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Direito Civil – Parte Geral

Prof. Pablo Bonfim


Definição Geral

→ Os bens são o objeto do Direito, e como tal é tudo


aquilo que pode proporcionar utilidade às pessoas.

→ No âmbito do ordenamento pátrio, considera-se bem


tudo aquilo que tem valor, destacando que o bem pode ter
utilidade econômica ou não econômica.
1. Bens e Coisas: Objeto do direito

Os bens e as coisas são os objetos de direito. Não existe


unanimidade na doutrina a respeito do conceito de bens e
coisas. Para Silvio Venosa “(...) todos os bens são coisas, mas
nem todas as coisas são bens. O sol, o mar, a lua são coisas,
mas não são bens, porque não podem ser apropriadas pelo
homem.
(...)”1. O doutrinador conclui, ainda, que para ser considerado
bem, o objeto deverá ter utilidade para as pessoas. Venosa
especifica em sua obra:

“Entende-se por bens tudo o que pode proporcionar utilidade


aos homens. Não deve o termo ser confundido com coisas,
embora a doutrina longe está de ser uníssona. Bem, em nossa
concepção, é tudo que corresponde a nossos desejos, nosso
afeto em uma visão não jurídica. No campo jurídico, bem deve
ser considerado aquilo que tem valor, abstraindo-se daí a noção
pecuniária do termo. Para o direito, bem é uma utilidade
econômica ou não econômica.

(...)

Coisa, por sua vez, pode ser tomada apenas por seu lado
corpóreo, como faz o Direito alemão. (...)”2
→ César Fiúza, por sua vez, assegura que “Bem é tudo
aquilo que pode ser útil às pessoas. Coisa, para o Direito, é
todo bem econômico dotado de existência autônoma, e
capaz de ser subordinado ao domínio das pessoas.”

→ O prof. Fiúza leciona, ainda, na mesma linha de Maria


Helena Diniz, que para um bem ser considerado coisa há de
se cumprir três pressupostos: interesse econômico, gestão
econômica e subordinação jurídica.
Em sua obra Direito Civil – Curso Completo o mestre Fiúza define:

“Coisa (...) é sinônimo de bem. Mas nem todo bem será coisa.
Assim, não são coisas os bens chamados jurídicos, como a vida, a
liberdade, a saúde etc. Para que um bem seja coisa, são necessários
três requisitos:

1) interesse econômico: o bem deve representar interesse de ordem


econômica. Uma folha seca não será bem nem coisa para o Direito;

2) gestão econômica: deve ser possível individualizar e valorar o bem.


A luz do sol, por exemplo, não possui gestão econômica. Portanto, não
será bem nem coisa para o Direito;

3) subordinação jurídica: o bem deve ser passível de subordinação a


uma pessoa. Tampouco deste ângulo a luz do sol seria bem ou coisa.”
Por outro lado, Caio Mário da Silva Pereira defende
que o objeto de direito é o bem, e em sentido amplo,
conceitua-o da seguinte forma:

“Bem é tudo que nos agrada: o dinheiro é um bem,


como o é a casa, a herança de um parente, a faculdade de
exigir uma prestação; bem é ainda a alegria de viver, o pôr-
do-sol, um trecho musical; bem é o nome do indivíduo, sua
qualidade de filho, o direito à sua integridade física e
moral.”

No sentido estrito, no entanto, o prof. Caio Mário


estabelece uma distinção entre bem e coisa, afirmando que
as coisas são materiais ou concretas, enquanto os bens
estão em classificação contrária: imateriais ou abstratos.
Por outro lado, Caio Mário da Silva Pereira defende
que o objeto de direito é o bem, e em sentido amplo,
conceitua-o da seguinte forma:

“Bem é tudo que nos agrada: o dinheiro é um bem,


como o é a casa, a herança de um parente, a faculdade de
exigir uma prestação; bem é ainda a alegria de viver, o pôr-
do-sol, um trecho musical; bem é o nome do indivíduo, sua
qualidade de filho, o direito à sua integridade física e
moral.”

