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PREDESTINAÇÃO
EM
CALVINO
Fred H. Klooster
Título do Original:
CEP: 13450
ÍNDICE
PREFÁCIO.................................................................................................... 5
CAPÍTULO 1 ASPECTOS GERAIS DA DOUTRINA DA
PREDESTINAÇÃO EM CALVINO ............................................................ 7
CAPÍTULO 2 ELEIÇÃO SOBERANA E GRATUÍTA ............................ 19
CAPÍTULO 3 SOBERANIA E JUSTA REPROVAÇÃO ......................... 38
CONCLUSÃO ............................................................................................ 64
PREFÁCIO
A luz das Escrituras - por mais que discordem desta doutrina os que a
rejeitam, quer inteiramente, quer parcialmente -, não podem fugir dela, uma
vez que ela expressa, de forma inequívoca, a absoluta soberania de Deus
em relação ao eterno destino dos homens, tanto dos que são alcançados
pela graça da redenção, quanto dos réprobos, que são objeto do justo juízo
de Deus. Em última análise, COMO diz Paulo, repetindo Moisés (Rm
9.15), da vontade e do propósito de Deus depende tanto o ter misericórdia,
quanto o endurecer o coração dos réprobos. A razão ou causa deste
comportamento de Deus está escondida ao nosso entendimento, visto que
só Ele a conhece. A nós, criaturas finitas competem uma atitude de
submissão a Deus, seja qual for o desígnio que Ele, na sua infinita
sabedoria, reserva a cada uma de nós.
Estudemos, pois, com devoção esta doutrina bíblica, como é exposta por
Calvino e descansemos na graciosa promessa divina, pois Deus começa e
termina, em nós, não só a obra da redenção dos que se arrependem, aceitam
a Cristo e são salvos, mas também a obra do seu juízo nos que rejeitam a
Cristo, não se arrependem e são condenados. Não é sem razão que o Autor
da Carta aos Hebreus (10.31), disse que "coisa horrível é cair nas mãos do
Deus vivo". O fato de não sabermos quem são os eleitos é confortador para
nós que, conhecendo o Evangelho, somos incumbidos de anunciá-lo a
tempo e fora de tempo, na certeza de que Deus conhece os que são seus (II
Tm 2.19). Por isso, porfiemos na esperança de sermos alcançados por sua
graça que opera infalivelmente naqueles que Ele chama, justifica e glorifica
(Rm 8.30).
Sabatini Lalli
CAPÍTULO 1
"De fato, o pacto da vida não é pregado igualmente entre todos os homens,
e entre os quais ele é pregado não tem a mesma aceitação, nem quanto à
constância, nem quanto à extensão. Nesta diversidade (de respostas) torna-
se conhecida a maravilhosa profundidade do juízo de Deus, pois não há
dúvida de que esta variedade (de respostas) serve também à sentença da
eterna eleição de Deus. Se é óbvio que, da parte de Deus, a salvação é
oferecida a alguns, enquanto outros são impedidos de ter acesso a ela,
surgem imediatamente grandes e difíceis questões, só explicáveis quando
as mentes reverentes consideram, como resolvido, que essas questões
podem apropriadamente estar ligadas à eleição e predestinação".
Aqueles que são cegos aos três frutos desta doutrina - a livre graça de Deus,
a glória de Deus e a humildade sincera -, "desejariam que o fundamento de
nossa salvação fosse remo¬vido do nosso meio" e "serviriam pessimamente
aos interesses deles mesmos e de outros crentes". Nesta doutrina
desco¬bre-se a verdadeira origem da Igreja de Cristo. O conforto da
predestinação de Deus não é só para os indivíduos; é para a Igreja e a
comunhão dos santos. Ouvimos Calvino pregar: Vamos apegar-nos à
eleição de Deus sempre que estivermos desanimados e abatidos; se virmos
os homens enfraquecerem e toda a Igreja parecer reduzir-se a nada
devemos lembrar-nos de que Deus é o seu fundamento, isto é, a Igreja não
está baseada na vontade do homem, pois os homens não podem edificar-se
a si mesmos, nem reformar-se a si mesmos: Porém, isto procede da pura
bondade e graça de Deus.
