tiver consciéncia de que o planejamento inclui a execucéo - ou, pelo menos, que fazer um plano s6 tem sentido se for para pé-lo em prética - realizeré esta parte da elaboracdo sob outro prisma, incluindo aqueles elementos que forgam a execuc&o do decidido (como isso se torna possivel, estudaremos mais a frente). Depois, néo podemos esquecer 0 formalismo e a burocracia que matam tudo aquilo em que tocam. Os experts fazem-nos preencher quadrinhos e formulérios € nos dizem que estamos plangjando. Evidentemente, nem eles mesmos levam a sério aqueles papéis e no julgem que vamos fazer algo daquilo, Mas a inconsciéncia e a falts de solucdes os obrigam a render culto 20 formalismo e & burocracia. Com isso desprestigia-se 0 planejamento porque chamam a esse preenchimento de papéis de planejar. Conheci um homem que desprezave o leo porque Ihe tinham mostrado um gambé e dito que aquele era o rei dos animais. Ha ainda 3 falta de capacitacdo técnica das pessoas que "planejam” ou mesmo coordenam a feitura de planos, o que termina levando os planos a ineficdcia. Se ndo seguir alguns principios fundamentais e no utilizar técnicas apropriadas @ vivéncia desses principios, a escrita de planos esta fadada a ser uma atividade pouco rentavel, completamente inutil ou, até, perigosa. Finalmente, muitas causas externas contribuem pare que o planejamento ndo mereca o cuidado sério das pessoas que julgam significativas as suas aces. Essas causas talvez apontem todas para a mesma dire¢do: 0 planejamento é pare a mudanca, para a transformacio, o que, provavelmente, no é 0 desejo dos "donos" de nenhum dos setores de atividade humana. Eles fazem propaganda para que creiamos em coisas, para que continuemos a agir descoordenadamente, e nés abrimos m&o do planejamento de verdade. © substitutivo & desmoralizado com raz8o, e isso nos deixa mais longe de realizar 0 verdadeiro. Claro que devem existir outras percepgdes sobre 0 porqué do relacionamento tio estreito entre plano e gaveta ou plano e prateleira. Nao se deve deixar reflexio alguma tornar-se absoluta, mas continuar a fazer 05 préprios questionamentos, naturalmente relativizando, também, 0 préprio modo de pensar. Assim vamos descobrindo, cada um na propria experiéncia, uma parte da verdade. © importante € que, descobrindo por que no se realizam os planos, aumentamos nossa condi¢éo de participar de um processo de planejamento que seja um meio de esclarecer e tornar precisa a aco do grupo em que estamos. PARA QUE PLANEJAR? Um grupo (sujeitos em interacdo) na dinémica da acdo-reflexéo, que busca a verdade e tende & transformago ¢ ao crescimento: eis a educago que deve estar em tudo. A primeira coisa que nos vem & mente quando perguntamos sobre a finalidade do planejamento é a eficiéncia. Aeeficiéncia é @ execugo perfeite de uma tarefa que se realize. O carrasco ¢ eficiente quando 0 condenado morre segundo o previsto. A telefonista ¢ eficiente quando atende a todos os, chamados e faz, a tempo, todas as ligacdes. O datildgrafo, quando escreve rapidamente (hd expectativas fixadas) e ndo comete erros. © planejamento e um plano ajudam a alcancar eficiéncia, isto é, elaboram-se panos, implanta-se um processo de planejamento a fim de que seja bem-feito aquilo que se fez dentro dos limites previstos para aquela execusao. Mas esta ndo é 2 mais importante finalidade do planejamento, Vi certa vez um homem que todas 2s manhas se punha diante do prédio em que morava e levava horas e horas cortando uma folha de papel em mindsculos quadradinhos, todos iguais, que, depois, jogava fore. Era uma perfeita eficiéncia para nada. © planejamento viss também a eficdcia, Os dicionérios no fazem diferenca suficiente entre eficdcia e eficiéncia, O melhor é no se preocupar com palavras e verificar que o planejamento deve alcancar nao sé que se facam bem as coisas que se fazem (chamaremos a isso de eficiéncia), mas que se facam as coisas que realmente importa fazer, porque so socialmente desejéveis (chameremos @ isso de eficécia), A eficdcia € atinglda quando se escolhem, entre muitas agées possivels, aquelas que, ‘executadas, levam a consecuco de um fim previamente estabelecido e condizente com aquilo em que se cré Além destas finalidades do planejamento - séo 2s que os bons livros de planejamento ressaltam -, gostaria de introduzir a discusso sobre outra, tdo significativa quanto estas, e que da ao planejamento um status obrigatdrio em todas as atividedes humanas: é a compreenséo do processo de planejamento como um processo educative. E evidente que este finalidade sé é alcancade quando o proceso de planejamento é concebido como ume pratica que sublinhe @ participacdo, a democracia, a libertecéo. Entdo o planejamento é uma tarefa vital, unio entre vida e técnica para o bem-estar do homem e da sociedade, Nao pormenorizo aqui esta finalidade do planejamento porque todo este livro trata dela. DEFINIR AJUDA A COMPREENDER Quando se define uma arvore tiram-se dela os frutos e, naturalmente, as folhas e as flores. Se cada um de nés referir a definicdo & sua ago concreta (melhor dizendo, aco do grupo a ‘que pertence), poderemos tirar grandes proveitos de ums definic#o, como euxiliar pare a compreensdo da aco. € evidente que uma definigo, nesse contexto, é de valor inestimavel quando a ela se chega por meio da prépria aco. A reflexo e a descoberta alheias podem servir @ qualquer um como indicagdo de rumos na direcdo dos quais pareca Util procurar. Por isso tentarei algumas definigdes de planejamento, a que cheguei pela reflexéo sobre o que se faz no ramo. Naturalmente so definigSes do “dever ser", ndio do que acontece. Melhor: do que acontece com sucesso, caso em que "o que é” coincide com o "dever ser”, Muito mais importante do que ler as definigSes seré que o grupo tente o seguinte: 4) descobrir 0s pontos essenciais comuns a todas; b) comparé-las com outras que o grupo conhece ou vive; ©) questionar todas as definicdes em virtude da pratica do grupo e da teoria que tenta explicar cesta pratice; 4d) se for 0 caso, optar por uma das definicdes e/ou elaborar outra, Todas as definigdes que incluo - elas serio muito mais, provavelmente - tam em comum pontos essenciais, sem o que no se pode falar em planejamento. 4) Planejar é transformar a realidade numa direco escolhida, b) Planejar é organizar a prépria aco (de grupo, sobretudo), «¢) Planejar é implantar "um processo de intervengo na realidade” (ELAP) 4d) Planejar é agir racionalmente. ¢) Planejar é dar certeza e preciséo 8 prépria acdo (de grupo, sobretudo). 4) Planejar é explicitar os fundamentos da aco do grupo, 2) Planejar é por em acdo um conjunto de técnicas para racionalizar a acdo. h) Planejer é realizar um conjunto orgénico de ages, proposto para aproximar uma realidade um ideal. i) Planejar é realizar 0 que é importante (essencial) e, além disso, sobreviver... se isso for cessencial (importante). © grupo que adoter qualquer dessas definigées estaré iniciando a corrego dos problemas que © planejamento comumente apresenta. Melhor: estaré colocando em sua reflexdo alguns elementos que tenderdo a questionar continuamente sua acéo. Esse questionamento se far, essencialmente, em trés sentidos: 2) no planejamento temos em vista @ eco, isto é, temos consciéncia de que @ elaboracdo é apenas um dos aspectos do processo € que ha necessidade da existéncia do aspecto execucéo e do aspecto avaliacio; b) no planejamento temos em mente que sua fungo tomar clara e precisa @ aco, organizer ‘que fazemos, sintonizar ideias, realidade e recursos pare tornar mais eficiente nossa aco; <) temos como definida e em evidéncie @ ideia de que todo 0 autoritarismo é pernicioso ¢ que todas 5 pessoas que compdem 0 grupo devem participar (mais ou menos, de uma forma ou de outra) de todas as etapas, aspectos ou momentos do proceso. DESCREVER E MELHOR O peixe que eu pesquei nao era um peixe qualquer: tinha esporas e dentes € escamas e olhos grandes e um lindo colorido azul Muitas vezes, definir é seco e morto, enquanto descrever é esclarecedor e motivante. Isto ‘acontece quando se fala em planejamento. A descrigo que se segue ndo é a descricéo do que existe, mas do que deveria existir ou, dito de outra forma, daquilo que se pode colocar como ponto de referéncia para ser perseguido na tarefa do planejamento. So trés as perguntas bésicas a ser feites e continuamente retomades (de forma dialética) em um processo de planejamento: + Oque queremos sleancar? = A que distancia estamos daquilo que queremos aleancar? = O que faremos concretamente (num prazo predeterminado) para. diminuir essa disténcia? Modelos ¢ metodologias dependem das concepges de homem e de sociedade que tem cada grupo. Por isso, podem variar sem grandes efeitos. Mas, se nao forem respondidas as trés perguntas, e de forma que uma resposta ajude na resposta das outras, no se poderd dizer que haja planejamento. Por outro lado, 0 esforgo em responder continuamente a estas trés questdes (na acdo- reflexo) ndo apenas dé eficiéncia ao trabalho como é 0 processo educativo humano mais fundamental © que queremos aleancar? ‘A maioria dos planos que vi supunham que esta ere pergunte jé respondida. Desta forma, preocupavam-se em melhorar o que estava sendo feito, sem perguntar-se acerca do "para que" das agées. Fazedores de tais planos assemelham-se aquele senhor a que deram como tarefa trocar de lugar as cadeiras de uma sala. Ele nao poderia tiré-las da sala, nem modificar sua relaco com 05 outros méveis. $6 poderia dispé-las de modo diferente a0 redor da mesma mesa. Apés trocé-las, foi instado a fazé-lo uma segunda € uma terceira ver. E tantas vezes quantas pudesse naquele dia... Houve um descanso na hora do almoco e, depois, foi-Ihe exigida mais rapidez (e eficiéncia.... A noite, as cadeiras estavam nos mesmos locais em que se achavam quando iniciara o trabalho. Mas ele estava quase morto de cansaco. Passou, entdo, a "planejar" para mudar 0 maior numero de vezes as cadeiras de lugar. Com isso, até foi promovido a chefe do DMC (Departamento de MovimentacSo de Cadeiras) e péde empregar mais gente, A pergunta "o que queremos alcancar?" teré conotagées diferentes quando respondida na indlistrie, no comércio, no governo, nas tarefas sociais... Na educagdo ela supée, certamente, a busca de um posicionamento (sempre pronto e sempre provisorio) a respeito do homem e da sociedade, a respeito da pedagogia. E um duplo posicionamento: politico (no sentido de uma visdo do ideal de sociedade ¢ de homem) e pedagdgico (no sentido de uma definigo sobre a acdo educativa sobre as caracteristicas que deve ter a institui¢do em que se plangja, uma escola, por exemplo). Aque distancia estamos daquilo que queremos alcancar? Arresposta a esta pergunta nos traz aquilo que se deve chamar de diagnéstico. Sabendo aonde queremos chegar (em termos de estrutura e funcionamento da instituigo em planejamento, a fim de que ela contribua para determinado tipo de homem e de sociedade), deveremos perguntar se estamos longe ou perto disto, se a distancia € de um tipo ou de outro, se ha tendéncias de melhoria ou de degeneracao. A resposta a esta questdo néo é, essencialmente, uma descrigdo da realidade, mas um juizo sobre ela, Poderiamos apresentar a pergunte de outra forma: o que estamos fazendo contribul (até que ponto?) para a existéncia daquilo que queremos alcangar? E necesséria uma descrigéo da realidade (0 que estamos fazendo), mas o essencial ¢ 0 julgamento dessa realidade, na comparacio com aquilo que queriamos que fosse. © que faremos (num prazo predeterminado) para diminuir essa distancia? Respondides as questies anteriores, pode-se estabelecer aquilo que é fundamental no planejamento: o que é necessério e possivel concretamente para diminuir @ distancia entre o que se faz € 0 que se deveria estar fazendo. E 0 que chamamos de programagio. Inclui os objetivos e as politicas de ago; 0s primeiros, ages que nos comprometemos @ realizar num determinado periodo para atingir fins, e as segundas, principios que regerdo nossa ago no periodo de validede do plano. ‘Trata-se, sempre, de agir na direcio do que se estabeleceu como ideal, com a luz que brotou do julgamento que se fez sobre o que se esta realizando. © que descrevi até aqui, neste capitulo, é @ parte de elaboragéo do planejamento. As outras duas partes s3o execugio (ago em conformidade cam o que foi proposto) ¢ a avaliagéo (reviso continua de cada parte e de cada aspecto no processo). A partir desta descrigdo, deixo para a meditag3o @ seguinte definigo de planejamento da educagio: Planejar é: elaborar- decidir que tipo de sociedade e de homem se quer e que tipo de aco educacional é necesséria para isso; verificar a que distancia se esta deste tipo de aco e até que ponto se est contribuindo para o resultado final que se pretende; propor uma série orgénica de agées para diminuir essa disténcis e para contribuir mais para o resultado final estabelecido; ‘executar - agir em conformidade com o que foi proposto; e aveliar - revisar sempre cada um desses momentos e cada uma das ages, bem como cada um dos documentos deles derivados. MODELO DE PLANO Um plano é bom quando contém em si a forga que o faz entrar em execugo. Ele deve ser tal ‘que seje mais facil executé-lo do que deixa-lo na gaveta. A partir do que ficou exposto no capitulo anterior, chega-se a um modelo de plano. Repito a cobservacao de que, mesmo sendo possivel um processo de planejamento sem plano(s), pelo menos quando 2 realidade plenejada ¢ restrita, este instrumento é veliosissimo, principalmente como momento de convergéncia e reuniéo des conauistas do grupo. Importante € questionar sua funcionalidade - um modelo é bom se funciona - aplicé-la a situagdes amplas e restritas, a fim de ver se ele resiste. Convém ressaltar, ainda, que, em um proceso de planejamento cuja duragio € indefinida, o(s) plano(s) tem duraco bem fixada. Este modelo tem em vista um prazo médio (3 a 5 anos), € deve sofrer adaptagdes - veremos come - no caso de 0 prazo ser mals curto, de um ou dois ‘anos. E claro que um plano diz respeito apenas a etapa que chamei de "elaboracdo". Isso nao deve fazer parecer incompleto o modelo apresentado a seguir. O que é preciso ressaltar, sempre, & que tudo deve ser pensado, nesta etapa, em razéo da execucdo. Neste sentido, ao se propor um modelo de plano, o direcionamento € a base estéo sendo dados pela necessidade de execucdo. Neste modelo, cada parte tem explicitado o seu significado e indicadas as principais perguntas ‘a que se deve der resposta, £ claro que as questdes podem ser acrescidas de outras e que variagdes so perfeitamente cabiveis, Pretendi apenas oferecer uma indicacdo bésica, para servir de orientago inicial. Como em todos os outros pontos, aqui também é recomendével que 0s coordenadores de um processo de planejamento procurem seu proprio Posicionamento e, sobretudo, seu préprio modo de agir. Observe-se que a presenca da mesma letra (A,B,C) indica uma correspondéncia entre os topicos que ela assinala. PARTE 1 MARCO REFERENCIAL. Desdobrando em trés aspectos; A. Marcos Situacional 8. Marcos Doutrinal. C. Marco Operative Significado: é 0 ideal Questées Fundamentais. A. Como é a reelidade global? 