No sentido estrito, no entanto, o prof. Caio Mário


estabelece uma distinção entre bem e coisa, afirmando que
as coisas são materiais ou concretas, enquanto os bens
estão em classificação contrária: imateriais ou abstratos.
OBSERVAÇÃO

Para Pablo Stolze, coisa seria identificada pelo aspecto de


sua materialidade, definindo que os bens compreenderiam “os
objetos corpóreos ou materiais (coisas) e os ideais (bens
imateriais).

Desta forma, há bens jurídicos que não são coisas: a


liberdade, a honra, a integridade moral, a imagem, a vida.”

→ O Código Civil de 2002 (arts. 79 a 103), no entanto, ao


definir sobre bens unificou a terminologia utilizada e de uma
forma única conceitua bens compreendendo os objetos materiais
e imateriais.

Assim, muito embora não haja consenso na doutrina sobre


a distinção de bens e coisas, o certo é que o direito positivo atual
os trata de forma uníssona.
2. Bens Corpóreos e Incorpóreos

- Bens corpóreos são aqueles que são tangíveis, ou seja, têm


característica material, são possuidores de existência física.

→ São de fácil apropriação e possuem valor econômico-


financeiro. Podemos citar como exemplo um carro, um livro ou
um cavalo são bens corpóreos ou materiais.

- Bens incorpóreos são aqueles que não possuem materialidade,


são abstratos.

→ Não existem fisicamente, mas são considerados no mundo do


Direito, sendo passíveis de serem considerados como objeto de
uma relação jurídica. Exemplo de bem incorpóreo podemos citar
os direitos personalíssimos e os direitos autorais.
Silvio Venosa define bens corpóreos e incorpóreos da seguinte forma:

“Bens corpóreos são aqueles que nossos sentidos podem


perceber: um automóvel, um animal, um livro. Os bens incorpóreos
não têm existência tangível. São direitos das pessoas sobre as coisas,
sobre o produto de seu intelecto, ou em relação a outra pessoa, com
valor econômico: direitos autorais, créditos, invenções.

(...)

Os bens incorpóreos são entendidos como abstração do Direito; não


têm existência material, mas existência jurídica. As relações jurídicas
podem ter como objeto tanto os bens materiais quanto os imateriais.”

Em mesma linha, Pablo Stolze define que “bens corpóreos são aqueles
que têm existência material, perceptível pelos nossos sentidos, como
os bens móveis (livros, jóias etc.) e imóveis (terrenos etc.) em geral.”
Ainda sobre o assunto, complementa o prof. Stolze:

“Em contraposição aos mesmos, encontram-se os


bens incorpóreos, que são aqueles abstratos, de visualização
ideal (não tangível). Tendo existência apenas jurídica, por
força da atuação do Direito, encontram-se, por exemplo, os
direitos sobre o produto do intelecto, com valor econômico.

→ Embora as relações jurídicas possam ter como objeto


tanto bens corpóreos quanto incorpóreos, há algumas
diferenças na sua disciplina jurídica, o fato de que somente
os primeiros podem ser objeto de contrato de compra e
venda, enquanto dos bens imateriais somente se transferem
pelo contrato de cessão (...)”.
3. Bens Móveis e Imóveis

- Bens móveis são aqueles que podem ser deslocados de


um lugar para outro sem que tal fato venha a prejudicar a
sua estrutura e nem alterar a sua substância natural,
essencial. Dentre os bens móveis estão incluídos os
chamados semoventes, que são aqueles com movimento
próprio, ou seja, podem se mover sem o auxílio de outrem –
são os animais.

- Os bens imóveis, a seu turno, de regra são aqueles que


não podem ser deslocados de um lugar para outro sem que
se prejudique a sua essência ou modifique a sua substância.
São aqueles que não podem ser transportados sem perda ou
deterioração.
3.1. Regime de Bens Imóveis

Os bens imóveis estão definidos nos artigos 79 a 81 do


Código Civil de 2002:

“Art. 79. São bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe


incorporar natural ou artificialmente.
Art. 80. Consideram-se imóveis para os efeitos legais:

I - os direitos reais sobre imóveis e as ações que os asseguram;

II - o direito à sucessão aberta.

