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Britten V1000: quando um desconhecido da Nova Zelândia ensinou ao


mundo como fazer uma moto de corridas
Carlos Eduardo Almeida 24 fevereiro, 2016 174 Comentários
Imaginem a cena: 1990, Autódromo da Daytona. Ducatis, Hondas, Suzukis
e outras marcas se preparando para a prova Battle of the Twins, que se
iniciaria em breve. De repente chega um neo-zelandês com jeitão caipira,
tira do trailer uma moto estranha azul e rosa, e começa a prepará-la para a
disputa.
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Confesso que, fosse eu engenheiro da Ducati, nem daria bola para aquilo.
Mas depois da corrida provavelmente comeria meu diploma. Aquele
“kiwi” simplesmente saiu de um arquipélago no fim do mundo e mostrou a
todos como fazer uma moto de corrida! Seu nome todos viriam a conhecer
depois: John Britten.
Nascido em Christchurch, Nova Zelândia, o garoto John passou perrengue
na escola, devido à dislexia. Ainda na infância seu talento para construir
coisas despontou. Começou construindo seus próprios carrinhos de rolimã;
aos 12 anos comprou um motor à combustão e construiu seu primeiro kart.
Aos 13 ele e um amigo acharam uma Indian Scout (coincidentemente o
mesmo modelo que fez a fama de seu ídolo, Burt Munro) numa vala e
juntos a restauraram. Daí surgiu a paixão do garoto pelas duas rodas. Mal
sabia ele que revolucionaria o motociclismo!
Sendo assim, não foi surpresa quando aquele menino (apesar das
dificuldades advindas da dislexia) se formou engenheiro mecânico. Dentre
outras atividades ele foi trabalhar no Reino Unido, onde participou da
equipe que projetou a ligação entre as rodovias M1 e M4 do arquipélago.
Voltando para seu país natal, desempenhou diversas atividades no ramo da
engenharia, o que lhe proporcionou um vasto conhecimento de metalurgia
e design de peças. Ele era um raro tipo de cara que não tinha medo de pôr
a mão na massa e levava a filosofia do do-it yourself a sério. Por exemplo,
reformando sua casa, ele não gostou de nenhum modelo de maçaneta,
torneira e puxador de porta de armário à venda no mercado. Ao invés de
tentar decidir entre o menos feio, ele usinou as próprias peças do jeito que
queria!
Valendo-se dessa experiência e atitude, e sendo um piloto de
motovelocidade amador, é bem fácil supor que seu próximo passo seria
melhorar a Ducati que ele usava como moto de corrida. Começou
projetando uma nova carenagem, porém o quadro e motor da moto não
eram lá tão bons. Em um segundo momento construiu um novo quadro,
mas o motor não era confiável. A partir dali ele fez como na reforma de
casa. Como não estava bom, acabou fazendo tudo do zero, do jeito dele.
“Não sabendo que era impossível, foi lá e fez.”
Com um orçamento limitado, uma equipe pequena, uma folha de papel em
branco, doses cavalares de criatividade e inventividade típicas do povo
neozelandês, ele simplesmente ignorou todos os livros de engenharia de
motocicletas e fabricou no quintal de casa uma das motos mais incríveis de
todos os tempos, a Britten V1000.

Apesar da grana curta, não poupou esforços em ter os melhores materiais


embarcados. Numa época em que fibra de carbono era material de
espaçonaves alienígenas e carros de F1 que dançavam nos boxes, a V1000
utilizava em carenagem, braços de suspensão, chassis e até mesmo nas
rodas. Titânio? Confere. Aço inox? Confere. Kevlar? Confere!
Mas não era só em materiais que o modelo se destacava. Na busca por
alívio de peso e resistência, Britten decidiu pelo exótico arranjo de motor
como componente estrutural. Sim, senhores, o motor era também o quadro
da moto! Essa é uma das maneiras mais eficientes de alívio de peso,
projetar uma peça para exercer duas funções. A partir do motor era preso o
subchassi dianteiro, que comportava a suspensão dianteira, guidão e
painel; braço de suspensão traseiro, banco e radiador (que ficava debaixo
do banco).