8, O que pretendemos alcancar neste contexto? C. Como deve ser nossa ago (globalmente) para buscar o que pretendemos? ou A. Onde trabalharemos? Como se apresente o mundo humano? B. Para que trabalharemos? (Que finalidades e funcSes ter nossa instituiclo, neste mundo humano?) C. Como trabalharemos? (Que diregéo tomar e que enfoques daremos ao nosso trabalho?) Partes 2 Diagnéstico Significado: é 2 comprovago entre o ideal (deve ser) 0 real. Questdes fundamentais B. Até que ponto estamos contribuindo para que o mundo humano seje como pretendiamos ‘que fosse? Quais as causas dos fracassos? Quais as causas dos sucessos? C: A que distancia esté nosse instituicéo do ideal que dela fizemos? O que aumenta essa distancia? Quais as causas dessa distancia? O que ja existe que ajuda a diminuir essa distancia? Parte 3. Programacéo Inclui: objetivos, politicas e estratégias, responsdveis, demais instrucdes de execucdo, Significado: é a proposta de ago. Questies fundamentais: O que faremos no decorrer do plano [orientacdes da aco e acdes concretas) pare contribuir mais na dirego do que pretendemos alcancar e para diminuir a distancia entre o ideal e 0 real de nossa instituicdo? O MARCO REFERENCIAL Ha quem procura andar o mais depressa possivel, néo importa para onde. Mestre Cedro escolheu ir a um lugar predeterminado, no sendo essencial ir depress. Dizer para que existe hoje a instituicdo que se planeja (para que vai existir nos préximos anos) 4 parte mais importante de um plano e, mesmo, de um proceso de planejamento, Sabe-se, de outros textos, que pode faltar quase tudo em planos, menos objetivos. Isso € correto. Contudo, estabelecer objetivos (acdes praticas 2 realizar em determinado tempo) sem saber para qual finalidade é, no minimo, perder ,o préprio tempo. Por isso, algo que é, de fato, condiggo (no planejamento entendido n@ pura técnica) é a parte mais importante num processo compreendido como algo vital. Um grupo que planeja é, por exemplo, um grupo de escola (pode ser o pessoal de uma secretaria de educacdo etc.), Ele tem de se definir, expressar sua identidade: dizer quem séo seus participantes, o que é a instituicdo e 0 que pretende alcancar, Os enfoques que esta busca de identidade deve levar em conta est8o apontados no capitulo sobre o modelo de plano. Trata-se de um posicionamento em termos sociolégicos, filoséficos (teolégicos), psicolégicos, pedagdgices.. Marco situacional Num primeiro momento (2 separacéo ¢ mais didétice do que real) o grupo expresse sua compreensdo do mundo atual. Procura descrever € julgar o mundo nos aspectos social, econémico, politico, cultural, religioso, educacional. Os pontos que tero realce sero os que o grupo julgar que merecem. De qualquer modo, para um plano educacional, é imprescindivel a compreensio sécio-econémica-politica-cultural do momento, porque é neste todo que estd integrada a educacéo. A pergunta bésica a ser respondida seré: como se apresenta o mundo em que estamos inseridos? Sera uma descri¢Zo e um julgamento. O proprio fato de ressaltar alguns aspectos deixar outros na penumbra ou no escuro ja é um julgamento. Além disso, é importante que a situac&o descrita seja valorizada: é 0 posicionamento do grupo que vai tomando corpo, Marco doutrinal Num segundo momento o grupo expressa seus ideais. Advirto, de imediato, que duas coisas so importantes aqui. Primeiro, quando se diz ideal, pretende-se escrever, mesmo, ideal, "aquilo que é de nossa mais alta aspiragéo; alvo de ambicdes ou afetos; perfeigo" (Pequeno Diciondrio Brasileiro da Lingua Portuguesa). Trata-se, portanto, de um marco, um ponto razoavelmente inamovivel que serve como utopia, como forca, como orientacéo. Nao pode ser algo inteiramente alcancavel, ‘embora no possa se constituir do teoricamente impossivel pare o homem. Segundo, dizer ideal no significa dizer coisas liidicas. N&o se trata de estabelecer algo imaginado, sem ligagdo com o momento, sem a forga da teoria, sem a justificativa da realidade. Antes, pelo contrério, trata-se de propor algo enraizado, possivel e realizavel, enquanto proposta da qual nosso esforco possa nos aproximar gradativamente. Inserida nessas dues adverténcias esté, por exemplo, @ simples opcio por um homem Participativo e por ums sociedade que permits a participacdo. E algo que constitui um ideal, alcangavel sempre em maior profundidade, préprio para o momento, contudo dificil de ser atingido plenamente. Ou a prépria proposta quentitativa (por exemplo, num plano de secretaria de educacio) de escolarizar, digamos, 95% da populacio na idade de 7 a 14 anos. Esses ideais podem variar emplamente, conforme a reelidade planejada, mas o que foi dito vale tanto pare os aspectos quantitativos como para os qualitativos, embora seje mais real para esses tiltimos. E importante aqui a presenca de teoria, porque é a teoria adotada para a ago que se constitui ‘em doutrina, De outra forma, a doutrina seria arbitrio e levaria, insensivelmente, & dominacéo, mesmo com a bos vontade dos “que planejam", Essa doutrina (esse ideal) deve ser enunciada a respeito do homem e da sociedade, pelo menos quando se trata de planejamento no campo social. Basicamente, é preciso ter clareza sobre o que se pretende com o esforgo que se faz (esforco educacional, por exemplo, seja uma ‘escola, seja outra instituigo ou outra realidade). Por isso, @ descricio de uma sociedade ideal de um homem ideal, nao existentes (talvez nem possiveis em todos os aspectos e/ou em i, todo 0 todos 0s lugares e/ou em todos 0s momentos), é fundamental, porque, @ partir di esforgo teré uma direcdo clara, © que importa, realmente, no é dizer genericamente que devam existir tais e tais coisas, como espirito critico, participagao ete. Interessa é dizer 0 que significa cada coisa para o grupo, dizer até quando, onde, como e para que cada caracteristica ou situacio deve ser realizada Marco operativo E necessério, ainda, um posicionamento @ respeito do que é adequado para que a instituigéo que se planeja (e 0 grupo que compée) seja fator eficiente na aproximacao de realidade existente & realidade idealizada, No caso de um trabalho educecional, tratar-se-d de um posicionamento pedagdgico que inclu a descrigo do tipo de educacdo que se supde adequada e coerente com os ideais de homem e de sociedade, descritos no marco doutrinal, e os principais enfoques da aco da instituicéo, de sua organizagéo, de seu modo de ser, de sua metodologia. Nao se acentuard suficientemente, suponho, a necessidade de que este marco operativo seja pensado para esclarecer e impulsionar 2 aco da instituico na sua contribuigSo para que acontecam aqueles ideais do marco doutrinal. Pode-se, assim, dizer que o marco doutrinal se situa no nivel dos fins, enquanto 0 marco operativo se situa no nivel dos meios. Convém ressaltar, contudo, que no se trata de propor as ages concretas que se vai realizar (isto contetido da programacao), mas de enunciar os grandes posicionamentos que guiarlo a ago da instituigo como um todo e das pessoas que compdem seus quadros. Numa escola, por exemplo, designar um marco operative significa propor (escolher cu compor) um tipo de educagéo, tragar linhas gerais de organizac3o de escola (governo, participacéo...), definir enfoques ou prioridades que sero sublinhados no periodo do plano, tudo em coeréncia com 0 marco doutrinal e para realizer os ideais nele tracados. O DIAGNOSTICO "A pratica de pensar a prética ¢ a melhor maneira de pensar certo.” Paulo Freire (revista Educagdo e Sociedade. n. 1. p. 65). A que distancia estamos do tipo de ser, do tipo de organizagao, do tipo de metedologia e do tipo de ago que nos propusemos no marco operativo? Com que contamos para diminui-la? Como so, que esperam, que pensam os membros do grupo (da instituig8o) em relago aos temas do marco referencial? Quais séo as causas dos problemas existentes? Estas so as questdes fundamentais que devem ser respondidas num diagnéstico. O diagnéstico &, como jé foi dito, a parte de um plano que profere um juizo sobre a instituigéo planejada em todos ou em alguns aspectos tratados no marco operativo (que descreveu o modo ideal de ser, de se organizar, de agir da institui¢do), juizo este realizado com critérios retirados do proprio marco operative e, sobretudo, do marco doutrinal. € também matéria do diagnéstico o juizo circunstanciado que esclareca até que ponto a instituigo esta contribuindo para que aconteca aquela sociedade e aquele homem que foram apresentados como ponto de chegada de todo 0 esforgo, no marco doutrinal 0 diagndstico é, dito de outra forma, o resultado da comparacdo entre 0 que se tracou como ponto de chegada (marco referencial) e a descri¢ao da realidade da instituic80 como ela se apresenta. Por isso, no é possivel realizar um diagnéstico sem saber 0 que se quer alcancar ao final (marco doutrinal) e/ou sem saber como se pretende que seje a instituico (marco operative). Estes aspectos do marco referencial so 0 pardmetro, contém os critérios pare julgemento da realidade, Muitos planos comecam com o "diagndstico” e ficam obviamente numa descricéo da realidade, sem critérios para escolher que pontos (aspectos) levantar da realidade e, pior, sem possibilidade de julger essa realidade, @ ndo ser por meio de comparagdes com chavdes sem base. Se, por exemplo, alguém disser que no sistema educacional de ensino ha tantos por cento de reprovacdes no 12 grau, anualmente, estaré descrevendo a realidade, mas no fezendo um diagndstico, Apenas um marco doutrinal (que falaré nos fins da educacdo, no em geral, mas nos que se adotaro em tal realidade) e um marco operativo (que vai dizer o que é bom ou mau, por exemplo, em termos de avaliacéo) € que possibilitar3o escalonar esse fato em relagdo a outros, encaminhardo levantamentos de hipéteses sobre causas e efeitos e, sobretudo, permitiréo concluir se aquele percentuel de reprovegdo bom ou mau. Um grupo ‘que julgasse ser 3 reprovacao sempre um mal diria que o sistema de ensino tem problemas ‘quando se verifica qualquer percentual de reprovagao; se o grupo pensa (vai constar no marco referencial) que deve haver um percentual de reprovacées, diré que o sistema vai mal quando ndo se verificarem "suficientes" reprovacdes. Se uma escola estabelece a participaco como um de seus ideais operativos, diré (no diagndstico) que vai muito bem quando os alunos, por exemplo, se propem @ analiser 0 tipo de trabalho que se realiza nas sales de aula; se, contudo, prezar mais (em seu marco operative) a obediéncia o respeito autoridade, dirs, diante da mesma realidade (0 fato de os alunos quererem analisar o trabalho dos professores), que a escola vai mal. Entéo é importante, no diagnéstico, 0 julgemento da realidade @ partir de critérios estabelecidos segundo aquilo que se disse "dever ser, Assim, 0 médico faz um diagnéstico: diz que algo esté mal (vai depois a busca das causas) quando constata 39 graus de temperatura ‘em um paciente (descricSo da reelidade), porque julga esta realidade com o critério do que deveria ser (os 36 virgula qualquer coisa que ¢ a temperatura normal do corpo humano). Essa ‘temperatura normal € dada pela teoria, No caso de um marco doutrinal e operativo de uma instituigdo social é também a teoria que vai dar o "dever ser", embora com possibilidades de Posicionamentos pessoais muito importantes, que nosso médico no tem (mas que mesmo o médico tem em outros pontos). Como ressaltei tanto que 0 diagnéstico néo € descricdo da realidade, devo enfatizar, também, que ele sé é possivel a partir desta descrigSo: se no se conhecer a realidade, nao se pode realizar um diagnéstico. Assim, na realizago de um diagnéstico inicial e no refinamento de diagnéstico existente, ‘ocorrem duas etapas complementares: @ pesquisa € 0 juizo, aquela pera se alcancar uma descrigdo da realidade existente e este para comparar o que se realize com o que se pretende (marco referencial), a fim de estabelecer a distancia. Apesquise A pesquisa é do tipo que, comumente, se chama de avaliativa: ela tem a fungo de conseguir ‘05 dados com os quais se posse fazer uma descricio da realidade. Sem entrar nos detalhes de um processo de pesquisa, abundantemente estudados em muitos bons manuais, estabeleco aqui os passos do tipo de pesquisa apto para o processo de planejamento e analiso as preocupacdes maiores que se deve ter em sua realizacéo. Os seguintes passos néo poderdo faltar numa pesquisa: 2) definico da pesquisa; b) elaboracdo de instrumento(s); ¢) aplicago do(s) instrumento(s) - coleta de dados; 4d) tabulacdo dos dados; ¢) leitura dos dados - DESCRIGAO DA REALIDADE, Cada passo ¢ decisivo para uma boa descricdo da realidade. A bibliografia que ajuda no desdobramento de cada um desses passos é razoavel e deve ser procurada para aperfeigoar 0 trabalho. ‘Aqui s6 serdo dadas algumas indicacées que tém como objetivo mostrar alguma especificidade que @ pesquisa assume para melhor servir 2 um processo de planejamento, em que a principal finalidede é a transformacdo de realidede e no qual a pesquisa tem o objetivo de possibilitar a realizaco do disgndstico, que, por sua vez, junto com 0 marco referencial, seré a base de toda a programacio. 2) Definigéo da pesquisa Este passo compde-se de trés tarefas: estabelecer as reas (te mas, assuntos) que se vai pesquisar; definir 0 objetivo da pesquisa em cada uma das areas; e determinar os indicadores pare cada uma delas. Embora uma pesquisa, mesmo num proceso de planejamento, seja tarefa que pode ser encomendada a especialistas de dentro ou de fora da instituigo (diferentemente do marco referen I, que deve ser elaborado pelo grupo que trabalha na instituico, com a ajuda de livros e especialistas, se parecer conveniente), é importante que sua defini¢lo seja realizada Por todos os que trabalham na instituicdo (pessoalmente e n3o de forma representada, sempre que possivel). Isto porque, além de ser tarefa esclarecedora e educativa, seu resultado deve ser coerente de forma total com o marco operativo. O estabelecimento das éreas da pesquisa consiste na divisao do contetide do marco operativo ‘em dreas abrangentes, quantas forem necessarias para cobrir a matéria nele tratada, Trate-se, basicamente, de prever em que aspectos deve ser descrita a realidade (em que aspectos ha interesse em fazer o levantamento da reslidade da instituico). Obviamente, estes aspectos so 05 apresentados no marco operativo, jé que nao vao interessar outros aspectos, aqueles que no dizem respeito as preocupacies atuelizadas da instituicdo. Se o marco operativo fala ‘em participago, em direco conjunta, em relaco escola-comunidade, estas sero outras tantas éreas de pesquisa, porque é necessério saber como a realidade est nesses pontos, para comparé-la com o ideal tragado. Para cada érea deve-se definir o que se pretende verificar, isto &, determinar 0 objetivo da pesquisa naquela érea. S40 exemplos de objetivos: verificar até que ponto o trabalho realizado nna escola contribui para tal aspecto; descobrir até que ponto tal outra coisa esté presente na escola; até que ponto a escole esté alcancando tal outro aspecto; como é @ consciéncia de ‘alunos e/ou de professores em tal aspecto etc. Mais dificil é estabelecer indicadores, isto é, determinar evidéncias - fatos, situacbes, ages - ‘que mostrem que tal aspecto (area) esté presente na realidade da instituicSo. © quadro a seguir mostra 6 resultado a que chegou uma escola no seu trabalho de definico da pesquisa (uma parte apenas: o trabalho tinha mais reas} Area: Criatividade Objetivos: Verificar se na escola hé ambiente para desenvolver 2 criatividade. Indicadores: Produz-se material novo, hé desenho artistico, hé entrevistes e pesquisas, apresentam-se experiéncias, hé trabalho do aluno em sala de aula, ha festivais, exposicdes, assembleias, feira de ciéncias e concursos literérios. Area: Senso Critico Objetivos: Verificar se a escola dé oportunidade para o desenvolvimento do senso critico. Indicadores: Hé auto avaliacdo e aveliacdo grupal, ha debates, ha contestaces, reivindicacdes, fazem-se pesquisas, hé tomada de posicdo (aluno e professores). b) Elaboragdo de instrumento(s) Tendo bem claras as dreas, os objetivos da pesquisa e, sobretudo, os indicadores, nao & excessivamente dificil preparar instrumento(s) para levantar dados. Antes de preparar instrumentos, ¢ conveniente reunir as informacGes requeridas pelos objetivos e indicadores e que jé estejam & disposicgo. Evita-se, assim, um trabalho desnecessario. Estes instrumentos sero, geralmente, questionérios, roteiros de entrevistas e fichas de observacdo. Todos eles se resumem a urna série de perguntas que, respondidas, mostram a existéncia dos indicadores e a intensidade dessa presenga. Hé bibliografia suficiente sobre os cuidados que se deve ter na preparacdo de instrumentos. Julgo que devo lembrar, de passagem, dois desses cuidados. Primeiro, todo instrumento deve ser apresentado a quem conhece bem o tema de que ele trata, @ fim de que haje um pronunciamento sobre se os indicadores foram realmente bem organizados, isto &, se os dados a ser recolhidos sero necessérios e suficientes para atingir 0 objetivo da pesquisa naquela area ‘Segundo, todo instrumento deve ser aplicado a um pequeno grupo da populagdo-alvo a fim de verificar se as perguntas esto sendo compreendidas do mesmo jeito por todos os que iréo responder, isto é, para verificar se as perguntas esto claras, ¢) Aplicacdo do(s) instrumentos(s) Entre nés, educadores, € corrente o pensamento de que conhecemos a realidade e de que no hd necessidade de investigacéo cientifica. € um erro que seré rapidamente compreendido quando iniciamos um trabalho de aplicacdo de instrumentos de pesquisa entre professores, alunos € pais de alunos. Entre os cuidados que se deve ter na aplicago de instruments de pesqui nas obras que tratam do assunto, quero ressaltar dois pessoas que conhecem a realidade que se quer abordar e nada perguntar a quem ganharia algo se mentisse ou perderia se dissesse a verdade. a, bem catalogados direcionar os instrumentos aquelas d) Tabulagdo dos dados Tarefa rotineira que consiste em estabelecer o niimero de vezes que cada resposte aconteceu, ‘com a respectiva percentagem. ) Leitura dos dados Consiste, basicamente, na passagem dos ntimeros para uma linguagem comum que descreve 0 que esté acontecendo (0 que é), sem contudo emitir diretamente um julgamento sobre esta realidade. Procura descrever com detalhes a situaco, baseando-se nos dados e sé nos dados, € utiliza expresses deste tipo: muitissimos, todos, quase todos, ninguém, quase ninguém, quase todos, fraco, forte, sempre, nunca, 4s vezes, quase sempre, quase nunca, muitos, fracemente, fortemente, 2 maioria, totalmente, de um modo geral, muito forte, muito fraco, oucos, pouguissimos, ha indicios, hé quase certeza, é dificil saber, néo hé dados, presumivelmente... Chega-se uma