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RESENHA CRÍTICA 1

Angelita Minélio da Silva, Ailedyssa Rocha Woelffel 2

Friedman, Milton. Capitalismo e liberdade. 1ª Ed. Rio de Janeiro: LTC, 2016. P. 163-
178

Neste capítulo 10 que é parte do seu livro “Capitalismo e Liberdade” Friedmam discorre
sobre a distribuição de renda afirmando que visa responder a certo sentimento coletivo
por ele detectado já algum tempo de que o Estado deveria intervir para promover a
igualdade de renda e que para isso pretende responder a duas perguntas: Qual a
justificativa da intervenção estatal para promover a igualdade? e Qual tem sido o efeito
das medidas efetivamente adotadas? (FRIEDMAN, 2016, p.164)

O capítulo é divido em quatro tópicos sendo dado no primeiro o seu fundamento ético,
no segundo a justificativa da distribuição de renda conforme o produto, no terceiro pontua
alguns fatos sobre a distribuição de renda e no quarto discorre sobre as medidas do
governo para distribuição de renda.

“A cada um de acordo com o que produz, por suas qualificações e por seus instrumentos”
é uma afirmação em que Friedman explicita o princípio que ele considera ser a ética de
como deve ser a distribuição de renda numa sociedade de livre mercado. Salienta que este
primeiro princípio ético se afina ao princípio de igualdade no tratamento. Isso quer dizer
que dessa forma em uma sociedade de livre mercado é dado a cada individuo a
oportunidade de desenvolver ao máximo suas capacidades e por elas teriam o retorno em
renda adequado as suas livres escolhas e que receberiam rendas diferentes por escolhas
diferentes e nisso baseia sua visão de igualdade, que não seria a de todos terem uma renda
igual já que tem escolhas com relação ao desenvolvimento e uso de suas capacidades de
forma diferentes. Daí deduz que na sociedade de livre mercado a renda é “desigual para
compensar tal diversidade” (MUSTAFÁ; SILVA; ANSELMO, 2018).

1Trabalho produzido e apresentado à disciplina Política Social, ministrada pela professora Dra.
Salyanna de Souza Silva
2Graduandas do 3º período do curso Serviço Social da Universidade Federal do Espírito Santo

(UFES).
Defende que o livre mercado dá conta de equalizar esta distribuição de renda sem a
necessidade da intervenção estatal que ao seu ver não apenas não ajudaria mas produziria
um efeito contrário ao desejado haja vista o estímulo a reprodução da pobreza pois estaria
tirando dos que pelo mérito conquistaram suas riquezas e rendas e dando aqueles que não
se emprenharam em fazê-lo. Para ele isso comprometeria o desenvolvimento da sociedade
e até afirmando que seria impossível a existência do “mundo civilizado”. Considera que
se o Estado agir para garantir uma distribuição de renda seria uma coerção e negação do
direito e liberdade individuais que são princípios que defende com veemência.
(FRIEDMAN, 2016, 164-168).

Para Friedman (2016) a cooperação entre os indivíduos só acontece porque cada um


almeja atender seus próprios interesses e a cooperação passa a ser uma forma de fazer
isso com maior eficiência, defendendo assim que a renda deve ser conforme o que se
produz, pois somente isso seria um motivador para que cada indivíduo dê o máximo de
si e de suas potencialidades numa atividade. Salienta também que para que isso seja assim
é necessário que este julgamento de valor seja aceito sem questionamento por todos na
sociedade, ou seja, que todos os indivíduos aceitem como inquestionável que cada um
deve receber segundo o que produz em reconhecimento a suas capacidades e habilidades
individuais. E vai além, afirmando que até os que criticam o capitalismo consideram justo
o pagamento conforme o produto e tece criticas ao pensamento marxista apontando que
é invalido o argumento deste de que o trabalho é explorado, pois o trabalho só seria
explorado se o individuo tivesse direito ao que produz. Também critica Marx por ter
mudado o significado da palavra trabalho e assim encarando o capital como trabalho
incorporado.

Friedman (2016) admite que um sistema capitalista gera desigualdade de renda porém
considera que isso seja uma desigualdade temporária que a longo prazo é equalizada numa
sociedade de livre mercado. Para isso traz exemplos de distribuição de renda em países
desenvolvidos e subdesenvolvidos afirmando que diante dos dados é possível deduzir que
o capitalismo e o livre mercado contribuem para promover e aprimorar as capacidades
dos individuas e dando-lhes oportunidades e isso como uma característica maior do que
a de ser um sistema de acumulação de propriedades, comparando que as sociedades não

1Trabalho produzido e apresentado à disciplina Política Social, ministrada pela professora Dra.
Salyanna de Souza Silva
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capitalistas são mais desiguais e que as capitalistas são menos, pois o capitalismo inclui
a mobilidade social e faz ruir estamentos.

