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AS FASES PROCESSUAIS

Para a escolha da peça adequada, é essencial que se tenha


em mente que o processo penal é dividido em fases. É
possível fazer uma porção de divisões, mas adotarei a mais
simples possível: a) fase pré-processual; b) fase processual;
c) fase pós-processual. Para cada uma delas, há um rol de
peças, com objetivos específicos.

PRÉ-PROCESSUAL → PROCESSUAL → PÓS-


PROCESSUAL

FASE PRÉ-PROCESSUAL

A fase pré-processual engloba tudo o que ocorrer antes do


RECEBIMENTO da denúncia ou da queixa. Ainda não existe
um processo em andamento. Antes de falarmos da fase pré-
processual em si, uma distinção importante: não confunda
oferecimento da petição inicial com o seu recebimento. Um
exemplo que talvez esclareça:

João é promotor de justiça. Francisco praticou um roubo.


João OFERECE denúncia contra Francisco. Carlos, o juiz da
comarca, RECEBE a denúncia contra Francisco, dando início
ao processo.

No momento em que o promotor OFERECEU a denúncia, a


fase ainda é a pré-processual. No entanto, quando o juiz a
RECEBEU – houve uma decisão judicial dizendo que a
petição inicial do promotor está de acordo com o art. 395 do
CPP -, deu-se início à fase processual. Pode parecer
besteira, mas veja algumas situações em que essa distinção
é exigida:
1ª. O arrependimento posterior (CP, art. 16) só é possível se
ocorrer até o RECEBIMENTO da denúncia.
2ª. A retratação da representação, em crime de ação penal
pública condicionada, só é possível até o OFERECIMENTO
da denúncia (CPP, art. 25).
3ª. A prescrição é interrompida pelo RECEBIMENTO da
petição inicial, e não pelo OFERECIMENTO (CP, art. 117, I).
Portanto, como já dito, a fase pré-processual é encerrada no
momento em que a petição inicial (denúncia ou queixa) é
recebida, quando é dado início à fase processual. Sabendo
disso, veja como é simples saber se uma peça é pré-
processual ou processual. Dois exemplos:

1º. Defesa Prévia da Lei de Drogas (Lei 11.343/06): “Art. 55.


Oferecida a denúncia, o juiz ordenará a notificação do
acusado para oferecer defesa prévia, por escrito, no prazo de
10 (dez) dias.”.

2º. Resposta à Acusação (CPP, art. 396): “Art. 396. Nos


procedimentos ordinário e sumário, oferecida a denúncia ou
queixa, o juiz, se não a rejeitar liminarmente, recebê-la-á e
ordenará a citação do acusado para responder à acusação,
por escrito, no prazo de 10 (dez) dias.”.

No primeiro exemplo, o dispositivo diz: oferecida a denúncia,


o acusado deve oferecer defesa prévia. Logo, fase pré-
processual. No segundo, o CPP fala em recebimento da
denúncia. Destarte, fase processual. Então, se o enunciado
da prova dissesse que a petição inicial foi recebida, a defesa
prévia da Lei de Drogas estaria descartada, pois só é cabível
após o oferecimento e antes do recebimento da denúncia.

Na fase pré-processual, embora existam outras peças, as


realmente possíveis para a segunda fase são as seguintes:

a) Liberdade Provisória: o enunciado descreverá hipótese em


que o cliente foi preso em flagrante dentro da legalidade, mas
estão ausentes os requisitos da prisão preventiva (CPP, art.
312). Não há denúncia e nem nada. Apenas a prisão em
flagrante. Exemplo: “João foi preso em flagrante por estar
dirigindo embriagado. Ele possui residência fixa, trabalha e é
a primeira vez em que é preso. Como advogado de João,
elabore a peça adequada em sua defesa”. A LP nunca caiu
em uma segunda fase por ser uma peça extremamente
simples, que não comporta muitas teses. Se caísse na
próxima segunda fase, seria, sem dúvida, uma grande
surpresa.
b) Relaxamento da Prisão em Flagrante: assim como na
liberdade provisória, o seu cliente foi preso em flagrante, mas
há um porém: a prisão é ilegal. Exemplo: “Após ser obrigado
a fazer o teste do bafômetro, João foi preso em flagrante por
estar dirigindo embriagado. Como seu advogado, elabore a
peça adequada em sua defesa”. Como todos sabemos,
ninguém pode ser obrigado a fazer o teste. Logo, a prisão em
flagrante foi ilegal, devendo ser relaxada. Veja que não há
qualquer menção ao recebimento de denúncia ou queixa.
Portanto, fácil perceber que estamos lidando com peça da
fase pré-processual. O relaxamento caiu no VI Exame de
Ordem.