Art. 81. Não perdem o caráter de imóveis:

I - as edificações que, separadas do solo, mas conservando a sua


unidade, forem removidas para outro local;

II - os materiais provisoriamente separados de um prédio, para


nele se reempregarem.”
OBSERVEM

→ A doutrina, a seu turno, classifica os bens imóveis de


acordo com as seguintes categorias: imóveis por sua
natureza; imóveis por acessão física ou artificial; imóveis por
acessão intelectual; e, por fim, imóveis por determinação
legal.

→ Os bens imóveis por sua natureza são assim chamados


por estarem imobilizados devido ao seu próprio estado
natural, sem que para isso tenha havido qualquer
intervenção do homem. O solo, independentemente da
vontade humana, é intransferível.
→ Caio Mário da Silva Pereira assim define os bens imóveis
por sua natureza:

“Esta classe abrange o solo, e tudo aquilo que a ele é


aderente em estado de natureza, independentemente de
qualquer artifício ou engenho humano. A árvore, o arbusto,
a planta rasteira, fixos ao solo pelas raízes, são imóveis por
natureza, ainda quando resultantes do trabalho de cultura
do homem.”

→ A segunda classe de bens imóveis adotada pela doutrina


é a bens por acessão física ou artificial, incluindo-se nessa
categoria aqueles que por uma ação do homem são
incorporados ao solo, de forma permanente. Dentre esses
estão as casas, os edifícios, o asfalto, etc.
Pablo Stolze bem esclarece o conceito dessa
classificação de bens imóveis quando afirma “é tudo quanto
o homem incorporar permanentemente ao solo, como a
semente lançada à terra, os edifícios e construções, de
modo que se não o possa retirar sem destruição ou dano
(...).”

→ Os bens imóveis por acessão intelectual são aqueles que


por uma vontade de seu proprietário são incorporados a
outro bem imóvel, mas que podem ser removidos de um
lugar para outro sem que, com isso, haja ocorra prejuízo
físico. Podem voltar a serem considerados móveis por
vontade de seu dono, a qualquer tempo. É o caso de uma
máquina industrial.
Sobre essa categoria de bens imóveis o Prof. Fiúza nos ensina:

“(...) É tudo aquilo que se mantém intencionalmente no imóvel


para sua exploração, aformoseamento ou comodidade. Esses
bens só são considerados imóveis enquanto ligados ao imóvel.
Dessa forma, uma máquina agrícola, enquanto estiver sendo
usada pelo fazendeiro na exploração da fazenda, é considerada
imóvel, mas no momento em que ele a venda, será considerada
bem móvel.”

→ Por fim, a última categoria relativa a bens imóveis é aquela


definida por determinação legal, que como o próprio nome diz,
está claramente definida no direito positivo. São aqueles que,
unicamente por uma vontade legislativa, são considerados
imóveis para os efeitos legais, aplicando-se a esses as mesmas
normas que regulam as relações relativas aos demais bens
imóveis. Podemos citar, por exemplo, o direito à sucessão aberta
previsto no inciso II do artigo 80 do Código Civil de 2002.
3.2. Regime de Bens Móveis

Os bens enquadrados nesta categoria estão definidos nos artigos 82 a 84 do Código Civil
de 2002:

“Art. 82. São móveis os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força
alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social.

Art. 83. Consideram-se móveis para os efeitos legais:

I - as energias que tenham valor econômico;

II - os direitos reais sobre objetos móveis e as ações correspondentes;

III - os direitos pessoais de caráter patrimonial e respectivas ações.

Art. 84. Os materiais destinados a alguma construção, enquanto não forem empregados,
conservam sua qualidade de móveis; readquirem essa qualidade os provenientes da
demolição de algum prédio.”
ATENÇAO !

Esse regime de bens – móveis, de uma forma geral,


tem a seguinte classificação: móveis por sua natureza;
móveis por antecipação; e móveis por determinação legal.

→ Os bens móveis por sua natureza são aqueles podem


ser deslocados de um lugar para outro sem qualquer
destruição, fratura ou dano. São, em geral, os objetos como,
por exemplo, uma mesa, uma televisão, uma bolsa.