Friedman (2016), já antecipa que a avaliação sobre as medidas governamentais para


alterar a distribuição de renda é pessoal e sem conhecimentos disponíveis a sua época
para se basear. Considera que a ação do governo no sentido de aplicar imposto de renda
progressivo com o objetivo de redistribuição de renda não se justifica e a ele parece ser
uma coerção e fere a liberdade individual. Para ele tributar os capitalistas é tirar do que
conquistaram para dar a outros. Defende uma alíquota única de imposto de renda.
Considera que as desigualdades são imperfeições do mercado e que a maioria dessas
imperfeições foram criadas pela ação do governo principalmente com o conjunto de
medidas para distribuir renda.

Diante do que Friedman apresenta neste capítulo de sua obra pode-se considerar que há
uma clara intenção de falar sobre uma distribuição de renda e não de riqueza,
considerando-se que concretamente apresentam distinções. Ele já traz a renda como foco
considerando que o sistema capitalista é o modo de produção inquestionável como matriz
econômica de uma sociedade e a renda que é a remuneração de trabalho ou serviço
prestado tenha uma dinâmica que privilegie os capitalistas que de outra forma seriam
prejudicados em suas atividades. Não fala da riqueza que está nas acumulações de
propriedades e fortunas, isso não é assunto em pauta, até porque considera essa
desigualdade como natural e defende que uma das poucas ações do Estado que concorda
é de que proteja a propriedade privada.

Quando Friedman se expressa defendendo a liberdade individual e igualdade de


oportunidades é bem notado que o faz de uma forma abstrata e sem levar em conta a
realidade concreta, a história. Está num contexto em que critica o Estado por não ter
utilizado os fundos públicos para intervir na crise de 29 e onde as “elites político-
econômicas começaram a reconhecer os limites do mercado se deixado a mercê dos seus
supostos movimentos naturais: a crise de 1929-1932.” (BEHRING, 2011, p. 68). Um
contexto também de fortalecimento da classe operária espelhado na revolução ocorrida
na Rússia em 1917 (BEHRING, 1011). Esse reconhecimento já põe em movimento ações
do Estado em garantir alguns direitos aos trabalhadores em termos de políticas sociais
temendo que esse movimento socialista ganhasse hegemonia. É uma visão a-histórica
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considerar que os indivíduos tem as mesmas oportunidades quando já se tem como
fundamento a existência da propriedade privada e concentrada nas mãos de um minoria.
Falar que há liberdade então é um contrasenso quando não há de fato a oportunidade de
escolher entre alternativas. Um trabalhador, inserido numa sociedade capitalista, não tem
liberdade de escolher não vender sua força de trabalho para sobreviver, pois isso é uma
determinação do trabalho coletivo.

As críticas de Friedman a Marx no que se refere a categoria trabalho tem sua razão de ser,
pois Marx parte para entender o trabalho em sua ontologia para depois buscar
compreender o que é isso que se dá no capitalismo que é chamado de trabalho.
Ontologicamente o trabalho é uma relação orgânica do homem com a natureza da qual
ele extrai o que necessita para atender as suas necessidades humanas. Quando Marx olha
para o que se dá numa sociedade capitalista não encontra o trabalho atendendo as
necessidades humanas e sim as necessidades do capital em sua incessante busca de lucro.
No capitalismo o trabalho ontológico é esquartejado em apenas uma parte, que é
denominado de Força de Trabalho, e esta é então submetida à mercantilização e se torna
uma mercadoria a ser vendida no mercado e com essa venda, o assalariamento, o
trabalhador usa o mediador universal dinheiro para ter acesso ao atendimento a suas
necessidades. Por isso, Friedman não entende (ou não quis entender!) o ponto de partida
que Marx está usando para compreender o trabalho e não consegue enxergar na
mercadoria a força de trabalho explorada.

É importante lembrar que Marx reconhece que o capitalismo é um modo de produção que
promove o maior desenvolvimento das forças produtivas de forma que nenhum outro
modo de produção foi capaz de fazê-lo, mas explicita também que nenhum outro produziu
tanta miséria como correlato. Enquanto nos outros modos de produção a pobreza era fruto
da insuficiência de produção para atender a todos, no capitalismo a miséria é parte e
expressão da própria lógica de seu desenvolvimento e expansão.

Para Marx para que haja uma justa divisão da riqueza, não basta ao indivíduo receber o
correspondente ao que produz, mas cabe “de cada um de acordo com as suas
potencialidades e para cada um, de acordo com as suas necessidades” (MUSTAFÁ;
SILVA; ANSELMO, 2018). È notório que entre o entendimento de Friedman e de Marx
sobre a distribuição de renda há um abismo, pois enquanto o primeiro se apóia em
1Trabalho produzido e apresentado à disciplina Política Social, ministrada pela professora Dra.
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(UFES).
abstrações, opiniões pessoais, a critica marxiana se fundamenta na realidade concreta. Os
exemplos usados por Friedman se baseiam em fábulas idealizadas sem nenhuma
correspondência na realidade concreta. O exemplo das ilhas que traz no seu texto dá uma
ideia clara desse descolamento de dados concretos. Além disso faz também comparações
entre países sem levar em conta suas particularidades, apesar de declarar que “essas
comparações sejam difíceis, em conseqüência da dificuldade de levar em conta a
heterogeneidade intrínseca das populações” (FRIEDMAN, 2016).