descrigdo de realidade e, se a pesquisa foi bem definida bem realizada, tem-se uma visio da instituigéo naqueles aspectos que interessam porque esto no marco operative Ojuizo Mesmo que a elaboracéo de instrumentos, sua aplicacao, a tabulacio de dados e até sua leitura tenha sido realizada por uma equipe da instituic&o ou de fora dela (como aprendizagem é excelente que todos os membros da instituigéo participem destas tarefas), é importante que © juizo sobre a realidade seja executado pelos que participam da instituicdo, todos ou o maior numero (representativamente) possivel. Para realizer 0 diagnéstico, é necessério voltar ao marco referencial, sobretudo ao seu aspecto operative, @ comparar o que se previu como desejével com o que se verificou ester acontecendo na realidade e que esté expresso na leiturs de dados, conclusio da pesquisa. Trata-se basicamente de responder as questées que abrem este capitulo: a que distancia esta 4a instituico do tipo de ser, de organizaco, de metodologia ago que se propés no marco ‘operative? Que caracteristicas tem essa distancia? Que fatores influem para aumentar essa distancia? Com que conta a instituicdo para diminuir essa distancia? Quais as causes dos problemas existentes? PROGRAMACKO Se 0 planejamento ngo leva a clareza em relacio 20 agir, é preferivel evitar falar em planejamento: para ndo se enganar. A programago € 2 proposta de aco para aproximar a realidade existente realidade desejada, Os autores concordam que @ clareza naquilo que se vai fazer concretamente € 0 resultado mais desejavel de um plano e, mesmo, sua parte mais importante. Isso € correto. O que a maioria néo acentua é que alcancar essa clareza ¢ tarefa que depende de um bom marco referencial e de um bom diagnéstico. A programacao tem duas dimensdes: a dos objetivos e @ das politicas. Esta dupla face da programacéo é ponto que trez algumas dificuldades tedricas e que, por isso, néo é suficientemente levado em conta na teoria e na prética, com enormes prejuizos para o bom nome e para a eficiéncia do planejamento, Vale 2 pena aprofundar o estudo deste aspecto, mesmo que ele pareca desnecessério: os resultados que advém da compreensdo deste ponto num processo concreto de planejamento séo valiosissimos, Objetivos Objetivos sé propostas de acdes concretas que devem ser executadas em um tempo determinado e servem para aproximar a realidade existente 3 realidade desejada ou para preparar condigdes a fim de que essa aproximacdo possa acontecer. A realizacdo dessas acdes coneretas vai requerer recursos humanos e materiais e prazo. Os critérios basicos na fixacdo dos objetivos séo sua necessidade © sua exequibilidade no tempo de duracdo do plano, segundo as circunstancias existentes, com os recursos de que se dips necessérias (para aproximar 0 real do ideal ou para permitir que se criem condicdes para isso), as ages concretas que vo constar como objetivos na programacdo devem ser mas devem ser, também, exequiveis. Observe-se que a situacéo aqui é completamente diferente daquela no momento de proposic#o do marco referencial: naquele oportunidade, os ossos anseios, as nossas grandes ideias no sé podem como devem estar presentes; na programacéo, embora continue presente o "dever ser", isto é, aquilo que & necesséri aparece com forga maior a categoria do possivel. 1. Tendéncias atuais na fixagio de objetivos Quando se trata se fixar objetivos, encontramos, entre as pessoas envolvidas com educacéo, duas tendéncias bem claras, cada uma com suas vantagens e seus defeitos (quando se trate de pasar aco). A primeira & propor objetivos amplos, um tanto quanto abstratos, cuja enunciaglo néo leva fem conta ages que no so enunciadas. Como consequéncie, 0s objetivos se apresentam como aspiragdes (muitas vezes vagas) e terminam como matéria para reflexes desligadas da realidade, mas no como dinamizadores e desencadeadores de acdo. Nao se faz uma exata distingdo entre o que é contetido e forma de marco referencial e 0 que é contetido e forma de programacéo. ‘Sé0 assim os objetivos que falam, por exemplo, em “insercdo € participa¢o no contexto histérico", em "valorizacdo da pessoa", em "conscientizacao e integracdo" etc. Tais formulagdes tém, claramente, um mérito importante: colocam os participantes de um proceso numa perspectiva do marco referencial, no ficando apenas na execucdo de acdes desligadas de um posicionamento e de um fim. © problems esté em que se contentar com formulacdes desse género é entorpecer-se em palavras que no levam & realizac3o daquelas, aspiracées legitimas. "Desenvolver 0 espirito critico", "fazer crescer a solidariedade" so exemplos desta forma de propor objetivos: a ago é dificil porque no hé nada concreto nestes ‘enunciados em termos de aco. A segunda tendéncia surge, exatamente, pare eliminar esse grande defeito da forma anterior de fixar objetivos, Pensam os educadores objetivos operacionais que tém, justamente, a virtude de trazer 0 esforgo para um campo em que é possivel saber o que fezer concretamente. O que acontece com isso ¢, contudo, um grave problema: o esforgo educacional se desligando gradativamente de objetivos que signifiquem fins importantes e a priséo em pequenas aces sem que se lembre com clareza para que, mesmo, elas estavam sendo realizadas, Fixam-se claramente objetivos, como: “identificar pronomes pessosis", “ouvir em siléncio as recomendagées dos professores". A partir dai tem-se clareza sobre o que se vai fazer, mas facilmente se esquece de que se vai fazé-lo, tanto num nivel imediato, pessoal, como num nivel mais abrangente, social. 2. Proposicéo Para sanar as desvantagens apontadas, conservando os beneficios, surgiu @ proposta de elaborar objetivos de forma que aparecesse, sempre, "o que” se vai fazer e "para que” se vai fazé-lo, Assim, buscam-se resultados significativos e sabe-se claramente o que se vai realizar. E, sobretudo, aumenta-se a possibilidade de que haje coeréncia entre o que se quer alcancar e © que se faz para aleaneé-lo. Exemplificando, podemos analisar melhor essas vantagens. Utilizo um objetivo no nivel de plano global de médio prazo de uma escola: "Dinamizar a vivéncia do método cientifico em toda a esfera de atuacdo, para desenvolver habilidades de observacio e de senso critica”. "Dinamizar a vivencia do método cientifico" é algo concreto, que se pode fazer (desde, é claro, que se saiba o que é método cientifico). €, portanto, um "o que" itl de figurar num plano (ndo de curto, mas de médio prazo). "Desenvolver a capacidade de observacdo e de senso critico" é algo importante (desde que o grupo pense, realmente, que é importante ao homem ser observador e ter senso critico - 0 estatia expresso no marco referencia) Observe-se que podem ser escolhidas outras acdes para contribuir para o desenvolvimento da observacdo e do senso critica, Esta deve ter sido escolhide porque o diagnéstico mostrou que possivel fazer isto em tal realidade, porque existem condigSes (sabe-se o que é, os professores aceitam, ha recursos...). Do mesmo modo, a dinamizacdo do método cientifico poderia ser proposta como alternative para alcangar outra coisa que no o desenvolvimento do espirito de observagéo e de senso critico. Dessa forma, quando se realiza algo, procure-se, explicitamente, atingir 0 que ficou expresso no marco referencial. A escolhe do que se vai fazer é condicionada por alguma finalidade. Outro exemplo mostraria melhor essa situago: "Implantar um proceso de planejamento para incrementar @ perticipagdo", Poderia ser para "desenvolver o espirito critico” , até, para "aumentar a forca da equipe de direcdo”. Além do natural sentido de aumentar a eficiéncia do processo, que pode ou ndo ser expresso. Esta técnica de expressar objetivos permite dimensionar melhor o que se quer alcancar com determinadas ages (0 enfoque principal fica expresso e quando se age se sabe claramente 0 que se estd buscando, o que, assim, se alcanca mais fécil, répida e profundamente), Por outro, lado, permite escolher com mais preciséo aquelas aces que serdo importantes para alcancer determinados fins que nos interessam. 3, Arvores de objetivos Em termos gerais, 4 moda de um modelo para compreender @ realidade, € evidente que a intencionalidade do nosso agir faré suceder que uma aco reelizads (junto com outras do mesmo nivel) cooperaré para alcangar algo proposto como nivel imediatamente superior; que este algo alcancado (juntamente com outros do mesmo nivel) ajuda a alcancar algo mais, distante; que isso, quando alcancado juntamente com outros do mesmo nivel, é fator de alcance para algo mais distante; e assim por diante, até o alcance do que o grupo tem como bem supremo, seja o reino de Deus, a democracia, o dinheiro, o bem-estar ou outra coisa qualquer. Isto nos faz chegar a0 que vou chamar “srvore de objetivos", cuje compreensSo parece ttl para 0 caso de planejamento de uma instituico - uma escola, por exemplo - que pretenda ‘cumprir seu papel de contribuir para o bem global de um povo e no apenas transmitir alguns fatos e algumas férmulas sem validade real alguma. Por meio desta "érvore", busca-se ume coeréncia em termos de objetivos em seus diversos niveis, Ela representa, contudo, antes um ideal ao qual se pode ir aproximando a compreenséo ‘que 3 instituigo tem de seu agir, do que algo que vai ser alcancado com todo o rigor: no é, praticamente, possivel dominar de tal forma o agir humano, havendo sempre parte da aco ‘que ultrapassa os esquemas de planejamento. Além disso, é preciso considerar que nenhum esforgo setorial & capaz de direcionar 0 aleance dos fins mais distantes, mas apenas de contribuir para que eles se realizem. Essas observagGes sobre limitagdes néo retiram o valor do que disse acerca da "érvore", cuja configuraco pode-se ver na figura ‘So varios grupos de "o qué" (acdes concretas) contribuindo, cada grupo, para um "para qué". Estes, por sua vez, se reagrupam, s#o “o qué" para algo mais importante e, assim, sucessivamente. ‘A medida que a clareza se implanta em todo o agir de uma instituico, a5 relacdes entre os diversos "o qué" e 0s diversos "para qué” se tornam mais precisas e, sobretudo, as ages do dia adquirem o valor de ser executadas para algo e de realizar, assim, a5 ideias que permeiam e revigoram a instituigo (que vo sendo fixadas no marco referencial). Ressalto, de novo, que, se esta coeréncia tdo global perece inatingivel (de fato é); isso néo deve preocupar ninguém: nem se pode pensar que os objetivos expressos no planejamento atinjam tal perfeicdo. A validade de refletir sobre e tentar realizar esse tipo de organizacao nos objetives é a de alcangar o maximo de coeréncia e, sobretudo, de ndo se resvalar para uma incoeréncia tdo grande que nao haja mais sentido falar em planejamento. 4, Objetivos gerais e objetivos especificos ‘Se quisermos falar em objetivos gerais e especificos, devernos lembrar que isso € relativo 40, nivel de generelidade em que nos colocarmos. Mas, sempre que tivermos um objetivo geral (com seu "o qué" e seu "para qué"), 05 objetivos especificos sero um conjunto de "o qué”, todos com um "para qué" igual a0 "o qué de objetivo geral. Voltemos ao exemplo concreto apresentado acima: "Dinamizar a vivéncia do método cientifico para desenvolver as capacidades de observacéo € de espirito critico". Os objetivos especificos desse objetivo gerel serdo acdes concretas (0 qué), cujo "para qué", de todas, seré "dinamizer ‘a vivencia do método cientifico” Poderiamos pensar, embora isso possa ser diferente porque aqui tudo é relative, que os objetivos gerais fossem dos planos de médio prazo e os objetivos especificos, dos planos de curto prazo. 5. Dimensdes dos objetivos © que se pensou como ideal (marco referencial) tem duas dimensdes, ¢ € nelas que os objetivos vo se organizando: a doutrinal e a operativa. Assim, os objetivos devem ser propostos a fim de contribuir para a eproximago da realidade aquele ideal de homem e de sociedade expresso no merco doutrinal e para aproximar o modo de ser e de agir da instituicgo ‘aquele ideal tracado no marco operativo, Dito de outrs forma: tendo sido indicado um ideal de homem e de sociedade e um ideal de instituigo, os objetivos s8o propostos para transformar, nos dois casos, a realidade existente, a fim de aproximar este real (em cada caso) ao ideal tracedo. 6. Responsabilidade na execug3o, Muito importante é que a realizagio de cada objetivo seja atribulda a alguém. $6 pode haver resultados praticos se cada um dos objetivos estabelecidos estiver sob a responsabilidade ou de alguém ou de algum érgdo da instituigo; nBo é necessariamente ume responsebilidade que signifique ser essa pessoa ou drgéo 0 executor des agdes incluidas no objetivo, mas que, de qualquer forma, configura a responsabilidade de coordenacéo para que essas acdes aconteam. Distinguirei, no capitulo seguinte, plano global e planos setoriais e veremos que ha ‘objetivos da responsabilidade das coordenacées dos diversos setores (planos setoriais). E dificil ressaltar suficientemente que, em planejamento, no se pode felar em objetivos se @ proposicéo que os encerra nao traz, junto, a conotaco da realizacao concreta de agdes rumoa alguma coisa. € clero que @ palavra objetivo pode significar outras coisas, como aspiracdes, fins, mas ela esta sendo utilizada neste livro com 0 significado bem especifico que foi ~apontado. Politicas e estratégias Outra modalidade de proposigio para @ mudanca da realidade € o estabelecimento de politicas e estratégias. € outra forma de eproximagéo @ aco, &s vezes confundida no ambito da denominaco geral e inespecifica de objetivos. E sumamente importante esta distinggo para aumentar a funcionslidade de um processo de planejamento. io dos Politicas so, também, como os objetivos, propostas de programacéo. Ao contra objetivos, que sao acées concretas que devem ser realizadas em um determinado tempo, as politicas so principios de ago, propostas para dar uma direcgo propria a tudo o que se faz na instituigdo. Lembre-se aqui que nem tudo pode estar nos planos, havendo sempre coisas que acontecem fora e além dos objetivos propostos. A elaborago de politicas é a tentative de abarcar de modo mais amplo todas as ages da instituicdo: qualquer coisa que se faca seja realizada dentro dos principios de acdo que so as politicas, escolhidas para o tempo do plano. Deste modo, como acontece com os objetivos, as politicas também expressam prioridades. Tomemos um exemplo de politica: "Que a anélise constante da realidade leve a0 desenvolvimento do senso critico"; ou, simplesmente, enunciando o principio: "A analise constante da realidade leva ao desenvolvimento do senso critico”, Prefiro a primeira dessas formulagées porque é mais impulsionadora da aco. Proponho @ outra porque também pode ser escolhida e, sobretudo, para que se verifique 2 existéncia do principio por trés da politica. Hé casos, talvez, em que haverd necessidade de expresser politicas que sejam apenas um desejo, sem um principio que as fundamente, mas isso no tem forga e deve ser evitado. Um grupo (instituicgéo) que adotasse tal politica, estaria propondo que todas as acdes que se realizassem naquela instituiggo, durante o desenvolvimento daquele plano, deveriam estar, sempre que possivel, sob @ inspirago daquela politica, isto ¢, relacionadas & anélise da realidade e comprometidas com o desenvolvimento do espirito critica. As politicas brotam do marco referencial. S80, no fundo, opedes mais claras e mais bem expressas de pontos importantes, jd constantes no marco referencial e que se verificou serem mais importantes para o periodo de dura¢o do plano apés a realizago do diagnéstico. Assim, as politicas tém a funcdo de fazer com que tudo o que foi expresso no marco referencial é mais necessério ¢ de alguma forma possivel para o periodo do plano - 0 diagndstico é que esclarece isso - esteja sendo trabalhado, mesmo que no seja possivel sob a forma de objetives. A idela € que todas as acdes que se realizem em qualquer nivel na instituigo sejam orientadas pelas politicas escolhidas. Julgo que no poderei insistir suficientemente na forma das politicas para a transformacéo da realidade: elas representam todas as pessoas todos os grupos na instituic&o realizando suas tarefas - 05 préprios objetivos dos planos - segundo orientagdes globais, escolhidas por todos, para o conjunto. As estratégias completam o sentido das politicas. Elas séo escolhidas, para cada politica, em conformidade com o que o diagnéstico demonstrou ser possivel e aconselhdvel. As estratégias so modos concretos de realizar, naquela realidade particular, 0 principio ‘expresso pela politica. Tomemos um exemplo, sempre lembrando que o contetido € 0 jeito da expresso so préprios de cada grupo que planeja: desenvolvimento do senso critica" Jue a participagdo seja a alavanca para o © niimero de estratégias para qualquer politica pode ser grande ou pequeno: o que definiré isso seré o encontro do marco operativo e do diagnéstico, que diré, enfim, o que & necessério, © 0 que é