Esta doutrina útil e seus frutos agradáveis "devem ser pregados aberta e
plenamente". "Os que pensam abolir a doutrina da eleição de Deus
destroem, tanto quanto possível, a salvação do mundo". "De fato, o diabo
não tem um instrumento mais adequado do que os que lutam contra a
predestinação; em seu rancor, não suportam que se fale da doutrina ou que
ela seja pregada como deve". "O diabo não pode encontrar meio melhor
para destruir a nossa fé, do que esconder este artigo aos nossos olhos".
4. A DEFINIÇÃO DE PREDESTINAÇÃO
"Como a Escritura, então, mostra claramente, dizemos que Deus, uma vez,
estabeleceu, mediante seu plano eterno e imutável, aqueles a quem, de
antemão, determinou, de uma vez por todas, receber para a salvação, e
aqueles a quem, por outro lado, destinou ao aniquilamento. Afirmamos
que, com respeito aos eleitos, este plano funda-se na graça de Deus,
livremente oferecida, sem levar em conta o mérito humano; mas, por seu
justo, irrepreensível, porém, incompreensível juízo, Ele fechou a porta da
vida àqueles a quem abandonou à perdição. Entre os eleitos, consideramos
a chamada como um testemunho da eleição e sustentamos que a
justificação ê outro sinal de sua manifestação, até que os eleitos entrem na
glória, onde está o cumprimento final da eleição. Porém, como o Senhor
sela os seus eleitos, chamando-os e justificando assim, por impedir que os
réprobos cheguem ao conhecimento do seu nome ou recebam a santificação
do seu Espírito,ele revela, por estes sinais, o tipo de julgamento que os
espera" Quase tudo o que Calvino ensinou, sobre a predestinação, ESTÁ
incluído nos dois sumários acima.
"Desde que Paulo os chama de eleitos, não resta dúvida de que ele está
falando aos crentes, como também logo declara... dizendo que "eles foram
eleitos antes da fundação do mundo" (Ef. I4A), eliminando qualquer
consideração a respeito de merecimento pessoal. Que base há para a
distinção entre estes que ainda não existiam e que, subseqüen-temente,
deveriam ser iguais a Adão? Ora, se eles são eleitos em Cristo, segue-se
não somente que cada homem é eleito sem qualquer conside-ração de
mérito próprio, mas também, que eles são separados de outros, pois vemos
que nem todos são membros de Cristo. Além disso, o fato de terem sido
eleitos para "ser santos" (Ef. 1.4b) refuta inteiramente o erro que faz a
eleição derivar do preconhecimento, visto que Paulo declara que toda
virtude que o homem é capaz de exibir, resulta da eleição. Agora, se
procura uma causa mais remota, Paulo responde que assim aprouve a Deus
porque está de acordo "com o beneplácito da sua vontade" (Ef 1.5b). Com
estas palavras, Paulo suprime todos os meios de eleição que o homem
possa pensar em possuir por si mesmo Pois todos os benefícios que Deus
concede para a vida espiritual, conto Paulo ensina, fluem desta única fonte:
Isto é, que Deus escolheu aqueles a quem quis e, antes do nascimento
deles, Deus guardou para eles, individualmente, a graça que lhes quis
conceder".
Ainda que este decreto divino seja, de algum modo, obra das três pessoas
da Trindade, Calvino concebeu-o primeiramente como obra das primeiras
duas pessoas. Que o Pai é o Autor do decreto é muito claro. É à luz do
eterno decreto do Pai que as palavras de Cristo adquirem sentido: "Todas as
coisas foram entregues por meu Pai... E a vontade do Pai que me enviou é
esta: Que eu não perca nenhum de todos os que me deu...". Assim, a
"dádiva do Pai é o começo de nossa recepção na segurança e proteção de
Cristo".
