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Floresta
submarina
Recifes da foz do
Amazonas podem ser
maiores, mais
profundos e complexos
do que o previsto
Carlos Fioravanti
Esponjas-do-mar e
algas a 90 metros
de profundidade,
na área norte dos
recifes da Amazônia
Greenpeace
Variedades amazônicas
Esponjas coletadas ao largo da foz do rio pelas equipes da Rede Abrolhos
5 cm
5 cm
5 cm
2 cm
Fernando Moraes / Rede Abrolhos
10 cm 5 cm
15 cm
Agelas clathrodes Geodia neptuni
Aplysina fulva
Estimativas recentes sugerem que a área poderia pelo rio no mar impediria a penetração
ser até seis vezes maior que a prevista de luz e a formação de qualquer tipo de
ambiente. Aos poucos, as evidências di-
n mapeamento de 2012 e 2014 luíram o pressuposto.
n área complementar estimada Há informações escassas sobre a foz
no mapeamento de 2016
do Amazonas desde os anos 1950. Na dé-
cada de 1960, o oceanógrafo John Milli-
Amapá man, de Woods Hole, e o geólogo Henyo
Barreto, da Petrobras, identificaram uma
estrutura rochosa rica em carbonatos na
região. Em 1977, dois biólogos do Museu
de História Natural dos Estados Unidos,
Rio Amazonas
Parcel de Manuel Luís
Bruce Collette e Klaus Rützler, apresen-
taram uma lista de 45 espécies de peixes
pará e 35 de esponjas típicas de recifes, cole-
tados ao largo da boca do rio.
Em julho de 1998, Moura, Francini e
o biólogo Ivan Sazima, da Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp), segui-
maranhão ram além do parcel de Manuel Luís, no
Maranhão, até então o banco de corais
mais ao norte do Brasil, entraram em
fonte francini filho, R. et al. FRONtiers in marine Science. 2018 águas ainda mais setentrionais da costa
brasileira e encontraram seis espécies
de corais que não haviam sido relata-
milimétricos parecidos com insetos, os EScarpas no fundo da foz das nessa parte do litoral. “Os pescado-
copépodes, com 92 espécies. Como de- No assoalho marinho, há escarpas, se- res falavam que ao norte do parcel havia
talhado em um artigo de março de 2018 melhantes a falésias, com quilômetros muito recife”, lembra Francini. A pesca
na Frontier in Microbiology pelo grupo de de extensão e até 70 m de altura. “Acre- de pargo e da lagosta na região também
Pernambuco, a densidade variou de 2,6 ditava-se que nessa parte da plataforma indicava que o fundo deveria ser sólido;
milhões de indivíduos por metro cúbico continental a areia e a lama, acumuladas não apenas lama, mas as dificuldades
(m3) nas áreas mais próximas da foz a ao longo de 10 milhões de anos, já teriam logísticas e financeiras dificultaram a
107 indivíduos por m3 nas mais distan- coberto todo o fundo”, diz Asp. Segun- organização de expedições. Até que em
tes, em razão do volume de sedimentos. do ele, os degraus poderiam ser conse- 2012 uma equipe coordenada por Mou-
Nos recifes vivem duas espécies de pei- quência da erosão causada pela água do ra, da UFRJ, percorreu a área a bordo do
xes azulados conhecidos como donzela mar há 18 mil anos, quando o nível do navio Atlantis, do Woods Hole.
(Chromis spp.) e comuns no mar do Cari- oceano estava cerca de 120 m abaixo do A inquietação convive com o deslum-
be, a cerca de 2 mil km de distância. Essa atual. As escarpas, portanto, marcariam bramento das descobertas porque a foz
e outras indicações reforçam a hipótese o limite do nível do Atlântico no último do Amazonas tem sido visada para a ex-
de que os recifes poderiam funcionar co- período glacial, quando grandes áreas ploração de petróleo e gás natural. Em
mo um corredor – e não como uma bar- do planeta estavam cobertas por gelo, 2013, em uma licitação internacional, o
reira, como também se cogitava – entre o ou expressariam mudanças no curso do governo federal ofereceu 125 áreas, das
mar do norte da América do Sul e o litoral rio Amazonas, cuja água poderia ter es- quais 39 foram adquiridas por empresas
ao sul do Maranhão. “Desde a década de cavado as rochas. Ou ainda, como uma nacionais e multinacionais. No final de
1970 se pensava que peixes e outros or- terceira hipótese, os degraus resultariam maio, ao voltar da segunda expedição à
ganismos poderiam passar de pouco em do peso dos sedimentos. Nesse caso, teria foz do Amazonas, Francini enviou um
pouco pelo fundo da foz e poderia haver ocorrido uma espécie de efeito gangor- ofício à Procuradoria Geral da União,
intercâmbio genético entre organismos ra: o rebaixamento de trechos da foz do com fotos submarinas dos recifes, requi-
do Caribe e do litoral ao sul da foz do Amazonas teria levantado outras áreas, sitando o bloqueio do pedido de licencia-
Amazonas”, diz o biólogo Sergio Floeter, como o leste da ilha de Marajó. mento ambiental feito por uma empresa
professor da Universidade Federal de “Os recifes do Amazonas são um am- petrolífera interessada em explorar uma
Santa Catarina (UFSC) e coordenador da biente único, que ainda está sendo des- área da região. n
Rede Nacional de Pesquisa em Biodiver- coberto. Ninguém imaginava que pudes-
sidade Marinha (Sisbiota-Mar). “Agora se ser tão grande”, diz a bióloga Helena Os artigos científicos mencionados estão listados na
temos mais evidências dessa conexão.” Spiritus, do Greenpeace. Essa área, enor- versão on-line desta reportagem.