possivel- trata-se de uma possibilidade mais ampla, no tdo especifica quanto a dos objetivos, jd que as estratégias serdo submetides a outro exame de exequibilidade, uma vez ‘que s&0 sugestes para servir, na medida do possivel, em planos de nivel mais baixo. Do plano de onde tirei esta politica, constavam como estratégias: - orgenizar equines de reflexdo; - elaborar textos que levem a reflexéo; - realizar debates sobre o sistema educacional do Estado; - elaborar objetivos junto com os alunos; incentivar grupos existentes; - descentralizar as decisdes. Como se vé, as estratégias so sugestées de ages e de modos de ago propostos pare niveis diversos, todos levando & realizac&o do principio de ago (politica) escolhido. Assim, quando se fala em todas as pessoas e em todos 05 grupos de uma instituicdo buscando realizar algumas ideias (politicas), fala-se dessas mesmes pessoas e desses mesmos grupos vivendo atitudes (estratégias) que tornam reais estas ideias. Tanto as politicas como as estratégias aproximam-se muito dos objetivos (politicas, dos gerais; estratégias, dos especificos), Sao diferentes por causa de sua formulacao e porque os objetivos dever ser programados com a consideracdo de recursos, tempo, etapas e atividades, ‘enguanto as politicas e estratégias ficam no campo da orientacéo. Note-se que hé preocupacdes dos componentes de um processo de planejamento que devem (por causa da realidade) ser transformadas em objetivos; outras, em politicas ¢ estratégias. Algumas dessas preocupacées devem transformar-se numa ou noutra destas categorias em razo de sua natureza E conveniente que um plano concreto inclua objetivos e também politicas e estratégias com a finalidade de que as coisas que nfo conseguimos realizar plenamente ja, agora, tenham orientacdo, isto é, um rumo, uma linha, Enquanto 0s objetivos tero sua execucao sob a responsabilidade direta das chefias da instituigo - os dos planos globais, da coordena¢o superior; os dos planos setoriais, da coordenago do respectivo setor -, as politicas e estratégias so da responsabilidade de cada grupo e de cada pessoa na instituicgo, as politicas servindo como direcionamento global da acdo e as estratégias se transformando em objetivos nos planos dos grupos e das pessoas e, assim, realizando, mais plenamente, a respective politica. Instrugdes para a execug3o Imaginemos que estejamos falando de um plano global de médio prazo de uma instituiggo, por ‘exemplo uma escola, Nele, apds 0 marco referencial © 0 diagndstico, escrevemos a programacao, com objetivos, politicas e estratégias. Sera necessério incluir, ainda, as "Instrucdes Gerais para a Execucdo", Sergo indicacdes que corientem, mais do que isso, que forcem a execugé0. Embora seu contetido deva atender inteiramente as necessidades do grupo, tais instrusdes contero, principalmente: - ordem e datas amplas de execucéo dos objetivos; - responsaveis pelo desencadear e pels coordenacao geral dos objetivos; - possiveis orientagdes para os objetivos especificos; indicagdes sobre a vivencia das politicas, incluindo pricridades; - épocas e responséveis pela coordenacdo dos planos de curto prazo e dos planos setoriais; + frequéncia de reunides que dizem respeito & execucio do plano; - indicagdes a respeito de recursos em geral e, em especial, os humanos € os econémico- financelros; = esclarecimento de relacdo entre objetivos e politicas, PASSAGEM DO PLANO GLOBAL DE MEDIO PRAZO AOS OUTROS PLANOS Retina o mais firme realismo & mais candente utopia. Numa instituigso que esta em um processo de planejamento ocorrem varios planos, de diversos niveis e de diferentes duracées. Insisto em que € mais importante 0 processo de planejamento do que os planos. Reitero, por outro lado, que os planos consolidam 0 processo de planejamento e déo aos que deles participam a oportunidade do esclarecimento e da preciséo. © plano central, do qual os outros dependem, ¢ 0 que chamamos aqui de plano global de médio prazo. Ele é elaborado para ter vigancia de trés, quatro, cinco, seis anos, abrangendo toda a instituigéo em seus mais variados aspectos. A partir desse plano, que busca especificar as propostas e aproximar sempre mais o Pensamento da aco, serdo elaborados planos, menos abrangentes, para orientar a aco: 42) de setores da instituigdo (planos de setores); b) de periodos menores (planos de curto prazo). Planos de setores Os planos de setores se organizam pare o mesmo periodo do plano global de médio prazo, especificando @ tematica para o setor (departamento, diviséo...) respective. Tero @ mesma estrutura: marco referencial, diagndstico, programacao. Na meioria das vezes, 0 marco referencial, em seus aspectos situacional e doutrinal, permanece o mesmo. Quando muito teré certas especificagdes concernentes 2o setor para o qual foi elaborado. No aspecto do marco operative, 0 marco referencial sofre mais transformagdes porque o plano estard tracando linhas para uma organizacéo e para um agir de contetidos muito especificos (do setor). O diagnéstico, com os temas tratados no marco operativo do plano do setor, seré diferente do diagndstico do plano global de médio prazo, embora possa retomar e aprofundar pontos. Obviamente hé necessidade de um conhecimento da realidade do setor para se chegar a um jagnéstico (que ¢ um juizo). Nem sempre, contudo, @ pesquisa 2 realizar para esse conhecimente deverd ser tdo ampla quanto a que requer o plano global. As pessoas envolvidas conhecem mais a realidade porque ela é mais restrita e mais proxima A programaco do plano do setor (acentuamos aqui os objetivos, jé que as politicas so as mesmas, com acréscimos ou no) decorre do confronto entre o marco referencial e 0 diagnéstico (ambos do plano do setor). Certamente, serdo coerentes com os da programaczo do plano global de médio prazo porque o ponto de partida para os dois casos é 0 mesmo. A presenca desta coeréncia é, até mesmo, um critério para julgar @ qualidade do proceso de planejamento que se esté vivendo, Com @ continuidade do processo, € normal que @ coeréncia va crescendo. Se as politicas e as estratégias do plano global de médio prazo estiverem bem tragadas, 05 objetivos dos planos setoriais se ligaro a elas, sendo, muitas vezes, os "o qué" destes objetivos muito parecidos ou iguais as estratégias estabeleci das. Por outro lado, esses objetivos setoriais explicitam, as vezes, objetivos do plano global de médio prazo. E util observar que 0s objetivos do plano de médio prazo indicam aces que a instituicéo vai realizar como um todo, e que eles so responsabilidade direta (de coordenacdo e de iniciativa) dos organismos centrais; além disso, os objetivos dos planos do setor indicam acSes que ‘aquele setor vai promover sob 4 responsabilidade de sua propria chefia. As polticas, por outro, fo, de todos os, lado, comuns a todos os planos, devem direcionar a aco de toda a in: setores, de todas as pessoes. Planos de curto prazo Os planos de médio prazo so feitos pars que a institui¢do alcance uma perspectiva mais ampla em sua aco, para que possa realizar aces mais profundas e mais vastas, para que possa incluir em sua aco 0s apelos que Ihe chegam continuamente, sem, com isso, perder 0 rumo de sua determinaco. Os planos de curto prazo so necessarios para tornar precisa a acdo, para concretizé-la, para realizar, no dia-a-dia, as ideias presentes na instituigdo. Tanto em relagéo 20 plano global como no que diz respeito aos planos setoriais, hé necessidade de se cheger a plenos de curto prazo, a partir dos respectivos planos de médio prazo. © modelo € o mesmo: marco referencial, diagnéstico, progremacéo. Elaborar um plano é, sempre, decidir sobre o que queremos alcangar e sobre como devemos agir para isso; verificar ‘a que distancia estamos do modo pelo qual devemos agir; determinar, concretamente, o que faremos no periode do plano para diminuir a disténcia. Antes de elaborar 0 plano de curto prazo, hé necessidade de uma decisdo: quais, dentre os ‘objetivos do plano global de médio prazo, serdo realizados em cada um dos anos de vigéncia deste plano, 0 que, geralmente, jé vai constar das "instrugdes para a execucdo", de que se falou antes. Tal deciséo, por outro lado, pode ter uma ou outra das seguintes orientagées ou a combinaco das duas: a) realizar todos os objetivos durante todos 0s anos, buscando, ano a ano, niveis maiores de realizacdo; b) realizar completamente algum ou alguns dos objetivos em cada ano, buscando o nivel maximo de realizacdo dentro do ano, A segunda hipstese é aconselhavel quando ha objetivo(s) que deve(m) ser alcancado(s) como um patamer para que outro(s) possa(m) ser tentado(s). Evidentemente as vezes, sobretudo quando o plano de médio prazo é de quatro ou mais anos, deve-se considerar a hipstese de pensar o curto prazo como sendo de dois anos e no de um. Tomada a deciséo sobre quais objetivos serdo trabalhados no respectivo ano, é preciso verificar se hé necessidade de complementagéo do marco referencial (doutrinal e operative) € do diagnéstico, agora apenas @ respeito do contetido do(s) objetivo(s) que seré(éo) trabalhadols) naquele ano, Muitas vezes, as ideias relacionadas aquele(s) objetivols) apresentam-se muito gerais no marco referencial (aspecto doutrinal e aspecto operativo sobretudo) e, em consequéncia, no diagnéstico. Ent8o, serd necessério concretizar um pouco mais no marco referencial, as ideias que se relacionam com o contetido do(s) objetivo(s) escolhido(s) para o ano. Deve-se, contudo, levar em conta as possibilidades existentes. Em geral, um grupo, assim que termina a elaboracdo de um plano globel e de um plano setorial de médio prazo, ndo retine condigies de voltar as ideias do marco referencial. Mesmo porque se esgotam as reserves de tranquilidade e de conhecimento, Mas, @ partir do segundo plano de curto prazo, as concretizacSes so valiosissimas. Também o serdo se em médio prazo tiver sua elaboracdo encerrada pelo menos uns quatro meses antes da escrita do plano de curto prazo. Contudo, o ser humano é sempre capaz de superar-se e, 85 vezes, o intervalo de uma semana é suficiente para que possa retomar, com disposigao, & tarefa de explicitacdo, que é mais dificil ~ porque nas generalidades todos concordamos mais -, mas muito enriquecedora. Elaborado este marco referencial para curto prazo (mais restrito e mais explicitado - riqueza de esclarecimento que a instituig3o vai recolhendo), deve-se verificar se 0 diagndstico néo necesita do mesmo tratamento. Tudo vai se tornando mais claro: esse diagndstico (para o qual valem as observacdes feitas acima) aborda pormenores da acdo que vem sendo realizada pela instituigo ou pelo setor. Com explicitago ou ndo do marco referencial e do diagnéstico. (deve ter ficado claro que o rigor tcnico ou cientifico n&o nos devem transformar em inoportunos), & necesséria a ‘especificacto do(s) escolhido(s) para o plano de curto prazo. Tais objetivos sero aces concretas que podem ser realizadas no periodo de validade do plano de curto prazo e que levem, no conjunto, & realizacdo de cads objetivo de médio prazo (geral). Nesses objetivos (tragados com 0 "o qué” e com o "para qué") o "o qué” é aberto e livre, devendo ser decidido, e 0 "para qué” serd 0 "o qué" do objetivo geral. Assim, varias ‘ages concretas ("o qué") ter8o 0 mesmo fim ("para qué") que, por sua vez, se reelizedo, ajudaré na consecugéo de um fim mais elevado. Sempre que possivel (sem que isso constranja), essas aes concretas que s0 0 "o qué" dos objetivos especificos deve ser retiradas das estratégias do plano de médio prazo, sendo exatemente iguais ou delas se ‘aproximando. E dbvio que, quase sempre, nem todas as estratégias so utilizadas porque elas esto ai em abundancia para servir a qualquer plano dentro de instituicdo. A indicagao de prazos, de responsaveis e do espirito com que devem ser realizadas as aces, concretas assume importancia fundamental em planos de curto prazo. ‘Amesma importéncia deve ser atribuida ao estabelecimento de instrucdo para viver as rotinas. Tais rotinas, quando hé um processo de planejamento, so iluminadas pelas politicas de aco. Pode haver, no plano de curto prazo, a escolha de alguma(s) politica(s) para serlem) vivia(s) com mais atenco naquele ano. Mas, além disso, 0 plano de curto prazo pode (seria utilissimo que o fizesse) oferecer instrugSes mais precises e mais concretas, sempre a partir das politicas, sobre o modo de se viver cada uma das rotinas PROJETOS E ROTINAS Gastaram trinta dias cacando rouxindis para comer-lhes a lingua. Foram muito festejados porque @ cagads foi abundante e... morreram de fome. Foi a partir do campo econémico que o planejamento tomou forga e se legitimou em outros setores de atividade humana, Por isso, muitas vezes, elaboram-se planos com modelos retirados da economia, que nem sempre funcionam em outros setores. Lembremo-nos de que o planejamento néo é uma cigncia - que seria aplicével mais universalmente -, mas um conjunto de técnicas cujo suporte tedrico esté, principalmente, nas ciéncias que sustentam a atividade humana em que se situa o planejamento respectivo. Por isso, tudo 0 que diz respeito 2o planejamento tem de se adapter 20 tipo de aco que o grupo que pretende planejar realiza. Na industria, por exemplo, a rotina perde em importéncia, no planejamento, para o projeto. A maior e mais significative parte do que precisa ser plenejedo pode ser organizada por meio dos projetos. Em outros setores da atividade humana, a educacdo por exemplo, as rotinas absorvem o maior esforco das pessoas envolvidas. & claro que as rotinas tamam o maior tempo das pessoas em uma industria. Ali, porém, .as rotinas ndo necessitam mais do que ser executadas - automaticamente produzir3o seus efeitos, sem que haja necessidade de nenhuma teoria para o trabalhador -, enquanto 2 educacSo e outros setores precisam ser ‘constantemente inspirados por um fim, porque interferem nos destinos humanos mais diretamente. Projeto ¢ uma ago desencadeada dentro de um periodo de tempo determinado, geralmente para criar algo que no existia antes. Rotina é um conjunto de ages que se repetem continuamente, cuja duracdo é indefinida dentro da instituicdo, Num plano de escola, por exemplo, é um projeto a organizago ¢ @ realizago de um curso de aperfeicoamento pare professores. Rotina &, por exemplo, o conjunto de tarefas necessérias normalmente para que acontecam as aulas. © que quero ressaltar é que numa escola, por exemplo, so mais importantes as rotinas do ‘que 0s projetos: em primeiro lugar porque é na sala de aula e em outras rotinas escolares que acontece verdadeiramente @ educago e, depois, porque # maior parte do tempo é gesta, justamente, nestas rotinas. Vi muitas escolas que realizavam extraordinarias agdes educativas nas assim chamadas “atividades extraclasse", enquanto na maior parte do tempo faziam um trabalho completamente contrério, de modo algum educativo. As rotinas Por tudo isso, o que distingue o planejamento no campo social a necessidade de dar espirito 4s rotinas, isto é, de realizé-les construindo uma ideia. € necessério, para que se fale em planejamento, que elas sejam realizadas com clereza, para algo definido, e no como acdes formalizadas, sem finalidade e sem a compreensio do que se faz. ‘So as politicas e as estratégias, fixadas na programaco, que mais esclarecem diretamente a5, rotinas, embora todo o processo de planejamento seja téo ou mais importante e, de qualquer modo, imprescindivel. As politicas e as estratégias, escolhidas a partir do marco referencial € do diagnéstico, dio luz as rotinas ¢ pdem todos os setores e todas as pessoas ligados instituicdo em que se planeja num esforco ordenado rumo a algo bern determinado. E por isso que, na programacéo, hé necessidade de estabelecer orientagdes sobre as rotinas, incluindo seu relacionamento com as politicas © com o marco referencial, a forma de realizagao das estratégias e outras especificagbes que forem Uteis ao desenvolvimento das aces cotidianas da instituicao. Os projetos © projeto é algo muito conhecido em planejamento. Faco apenas algumas observacées, que me parecem importantes, sobre # forma de encarar esse tépico em um plano, Primeiramente, nunca se pode ressaltar em demasia que o projeto visa @ alcangar um objetivo especifico (conforme caracterizacdo no capitulo em que falei da programacao) de um plano de curto prazo. Nao tem sentido, assim, um projeto desligado de um plano mais amplo. A verdadeira mania de projetos que se abateu sobre a educaco tem gerado ages esporédicas, até contraditorias entre si, porque é bonito administrar por projetos e no se tem o cuidado de realizar aqueles que brotassem de um plano global (que, a sério, néo existe). Como consequéncia, o projeto abrange uma acdo bem limitada no espaco no tempo. Os projetos que pretendem ser amplos, tomar o lugar de um plano global, perdem-se em palavras no ajudam a realizar nada. Dai @ necessidade de ser 0 projeto algo muito simples, estando as considerages que o ‘embasam jé contidas no plano do qual brotou a decisio do