c) Queixa-Crime: é uma peça com boas chances para a


próxima segunda fase. O enunciado dirá que o seu cliente foi
vítima de um delito e você, como advogado, deve buscar os
meios adequados para que o criminoso seja punido.
Exemplo: “João disse em uma rede social que Francisco, seu
vizinho, está tendo um caso extraconjugal. Segundo ele,
Francisco encontra a amante às quartas, após o expediente.
Como advogado de Francisco, elabore a peça adequada
para a defesa dos seus interesses”. Veja que não se falou
em recebimento de queixa ou em sentença. O seu cliente foi
ofendido e você deve fazer algo em sua defesa. Portanto, a
peça só pode ser a queixa-crime, que não cai desde o XV
Exame de Ordem.

d) Defesa Preliminar (Crimes Funcionais): o art. 514 do CPP


diz assim: “Art. 514. Nos crimes afiançáveis, estando a
denúncia ou queixa em devida forma, o juiz mandará autuá-la
e ordenará a notificação do acusado, para responder por
escrito, dentro do prazo de quinze dias.”. Trata-se de peça do
rito especial dos crimes funcionais (crimes cometidos por
funcionários públicos). Perceba que o dispositivo não fala,
em momento algum, que a denúncia foi recebida. Embora
tenha havido manifestação do juiz, não houve o recebimento
da petição inicial. Logo, mais uma peça pré-processual. Dica:
antes do recebimento, o juiz manda notificar; após o
recebimento, o juiz manda citar. Se o dispositivo legal disser
“notificar”, você já sabe que a peça é pré-processual.
Exemplo: “João foi preso em flagrante pela prática do crime
de peculato (CP, art. 312). Concluído o inquérito, o promotor
de justiça o denunciou pela prática delituosa. O juiz da
comarca o notificou a respeito da denúncia, para que ofereça
a peça cabível. Como advogado de João, ofereça a peça
adequada”.
e) Defesa Prévia (Lei de Drogas, art. 55): o enunciado da
prova descreverá situação em que o cliente praticou crime da
Lei 11.343/06 – provavelmente, tráfico – e dirá que a
denúncia foi oferecida, mas ainda não recebida. Exemplo:
“João foi preso em flagrante por estar transportando 2kg de
maconha. O promotor de justiça o denunciou pelo crime de
tráfico de drogas, com fundamento no art. 33 da Lei
11.343/06. João foi notificado no dia de ontem da denúncia.
Como seu advogado, elabore a peça cabível”. Perceba, mais
uma vez, que não foi falado em recebimento, fazendo com
que o leitor do enunciado conclua com facilidade que se trata
de peça pré-processual.
Como já dito, há outras peças pré-processuais. Algumas
serão vistas durante a nossa preparação. No entanto, as de
maior probabilidade para a próxima segunda fase são as
descritas acima.

FASE PROCESSUAL

A fase processual tem início com o recebimento da petição


inicial (denúncia ou queixa). O juiz decide se recebe ou não a
inicial com fundamento no art. 395 do CPP – marque em
seu vade mecum, pois pode ser útil no futuro. As principais
peças da fase processual são as seguintes:
a) Resposta à Acusação: é a primeira chance de defesa na
fase processual. O problema dirá que a denúncia foi recebida
e que o cliente foi citado. Exemplo: “João foi preso em
flagrante pela prática do crime de roubo. O promotor de
justiça o denunciou pela prática delituosa. O juiz de direito
recebeu a inicial e determinou a citação do réu, ocorrida há
dois dias. Como advogado de João, elabore a peça cabível”.
Veja que não foi falado em audiência ou em sentença. A
problema tem como último ato o recebimento da inicial. A
resposta à acusação foi a peça em três Exames de Ordem.

b) Memoriais: como regra, concluída a audiência, advogados


e Ministério Público devem fazer as alegações finais
oralmente. No entanto, em algumas situações, isso não é
possível, e o juiz abre prazo para que as alegações sejam
oferecidas por escrito. São os memoriais. Portanto, se o
problema disser que houve audiência, mas ainda não foi
dada a sentença, os memoriais são a única peça possível.
Exemplo: “João foi preso em flagrante pela prática do crime
de roubo. O promotor de justiça o denunciou pela prática
delituosa. O juiz de direito recebeu a inicial e determinou a
citação do réu. A resposta à acusação foi oferecida. Ocorrida
a audiência, saíram as partes intimadas para que ofereçam
suas considerações finais. Como advogado de João, elabore
a peça cabível”. A FGV já cobrou memoriais em quatro
oportunidades.