Como bem apregoa o mestre Caio Maio da Silva Pereira


“incluem-se todas as coisas corpóreas que se podem remover
sem dano (...) de um para outro lugar, com exceção,
evidentemente, das que acedem aos imóveis.”
→ Os bens móveis por antecipação, apesar de terem sido
desconsiderados na nova edição do Código Civil (2002),
ainda permanecem sendo considerados por parte da
doutrina e são aqueles que são naturalmente incorporados
aos imóveis, como é o caso das árvores plantadas para
corte, que irão a qualquer momento ser retiradas,
adquirindo, portanto, a sua condição de mobilidade.
De forma bem simples e clara, Pablo Stolze assim
define os bens móveis por antecipação:

“São os bens que, embora incorporados ao solo, são


destinados a serem destacados e convertidos em móveis,
como é o caso, por exemplo, das árvores destinadas ao
corte.”

→ Os bens móveis por determinação legal são aqueles


taxativamente previstos em lei nessa condição, como é o
caso das energias que tenham valor econômico, dentre
outros. São na verdade bens imateriais que adquirem a
condição de bem móvel por definição legal.
4. Bens Fungíveis e Infungíveis

Os bens fungíveis, previstos no artigo 85 do Código


Civil de 2002. O conceito de fungibilidade está intimamente
relacionado à possibilidade de substituição de uma coisa por
outra desde que de mesma espécie, qualidade e
quantidade. Dessa forma, são fungíveis os bens que
apresentam tal possibilidade. Como exemplo podemos citar
os cereais, os minérios e etc.

Ao reverso, os bens infugíveis são aqueles que não


podem ser substituídos com as mesmas características
(espécie, qualidade de quantidade).

São exemplos de bens nessa classificação: uma obra


de arte, um vaso da dinastia ming e etc.
OBSERVEM

O enquadramento que se dá a um bem como fungível ou


infungível dependerá, por vezes, dependerá da avaliação do
caso concreto, como nos exemplifica o Prof. Venosa:

“A fungibilidade é qualidade da própria coisa. Haverá


situações em que apenas o caso concreto poderá classificar
o objeto. Desse modo, uma garrafa de vinho raro, de
determinada vindima, da qual restam pouquíssimos
exemplares, será infungível, enquanto o vinho, de maneira
geral, é fungível.”
5. Bens Consumíveis e Não Consumíveis

→ Consumíveis são os bens que desaparecem logo com o


primeiro uso, deixando de existir. Podemos citar como
exemplo dessa classificação de bens os combustíveis, que
desaparecem imediatamente após a sua utilização, bem
como os alimentos. Decorre da natureza própria do bem, ou
seja, são bens que em decorrência do seu uso importa a sua
destruição imediata.

→ Os bens inconsumíveis, são aqueles que permitem sua


utilização de forma continuada, sem ocorrer qualquer
alteração relevante em sua substância. Os computadores, os
carros e as televisões são bens inconsumíveis, pois não
perdem suas qualidades com seu uso imediato.
Bem resume Silvio Venosa acerca dos bens consumíveis e
inconsumíveis:

“Deve-se entender como bens consumíveis todos


aqueles que podem desaparecer por um só ato de utilização.
Inconsumíveis são aqueles que permitem uso continuado,
sem acarretar sua destruição total ou parcial. Note que o
importante é a destruição ‘jurídica’. As mercadorias
destinadas à venda no estoque do comerciante são sempre
consideradas consumíveis. Poderão deixar de sê-lo no
momento em que foram adquiridas.”
6. Bens Divisíveis e Indivisíveis

→ O bem é considerado divisível quando há a possibilidade de


sua repartição sem perda de seu valor econômico ou de sua
substância, conservando a sua utilidade e suas características.

O artigo 87 do Código Civil já bem define tais bens,


considerando que “bens divisíveis são os que se podem fracionar
sem alteração na sua substância, diminuição considerável de valor,
ou prejuízo do uso a que se destinam”. Podemos citar como
exemplo de bem divisível o litro de vodka, que pode ser distribuído
em duas garrafas de meio litro, sem que a bebida deixe de ser
vodka ou sofra alguma alteração quanto à sua utilidade.