projeto. Precisa ser téo claro e téo simples que qualquer pessoa posse coordener sua execugo, mesmo que no seja da instituicdo em que aconteceré o projeto. Essa clareza e essa simplicidade ndo serdo caréncia tedrica dos que elaboram os projetos, mas demonstracdo de que eles esto esclerecendo & dando preciso maior & sua aco. O projeto é a méxima aproximagéo - junto com a orientacéo da rotina - entre @ elaboragfo (penser) a execugio (agir): constam nele apenas es especificagdes para a acéo, uma vez que a teoria e a doutrina que o embasam jé estavam presentes, Com base nessa simplicidade, além de algums instruco suplementar eventualmente necesséria, as partes de um projeto séo, essencialmente: a) objetivo, com os "o qué" e "para qué” (tomados do plano) muitas vezes aparecendo sob os titulos de objetivo e de finalidade; b) justificativa (breve), se parecer necessério; «¢) localizacdo, dizendo onde sero desdobradas as atividades do projeto; 4) cronograma, dizendo quando aconteceré cade atividade; ) metodologia, descrigio circunstanciada das atividedes, incluindo todas as orientacdes necessérias para que o projeto acontega no espirito que o gerou; 4) recursos humanos, indicacao de pessoas com a respectiva habilitacdo que serdo necessérias para a execuco do projeto; 8) recursos fisicos e financeiros, dizendo o que sera gasto € de onde sairo os recursos; h) critérios de eficiéncia, em que se descreva o resultado que seria aceitavel como consequéncia da execucéo do projeto. Obviamente, mais itens podem ser acrescentados, se necessério, e @ ordem pode ser alterada segundo as conveniéncias. £ util apresenta-lo sob a forma de um quadro, se isto, para 0 grupo, for itil a fim de tornar a compreensio mais clara, que é sempre fundamental, e mais ainda num projeto. Segunda parte Planejar néo é fazer alguma coisa antes de agir. Planejar é agir de um determinado modo para um determinade fim. PLANOS £ PROCESSOS DE PLANEJAMENTO A elaboraco de planos é muito importante num processo de planejamento. Convém repetir contudo: mais importante que o(s) plano(s) é © proceso que se desencadeia. [Hoje fala-se, até mesmo, em planejamento sem planols), 0 que é muito bonito e até funciona para quem domina muito bem a teori do planejamento adquirida na prética. Mas, para introduzir-se um processo, tanto mais quanto maior for a instituicdo, @ elaboraco de planos é quase imprescindivel.] De fato, planos séo escritos para tornar mais eficiente e mais eficaz nossa aco e, sobretudo, para dar consisténcia a um proceso de planejamento, alcancando, como resultado adicional (ndo de menor importancia), ser processo educativo. Fazer plano(s) sem um processo de planejamento é tecer uma rede em que sd hd os nés € nada que os ligue entre si. Ter um processo de planejamento sem planols) é correr o risco de que a rede se desmanche por falta de pontos de ligeco dos fios. Contudo, nem todas as metodologias de elaboracdo de planos so organizadoras de um processo de planejamento, Com muitas metodologias, mesmo que se queira ter um processo, fica-se num suceder de planos desligados entre si Por isso é que apresento algumas sugestes, de como realizar planos salvando o que é mais fundamental, 0 processo PRINCIPAIS CUIDADOS NA ELABORACAO DE PLANOS estrada O planejamento é uma tarefa que anda por uma estreita via entre dois desfiladeiro: é firme desde que se tomem os cuidados necessérios para no cair em nenhum deles. A tendéncia, no planejamento, é a normatividade e, mesmo, uma visio imperativa; por isso a imposi¢o pode instalar-se com facilidade e produzir a manipulago: é um dos precipicios. Por outro lado, 0 desejo de fugir disso pode levar 20 outro desfiladeiro: permitir a desorganizagio que nega o préprio planejamento. © caminho estreito é a coordenacao bem direcionada que retine, incentiva, organiza propostas claras e questiona o pensamento do grupo. Para essa coordenaggo ¢ essencial uma pequena equipe. Essa pequena equipe - néo de planejadores, mas de coordenadores teré como funcdes: a) conhecer a teoria de planejamento; b) ter claro um modelo de plano e um modelo de metodologia de planejamento; ©) ser capaz de: explicar estes modelos; no tomar posigSes que inibam os participantes; sentir ‘0 momento de propor cada etapa ou cada atividade do processo; 4d) redigir, em ultima forma, sempre respeitando o pensamento do grupo. Esta equipe deve fazer deslanchar o proceso de planejamento parece que esta é uma interferéncia ética e cientificamente aceitével no grupo, inclusive com o aval da “autoridade", tendo em vista que néo visa @ manipulago e busca sair do espontaneismo de deixar as coisas ficarem como esto. ReuniSes novas podem ser criadas para isso. Mais importante, porém, é utilizar as reunides jé estabelecidas como ocasides para serem o suporte de tempo necessério & implantacdo de um processo de planejamento. © fundamento e o resumo de tudo, como se depreende de cada pagina deste livro, é colocar, ‘as pessoas como grupo a decidir seus rumos, sob uma coordena¢éo, num proceso em que cada estégio que se alcance seja assumido como algo que meresa o esforgo de todos e, a0 mesmo tempo, seja considerado provisorio, devendo, por isso mesmo, ser ultrapassado por estégios superiores. ABUSCA DO MOMENTO OPORTUNO Quando, numa instituigéo, se decide implantar o proceso de planejamento descrito neste livro, surge 0 problema do momento préprio para o deslanchar das atividades. Seré oportuno que a equipe diretiva da instituigo, tendo constituido @ equipe caracterizada no capitulo anterior, deixe bem clara a proposta de implantar um processo cooperativo de planejamento. ‘Trés varidveis devem ser observadas no que se refere as caracteristicas do grupo principal da Instituigdo (no caso de escola, o corpo docente € o corpo administrativo): 2) motivacgo para e mudanca; b) capacitacdo para o planejamento, incluindo conhecimento dos esquemas mais amplos da metodologia de implantago de um processo e, sobretudo, dominio dos pontos basicos do modelo de plano adotado; ) competéncia profissional. Nao se trata de estabelecer com extremo rigor o nivel de presenca das qualidedes que estes varidveis supdem, Trata-se antes de ter uma viséo ampla sobre as ceracteristicas globais do grupo para decidir os primeiros pasos de acéo, Nunca é demais insistir que no se vai comecar algo @ partir de um zero: a histéria, a “filosofia", mesmo implicita, e as caracteristicas atuais da acéo do grupo so, sempre, 0 ponto de partide. Também vale lembrer que, individualmente, as pessoas do grupo estaro em situacdes diferentes, 0 que, a par dos problemas que causa, traz reais enriquecimentos do todo, Deve-se encaminhar 0 processo conforme a situacio do grupo. Num extremo, haveré necessidade de preparacdo do grupo nos trés pontos (varidveis) apontados acima, desde aspectos introdutérios, por meio de cursos, treinamentos, palestras... No outro extremo, trata- se simplesmente de coordenar 0 grupo em suas definigdes. Em geral, 0 necessério é descobrir em que aspecto o grupo esté forte, fazer disso a base do trabalho e proporcioner aperfeicoamento nos outros aspectos. Nao se pense que hé necessidade de que todos os membros de um grupo tenham condicdes pelo menos razodveis: os estudos citados por Everest Reimer (A escola esta morta) dio conta de que seriam suficientes 30% de pessoas realmente capazes para transformar uma realidade. De resto, © préprio desenvolver-se do processo ¢ 0 melhor método para o crescimento continuo do grupo como um todo e de cada um de seus membros em particular. MODELO DE PLANO E DE RELACIONAMENTO ENTRE PLANOS. E imprescindivel que em toda a instituigo exista, bem claro, um modelo de plano. Sugeri um modelo na primeira parte deste livro. Tenho-o empregado com bons resultados em véries circunstancias e vi instituiges eumentarem sua capacidade de esclerecer sua aco com tal modelo. Mas 0 que importa mesmo é que cada instituigdo va firmando seu modelo - a importncia da equipe coordenadora é fundamental aqui. Vai acontecer, por exemplo, que o modelo iré se modificar conforme o caminho que o grupo for trilhando. E evidente que hé coisas essenciais que devem existir em cada modelo para que se possa falar em planejamento, mas existe a possibilidade real de 2 instituico, sobretudo por meio de sue equipe coordenadora de planejamento, ir organizando seu préprio modelo, aquele que responde de modo mais completo as suas necessidades e as das pessoas que nele realizam o processo, Quando felo em modelo estou pensando, também, no esclarecimento que & necessério aumentar no que se refere ao relacionamento entre diversos planos. O essencial para estabelecer um modelo nesse sentido, tratel-o no capitulo respectivo da primeira parte. E um ideal a ser perseguido: ter clareza cada vez maior a respeito de cada plano em particular € da relago que eles devem guardar entre si. Hé aqui um indispensével servico que, por ser essencialmente técnico, pode néo ser inteiramente estimulado, mas que deve ser prestado pelos que tm "autoridade" Nao € funglo de todos, mas da equipe coordenadora, estar sempre a par do "contetido” dos planos e do processo de planejamento como um todo, que deve sempre ter a viséo global do "administrativo" no planejamento. EXPERIENCIA DE APLICAGAO | Tive sucesso em ajudar as pessoas a se organizarem e @ decidirem com mais clareza, consciéncia e coeréncia a direco de seu agir quando Ihes ofereci técnicas que incentivaram a participagéo. Apresento aqui algumas sugestdes, Outras técnicas podem ser usadas. Os exemplos que dow slo para ajudar a firmar as linhas gereis que esto presentes neste tipo de metodologia. As técnicas podem variar bastante: 0 que é preciso salvar é a participacéo. Pediu-me uma escola a assessorie para desencadeer um processo de planejamento. Era uma escola pequena, com apenas 32 professores, aos queis se junteram a diretora, 0 secretério e 0 coordenador pedagdgico, que também lecionava. Decidimos, segundo as possibilidades existentes, que teriamos dois dias para a elaborago do marco referencial, dois para o diagndstico e um e meio para a programagio. Como se vé, a proposta foi elaborarmos um plano global de médio prazo para a escola em questo, como forma de desencadear um processo de planejamento, Levamos em conta que um plano global de médio prazo: a) pde o grupo em acao de planejar, capacitando-o progressivamente para a tarefa; b) estabelece a existéncia das etapas de elaboracdo, de execusdo e de aveliacSo; ¢) cria necessidade de planos inferiores. Reuniram-se os professores no final das férias, dispostos a permanecer reunidos durante uma semana, das 8 as 12 horas, das 14 as 18 horas e das 20 as 22. (Em outras oportunidades, nio podendo os professores se reunir da forma indicada, utilizei vérios outros esquemas, com reunides de manhis inteiras durante o ano, de dias e até de algumas horas.) Alguns cuidados foram sempre tomados: a) néo decidir nada nem avaliar textos em plenério, mas sempre em grupos de 5 a 7 pessoas, ‘com esquemas para ir reunindo os resultados dos grupos; b) no realizar trabalhos de grupo sem realizar antes trabalhos individuais; ©) organizar sempre equipes de reda¢o para liberar os grupos dos detelhes redacionais € permitir, assim, que se esmerassem na clareza e na adequagio das ideias; 4d) dar a0 plenério as fungdes de: + esclarecer os textos intermediérios para que pudessem, de pois, ser avaliados nos grupos € reorganizados; - restabelecer, sempre, a visio global do que estava acontecendo (reenfocar 0 grupo, quando necessério); ~ servirem os grupos de inspiraco uns 20s outros quendo relatavam seus trabalhos; ~ estabelecer critérios de avaliacdo do que se ia produzindo; €) decidir sempre, antes de cade tarefa, 0 tempo que se dedicaria a ela; sobre esse tempo, convém ressaltar que: = ndo se deve querer algo perfeito de uma s6 vez: a forma correta € retomar varias vezes & mesma tarefa, introduzindo sempre novas melhorias em novas versées; por isso 0 tempo para cada atividade pode ser menor; = 0 tempo deve ser decidido pelo grupo de perticipantes com os esclarecimentos da equipe coordenadora, que tem um programa global aproximado de distribuicdo cronolégica; = 0 tempo estabelecido para cada tarefa deve ser escrupulosamente mantido para o bom andamento do todo; 4) quando se chegava 2 um resultado, mesmo que intermedirio, ele era epresentado de forma que todos os participentes podiam acompanhar sua leitura, fosse @ quadro-negro ou em cartezes, quando a extensao era pequena, fosse em papéis mimeografados quando a extenséo do texto 0 pedia (o simples ouvir o texto, sem que todos possam acompanhé-lo, de nada serve para 0 progresso dos trabalhos). Para o plano, seguimos 0 model o trabalho. \cluido na primeira parte, donde surgiram trés etapas para Primeira etapa - Elaboracdo de um marco referencial De inicio, explicitei o que é um marco referencial, distinguindo suas trés parte Depois, foi estabelecido o objetivo desta primeira etapa: definir a identidade da escola, por meio de um marco referencial. A partir dai, desencadeou-se um processo participative de elaboracao que passo a descrever. A. Distribuiram-se aos participantes pequenas fichas (1/8 de folha oficio). Nelas os participantes escreveram temas que deveriam constar no marco referencial. (Trabalho individual, com utilizago de toda a bibliografia possivel, escrevendo-se em cada ficha um sé tema, anotando, cada vez, se tratava de tema para marco situacional, para marco doutrinal ou para marco operetivo.) A idela ere recolher aqueles temas que mais preocupavam os participantes. € importante ressaltar que todos preencheram as fichas individualmente ou, no maximo, de dois em dois, utilizando seu conhecimento e também a bibliografia que cada um julgava importante e outra que fol posta & disposic&o do grupo pela coordenacéo. O critério bésico nessa atividede foi a ‘abundancia: era o momento de reunir o maior nuimero de temas que parecessem vélidos para estabelecer a identidade da escola. Por isso, sempre que houve duvida sobre a utilidade de qualquer tema, os participantes a manifestaram. Depois se faria a seleco. Tempo: 30 minutos B. Reuniram-se os participantes em seis grupos, distribuidos por acaso. Os grupos 1 e 2 receberam as fichas identificadas com MS, metade para cada grupo; 0 grupos 3 e 4, as fichas ‘com MD € os grupos 5 e 6, as fichas com MO. A tarefa, para cada grupo, consistia em, utilizando os temas propostos, reuni-los de forma coerente, tentando elaborar um esquems (um indice) pare o futuro MS, MD ou MO. Durante o rapido plenério em que se organizaram os grupos ¢ se esclareceu a tarefe, foram fixedos critérios de selecio e de organizacio dos temas (indicados e aceitos pelo grupo): - que fossem claros; - que fossem abrangentes, mas concretos; ~ que sugerissem inovaco; = que tivessem embasamento tedrico; ~ que, no conjunto, tivessem sequéncia; = que, no conjunto, fossem coerentes entre si C. Em plenério, foram apresentados os seis conjuntos de temas (quase esquemas) que tinham sido escritos em grandes pedacos de papel de embrulho: cada grupo explicou como trabalhara, que dificuldades encontrou; em seguida, leu o resultado @ que chegara e respondeu 8s eventuais perguntas que incidiam (no podiam ser feitas avaliagies) sobre o significando exato das expresses. D. Novamente em grupos (os mesmos), fez-se @ avaliacéo (néo a modificacio) dos "quase- ‘esquemas" expostos, Os grupos 1 e 2 avaliaram 0 trabalho dos grupos 3, 4, 5 e 6; 0s grupos 3€ 4, dos grupos 1, 2, 5 e 6; 05 grupos 5 e 6, dos grupos 1, 2, 3, € 4. A tarefa consistia em dizer-se (© que estava bom e 0 que estava mau, segundo os mesmos critérios estabelecidos antes. Acrescentourse um critério: que os temas tivessem coeréncia no todo, incluindo os trés aspectos do marco referencial (MS, MD, MO). Os participantes foram alertados de que mais, importava 0 mérito em grandes linhas do que os detalhes. Todos deveriam buscar que suas observacées gerassem futuras mudangas no esquema para que o marco referencial viesse @ ter condigSes de funcionalidade real. Foi pedido a cada grupo que fizesse duas cépias de suas observacées. Tempo: 35 minutos E. Em plenério, foram lidas as observacdes sobre cada esquema, tentando sempre que todo 0 grupo tivesse presente que se estava escrevendo um marco referencial para a escola, F. Reunindo, novemente, 0s mesmos grupos, foi feita uma nova versio dos esquemas: grupos 1 € 2, do marco situacional; 3 € 4, do marco doutrinal; 5 e 6, do marco operativo. Cada grupo recebeu cdpia das observacdes dos grupos sobre seu primeiro trabalho. Deveria ser aproveitado tudo que até ai surgira: cada grupo que fizesse uma matriz do resultado de seu trabalho. As matrizes foram rodadas & medida que os grupos concluiam e durante o intervalo que estava previsto, Tempo: 60 minutos G. Em plenério, cada grupo explicou como realizara seu trabalho e que dificuldades teve, sendo lido cada esquema e respondidas as perguntas que incidissem sobre como se deveria entender cada aspecto apresentado. Antes de