Disciplina: Tópicos variados em História e Memória.
Docente: Dr. Claúdio Guilarduci Discente: Ana Paula Alab
Resenha AGAMBEN, Giorgio. Ninfas. São Paulo: Ed. Hedra, 2012.
Ninfas, é uma série que compõe o ensaio Image et mémorie, publicado
em 1988, por Giorgio Agamben. Agamben irá abordar o esquecimento moderno da experiência. O ensaio é baseado numa analise feita a partir do trabalho do historiador de arte Aby Warburg, conhecido pelo seu ambicioso projeto chamado de Atlas Mnemosiney, onde pretendia estabelecer “cadeia de transporte de imagens”, entre essas imagens teremos as ninfas.
Ninfas são seres não-humano e não-divino, apesar de terem sido
criadas por Deus, porém são seres sem alma. Mitologicamente falando, as ninfas pertencem à categoria de espíritos da natureza. São figuras femininas. Os gregos acreditavam que elas viviam em lagos, florestas, montanhas, sendo responsáveis por levar felicidade às pessoas. Representavam também a fertilidade. As ninfas simbolizam a própria força geradora (que preside a reprodução tanto animal quanto vegetal), uma vez que estão ligadas a terra e a água, representam, portanto a Geia ou Gaia, devido as suas múltiplas facetas, enquanto origem de todas as coisas, cujas energias nunca se esgotam. Bachofen teoriza que as ninfas não são imortais, porém vivem por muitos anos, tendo analogia com a natureza que não é imortal, que perece e renasce, num constante ressurgir e que Warburg as definem como uma figura tutelar da “vida após a vida” (nachleben) das imagens, ou seja, uma sobrevivência, que dá continuidade visível a nossa cultura.
O ensaio de Giorgio Agamben se inicia com o ponderamento a respeito
da seleção de vídeos apresentados na exposição “Passion” de Bill Viola. O que interessa a Agamben nesse trabalho é a simulação da estaticidade que se revela através da lentidão dos movimentos das imagens. Essa lentidão exige que os visitantes da exposição fiquem longos minutos em frente a cada obra para ver o sentido delas. Viola legitima sua obra com o seguinte pensamento: “precisamos estar acordados, quietos e parados. Isso é muito importante”. Segundo o artista, numa era altamente rápida, onde existe uma necessidade de informações, deve-se ter a sabedoria de que quando as coisas estão mais devagar, elas se revelam. Portanto essas imagens de Viola estariam reivindicando um lugar no tempo, “poderíamos dizer que eles não inserem as imagens no tempo, mas o tempo nas imagens.”
Num segundo momento, Agamben questiona como que uma imagem
pode se carregar de tempo, e para isso usará o conceito de fantasmata de Domenico da Piacenza, um famoso coreógrafo e mestre de dança na corte dos Sforza, em Milão. Domenico enumera seis elementos fundamentais da dança: medida, memória, agilidade, maneira, medida do terreno e “fantasmata”. Esse ultimo elemento é definido como uma parada repentina entre dois movimentos que são capazes de concentrar a medida e a memória numa tensão interna em toda uma coreografia. Essa relação entre a parada e o movimento, significa o encontro com uma imagem mnêmica, imagem carregada de energia capaz de mover e turbar o corpo, que Domenico a configura como a “cabeça de medusa” (essa figura da cabeça de medusa remete a potência do encantamento e a petrificação, seria para ele uma pausa não imóvel). Para Domenico, a dança é sobre a memória , é uma composição de imagens em uma série temporal e espacial, és ai a possível relação entre imagem e tempo que Agamben inicia a segunda analise. Podendo se afirmar que “somente os seres que percebem o tempo, relembram, e com a mesma faculdade com a qual percebem o tempo, isto é com a imaginação.”
Agamben seguirá seu ensaio analisando imagens de Benjamin,
Paracelso, Vischer, Henry Darger e Bocaccio da mesma maneira que Aby Warburg fez o seu processo de montagem dos painéis, fundamentando-se na teoria de Phatosformel. Warburg define Phatosformel como experiência de tempo condicionada à afecção, estabelecendo uma relação com a imagem. Porém essas imagens estão destinadas ao endurecimento espectral, que mesmo estando vivas, são feitas de tempo e memória e, portanto sua vida é sempre uma sobrevivência. Discernir sobre essas imagens será o papel do sujeito historiador e o autor sugere para essa analise o estudo de Benjamin a respeito das imagens dialéticas, onde para ele a imagem é aquilo que se funde com o passado e com o presente, é uma oscilação entre o estranhamento e uma nova ocorrência de sentido. Ele compara essa dialética com a dança por fantasmata de Domenico, em que a vida das imagens não está apenas na imobilidade ou na retomada do movimento, mas nessa pausa carregada de tensão.
Além disso, Agamben traz essa dialética para as ninfas, quando
recorda que elas são seres sem alma, e como as imagens enrijecidas não terão salvação. Porém a partir do contato carnal (uma paixão) com homens, de onde se gera um ser, elas e seus filhos terão almas e passarão a serem humanos. Mostrando a ambigüidade entre homens e ninfas, mostra-se a difícil relação do homem com as imagens
Finalizando, Giorgio Agamben enfatiza que as imagens são elementos
de marcação histórica, que segundo Benjamin,surge vida de tudo aquilo que surge história. E se a história da humanidade é sempre uma história de fantasmas e imagens, pois para ele é na imaginação que se tem lugar para o múltiplo e o único, o sensível e o inteligível, individuo e o impessoal. As imagens são, portanto “vestígios dos homens que nos precederam, esperaram e desejaram, temeram e removeram.” E será, portanto o plano da imaginação que regerá o homem.
Referências:
AGAMBEN, Giorgio. Ninfas. São Paulo: Ed. Hedra, 2012.
TEIXEIRA, F.C. Aby Warburg e a pós-vida das Pathosformeln antigas, Ouro Preto, 2010.