→ Os bens indivisíveis a seu turno, são aqueles que não podem


ser fracionados sem que se altere o seu valor econômico ou a sua
substância, como é o caso de uma motocicleta, que em se partindo
perderá sua utilidade e valor.
Sobre o assunto o Prof. Fiúza assim se manifesta:

“São divisíveis os bens que se podem fracionar em


porções distintas, formando, cada qual, todo perfeito, sem
que tal fracionamento importe em alteração de sua
substância, diminuição considerável de seu valor ou prejuízo
para o uso a que se destinam. Como exemplo, nada melhor
do que um terreno. Se o dividirmos ao meio, teremos dois
terrenos que conservam sua substância e não perdem seu
valor econômico.

Indivisíveis são os bens que se não podem partir sem


que seja alterada sua substância ou seu valor econômico,
como um automóvel. Se o dividirmos ao meio, não teremos
dois automóveis com a mesma substância e com a mesma
relevância econômica.”
A doutrina utiliza ainda uma classificação para os bens
indivisíveis: por sua natureza, por determinação legal e por
vontade entre as partes (por convenção). Dentre os três
tipos, podemos citar como exemplos:

I - Por sua natureza: um animal;

II - Por determinação legal: um módulo rural;

III - Por convenção ou vontade entre as partes: definição em


assembléia de condôminos.
7. Bens Singulares e Coletivos

→ Os bens singulares são aqueles que possuem


existência independente dos demais. “São as coisas
consideradas em sua individualidade, representada por uma
unidade autônoma.” Podemos citar como exemplo um livro,
que ainda que reunido com outros livros, formando uma
biblioteca, não perde suas qualidades essenciais, podendo
ser considerado em sua individualidade.

→ Já o coletivo é justamente o todo formado pela


reunião de bens singulares. É o caso, por exemplo, da
própria biblioteca, formada por vários livros, sendo que
cada qual desses livros permanecem com sua função e
existência independentes.
César Fiúza resume bens singulares e coletivos da seguinte forma:

“Bens singulares são os individualizados, como um livro ou


um apartamento.

- Coletivos são aqueles bens considerados em seu conjunto.


Podem constituir universalidades de fato, quando uma pluralidade
de bens, pertencentes a uma pessoa, tiver destinação unitária,
como uma biblioteca ou uma coleção de selos; ou universalidades
de direito, quando um conjunto de bens recebe do ordenamento
jurídico um tratamento unitário, como uma herança.”

- Os bens singulares são ainda classificados pela doutrina


como simples e compostos. Para Pablo Stolze são “simples, quando
as suas partes componentes encontram-se ligadas naturalmente
(uma árvore...), ou compostas, quando a coesão de seus
componentes decorre do engenho humano (um avião, um relógio)”.
8. Bens Reciprocamente Considerados

Abordagem do tratamento dado pelo sistema jurídico


brasileiro aos Bens Reciprocamente Considerados, que são
aqueles concebidos em relação a outros bens. Tais bens são
assim classificados:

8.1. Principais e Acessórios

A classificação dos bens com relação uns aos outros


está definida no art. 92 do Código Civil de 2002: “Principal é
o bem que existe sobre si, abstrata ou concretamente.
Acessório, aquele cuja existência supõe a do principal”.
OBSERVEM :

• Bem principal é, pois, aquele que possui existência


própria, autônoma, independente de qualquer outro bem.

• Acessório, ao contrário, é aquele que somente pode ser


concebido na dependência da coisa principal, ou seja, cuja
presença do bem principal é pressuposto de sua existência.

→ O bem acessório não tem autonomia. Exemplo clássico


de bem acessório é uma árvore, cuja existência pressupõe a
presença do solo – bem principal.
Sobre o assunto o prof. Venosa esclarece em sua obra:

“Para que se configure o acessório, há necessidade de


pressupor a existência de um bem principal, ficando
assentado que o bem acessório não tem autonomia. Não
basta a simples relação de dependência com a coisa, pois
não há que se confundir acessório com a noção de parte
integrante, que é parte constitutiva da própria coisa.”
8.2. Frutos, Produtos e Rendimentos

 Frutos: São as utilidades que o bem principal produz,


cuja extração não acarreta nenhum prejuízo ou desfalque
em sua substância e que tem periodicidade na produção. A
doutrina costuma classificar os frutos em:

I - Naturais – “São os provenientes da força orgânica


que se renovam periodicamente, como as frutas de uma
árvore e as crias de um animal.” Podemos citar como
exemplo a maçã com relação à macieira;
II - Industriais – “São decorrentes da atividade
industrial humana (bens manufaturados).” Citamos como
exemplo a roupa em relação à indústria têxtil; e

III - Civis – “São, por uma extensão gerada pela


capacidade humana de abstração, os rendimentos e
benefícios que alguém tira de uma coisa utilizada por
outrem.” Exemplificamos, nesse caso, os rendimentos
extraídos de um aluguel ou do empréstimo de dinheiro
(juros).
Já quanto à vinculação à coisa principal, os frutos podem ser:

I - Pendentes, quando ainda estão unidos ao bem principal


que os gerou;

II - Percipiendos, quando estão na iminência da separação;


e

III - Percebidos, quando já se encontram colhidos ou


extraídos do bem principal.

Caio Mário esclarece em sua obra Instituições do Direito


Civil – Introdução ao Direito Civil que a “distinção dos frutos
nessas várias categorias não é apenas um luxo da doutrina, mas
oferece importância prática, em atenção ao tratamento jurídico
do possuidor, conforme as situações em que sua
responsabilidade se estende aos frutos da coisa.”
→ Produtos: São acessórios que, da mesma forma que os
frutos, provém do bem principal, ou seja, são utilidades
produzidas por este, porém, sua extração acarreta a
destruição ou perda da substância da coisa principal, de
maneira mediata ou até mesmo imediata. Além disso, não
têm periodicidade na produção. Podemos citar como exemplo
de produto o ouro com relação a uma mina, ou do petróleo
em relação ao poço.

→ Rendimentos: Os rendimentos, como dito


anteriormente, são os frutos civis. Como bem define Pablo
Stolze, “são utilidades que a coisa frugífera periodicamente
produz, viabilizando a percepção de uma renda (juros,
aluguel).”
8.3. Benfeitorias

→ Benfeitorias é tudo aquilo que o possuidor ou


proprietário de um bem móvel ou imóvel emprega no bem
principal, relativos a despesas ou obras, a fim de conservá-
lo, melhorar seu uso, ou simplesmente deixá-lo mais bonito.
São decorrentes da ação do homem sobre o bem.
Existem no ordenamento pátrio (artigo 96 do CC) três
espécies de benfeitorias, a saber:

I - Voluptuárias, que são aquelas de mero deleite, ou


seja, as empregadas para fim meramente estético ou
recreativo, não aumentando a utilidade habitual do bem,
como por exemplo, a construção de uma piscina;

II - Úteis, que são as que facilitam ou aumentam a


utilidade do bem, como por exemplo, a instalação de rede
elétrica em uma fazenda;

III - Necessárias, que são as empregadas para


conservar ou evitar a destruição do bem, como por exemplo,
a substituição do telhado de uma casa, que se encontrava
apodrecido.
IMPORTANTE !

A distinção entre as espécies de benfeitorias é de


especial importância, em razão da necessidade de se
verificar o direito à indenização do agente. O código civil de
2002 estabelece em seu artigo Art. 1.219: “O possuidor de
boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias
necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se
não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem
detrimento da coisa, e poderá exercer o direito de retenção
pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis.”
Silvio Venosa bem destaca o assunto em sua obra,
discorrendo sobre a importância da classificação das
benfeitorias da seguinte forma:

“As conseqüências da classificação em uma das três


categorias são grandes, pois o possuidor de boa-fé tem
direito à indenização pelas benfeitorias necessárias e úteis,
podendo levantar as voluptuárias, se não lhe foram pagas e
permitir a coisa, sem que haja prejuízo. Poderá, ainda, o
possuidor de boa-fé, pelas benfeitorias úteis e necessárias,
exercer direito de retenção. Já o possuidor de ma-fé não terá
tal direito de retenção, devendo apenas ser ressarcido pelo
valor das benfeitorias necessárias.”
9. Bens Particulares e Públicos

→ Bens públicos são todos aqueles que estão sob o


domínio de entidades públicas, como a União, os Estados
Federados e os Municípios, ou seja, de pessoas jurídicas de
direito público.

→ Já os particulares são aqueles cujos proprietários são a


pessoa física ou a pessoa jurídica de direito privado.