iniciar @ exposico dos grupos, tinham sido escolhidas trés pessoas, uma dos grupos 1 ¢ 2, uma dos grupos 3 e 4 e uma dos grupos 5 6, pare, epés 0 plenério, cuidarem dos detalhes de redacdo e de apresente¢o, reunindo num sé esquema as trés partes, Este comissio tinha apenas a funcio de redaco, devendo conservar ‘as mesmas ideias, podendo reorganizé-las em pequene escala se necessario. H. Enquanto a equipe fez 2 redacdo final do esquema, prosseguiram os trabalhos. Tomando os ‘esquemas provisérios (mimeografados), cada participante elaborou perguntas sobre os temas 1s colocados cuja resposta constituisse matéria para o marco referencial. As perguntas foram colocadas em fichas, ainda identificadas com MS, MD, MO. Tempo: 20 minutos |. Escolhidos novos grupos, sempre ao acaso, foi repetido aproximadamente o que se fezem B, ‘englobando o que se fez em F, com critérios aproximados aqueles. A ideia era relacionar um grupo de perguntas e colocé-las em ordem. O resultado foi apresentado em folhas grandes de papel de embrulho, numeradas as perguntas de forma bem clara. Tempo: 45 minutos J. Individualmente, os participantes responderam as perguntas. Em fichas de meia pagina identificadas com 0 niimero da pergunte. Foram fixados critérios para responder as questles, quanto & qualidade das respostas: ~ que respondessem ao essencial da questo; = que fossem claras e precisas; - que fossem concretas, ainda que abrangentes; = que se situassem no aspecto situacional, doutrinal ou operative do marco referencial; = que fossem sintéticas; ~ que impulsionassem & ago. Observacées: E tedioso repetir todo o trabalho feito. De posse das respostas, deu sequéncia, com mais profundidade e mais tempo em cada etapa, { elaboraco do marco referencial, seguindo sempre os cuidados gerais. Pode-se, é claro, comecar logo com as perguntas, omitindo @ preparacio do esqueme. Ou ‘omitir as perguntas e, uma vez 0 esquema pronto, pedir a todos que ponham nas fichas matéria para a elaborado do marco referencial. Ou comegar logo com as ideias. Se a escola tem "filosofia'" ou "diretrizes", pode-se pér isso como inicio. E preciso questionar sempre. Pode-se, também, preparar primeiro 0 marco situacional, depois 0 marco doutrinal, e enti 0 marco operativo. ‘As técnicas podem variar. Por exemplo: grupos sucessives, cochicho ete. Pode-se conseguir especialistas nos assuntos envolvidos e oferecer palestras aos participantes, © importante ¢ privilegiar a participacdo © buscar que os resultados a que se chegar sejam sempre mais 0 pensamento do grupo como um todo. Os mesmos procedimentos podem ser seguidos para 0 diagnéstico e para a programacdo. Algumas especificages para um e pare outra podem ser aproveitadas do que se diz no capitulo seguinte. EXPERIENCIA DE APLICAGAOII Ha sempre alguns principios a ser seguidos na realizacdo de um proceso de planejamento, 0 {que se corporifica pela adocéo de algumas atitudes basicas em toda a aco. Realidades diferentes sugerem, contudo, tarefas diferentes e, muitas vezes, relacionamento diferente entre as atividades, sempre ressalvados aqueles principios e equelas atitudes. Uma das escolas que me pediram assessoria era composta de 130 professores, além do pessoal da dirego, Nao € conveniente reunir, para o trabalho do tipo que descrevi no capitulo anterior, mais do que 45 pessoas. Cheguei mesmo & concluso de que o nimero realmente bom para isso é 36 pessoas, fora o coordenador e eventuais assessores (jé trabalhei com 0 dobro e com 0 triplo desse nimero, mas o aprofundamento no pode ser o mesmo). Era necessério imaginar outro tipo de trabalho. 1. Decidida a implantag#o do processo de planejamento, realizaram-se, para todos os professores, para 0 pessoal administrativo, para os representantes de alunos e de pais, algumas palestras motivadoras e esclarecedoras sobre o processo. Foram quatro noites com os seguintes temas: A Realidade Global e Educacional do Brasil; A Educacao Libertadora; A Acéo Transformadora; O Processo de Planejamento 2. Foram escolhidos 25 representantes dos professores (coordenadores e alguns eleitos pelos colegas), um representante do pessoal administrative, dois representantes dos pais e dois dos alunos. O grupo foi completado com o pessoal da direco, chegando ao total de 36 pessoas. Desse grupo foram designadas trés pessoas para constituir a equipe de coordenagio (pessoas com algumas disponibilidade maior de tempo e pertencentes a direco). 3. A proposta era: durante o ano, preparar um plano global de médio prazo para a escola (para 5 trés anos seguintes aquele em que se estava vivendo), tendo por base o grupo indicado ‘cima e com o trabalho de todo o pessoal igado & escola. 4, Foi reunido, ainda em margo, 0 grupo de 36 pessoas para o trabalho de um dia. Foram discutidos 0 modelo de plano e @ metodologia global do proceso. Depois foram estabelecidos (05 passos que seriam seguidos no caso concreto: elaboracdo do marco referencial, realizagSo, do diagnéstico, estabelecimento de programacéo. 5. A primeira atividade do primeiro passo foi realizada sinda no mesmo dia de reunio indicada ‘em 4, Foi a preparacéo de um conjunto de questes que, uma vez respondidas, dariam matéria ara construir © marco referencial. Dada a brevidade de tempo, as questdes ficaram apenas esbocadas. Coube @ equipe de coordenacéo aprimoré-las e até completé-las em alguns casos. Para isso, tinha a expressa anuéncia do grupo representativo. 6. As questdes foram encaminhadas a todos 0s professores, a todos do corpo administrativo, a0 grémio de alunos e ao circulo de pais e mestres. Foi pedido a todos que respondessem as questBes até o dia 15 de maio (teria uns 40 dias). Aos professores se pediu resposta individual; a0 pessoal administrative foi proporcionada uma tarde de estudo, junto com a equipe coordenadore, em que as pessoas responderam de duas em duas, depois reuniram as respostas em grupos de cito; aos alunos e aos pais se pedi uma resposta por intermédio do grémio de alunos do circulo de pais e mestres, sem nada mais indicar. 7. As principais questes foram as transcritas a seguir. ‘A. Que fenémenos caracterizam, hoje, a realidade mundial, latino-american e brasileira? Que valores predominam na sociedade atual? Que funcéo a escola esté exercendo na sociedade? Quais as causas dos fendmenos que vocé citou acima? B. O que significa ser homem novo nos seguintes aspectos: critico, solidério, em libertacéo, participativo, justo, construtor da histéria? (Caracterize cada aspecto e acrescente outros.) © que significa uma sociedade nova nos seguintes aspectos: participativa, fraterna, livre, que velorize o sere ndo 0 ter? (Comente cada aspecto e acrescente outros.) C. Como é uma escola em que o aluno é sujeito do seu préprio desenvolvimento? Como se caracteriza a comunidade educativa? Qual é a funco do professor numa escola que trabalha @ educacdo libertadora? Qual é a importancia da participacao? De que participacio? Caracterize 0 didlogo numa metodologia libertadora. 8, Para melhor desenvolvimento da tarefa seguinte, 2 equipe de coordenaglo fez com que, nas. reunides comuns de areas e de graus, os professores reunissem (nao resumissem) suas respostas individuais, de modo que, de todos os professores, havia a0 final cito respostas. 9, Recebidas as respostas (doze conjuntos, oito dos professores, dois dos funcionarios, um dos ‘alunos € um dos pais), foram elas mimeografadas em um niimero suficiente para todo 0 grupo representativo. 10. Foi, a seguir, levads @ efeito uma reunidio de um dia e meio com o grupo representativo. 0 objetivo era, a partir do material ensejado pelas respostas 4s questées acima, organizer uma primeira versio do marco referencial do plano. 10.1. Separados em seis grupos, os participantes reuniram o material dos doze conjuntos de respostas, os grupos A e B no que se referia ao marco situacional; os grupos C e D, marco doutrinal; os grupos E € F, marco operative. 10.2, Feitas cépias dos resultados, cada grupo apresentou, em plenario, 0 modo de trabalho, 2s dificuldades e o resultado @ que chegou. Nao houve discusso em plenério. 10.3, No mesmo plenério firmaram-se critérios para a avaliacdo desses resultados. Os critérios slo, aproximadamente, os que figuram no capitulo anterior (Primeira etapa, letra 8) 10.4, Cada subgrupo (0s mesmos) avaliou todo o material dos seis grupos, utilizando os critérios & preocupando-se basicamente com a seguinte pergunta: O material é suficiente, necessério e adequado para ser o marco referencial de nossa escola? Foi bastante demorada esta avaliacao (tempo estabelecido antes de iniciar a tarefa). O principal alerta era para que os participantes se preocupassem com 2s ideias, no com detalhes de redaco ou com formalidades, relativizando-se a preocupacéo de colocar cada ideia no seu "quadrinho” predeterminado. Buscava-se um texto forte, eficaz, no um texto "bonitinho". Todos anotaram 2s principais observacdes em que houve concordancia, 10.5, O plenérrio foi breve, Pediu-se a cade grupo que no se detivesse em "miudezas" e dese uma viséo ample e global sobre seu julgamento dos textos. 10.6, Reiterads a necessidade de observar critérios na elaboracdo, 0s subgrupos foram reorganizados. Essa reorganizac3o foi algo complicado: havie boas condigdes para isso. Mas € evidente que isso pode ser feito mais simplesmente. Foi dado a cada participante, de cada subgrupo, um niimero de 1 a 6. Organizaram-se, depois, 05 novos grupos da seguinte forma: Os niimeros 1, 2, 3 dos grupos E F: MO; todos os rnimeros 4; MS; todos os ntimeros 5: MD; todos os nimeros 6: MO. Tinhamos, assim, novamente seis subgrupos, cuje tarefa foi reescrever 0 marco referencial (dois grupos, o MS; dois grupos, o MD; dois grupos, o MO). © resultado foi recolhido e @ comissio coordenadore, que pediu ajuda a um membro de cada subgrupo, fez uma redago Unica, nade acrescentando, tirendo ou modificando, mas apenas dando forma e reunindo, jé que havia duas redages para cada parte do marco referencial. 11, Terminada esta etapa, a equipe coordenadora encaminhou a todos (professores, pessoal administrativo, CPM e grémio de alunos) cépias do marco referencial, com uma introdugéo que explicava seu sentido no plano e que pedia pronunciamento no prazo de um més sobre 0 contetido do documento. Nesta introducio, orientavam-se os grupos (séries, niveis de ensino etc.) pera que dessem seu pronunciamento conjunto. 12. Enquanto se esperavam as respostas, a equipe de coordenacéo, com a ajuda de um estudioso da pesquisa, preparou questionérios e roteiros de entrevistas a serem aplicados, por amostra, a pais e alunos, e no universo dos professores e pessoal administrativo, Tinha-se em mente uma pesquisa avaliativa (ver capitulo "O diagnéstico", da primeira parte) para verificar: a) até que ponto a escola contribuia para @ existéncia do tipo de homem e do tipo de sociedade propostos no marco referencial; b) a que distancia estava a escola do ideal que se propusera no marco operative. 13, Recebidos os pronunciamentos sobre o marco referencial, foram revistas todas as questes para 2 pesquisa que foi, em seguida, realizade. 14. Os dados recolhidos foram tabulados e os pronunciamentos sobre o marco referencial, reunidos. 15. Ao reunir-se novamente (dois dias), o grupo dos 36 dedicou pequena parte do tempo a consolidar © marco referencial e a maioria na preparagdo de um diagnéstico, a partir dos, dados recolhidos. 16. Trabalhando em dinamica parecida com a indicada sob o item 10 deste capitulo, o grupo realizou a leitura dos dados, 0 pré-diagnéstico global (veja capitulo correspondente na primeira parte). 17. Encaminhando 0 marco referencial reformulado € 0 diegnéstico aos professores, 20 pessoal administrativo, aos alunos € 20s pais, a equipe coordenadora orientou a todos para que, em seus grupos, propusessem objetivos e politicas com suas estratégias (veja capitulo correspondente na primeira parte). 18. Em nove reunigo (um dia € meio), 0 grupo representative - os 36 de que falel antes - chegou & programacéo, sempre trabalhando de modo parecido com o apresentado no item 10, deste capitulo. 19. 0 plano completo foi encaminhado a todos para que se pronunciassem novamente sobre 0 todo. 20. Em novembro, em reunigo final, o grupo representativo chegou ao texto final para os trés ‘anos seguintes, sempre utilizando as observacdes que os participantes tinham encaminhado. Nesta mesma reunigo, foi aprovada a orientago gerel para os planos setoriais e para os planos de curto prazo (veja capitulo correspondente de primeira parte) EXEMPLO DE PLANO Transcrevo excertos de um plano com a finalidade de, entre outras coisas: 4) permitir o estudo de sua estrutura global; b) ressaltar a importancia das ideias globalizentes e das opcdes; ¢) fazer notar a coeréncia entre suas partes. Trata-se de um plano global de médio prazo (trés anos) que foi completado por planos globais, de curto prazo, ano a ano, e por planos setoriais. |. MARCO REFERENCIAL 1. Marco situacional ‘Somos um grupo que trabalha numa escola, no Brasil, dentro de um contexto latino-americano do tiltimo quarto do século xx. Asociedade se apresenta em luta. (...) © mundo esté dividido, n8o permitindo @ todas as pessoas @ participago nem nos bens materiais nem nos bens espirituais, muito menos na possibilidade de construir juntos um mundo bom para todos. Hé uma crescente distincdo entre os que podem e os que néo podem, os que agem e os que reagem, os que sabem e os que ndo sabem, os que tem e os que no tém.(...) Esta situagdo tem suas causas no egoismo e na incompeténcia dos que dominam e na falta de clareza e de capacitagdo dos que sofrem caréncias importantes para sua formagio e seu crescimento. bad Ha uma crenga generalizada de que as estruturas sociais existentes s#o inamoviveis e, mesmo ‘que se compreenda a irracionalidade de algumas, néo se julga que seja digno lutar contra elas (..). Geralmente, ha o medo de que transformagSes tragam prejuizos maiores. 2. Marco doutrinal Entendemos o homem como um ser de relacdes. A partir dai pretendemos contribuir para que nos aproximemos todos de ume sociedade a) marcada por esta caracterizago do ser humano. Uma sociedade em que todas as pessoas participem de grupo(s), néo simplesmente escolhendo seus governantes, mas tomando em conjunto todas as suas decisdes e, mais do {que isso, construindo juntas, rumo a objetivos previa mente tracados também conjuntamente, uma sociedade mais humana. Pretendemos contribuir pare uma sociedade em que se ultrapassem as situagdes baseadas no esquema deveres/direitos para se alcancar um relacionamento humano uma reestruturago social firmados em sistema parecido com o das bem-aventurancas propostas por Jesus Cristo no Evangetho. ) Isso muda 0s esquemas de governo, de chefies. Propde uma coordenaco que brote dos grupos bésicos (natureis) e que, por meio da representatividade, chegue a uma coordenaco global. © homem, nessa sociedade (para contribuir para que os seres humanos se aproximem desse ideal € que pretendemos trabalher), deve ter, em primeiro lugar, um compromisso de esperance com seu semelhante, uma crenga de que as pessoas séo capazes € podem ser honestas e competentes. ‘Além disso, o homem deve ser consciente como pessoa, lutando sempre, por sie em conjunto, pela verdade. ) As situagies de conflito que existem e perdurario na caminhada humana tém de ser resolvidas a partir de um posicionamento bésico de busca em conjunto de verdade, com esquemas de julgamento superiores em casos de impossibilidade de solugdo nos niveis mais, baixos de agrupamento e de representatividade. ) 3. Marco operativo Queremos realizar uma escola que seja adequada para contribuir na direco daquele homem e daquela sociedade expressos antes. (..) Por isso optamos por uma educacdo libertadora que entendemos como: 4) 2 que possibilita & pessoa, especialmente ao educando, ser sujeito de seu desenvolvimento; b) a que propde uma transformacio social, investindo, por isso, num posicionamento socioeconémico-politico e no conhecimento adequado da realidade (ed Pensamos que nossa educacao deve se voltar para as seguintes fungdes: 2) formaco, como busca e realizaco da identidade desejada (das pessoas e dos grupos); b) desenvolvimento de ciéncia para a exata compreenséo da realidade; ) dominio da técnica como meio de transformar a realidade pare o bem-estar de todos. (a A escola pela qual lutemos ¢ aberte e democrética, entendida democracie como o relacionamento em que se sublinha a igualdade das pessoas, antes de considerar suas diferencas. Uma escola em que a participacdo ultrapasse os niveis de colaboracdo, de deciséo € atinja o nivel de construcde em conjunto, em que o grupo se organize para eleancar fins estabelecidos em conjunto. (a Serd uma escola que relativiza o diploma, um grupo que pensa, concretamente, na aboligo de todos 05 diplomas...) (...) que se prope métodos ativos (...) ) que utiliza os meios necessarios ao desenvolvimento do espirito critico (.. (... cujo Unico critério seja o da moralidade desses meios, significando que sejam eles mesmos libertadores, isto é, levem 2 um posicionamento pessoal dentro de um grupo, respeitando, basicamente e em tudo, 0 ser humano, segundo os parametros indicados no marco doutrinal. (.) Il, DIAGNOSTICO IntrodugSo Em nosso marco referencial insistimos nos aspectos qualitativos, Do ponto de vista quantitativo, nossa escola ai esté, tem condigdes de continuidade, esta inserida numa zona de classe média. (...) Nossos alunos pagam anuidade em sua maioria. Poucos tém bolsas de estudos (...) As familias compéem-se de profissionais liberais, pequenos comerciantes e industriais(...) Em relago ao marco doutrinal Nao somos uma escola que contribua de modo importante para a existéncia do tipo de homem e do tipo de sociedade que julgamos desejaveis.