Calvino, porém, considerava também o próprio Cristo Como Autor do
decreto da eleição: "Entrementes, ainda que Cristo se interponha como
Mediador, Ele reivindica para si, em comum com o Pai, o direito de
escolher". Este é o sentido das palavras de Jesus, em João, 13.18: "Não falo
a respeito de todos vós, pois eu conheço aqueles que escolhi." Assim,
quando Cristo declarou que "conhece os que escolheu", ele assinala, no
gênero humano, uma espécie particular, distinta não pela qualidade de suas
virtudes, mas pelo decreto celestial... Cristo faz-se a Si mesmo Autor da
eleição". Concisamente, vere¬mos também que Calvino considerou o eleito
como "eleito em Cristo, e considerou a Cristo como o "espelho de nossa
eleição". Porém, é importante ver aqui que Cristo é, Ele mesmo, o Autor do
decreto.
Notamos que Calvino considerava o decreto divino como obra das três
pessoas da Trindade, porém, dava ênfase ao papel do Pai e do Filho. Ele
não refere explicitamente o Espírito Santo como autor do decreto, como faz
em relação ao Pai é o Filho. O Espírito Santo, naturalmente, está envolvido
na doutrina da eleição: Ele é o Mestre desta doutrina, pois inspirou as
Escrituras, e, mais significativamente, Sua obra soteriológica consiste em
executar o decreto de Deus.
Os herdeiros de Abraão não eram mais dignos do que outros povos, quando
a nação de Israel foi eleita. De igual modo, os indivíduos eleitos para
salvação não são mais dignos de eleição do que os que são rejeitados. Isto
se deve simples¬mente à soberania de Deus. ".Deus escolhe uns e rejeita
outros, de acordo com a Sua decisão...". "Deus é sempre livre para dar a
Sua graça a quem Ele quer"; se alguém busca alguma causa (para este
procedimento)! Além da livre soberania de Deus, deve "responder por que
são homens ao invés de bois ou burros. Ainda que estivesse no poder de
Deus fazê-los cachor¬ros, Deus os fez à sua própria imagem". A resposta
de Calvino a tais questões é a mesma resposta de São Paulo: "Quem és tu, ó
homem, para discutires com Deus? Porventura pode o objeto perguntar a
quem o fez: Por que me fizeste assim?" (Rm 9.20).
Do dito acima fica claro o que Calvino quis dizer quando definiu a
predestinação como "o eterno decreto de Deus pelo qual Ele determinou,
em Si mesmo, aquilo que deveria ocorrer com cada homem". O decreto da
eleição faz distinção entre indivíduos, distinção que não existe por
natureza: Em Jacó e Esaú, "todas as coisas são iguais, contudo, o juízo de
Deus, sobre cada um, é diferente, pois Ele aceita um e rejeita outro.
Rejeitando a Ismael, Ele volta o seu coração para Isaque (Gn 21.12).
Preteriu a Manasses e honrou a Efraim (Gn 48.20)". O decreto, contudo,
não é conhecido dos homens, exceto em raros casos, quando Deus decide
revelá-lo. No único caso de Jacó e Esáu, foi revelado aos pais o eterno
decreto de Deus relativo a seus gêmeos, antes do nascimento deles. Rebeca
foi Divinamente informada da eleição de seu filho Jacó. Porém,
Mesmo nesse único exemplo, esta divina revelação não se motivo de ação
divergente por parte dos pais. Os meios de graça não eram para serem
tirados de Esaú e dados somente ao eleito Jacó. A eleição soberana dos
indivíduos, para receber o dom da salvação através de Jesus Cristo, dá
ênfase, contudo, a livre graça de Deus em dar a uns o que nega a outros - e
dar generosamente onde não há mérito nos que recebem.
B. A causa e a Base da Eleição
a) A causa (da eleição) não sãos as boas obras. Calvino enumerou três
razões para rejeitar a posição de que as boas obras são a causa da eleição.
Deus estabeleceu o seu decreto antes da fundação do mundo, de modo que
as pessoas eleitas ainda não existiam para produzir quaisquer boas obras
todos os homens se perderam em Adão e, por isso, são incapazes de
produzir quaisquer boas obras (para a salvação); finalmente, a eleição, em
si mesma, existe para as boas obras "Ele nos escolheu nele antes da
fundação do mundo, para que fossemos santos e sem mácula diante dele"
(Ef 1.4).