No contexto de um estado de direito burguês é necessária a intervenção do Estado para


garantir o mínimo necessário para que a classe trabalhadora possa se reproduzir. Isso não
significa uma dádiva e sim o atendimento ao próprio Capital que depende da extração da
mais valia para sua expansão e continuidade. O Estado age em total favor do Capital e é
demandado também pelas lutas sociais que reivindicam melhores condições de trabalho
e salário, mas nessa luta histórica o avanço do Capital sobre o trabalho vai se
intensificando cada vez mais. Um teórico como Friedman defende que esse avanço se dê
de forma ainda mais cruel, pois defende a não garantia de sobrevivência da classe
trabalhadora, e na medida que acena algo neste sentido o faz a contragosto afirmando que

Como liberal, considero difícil encontrar qualquer


justificativa para a tributação progressiva, apenas para
fins de redistribuição de renda. Esse me parece um caso
claro de usar a coerção para tirar de alguns e dar para
outros, o que conflita em cheio com a liberdade
individual. (FRIEDMAN, 2016)

Para Marx somente numa sociedade comunista os indivíduos serão capazes de


desenvolver ao máximo seus potenciais e serem realmente livres já sem as amarras do
assalariamento e da divisão social do trabalho. (MUSTAFÁ; SILVA; ANSELMO, 2018).

O texto de Friedman é especialmente útil aqueles que buscam fundamentar a defesa de


uma mudança estrutural na sociedade contra os argumentos liberais e neoliberais, pois
para se ter argumentos é preciso conhecer os argumentos contrários e identificar suas
fragilidades e incoerências. A crítica impõe conhecer os conteúdos criticados para não se
tornar vazia e falaciosa.

1Trabalho produzido e apresentado à disciplina Política Social, ministrada pela professora Dra.
Salyanna de Souza Silva
2Graduandas do 3º período do curso Serviço Social da Universidade Federal do Espírito Santo

(UFES).
Segundo as informações colhidas na wikipedia e no site do Instituto Liberal, Milton
Friedman nasceu em Nova Iorque (EUA). Filho de pais imigrantes judeus. Em 1932
formou-se na Universidade Rutgers, se especializando em Matemática e Economia e
fortemente impactado em suas idéias pela Grande Depressão (crise de 1929). Fez
mestrado em economia na Universidade de Chicago em 1933. De 1941 a 1943, Friedman
trabalhou como conselheiro no Departamento do Tesouro dos Estados Unidos. Em 1946
concluiu seu doutorado na Universidade de Colúmbia e no mesmo ano ingressou como
professor da Universidade de Chicago onde trabalhou por 30 anos. Sua obra mais
conhecida é Capitalismo e Liberdade publicada em 1962. As suas outras obras são: Livre
para escolher: uma declaração pessoal; Uma história monetária dos Estados Unidos 1867-
1960; Males do dinheiro: episódios na história monetária.; Controle de aluguel; um
paradoxo popular: evidência dos efeitos econômicos do controle de aluguéis; Tirania do
status quo.. No final dos anos 90 escreveu uma autobiografia em conjunto com sua esposa,
também economista, entitulada Duas Pessoas de Sorte.

Uma reflexão:
“O primeiro que, tendo cercado um terreno, atreveu-se a dizer: Isto é meu, e encontrou pessoas simples o
suficiente para acreditar nele, foi o verdadeira fundador da sociedade civil. Quantos crimes, guerras,
assassínios, quantas misérias e horrores não teria poupado ao gênero humano aquele que, arrancando as
estacas ou enchendo o fosso, houvesse gritado a seus semelhantes: ‘Evitai ouvir este impostor. Estareis
perdidos se esquecerdes que os frutos são de todos e que a terra não é de ninguém’.” (ROUSSEAU, 1999,
p. 203 grifo nosso)

1Trabalho produzido e apresentado à disciplina Política Social, ministrada pela professora Dra.
Salyanna de Souza Silva
2Graduandas do 3º período do curso Serviço Social da Universidade Federal do Espírito Santo

(UFES).
BIBIOGRAFIA

FRIEDMAN, Milton. Capitalismo e liberdade. Rio de Janeiro: LTC, 2016.

BEHRING, Elaine; BOSCHETTI, Ivanete. Política social: fundamentos e história. São


Paulo: Cortez, 2011

https://www.institutoliberal.org.br/biblioteca/galeria-de-autores/milton-friedman/

https://pt.wikipedia.org/wiki/Milton_Friedman#Bibliografia

MUSTAFÁ, M. A. S. M.; SILVA, S. S.; ANSELMO, G. C. R. Democracia e justiça


social em tempos de golpe sob a égide do neoliberalismo. 2018. P. 416-426,).

ROSSEAU, J. J. Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os


homens. 2ª Ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999

1Trabalho produzido e apresentado à disciplina Política Social, ministrada pela professora Dra.
Salyanna de Souza Silva
2Graduandas do 3º período do curso Serviço Social da Universidade Federal do Espírito Santo

(UFES).

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