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Werneck, R. “Energia Velha”. O Estado de S. Paulo, 29/8/2003, pág. B2. Disponível em: www.estadao.com.br.
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contraste, por exemplo, com o custo de produção de energia em usinas termoelétricas, que usam
carvão ou gás de petróleo como insumo.
A proposta de política de preços ora em estudo pretende se valer desse fato para chegar a
um nível de preços que não onere muito o consumidor. Fixar-se-ia algo como um preço médio, e
essa média seria puxada para baixo pelo custo de geração da “energia velha”, produzida nas
hidroelétricas instaladas há tempos. A ideia subjacente é que, dado que o custo de construção de
tais usinas já foi, praticamente, amortizado, só o custo de operação seria relevante; sendo este
baixo, não haveria por que encarecer desnecessariamente o preço final da energia elétrica para o
consumidor.
Ora, como assinala Werneck,. essa ideia deixa de lado um princípio econômico elementar.
Do ponto de vista contábil, é certo que o custo de construção de boa parte de nossas usinas
hidroelétricas não representa mais um ônus financeiro significativo, ou mesmo ônus algum, para
seus proprietários (na maioria dos casos, o Governo, isto é, todos nós). Os empréstimos
levantados para financiar essas obras já foram pagos, ou quase isso; no essencial, os custos já
foram amortizados. Mas isso não significa, em absoluto, que o valor econômico desse capital
investido no passado seja insignificante. Pois esse capital tem um custo de oportunidade: o
Governo poderia, por exemplo, vender suas hidroelétricas, e com os recursos obtidos amortizar
parte de sua dívida, pela qual paga juros notoriamente altos. Por quanto poderiam ser vendidas as
usinas hidroelétricas “velhas”? Um valor de referência básico (usado, por exemplo, nos leilões de
privatização) é o fluxo de rendimentos líquidos que se pode esperar obter desses ativos, até o final
de sua vida útil. Como usinas hidroelétricas têm, em geral, uma longa vida útil, trata-se de muito
dinheiro. Vários bilhões de reais — que, sob a forma de dívida pública, acarretam uma despesa
substancial em juros, todos os anos.
Ou seja, considerar que a “energia velha” tem um preço baixo equivale, de fato,
implicitamente, a conceder o Governo um subsídio aos consumidores de energia elétrica. Ou
melhor, concedermos todos esse subsídio, nós, os contribuintes, que somos de fato os donos das
hidroelétricas velhas. Faz sentido, isso? Em princípio, pode fazer sentido subsidiar alguns
consumidores de eletricidade, como os domicílios de baixa renda (o que costuma ser feito, por
meio de tarifas diferenciadas). Mas, no caso, trata-se de um subsídio generalizado, que atinge
também o ar-condicionado central dos edifícios de luxo, ou a feérica iluminação de um shopping
center. Se esse subsídio indiscriminado fosse explicitado, e fosse deixado claro também qual é o
seu custo de oportunidade, é provável que a maioria dos contribuintes se recusasse a custeá-lo.
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O erro de raciocínio econômico pode ser posto em relevo por uma analogia proposta por
Werneck. Suponhamos que um avô indulgente ceda uma loja, que comprou há anos, num ponto
privilegiado, para que o neto preferido explore uma atividade comercial. Para o neto, o custo do
aluguel desse imóvel “já amortizado” é zero, o que certamente fará subir o lucro contábil do
empreendimento comercial. Mas é claro que não fará sentido tomar esse lucro como um
indicador da viabilidade econômica do empreendimento, pois há um custo não contabilizado: o
custo de oportunidade, para o avô, da loja cedida. Pode ser que, incluído esse custo, o lucro do
neto fosse de fato negativo.
Vê-se, portanto, que a noção de custo de oportunidade parece estar sendo
desconsiderada, na desenho da política de preços de energia elétrica atualmente em estudo. É
fácil ver que isso não envolve apenas uma questão acadêmica. Se efetivamente adotada, tal
política poderá ter efeitos indesejáveis para toda a população, pelo menos de duas formas. De um
lado, um preço artificialmente baixo induzirá um maior consumo de energia elétrica, em
detrimento de outras formas de energia: estas parecerão comparativamente caras para o
consumidor, em decorrência do subsídio implícito contido no preço da eletricidade. Ou seja: os
preços relativos das várias formas de energia, por indicarem incorretamente seus custos de
oportunidade, levarão a uma estrutura inadequada de consumo (mais de eletricidade e menos das
outras formas de energia), o que representa um desperdício de recursos.
De outra parte, dado que o preço da energia elétrica tenda a se fixar, em decorrência do
subsídio implícito, abaixo do custo marginal de produção, isso certamente terá o efeito de afastar
investidores privados dessa área. Esse é o efeito potencialmente mais danoso, no longo prazo, na
medida em que se pretenda atrair a iniciativa privada para o investimento em geração de
eletricidade no País. Quando se consideram as restrições orçamentárias do Governo, é muito
possível que o investimento privado venha a ser necessário, nessa área; se os incentivos não
forem adequados, poderemos voltar a ter problemas com uma oferta insuficiente de energia
elétrica, no futuro.