Sem dúvidas a respeito, o art. 98 do Código Civil


determina que “São públicos os bens do domínio nacional
pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno;
todos os outros são particulares, seja qual for a pessoa a que
pertencerem.”
Os bens públicos são divididos em três categorias distintas:
bens de uso comum do povo; bens de uso especial; e bens
dominiais ou dominicais.

• Os Bens públicos de uso comum do povo são aqueles cuja


utilização e acesso é permitido a todas as pessoas, como, por
exemplo, um parque. Essa utilização pode ser gratuita ou onerosa,
como é o caso da cobrança de pedágio nas estradas.

• Os Bens públicos de uso especial são os que possuem umas


finalidades especiais, sendo destinados à utilização pelo poder
público. Como exemplo dessa categoria de bem podemos citar uma
penitenciária ou um hospital público.

• Os Bens dominicais ou dominiais são os que fazem parte do


patrimônio das pessoas jurídicas de direito público. É o caso, por
exemplo, das terras devolutas.
Destaca-se que os bens públicos são imprescritíveis,
inalienáveis e impenhoráveis, não sendo possível, portanto,
aventar-se o usucapião desses bens.

Silvio Venosa assim se manifesta sobre o assunto:

“A inalienabilidade dos bens públicos decorre de sua própria


natureza. A faculdade de aliená-los só pode ocorrer mediante
desafetação, isto é, por meio de lei ou ato administrativo que
autorize essa alienação (...), que poderá dar-se só em relação a bens
que não se destinem ao uso comum do povo, como mares, rios,
estradas etc. Os arts. 100 e 101 do atual Código absorvem
justamente essa noção: os bens públicos de uso comum do povo e
os de uso especial são inalienáveis, enquanto conservarem sua
qualificação, na forma que a lei determinar; os bens dominicais
podem ser alienados, observadas as exigências legais.

(...)
Como conseqüência da inalienabilidade, os bens
públicos também são impenhoráveis, porque pela
impenhorabilidade se impede que passem do patrimônio do
devedor ao do credor, por meio de execução judicial.”

Pablo Stolze, ao arrematar o assunto em sua obra,


destaca: “Finalmente, cumpre lembrar que o Novo Código
Civil, seguindo diretriz consagrada em nosso direito, proíbe
o usucapião de bens públicos (art. 102.)”.
10. Bem de Família

→ O bem de família, segundo a legislação que trata a


matéria, é outra categoria de bens insuscetíveis de alienação
ou de penhora. Se trata de bens imóveis, cuja destinação é a
moradia de familiares.

A Lei no 8.009, de 29 de março de 1990, dispõe em


seu artigo 1o “o imóvel residencial próprio do casal, ou da
entidade familiar, é impenhorável e não responderá por
qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária
ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais
ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo
nas hipóteses previstas nesta Lei.”
O Código Civil de 2002 também trata o assunto,
dispondo em seu artigo 1.711:

“Art. 1.711. Podem os cônjuges, ou a entidade


familiar, mediante escritura pública ou testamento, destinar
parte de seu patrimônio para instituir bem de família, desde
que não ultrapasse um terço do patrimônio líquido existente
ao tempo da instituição, mantidas as regras sobre a
impenhorabilidade do imóvel residencial estabelecida em lei
especial.”
IMPORTANTE !

A finalidade do bem de família é a de proteger o domicílio familiar


de possíveis execuções por dívidas fiscais, tributárias, civis, etc. Tais
dívidas, no entanto, para que não alcancem o bem de família, têm que ser
posteriores à destinação do bem (CC, art. 1.715). Se assim não fosse, tal
instituto seria um incentivo à fraude contra credores, uma vez que o
devedor, ao perceber que seu imóvel seria executado por uma dívida
qualquer, trataria logo de “proteger” tal bem, impossibilitando o
pagamento ao credor.

Uma vez considerado como bem de família, o imóvel não poderá


ser alienado, salvo se houver o permissionamento dos interessados ou de
seus representantes legais.

Por fim, registra-se que a legislação pátria impõe, outrossim,


algumas exceções acerca das garantias de inalienabilidade do bem de
família, como é o caso, por exemplo, de tributos relativos ao próprio prédio
(bem), ou de despesas de condomínio.

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