(...) A. 0s professores no so um grupo coeso em torno daquelas ideias. Todos desejam compor- 52 um futuro desejavel em relacéo & sociedade e ao homem para dar sentido ao seu trabalho escolar, mas muitos hesitam em organizer um conjunto de ideias claro. Isso se deve, principalmente, & dificuldade de uma visio global da realidade existente e das teorias sobre 0 homem e sobre a sociedade, ) B. Os alunos e suas familias respondem bem a uma proposta educacional relacionada com os problemas mais fundamentais da humanidade. (...) Hd esperanca e crescimento por parte dos alunos e algumas preocupagées por parte dos pais. Em relago a0 marco operative A educacdo libertadore & um esforgo em realizagZo em nossa escola. A grande maioria dos professores compreende a sua orientacéo basic, expressa em nosso marco operative. Um bom grupo ja faz aplicagio em termos dos elementos basicos do curriculo (objetives, metodologia, relacionamento, contetido, avalisc#o]. Outros ndo conseguem, por falta de convencimento e/ou por dificuldades de descoberta de estratégias para a tarefa. ) Hé, assim, altos e baixos que nfo esto, parece, prejudicando o trabalho porque hé um Posicionamento fundamental de se par nesse caminho e de buscar assim realizagdes maiores, A realizacdo democratica é significative: direco, servigos, professores, pessoal administrativo ¢ alunos esto aceitando @ igualdade bésica, respeitada a coordenacdo e a representatividade, (a Ha falhas claras ne utilizago de métodos ativos € no desenvolvimento do espirito critico: néo ha suficiente capacitaco entre os professores para a operacionalizacdo nesses campos, ‘embora em termos de conviccéo a situagio esteja melhor. Paralelamente a isso, ndo se esta alcangendo de modo suficiente que os alunos se desincumbam de meneira constante & produtive das tarefas de organizer o préprio plano de ensino. Il, PROGRAMAGAO 1. Objetivos ‘A. Promover 0 estudo da realidade global latino-americane e de propostas sobre o homem e sobre a sociedade a fim de gerar espirito critico e participacéo na sociedade. B, Estabelecer, cooperativamente, estratégias globais condizentes com # educacdo libertadora para favorecer ao aluno ser sujeito de seu desenvolvimento, C. Dinamizar 0 Servigo de Superviséo Escolar pata o apoio aos professores na utilizecao de métodos ativos, a fim de promover 0 espirito critico, 2. politicas e estratégias Que 2 reflexdo constante sobre a realidade seja elemento de promogo do espirito critico: = realizar pesquisas sobre a realidade circundante; - trabalhar em sala de aula sobre noticias de jornais e de revistas; ~ criar grupos para refletir sobre realizacdes na sociedade. ( Que o incremento da participacdo gere uma deciséo eficaz de transformacdo social: - estabelecer em conjunto (alunos e professores) os objetivos pare a sale de aula; integrar-se (0 aluno) nas decisdes e na aco do grémio de alunos; - consultar (a dirego, os servigos) quando do estabelecimento de rotinas; ~ participar na elaboracdo de qualquer plano. Que 0 aperfeigoamento e a capacitacéo constantes sejam forma de viver as bem-aventurances evangélicas: - assinar revistas que tratem de educacdo; = propor, nos grupos, situacdes que necessitem de estudo para solucao; - ler, pelo menos, um livro sobre tema educacional por semestre. ( 3. Orientacao para a execucao Os objetivos serdo para os trés anos. Os planos de curto prazo estabelecer’o os objetivos especificos para cada um deles. A direcio sera responsdvel pela coordenacéo e pelo impulsionamento inicial da execucio dos objetivos. ) As politicas sero levadas em conta por todos os setores ds escola em seus planos especificos « por todos os professores em qualquer de seus trabalhos. ) Anualmente, a avaliago incluiré, também, o questionamento sobre todas as propostas deste plano, a fim de verificar 2 validade de sue continuagSo. A DIRETIVIDADE DA COORDENAGAO E bom insistir que, entre as linhas orientadoras do planejamento que estamos anelisendo, @ participago ocupa destacado papel: ela é um meio para a eficiéncia e para a eficécia e é um fim a ser buscado na organizacao das instituigdes e da sociedade em geral ica concreta do dia Na pr que planeje, mais especificamente, o problema da diretividade ou no dessa coordenacio. -dia, surge, a partir dai, 0 problema da coordenacéo de um grupo Parece evidente, em primeiro lugar, que a democracie (pensada aqui como forma de relacionamento entre as pessoas mais do que como forma de governo) sé prevelece se houver coordenaco, naturalmente a servigo do grupo e cada vez mais realizando aquelas tarefas que © grupo Ihe atribuir. Na situago de planejamento, a soluco se organiza, geralmente, com a consideragio de trés premissas bem claras ¢ simultaneamente postas em prética: a) & coordenago compete a proposta da metodologia do planejamento: apresentagdo de ‘esquemas de trabalho, encontro do momento oportune para cada coisa, provisionamento de textos e de pessoas que venham a contribuir para a caminhada do grupo, redago de textos, finais, cobranga de tarefas solicitadas pelo grupo a alguns de seus membros... b) ndo compete @ coordenacao, mas ao grupo, tomar decisées quanto ao contetido e ao método de sua agZo, isto é, de seus planos; ©) 2 coordenagéo, se for bem compreendida, caminharé de ume diretividade grande (quanto metodologia do planejamento, nada tendo @ dizer, desde © comeco, sobre contetide) quando da formacdo do grupo (ou na implantaco de um processo de planejamento) até uma quase nao-diretividade total, & medida que o grupo for descobrindo e definindo seus préprios caminhos. De qualquer modo, o mais importante ¢ a deciséo firme (e a aco coerente) de possibilitar a0 grupo @ definico de sua identidede desejada e de ser um servico, dentro do grupo, para a realizagdo dessa identidade, DISTINGAO IMPORTANTE: MARCO REFERENCIAL E PROGRAMACAO Conteram-me, em Sante Catarina, uma historinha (néo me disserem quel sua origem) que ilustra bem @ problemética do planejamento, nos dois niveis principais em que ele pretende estabelecer fins, metas e coisas que tais Um chinés (ou era um indiano?) ajudava um grupo de arqueiros a melhorer sua pontaria Trabalharem durante alguns meses e chegou o dia da prova, Acada um que se apresentava, o mestre fazia as mesmas perguntas, nesta mesma ordem a) Vocé vé aquela floresta? b) Vocé vé aquela arvore? ©) Vocé vé aquele galho? 4d) Vocé v8 aquele passarinho naquele galho? Todos respondiam "sim" a todas essas perguntas e eram dispensados pelo mestre, que thes dizia: "Se vocé vé tudo isto, ndo adianta tentar: vai errar! Teré de voltar aos treinamentos'” Apenas um respondeu negativamente a todas as perguntas do mestre. Este, entdo, acrescentou mais uma pergunta: "O que vocé vé?" - Vejo - respondeu o discipulo -0 olho de um passerinho = Va disse o mestre -, no precisa tentar: no é possivel que vocé erre. O planejamento é 0 conjunto de técnices para dar aos grupos e as instituigBes: a) @ visio global de realidade e da aco do grupo, inserindo-a num todo mais amplo, buscando fins reais e significativos; b) a adequada firmeza, clareza e preciso nas agdes concretas do dia-a-dia. Quando se elabora um marco referencial, estudam-se floresta, as érvores, as clareiras, toda sua fauna, seus caminhos e tudo o mais que nela existir. Quando se prepara uma programacéo, 36 se vé 2 folha, o verme, o olho do passarinho. Num processo de planejamento, esses dues visdes néo so seperadas, estenques ou perfeitamente distantes no tempo: elas se superpdem, se esclarecem mutuamente. Quando se trabalha na preparaco de um marco referencial no hé por que tolher a imaginago. Os niimeros-limite s8o as possibilidades teéricas. € preciso pensar um futuro desejavel sem se preocupar se seremos nds que vamos realizé-lo. Aliés, é fundamental aqui a ideia de que, se esse futuro for bem projetado, no veremos ¢ sua realizacdo. Quando, porém, se prope uma ago para um prazo determinado, isto , se prepara uma programacéo, embora a criatividade - ¢ a imaginago - seja imprescindivel, os limites so bem mais préximos: so todos os limites meto do ldgicos e de recursos que a instituigo 0 grupo - possui Julgo que o planejamento falha grandemente porque no hé, nos que planejam, essas duas atitudes, de certa forma contradit ras, exercidas, cada uma, no momento oportuno: 4) 2 de propor um ideal, um farol para iluminar; b) a de realizar agées concretas condizentes com as condicBes reais. AAs vezes essas duas atitudes existem em momentos errados: a primeira na programacéo e a segunda no marco referencial. E nade pode ser feito porque a confusio resultante de um plano é muito pior do que @ confuse natural sem plano algum. Terceira parte Invista no moinho: produziré boa farinha. Mas no esqueca o gro, para que valha a pena haver farinha. ATEORIAE A PRATICA Varias vezes mencionei a teoria nas paginas precedentes. Sua importancia € decisiva para o planejamento, Sem ela, 0 planejamento nao existe e a atividede que € assim chamada nao passa de mera programaco, muitas vezes burocratica. Acontece que, falando com professores, muitas vezes ouvi que diziam: "Isto é assim na teoria, mas na pratica é diferente" Quando se investiga um pouco mais sobre o que os professores pensam que seja a teoria, ‘compreende-se logo que muitas outras coisas so confundides com ela: o palpite, a hipétese, a doutrina, 0 desejo. E fica dificil saber 0 que cada um esta pensando quando diz "teoria". € fica dificilimo planejar Porque esta mistura é a prépria desorganizacdo, que nega o planejamento. A propria disjuncéo que se faz entre teoria e prética mostra a incompreenséo que os professores tém da teoria. Se uma teorie diz algo sobre a prética que, na prética, no é assim, isso ndo € teoria, ignorancia, se no for interesse, Dizer teoria significa dizer um conjunto de conhecimentos que explicam @ reslidade, isto , que explica os fenémenos e suas causas. Ser tedrico significa, ento, explicar uma determinada realidade, um determinado conjunto de fates, significa compreender o que esté acontecendo por que esté acontecendo, Assim, ao dizer que os tomateiros adoecem quando suas folhas so seguidamente molhadas, vocé esté compreendendo uma das causas de um tipo de doenca dos tomateiros. Esta teoria nasceu da verificacdo continua de que 2 excessiva umidade nas folhas dos tomateiros Ihes trazia uma determinada doenga. Com esse conhecimento vocé pode: a) estabelecer uma hipétese para o caso de seus tomateiros estarem doentes (pode ser excesso de umidade, sobretudo quando vocé tenha visto que o aspecto de seus tomateiros 6 semelhante a0 dos que adoeceram por excesso de umidade; b) prever que determinados tomateiros ficaro doentes quando vocé vé que os regam em demasia; ¢) programar sua cultura de tomates, com determinado tipo de rega para que ndo adquiram a doenga derivada do excesso de umidade. Como vocé se adona de ums teoria? Vocé acredita nela, experimenta-a, dé certo, vocé fica sabendo. E enquanto der certo voce sabe. Se houver uma falha, vocé investiga e pode modificar a teoria ou descobrir que vocé nao conferiu bem a realidade. As vezes, a gente |8 uma teoria num livro. As vezes, a gente intui 2 explicago e, ao agir, vai confirmando ou no a explicago que intuiu. Quando, em vez de lidar com tomateiros, a gente lida com pessoas, como na educagéo, as coisas se complica um pouco, mas a teoria continua a ser 2 mesma coisa: ou explica a realidade ou nfo serve para nada, Se voce Ié ou uve, por exemplo, que aprendizagem se faz ‘quando ha interesse e atividade, voc8 pode ter sua atenglo alertada ou pode nem sequer ligar para isso. Vocé ligard se tiver alum interesse nisso, se tiver alum problema relacionado 20 assunto, se vocé pretende promover a aprendizagem. Do mesmo modo que a conversa sobre (05 tomateiros no vai dizer nada para quem no pretende plantar tomates. Isto é, a escolha de teorias vai estar em funcéo do que se deseja fazer: para resolver problemas praticos, ‘Suponhamos que vocé tem um problema pratico relacionado a aprendizagem e que seu modo de ser entrou em sintonia com aquele esquema tedrico que citei acima, Vocé estuda um pouco mais, vé sua realidade, estabelece ums hipétese (se deu certo em outre situaco, pode der certo nesta em que estou envolvido) ¢ age segundo essa hipdtese. Vocé no sé est usando teoria como esté teorizando: se seus resultados forem bons, vocé confirma a teoria; se nao forem tio bons, vocé tem de rever tudo; se abordou o assunto de forma suficientemente global, se viu bem a realidade, se pds em pratica uma hipétese bem organizada. Se fez tudo certo € 0 resultado no foi satisfatério, vocé descobriu que 0 que explicou uma realidade em outro lugar e/ou para outras pessoas no explica a realidade aqui e agora, Tanto no explica que fez vocé fazer previsdes erradas. Isto signi que é errado trebalhar inspirado na teoria? Nao. Significa apenas que ¢ errado trabalhar sem conhecimento. Assim como se plantasse ‘tomates com a teoria de que os tomateiros precisem ser regados de hora em hora: néo teria resultado algum (vocé trabalharia sem teoria) Por isso, 0 cuidado com as teorias € importante. Nenhuma teoria explica completamente o ser humano. Mas hé as mais abertas e as mais fechadas. Parece-me que as teorias sobre o homem que no levam em conta a liberdade, a imaginacao, a criatividade, a fé... sio muito restritas e explicam apenas parte do homem, quase tornando-o igual a uma érvore ou a um gato, bem mais previsiveis, As teorias mais abrangentes, mais abertas tém mais condicdes de explicar 0 homem e os grupos, embora sejam de mais dificil dominio, por sua abrangéncia Isso tudo tem muito a ver com a pratica. E a partir da aplicagio da teoria que vocé aumenta a qualidade de sua pratica, No planejamento, a teoria sobre a pratica daquele setor que esté sendo planejado deve estar presente em cada momento. Mas é, sobretudo, no marco referencial que mais € necesséria para servir 20 posicionamento do grupo sobre sua prética futura. Tanto para sua opcéo doutrinal como para sua op¢io operative, o grupo necessita do embasamento teérico sob pena de propor-se 0 que ¢ impossivel ou o que no tem significago. O que vocé prope no & teoria, é doutrina, é metodologia, é operacionalizacao. Mas se 0 fundamento desta doutrina, desta metodologia, desta operacionalizaggo néo for ¢ teoria inclua aqui a teorie filoséfica ¢ @ teoria teolégica - sua prética seré de menor significado. A DINAMICA DA ACKO-REFLEXAO Muito se tem falado ne a¢do-reflexio como dinamica (ou como metodologia) prépria para gerar a conscientizacao. Isto tem ficado muito distante da pratica dos educadores, ¢ 0 que acontece com mais frequéncia é 0 seguinte: a) professores que discutem em cursos, seminérios, encontros, escolas, sobre uma porcdo de ideias (chamam @ isso de refiexo) e que realizam uma pratica completamente dirigida por outras ideia b) salas de aula em que os alunos decoram férmulas e fatos completamente desligados de sua vide e de seus interesses. Falar em dinamica (proceso, metodologia) da acéo-reflexéo e pé-la em pratica significaria transformar inteiramente a atual concepsao de educago escolar. E convém pensarmos se isso € possivel sem, antes, transformar a sociedade, Ou se nao seria esse exetamente um elemento para encaminhar uma transformacéo social, junto com outras forcas engajadas na mesma luta, De qualquer modo, o que quero ressaltar é que as ideias bésicas que sustentam o processo de planejamento de que felei até aqui s8o as mesmas que orientam ume dinmica de aco- reflexdo a caminho da conscientizacéo. No fundo, pretende-se que cada acdo seja esclarecida pela reflexdo e que cada reflexio seja realizada com base naquilo que se faz ou no que aconteceu. Néo é admissivel o estudo desligado da prética ou a pratica desligada do estudo. Embora as coisas n&o ocorram de forma tdo linear, podemos dizer, esquematicamente, que acontece o seguinte: 1) uma aco traz inquietude porque os resultados no so convincentes; 2) sobre esta aco incide a reflexdo; 3) a partir desta reflexo, a agdo seguinte sofre transformacées; 4) sobre esta nova aco hé uma nova reflexio. Este é 0 proceso de conscientizaglo (de educa¢o) mais eficaz. Sobretudo por que duas coisas importantes costumam acontecer nessa dinémica: 4) 0 alargamento da