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Artigo Publicado Com Gilmar Na Geografar PDF
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Curitiba, v.8, n.2, p.180-204, dez./2013 ISSN: 1981-089X
RESUMO
território que atualmente ocupam, como também do universo de valores que dão
sentido a estas relações. A partir desta constatação, este artigo tem por objetivo
conhecer a trajetória de vida dos reassentados da Usina Hidrelétrica de Irapé no
Vale do Jequitinhonha, desde os locais de origem até o atual momento em que
residem nos reassentamentos. Para isso, utilizamos como procedimentos
metodológicos tanto técnicas quantitativas quanto qualitativas, em que o método
principal escolhido foi o estudo de caso, com uma amostra de 61 reassentados
distribuídos em 10 associações diferentes, em 5 municípios da região: Turmalina,
Leme do Prado, José Gonçalves de Minas, Capelinha, e Água Boa. Através deste
estudo, constatamos que a trajetória de vida dessas populações que são
reassentadas é marcada pela inevitabilidade que um processo de reassentamento
forçado possui, e que estes estão, constantemente, imersos em um processo de
mudança e de re-significação dos seus meios de vida.
ABSTRACT
The implementation of large hydropower projects in Brazil brings up a discussion
based on the duality between the parties involved in the process on the one hand
entrepreneurs endowed with a speech developmental facing the demands of an
industrialized society, and the other rural populations affected, which are
compulsorily displaced for resettlement. Therefore, this study sought to understand
how social relations are structured these segments affected, their adaptive strategies
in conjunction with the territory that currently occupy, but also the universe of values
that give meaning to these relationships. From this finding, this paper aims to
understand the trajectory of lives of resettled Irapé Power Plant in Vale do
Jequitinhonha, from the places of origin to the present time residing in resettlement.
For this, we use as instruments both quantitative and qualitative techniques, in which
the main method chosen was the case study, with a sample of 61 resettled
distributed in 10 different associations in five municipalities in the region: Turmalina,
Leme do Prado, José Gonçalves de Minas, Capelinha, and Água Boa. Through this
study, we could realize that the life histories of these populations which are resettled
is marked by inevitability that a process of forced resettlement has, and they are
constantly immersed in a process of change and re-signification of their livelihoods.
1 INTRODUÇÃO
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e implantados. Os argumentos mais comuns que podem ser observados são de que
esses investimentos se fundamentam em: novas oportunidades de emprego que são
gerados, na dinamização da economia local, na melhoria da infraestrutura
disponibilizada à população, entre outros. Estes seriam classificados como os
impactos positivos da construção das grandes barragens, levando-se em conta a
perspectiva de seus apoiadores.
Esta abordagem, portanto, não deve servir como referência quando tratamos
das diversas comunidades rurais que são atingidas, direta e indiretamente, por
esses empreendimentos. É preciso enxergar quão grande são as dificuldades dos
reassentados em reproduzir suas vidas sob novas bases materiais e
organizacionais, especialmente longe da água, elemento fundamental para o
sucesso de suas atividades produtivas e referencial simbólico máximo de
espacialidade. Um discurso desenvolvimentista e territorializador que vem dos
interessados na construção de grandes empreendimentos hidrelétricos se choca
com uma realidade sensível e sócio-culturalmente construída ao longo da vida dos
ribeirinhos, o que revela as profundas irracionalidades e injustiças cometidas quando
o que está em jogo é a imposição e não o diálogo.
De acordo com esta perspectiva, Ribeiro e Galizone (2003) ao estudarem a
questão da água, as políticas de gestão e a população rural do Vale do
Jequitinhonha em Minas Gerais, apontam que apesar da aplicação de esforços e
recursos públicos necessários ao desenvolvimento do campo, grande parte da
população rural permaneceu, e permanece, à margem da produção intensiva, dos
mercados e até mesmo das discussões que envolvem o direcionamento de ações
que lhes contemplem melhores condições de vida.
Num primeiro momento, Ribeiro e Galizone (2003) apresentam a ideia de que
elaborar e transmitir conhecimentos é uma atividade permanente para estas
populações rurais, pois a sua produção de alimentos e outros bens baseiam-se em
suas práticas. Por essa razão, o território e suas formas sociais de apropriação têm
para essa população uma enorme importância e uma forte valorização subjetiva. No
caso específico apresentado sobre o Vale do Jequitinhonha, as nascentes e os
pequenos cursos d'água são fatores fundamentais para a localização dessas
populações, assim como da organização de suas atividades sociais e econômicas.