A suspensão dianteira usava uma solução genial, nunca antes pensada para
corridas: um arranjo do tipo Hossach, de braços duplos sobrepostos e garfo
rígido ligando a roda dianteira a esses braços. Segundo Britten, com esse
arranjo, trail e cáster (ângulos cruciais para determinar o comportamento
dinâmico da moto) eram variáveis, e ele poderia facilmente ajustar a
geometria da moto para agilidade em circuitos travados ou estabilidade em
retas e curvas de alta. Na traseira, um braço preso ao motor, utilizando
conjunto mola-amortecedor único e ajustável. Seria um arranjo bem
comum não fosse o fato dele ter colocado o coilover à frente do motor,
para facilitar na refrigeração do óleo do amortecedor.
Mas e o motor? Ele projetou e forjou todas as peças no quintal de casa,
usando até mesmo água da piscina para resfriar o metal forjado. Um V2
com cilindros a 60o todo em aço, cabeçotes com 4 ou 5 válvulas
(dependendo da versão) e duplo comando, válvulas e bielas em titânio. A
cilindrada era variável dependendo da configuração, mas sempre entre
1.000 e 1.100 cm³. O propulsor gerava cerca de 160 cv nas configurações
mais fortes, o que era um assombro para a época.

Para modelar as carenagens e outras partes, ele comprou arame no 9 e


pegou a pistola de cola quente da esposa emprestado. Após isso, moldou a
fibra de carbono sobre a estrutura de arame e fez todo o processo de cura
em autoclave. Fechando o pacote, embreagem seca (normalmente as
motocicletas possuem embreagem banhada à óleo) e injeção eletrônica
programável com um dos primeiros sistemas de data loggin utilizados em
um veículo de duas rodas.
Poucas peças não foram construídas por ele. Coilovers (Ohlins), freios
(Brembo), pneus, injeção eletrônica e outros componentes elétricos,
basicamente.
Quando terminou, não só havia construído a moto de corrida mais
avançada até aqueles dias, como também uma obra de arte! Linda, esguia,
orgânica, pesava apenas 138 kg em ordem de marcha. Para se ter uma
idéia, isso é 10 kg mais leve que uma Honda CB 300 equipada com ABS!

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Pois bem. Em 1990 ele levou a moto para correr nos EUA. Conseguiu a 3ª
e 5ª colocações na Battle of the Twins em Daytona e chamou a atenção do
mundo! A partir daí começava uma carreira vitoriosa. A moto era tão
rápida que em determinadas provas os pilotos contratados por ele
passavam empinando (!) pelos adversários.
Foto: Nina Crawford/BSB Pix
Britten tornara-se celebridade no meio, sua moto é exibida em várias capas
de revista mundo afora e ele é aclamado como um gênio das pranchetas.
Conseguira realizar um feito tão notável quanto aqueles de seus ídolos e
compatriotas Burt Munro, Bruce Mclaren e Bill Hamilton (inventor dos jet
boats). Saiu de uma ilha isolada no Oceano Pacífico para assombrar o
mundo com um feito notável.
Object 2

Infelizmente, em 1995, descobriu que estava com câncer e morreu no dia 5


de setembro daquele mesmo ano. Àquela altura, ele já havia provado ao
mundo que era possível um cara construir uma moto em casa e competir
de igual para igual com as maiores empresas do mundo.

Mesmo com o desenvolvimento cessado prematuramente, sua criação


continuou vencendo corridas até 1998, uma prova incontestável do
trabalho estupendo feito por um sujeito que levava a filosofia do-it
yourself às últimas consequências.

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TAGS » Britten V1000, John Britten, motociclismo


POSTED IN » História, Motos

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