c) Apelação e Recurso em Sentido Estrito (razões): se o


problema disser que houve decisão de juiz de primeira
instância, é bem provável que a peça cabível seja uma
dessas duas. Há outras, a exemplo dos embargos de
declaração, que serão estudadas, mas a chance de caírem
em uma segunda fase é quase inexistente. Para decidir por
uma ou por outra, veja se a hipótese relatada se encaixa em
uma das situações do art. 581 do CPP. Se houver
correspondência, faça o recurso em sentido estrito. Caso
contrário, faça apelação. Exemplo: “João foi denunciado pela
prática de um homicídio. Recebida a inicial e ocorrida a
audiência, o juiz decidiu pronunciá-lo. Como advogado de
defesa, elabore a peça cabível”. Como o art. 581, IV, prevê
que a peça cabível é o RESE, é a peça a ser elaborada no
exemplo. Outro exemplo: “João foi denunciado pelo crime de
roubo. Concluída a audiência, o juiz o condenou à pena de 6
anos. Como advogado de João, elabore a peça adequada”.
Como o art. 581 não prevê a hipótese do segundo exemplo,
por eliminação, a peça cabível é a apelação. A apelação já
caiu em oito edições da prova. O RESE, em duas, e já não
cai há algum tempo, o que me leva a crer que pode ser a
peça da próxima segunda fase. Atenção: pode ocorrer de o
enunciado descrever hipótese em que a outra parte ofereceu
apelação ou recurso em sentido estrito. Neste caso, para
defender o cliente do recurso interposto, deverão ser
oferecidas contrarrazões.

d) Embargos Infringentes e/ou de Nulidade: nunca caíram em


uma segunda fase – e, sinceramente, acho que nem cairão.
Digo isso pela facilidade da peça. Os embargos são cabíveis
contra decisão por acórdão (decisão de órgão colegiado, a
exemplo de uma câmara criminal de TJ), quando não houver
unanimidade entre os julgadores. Explico: se uma câmara
criminal for composta por três desembargadores, pode
ocorrer de dois votarem pela condenação e um pela
absolvição. Neste caso, o réu pode oferecer embargos
infringentes e/ou de nulidade para que o voto do
desembargador que entendeu pela absolvição prevaleça.

e) Recurso Especial e Recurso Extraordinário: nunca caíram,


mas acredito que pela dificuldade. São os recursos cabíveis
contra decisões de tribunais em hipóteses bem específicas,
previstas nos arts. 102, III, e 105, III, da CF. O Recurso
Especial leva a discussão ao STJ; o Extraordinário, ao STF.
Se caírem um dia, a reprovação será em massa.
Considerando que a FGV pegou pesado na primeira fase do
XXIII Exame de Ordem, não acredito em um dos dois para a
próxima segunda fase. De qualquer forma, serão estudados.
f) Recurso Ordinário Constitucional: carinhosamente
chamado de “ROC”, é uma peça com boas chances para
uma segunda fase. O ROC é cabível contra decisão de
tribunal que denega HC e MS. Se a decisão for de TJ ou
TRF, o ROC deve ser endereçado ao STJ; se a decisão for
do STJ, a peça é endereçada ao STF. Exemplo: “João teve a
sua prisão preventiva decretada pelo juiz da 1ª Vara Criminal.
Um Habeas Corpus foi impetrado em seu favor, mas o
Tribunal de Justiça o denegou. Como advogado de João,
elabore a peça cabível”. No exemplo, a peça é um ROC ao
STJ.

FASE PRÓ-PROCESSUAL

Considera-se fase pós-processual tudo aquilo ocorrido após


o trânsito em julgado, momento em que a fase processual é
encerrada. Como advogado, há dois motivos de intervenção
pós-processual: para a discussão do cumprimento da pena
(ex.: pedido de progressão de regime) ou para buscar a
rediscussão de um caso já transitado, quando nenhum
recurso é mais cabível. Para o Exame de Ordem, há duas
peças pós-processuais com grande probabilidade:

a) Agravo em Execução: é o único recurso cabível contra


decisão do juiz da execução penal. Se o problema disser que
o a decisão partiu de juiz da Vara da Execução penal, pode
fazer Agravo em Execução, sem medo de errar. Exemplo:
“João cumpriu 1/6 de sua pena em regime fechado. Embora
presentes os requisitos para a progressão de regime, o juiz
da Vara da Execução penal negou o pedido feito. Como
advogado de João, elabore a peça cabível”. Caiu uma vez no
Exame de Ordem.

b) Revisão Criminal: é a peça cabível para voltar a discutir o


mérito de um processo já transitado. Como já não há mais
recursos cabíveis, resta ao injustiçado buscar o que lhe é de
direito em revisão – equivalente à rescisória do processo
civil. Exemplo: “João foi condenado pelo crime de roubo.
Transitada em julgado a sentença condenatória, surgem
documentos que provam a sua inocência. Como advogado
de João, elabore a peça adequada em busca dos seus
interesses”. Também caiu uma vez no Exame de Ordem.
CONSIDERAÇÕES FINAIS

É claro, há outras peças – HC, MS, carta testemunhável etc.


Todas elas serão estudadas. No entanto, a FGV não é de
inovar no que vem pedindo. Por isso, o seu foco deve estar
voltado às peças vistas neste resumo. Uma delas cairá na
próxima segunda fase. No próximo post, começaremos com
o estudo individualizado das peças. A primeira será o
relaxamento da prisão em flagrante. Por ora, tenho uma
sugestão: leia os enunciados das provas passadas e tente
identificar quais foram as peças cobradas.

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