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2 MATERIAL E MÉTODOS
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3. RESULTADOS
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sua reprodução e de sua família, e sim um complemento aos seus meios de vida e
de obtenção de instrumentos para o trabalho. Na produção camponesa não há a
escolha por plantar para vender ou para o sustento, a troca do excedente realizada
no mercado é uma alternativa para a garantia de condições mínimas de sua
reprodução.
Boa parte dos homens, pais de família, também trabalhavam a dia de serviços
para aqueles que demandassem, como no caso das plantações de eucalipto que
prevalecem na região. A maioria dos reassentados começaram a trabalhar muito
cedo para a ajudar nas necessidades da casa. De acordo com Candido (2003, p.
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Participação nas etapas Participação na seleção das terras (% ) Participação na seleção dos lotes (% )
Sim 91,80% 78,69%
Em parte 3,28% 9,84%
Não 4,92% 11,47%
Fonte: Dados da pesquisa, 2010
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quais "terras" iriam e onde seus lotes situariam. As terras do reassentamento foram
repartidas seguindo os critérios e os tamanhos definidos pelo acordo. Durante essa
etapa buscou-se preservar as proximidades e os laços afetivos existentes entre as
famílias na comunidade de origem, a fim de que permanecessem próximos na nova
localidade e para que a adaptação se desse de uma maneira menos impactante
possível.
Antes das definições referentes às distribuição das terras e dos lotes era
preciso que fosse feita uma avaliação prévia de benfeitorias do lote de origem, para
que o reassentado fosse indenizado de acordo com os bens que possuía. Uma das
modalidades aplicada quanto a forma de ressarcimento aos reassentados sobre as
perdas que teriam com o abandonar de suas terras de origem, se deu através de
indenizações monetárias.
Portanto, as informações apresentadas a seguir demonstra a opinião dos
reassentados se realmente foram indenizados, assim como estava previsto no
acordo de realocação:
Pagamento de Indenizações %
Foi Indenizado 73,77%
Foi Indenizado Parcialmente 13,12%
Não Foi Indenizado 9,84%
Fonte: Dados da pesquisa, 2010
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sido justo aquilo que lhes foi oferecido. Aqui destacamos com bastante ênfase o
depoimento recolhido sobre a administração desses recursos por muitas famílias
indenizadas. Em poucos casos, percebe-se famílias que souberam investir o seu
dinheiro e estão melhorando sua condição financeira a cada dia. Por outro lado,
observa-se relatos de famílias que não souberam coordenar seus gastos e hoje
vivem em situações iguais ou piores às condições que ocupavam antes de serem
reassentadas.
Nas palavras de Sigaud (1992) observa-se os efeitos perversos contidos nas
políticas do setor elétrico, que são responsáveis pelo deslocamento compulsório e
extremamente desorganizado de milhares de cidadãos brasileiros, contribuindo para
seu empobrecimento e por uma profunda transformação do seu modo de vida.
Torna-se bastante comum na região a aquisição, por parte dos
reassentados, de veículos automotores com o dinheiro pago pelas indenizações,
sem medir as consequências dos possíveis gastos que o transporte pode trazer
futuramente (manutenção). Destaca-se também outras formas de investimentos
(equipamentos domésticos, de produção e outros) que muitas vezes estão
subordinadas à pessoas de má fé, aproveitando o baixo grau de informação e
escolaridade que há entre os reassentados. Evidencia-se com isso a falta de
orientação dos órgãos responsáveis pelo empreendimento e reassentamento dos
atingidos em, de alguma forma, orientar ou mesmo acompanhar a administração dos
recursos por estas famílias. Fica bem evidente que os “indenizadores” pensam
apenas em cumprir a meta de indenizar, conferindo às famílias a responsabilidade
sobre seus investimentos.
Outra questão que destacamos com bastante ênfase se trata dos impactos
socioculturais que o empreendimento trouxe para aquelas comunidades atingidas.
Quando os primeiros interessados chegaram a região, no caso a empresa que
avaliava o potencial energético do rio, perceberam que algumas medidas deveriam
ser tomadas em relação ao rico acervo cultural que o Vale do Jequitinhonha
possuía. Antes do processo de reassentamento, nas reuniões que eram realizadas
para a definição de como as famílias atingidas seriam reassentadas, os
reassentados afirmaram que estas questões em relação à preservação de seus
costumes, cultura e práticas religiosas foram discutidas. Estes também afirmaram
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Participação na Associação %
Participa 95,08%
Não participa 4,92%
Fonte: Dados da pesquisa
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4 CONCLUSÃO
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7 BIBLIOGRAFIA
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SIGAUD, Lygia. O efeito das tecnologias sobre as comunidades rurais: o caso das
grandes barragens. RBCS, n.18, ano 7, 1992.
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