abrangéncia da reflex3o, dando um sentido mais global a ages restritas; b) 2 anélise, na reflexo, no sé da prépria ago (de uma pessoa ou de um grupo), mas da ago de outros grupos e da sociedade como um todo, incluindo acontecimentos presentes passados. A grande dificuldade para uma totel eplicago do processo da educacdo escoler € 0 constrangimento exercido pela expectativa de todos (ou quase) de que o estudante ne escola decore algumas informacées desconexas, discutiveis, menosprezadas pelas pessoas competentes e quase sempre sem serventia. Entdo, a adocdo integral de tal processo educativo é ilusério na escola enquanto nao for mudada essa expectativa. Contudo, é possivel que ela ndo mude se no acontecerem realizacdes de tal pratica com sucesso. © processo de planejamento de que falei (ver, especialmente, os capitulos "Descrever é melhor" @ "Modelo de plano", da primeira parte) € um processo de acHo-reflexdo. Os principios e as técnicas explicitados para este processo podem ser transferidos para outras situagdes com bons resultados no que se refere & conscientizaco dos participantes. PLANO COMO HIPOTESE DE TRABALHO. O planejar foi sempre pensado como manejar um conjunto de técnicas para tornar eficiente e/ou eficaz a propria ado (de pessoa ou grupo). E uma boa concepcéio. Mas € necessério que, além disso, ele seja o dominio do "que fazer” especifico sobre o qual se realiza, tanto em si mesmo como em seu relacionamento global, € tanto em sue teoria como no conhecimento da realidede. Assim, pode-se dizer que técnica e metodologia se integram com o contetido ou, comparando, ‘que o moinho se interpenetra com o grdo e vice-versa, de modo que um se realize & feigo do outro, Se pensarmos 0 planejamento da educacdo, veremos que 0 processo de planejamento & ‘educativo (veja capitulo adiante) e que sua metodologia ¢ moldada por seu conteuido. Vejamos como isso se processa. Partimos de uma situago que seja vista como necessidade ou como problema. Para compreender essa situaco e para solucionar o problema (a necessidade) que nela se viu, sdo necessérios a teoria e o conhecimento da realidade. Aplicada a teoria atinente ao caso e conhecida, to amplamente quanto possivel, a realidade, pode-se chegar a uma hipétese de solucSo, ou seja, uma proposta de acdo. Essa proposta, uma vez realizade, solucionaré o problema (em parte ou globalmente) ou traré mais problemas. No primeiro caso, consolidaré a teoria utilizada; no segundo, traré duividas sobre esta teoria, sobre 0 conhecimento da realidade ou sobre a quslidade da hipdtese proposta. Néo é certo, de imediato, que a teoria no seja consistente, porque a falha pode localizar-se em outro ponto. A aveliago correta que vai esclarecer qual foi o ponto fraco da cadeia, Mas haveré momentos em que a teoria adotada nao traré mais resultados. E fundamental, como se vé, que haja uma aco. Téo fundamental quanto a existéncia de uma teoria e do conhecimento da realidade, £ nesse quadro que uma proposta de ago tem sentido ¢, sobretudo, possibilidades de ser eficaz © "Modelo de Plano" (veja na primeira parte) esté construido sobre esta base aqui apresentada. De fato, todo o planejamento é 0 relacionamento adequado entre esses elementos: a situacgo, a teoria, a realidede, a ago, o resultado dessa ago € a avaliagso constante de tudo isso. Esse é 0 processo educetivo fundamental para o ser humano, DOIS CONCEITOS DE EDUCAGAO. E fundamental a compreensio de que 0 proceso de planejamento tem seu sentido maior ‘quando se converte em processo educativo: repetir esta ideia sob diversas formas parece-me essencial, considerada sua importancia, Nessa linha de pensamento, é itil investigar @ conceituagao de educaco que sustenta tal aproximacéo. ‘A observacdo preliminar a esta conceituacéo é de que ¢ inutil e prejudicial buscar compreender 0 ato de educar: € dbvia a conclusdo de Paulo Freire de que ninguém educa ninguém (ninguém se educa sozinho; todos nos educamos no relacionamento). Vale a pena, isto sim, compreender 0 ato de educar-se. €, complementarmente, a educaco ‘como um conjunto de recursos, situagdes e aces para que mais facilmente aconteca o educar- se. A. Educar-se é, em primeiro lugar, projetar e buscar a prépri identidade, seja pessoal seja do grupo, (Estou trabalhando a partir de uma conceituacao apresentads por Francisco Tabords no 1. 14 dos Cadernos da AEC do Brasil intitulado "Processo e relagdes educacionais: anélise ) teoldgica - reflexdes para educadore: Isto quer dizer que, pessoalmente ou em grupo, projetamos para nés um futuro desejével eo buscamos com mais ou menos intensidade, com mais ou menos motivacdo, com mais ou menos capacitago. Mas 0 buscamos de uma forma ou outra, isto é, nos educamos, crescemos. Ore, planejer é justamente isso: propor-se uma identidade e agir para aproximar o que somos (como grupo) daquilo que queremos ser. B. Educar-se é, em segundo lugar, dotar-se de instrumentos para participar na sociedade, Estou partindo do que Dermeval Saviani considera a func3o da escola em artigo na Revista de Educacio AEC, n.34 Este segunda conceituacdo é necesséria para completar a anterior, uma linha mais social, dada «a possibilidade de ser aquela considerada essencielmente ligada & pessoa. Num proceso de planejamento em que a participacdo é fundamental, nao é exagero insistir vérias vezes na necessidade de que as pessoas tenham condicées - e capacitacdo - para participar. De fato, as pessoas sé fazem aquilo para o qual esto capacitadas. De modo que, se este segundo pensamento n&o parecer to proximo quanto o primeiro 20 proceso mesmo do planejamento, ele se torna necessério para ser completa 3 conceituacao de educacdo e pare facilitar a compreensio de que, se da educacdo no resultar a capacitagéo, para @ participacio, é va toda a tentativa de estabelecer um processo de planejamento significative. FUNGOES DA EDUCAGAO Toda esta proposte de planejamento tem como pano de fundo muitos posicionamentos claramente identificaveis por um leitor atento. Entre os que no posso deixar na obscuridade esté o da compreensao das fungées do processo educacional, especialmente o escolar. Nao falo do que a escola realiza, mas do que tenta realizar, isto é, do que é a sua funcéo, doutrinariamente falando. Assim, analisando a escola como um todo, julgo que ela se resume a trés fins bésicos que deveriam ser buscados harmoniosamente: a) 2 formagao do ser humano; b) 0 desenvolvimento da ciéncia; ©) 0 dominio da técnica Esses trés fins (fungdes) tém relacdo com as necessidades humanas mais fundamentais: a cigncia € 0 meio indispensdvel para compreender a realidade; a técnica é utilizada para transformar essa realidade, visando 20 bem-estar; e 2 formacdo é entendida aqui como elemento bésico na realizacdo da identidade das pessoas e dos grupos, incluindo @ prépria utilizacdo da ciéncia e da técnic Independentemente de serem ou ndo superpostos em alguns pontos, esses fins bésicos nos permite dominar intelectualmente os vastos caminhos do sistema escolar ¢, como consequéncia, agir de forma mais planejada. Nao hé necessidade de analisar cada um deles, porque so visiveis para quem trabalha em educaco. Valeria talvez @ pena mencionar alguns aspectos, rezoavelmente cbvios, mas esclarecedores: a) toda a formagao artistic, religiose, comunitéria ou de outro tipo, na medida em que for exigida em determinado momento ou sociedade, esta incluids e deve ser levada em conta; b) nao se esté confundindo desenvolvimento da ciéncia com repeticiio (e memorizacdo) de fatos e férmulas desligados da compreensio de realidade e do crescimento teérico: «) hi limites cleros (e hé possibilidades) na busca e na consecucio desses fins pela educacéo, limites de todos os niveis, desde injunc&es do modelo de sociedade vigente até a felta de recursos. © planejamento, como ¢ opeéo, é instrumento para escalonar a importéncia relativa desses fins e para organizar esforgos para seu alcance. PLANEJAMENTO E EDUCACAO LIBERTADORA No planejamento, é fundamental a ideia de transformagéo da realidade. Isto quer dizer que uma instituigo (um grupo) se transforma a si mesma tendo em vista influir na transformac&o da realidade global. Quer dizer, também, que fez sentido falar em planejamento acima e além da administracdo - como uma tarefa politica, no sentido de participar na organizaglo na mudanca das estruturas sociais existentes. Quer dizer, finalmente, que planejar ndo é preencher quadrinhos para dar status de organizagéo séria @ um setor qualquer da atividade humana, Isso nos traz & educagSo libertadora como proposta educacional apta a inspirar um processo de planejamento do tipo que descrevi e como conteiido significativo deste mesmo proceso. Porque 2 educagao libertadora é uma proposta de mudanga. A educacio libertadora de que falo € a que tem sua base na Il Conferéncia Geral do Episcopado Latino-Americano (Medellin, Colémbia, 1968). A proposta deste texto sobre a educaco tem duas linhas fundamentais (0 restante so consequéncias, tanto que o pardgrafo seguinte se inicia com "Portanto") ducaca [As duas linhas nas préprias palavras do texto so (referindo-se )""a que converte o educando em sujeito do seu préprio desenvolvimento" b) "o meio-chave para libertar os povos de toda a escraviddo e para fazé-los ascender de condigées de vide menos humanas a condigSes mais humanas' Ha histo uma dimenséo pessoal e uma proposta social global bem claras, no texto apresentadas de forma no separada, mas como um posicionamento apenas. ‘Sem entrar na discuss8o se 0 termo "meio-chave” é exagerado e aceitando que a educaco, mesmo @ escolar, tem uma dimenséo politica realizével, pode-se ver que esta duple proposta leva em conta os dois grandes problemas da América Latina de entéo, que perduram ainda hoje: @ organizacdo injusta da sociedade e a falta quase total do remédio para isso, a participagio, ‘Ao propor que o educando seja sujeito de seu desenvolvimento, esté propondo a existéncia do grupo, da participacio e, como consequéncis, a consclentizaco que gera a transformacdo. Basicamente esté dando ao pedagégico a forca que ele realmente pode assumir como contribuinte de uma transformaco social ampla em proveito do homem todo e de todos os homens. A partir dai, a aproximacdo entre educacgo libertadora e planejamento educacional sublinha ‘as mesmas ideias bésicas, de grupo, de participacao, de transformacdo da realidade. Tanto que, 4 partir desta dupla base de Medellin, e pensando no que Ihe é mais caracteristico, ‘a metodologia, pode-se definir a educacdo libertadora assim: um grupo (sujeito em interacdo) nna dinémica de aco-reflexéo, buscando verdade e tendendo 2o crescimento pessoal € @ transformagéo social. A partir dai, as duas concepcies de educacéo com que trabalhei antes essumem importancia para o esclarecimento da prética educativa concreta PARTICIPAGAO A democracia seré, provavelmente, a salvaco da humanidade. Mes a democracia no & apenas (nem principalmente) votar. Democracia é, essencialmente, participar. Quando os tecnocratas falam em participagZo de todos querem dizer que permitiréo a alguns s@ pronunciar sobre aspectos secundatios de ume acdo, decidida muito antes pele propria tecnocracia, como se 0 condenado pudesse escolher o calibre das balas. Ou se pudéssemos escolher a cor dos tiltimos dez centimetros da asa esquerda de um avido que fabricaram com nosso dinheiro sem nos avissrem. Um processo de planejamento exige, quando se pretende o bem de todos, que @ participacao aconteca em cada momento e em cada aco. Nao se trata de que alguns sabe mais e por isso agem, permitindo 2 participacdo. Trata-se de todos agirem juntos em cada situacdo. Melhor: trata-se de construirmos todos juntos com a contribuicfo que temos a dar, coordenados por aqueles que tém, por algum motivo, algum destaque, cuja atuacéo serd até menor nas decisées, uma vez que estardo mais engajados em promover a vontade do grupo. Cada grupo sabe 0 que é bom para si, mesmo que @ alguns pareca que as pessoas sejam ignorantes porque no sabem as mesmas coisas que eles sabem. E ébvio que cada grupo chega a diferentes patamares, segundo as possibilidades, as crencas, 105 anseios de cada um. £ preciso que aqueles que pensam em auxiliar 0s outros compreendam profundamente que no é auxilio nenhum tomar decisées por esses outros. Auxilio &, se alguém tem mais informagio do que outros, pér a servico de todo o grupo essas informacées e ser, depois, um voto igual aos outros na decisio dos rumos. Fora disto, 0 que existe ignorancia ou hipocrisia, deveria ser capaz de elaboré-las e descobrir a verdade, a segunda porque supde um tipo de conversa para enganar as pessoas em proveito proprio. \desculpéveis ambas, a primeira porque quem tem mais informacSes A verdade é que o melhor auxilio que se pode dar a uma pessoa é incentiva informagées (quando for o caso) para que ela se torne mais pessoa, para que assuma suas posigies de modo claro, consciente e critico dentro do grupo. la e oferecer-the Para isso o planejamento serve. &, aliés, o modo pelo qual se pode sair do palavreado sobre a participacio e ir para sua pratica. €, mesmo, fundamental que o processo de planejamento sobre um determinedo campo de atividade (a educago por exemplo) seja entendido como uma contribuig&o para que, em nossa sociedade, diminuam as diferencas entre os que tem e (05 que ndo tém, os que agem e os que ndo agem, os que saber € 0s que no sabem... O grande remédio é a participaco porque ela é mola para a conscientizacao. TECNOCRACIA E PLANEJAMENTO Nao se pode confundir solucdes tedrico-técnicas - ¢ 0 que requer o planejamento - com tecnocracia. Nossa sociedade sofre tremendos problemas (injustica, fome, guerras, desvalorizagio das pessoas) € as discusses se avolumam incessante e desnecessariemente. As divisées mais fundamentais caracterizam-se pela opgo bésica que as pessoas tomam. Além daqueles que ‘optam por si mesmos - destes néo falo, mas sé daqueles que pretendem resolver os problemas da humanidade como um todo -, hé duas classes de pessoas bem-intencionadas: a) aquelas que optaram pelas pessoas; b) aquelas que optaram pelas coisas. © tecnocrata esté neste segundo grupo: falta-Ihe sensibilidade pare com a realidade. Suas “teorias" so seu mundo e a elas tudo deve se condicionar, inclusive as pessoas e a realidade global. Por isso, ele é capaz de no compreender por que néo aceitamos sua "solucSo" quando ele "planeja" abrir um campo de aviacSo pera nele pousarem os mais modernos jatos no mais distante distrito de uma cidade do interior. "De fato", conclui ele, "o aviéo é o melhor meio de transporte. O povo é que esté errado porque ndo tem dinheiro, tem medo de avigo, gosta de andar de carroga.” Na educacdo voce jé ouviu esse tipo de conversa: "A filosofia da lei de ensino dtima; ndo tivemos sucesso nestes anos porque 0 povo no quer este tipo de ensino, as escolas ndo tm equipamento, os professores no esto preparados para ela; mas a lei é étima. Conserverno-la". Se o planejamento for de todos (um processo participado e, por isso, educativo), os técnicos serdo extraordinariamente iteis. N3o sero tecnocratas que impdem suas solucdes independentemente da vontade e da necessidade do povo. Nao se trata, realmente, de abandonar a teoria e as técnicas que resolvem os problemas. Trata-se de haver uma politice dessa técnica, em beneficio de todos. Melhor: trata-se de haver uma politica estabelecida democraticamente pelos que tém interesse nos resultados da técnica, Assim & 0 planejamento, Hé os que julgam que insistir no planejamento é buscar prisdes, impedir a inspiracdo, esquecer-se das pessoas. Isso realmente é assim quando hd os que dominam o planejamento, os que realizam planejamento burocrética e tecnocraticamente. Nao € assim para aqueles que usam o planejamento como uma estrada asfaltada para ir mais depressa @ algum lugar. Pode-se dizer que 0 asfalto tira a liberdade porque nos constrange a ir por ele sem nos deixar 0 caminho dos campos e das cachoeiras. Mas, se temos liberdade de escolher os lugares aonde queremos ou precisamos ir, o asfalto é um modo de irmos melhor. CONCLUSAO Nao parece que seja justo considerar qualquer livro como # solugo dos problemas. 0 habito que temos, por exemplo, de ndo questionar qualquer coisa que esteja escrita (desde as leis, pasando pela orientacéo da ciéncia ou da técnica) e partir burocraticamente para sua realizaco empobrece e dificulta uma aco significative em nosso esforgo educacional. Tenho visto universidedes que, em vez de questionar a teoria, por meio da pesquisa, passam @ seus alunos determinagSes e orientacdes que, as vezes, séo desprovidas de qualquer teoria. Desejo que este livro seja aplicado. Mas desejo mais: que ele seja questionado para que se compreenda, além dele, 0 valor do planejamento, seus fundamentos e suas técnicas, seus processes ¢ instrumentos. Terei satisfago em receber qualquer observacdo sobre @ aplicagdo deste livro e qualquer questionamento sobre sua validade.

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