D. A base (da eleição) é Cristo. Calvino deu ênfase ao fato de que a eleição
soberana, para a salvação, é a eleição em Cristo. A eleição se origina da
soberana vontade de Deus, mas há uma base ou fundamento para esta
eleição. "Quando Paulo ensi¬na que nós somos escolhidos em Cristo 'antes
da fundação do mundo' (Ef 1.4a), ele elimina toda e qualquer
considera¬ção de obras meritórias de nossa parte, pois é exatamente como
se ele dissesse: Desde que entre todos os filhos de Adão o Pai celestial não
encontrou ninguém digno de sua eleição, Ele voltou seus olhos para o Seu
Ungido a fim de escolher, como membros do Seu Corpo, aqueles a quem
fosse receber em comunhão da vida".
A glória de Deus era a única ênfase de Calvino, tanto no seu ensino como
na sua vida pessoal. "Soli Deo Gloria!" (Só a Deus seja dada glória!). Este
era o bem conhecido moto de Calvino. Seus comentários sobre Efésios são
claros sobre este aspecto da eleição, mas ele os elaborou na sua discussão
da eleição, nas Institutas. A glória de Deus é, contudo, como já vimos aqui,
um dos frutos agradáveis que colhemos da com-preensão desta doutrina.
Esta perspectiva subjaz a toda sua discussão da soberana e gratuita
misericórdia de Deus revelada na eleição divina.
Nas Institutas, Calvino deu muito mais atenção ao propó¬sito imediato da
eleição - nossa santificação -, e às questões relativas a este propósito. O
objetivo ou propósito imediato da eleição é a santificação do eleito, isto é, é
torná-lo "santo e sem mácula diante dEle" (Ef 1.4), e essa santificação leva
o crente a glorificar seu misericordioso e soberano Senhor. A eleição
soberana prove todos os meios para que o propósito soberano de Deus
atinja o seu objetivo. Romanos, 8.29-30 nos oferece a estrutura básica
destes meios pelos quais Deus efetua Sua eterna eleição, isto é, a chamada,
a. justificação e a glorificação. Há uma ação recíproca; os meios conduzem
a atenção ao propósito e à fonte de Deus: "Agora, entre os eleitos,
consideramos a chamada como testemunha da eleição. “Em seguida, temos
a justificação como outro sinal de sua manifestação, até que os eleitos
entrem na glória, onde está a consumação final da eleição”. Isto indica
também a significação crucial para toda a teologia de Calvino. A eleição
envolve todo o processo redentivo, desde o decreto eterno à sua
consumação final na glória. Entre estes dois pólos, a eleição é relevante à
doutrina da fé, ao conhecimento de Deus, a toda Soteriologia, à Igreja e
sacramentos e, também, à escatologia. Assim, finalmente, Calvino
encontrou o lugar certo para a discussão da predestinação - o Livro III das
Institutas - que trata extensamen¬te da Soteriologia. A Soteriologia
culmina na escatologia, por¬que "o inabalável amor de Deus dura de
eternidade a eternida¬de sobre os que o temem" (SI 103.17). Calvino citou
Bernardo, referendando suas palavras: "Da eternidade, por causa da
predestinação; para a eternidade por causa da santificação -uma não
conhece o começo, outro não conhece o fim".
Deus faz uso dos meios para levar Seu propósito decretivo à consumação.
E estes próprios meios também estão incluídos no decreto de Deus e estão
sob Seu controle soberano. Por ordem divina, o Evangelho deve ser
pregado a todos os povos; contudo, nem todos ouvem e, entre os que
ouvem, as respostas são diferentes. Nisso a predestinação de Deus está
envolvida "Mesmo que a pregação do Evangelho flua da fonte da eleição,
ela não é, em si mesma, prova plena da eleição". A chamada é que é a
prova da eleição. A chamada referida em Rm 8:30 "consiste não só da
pregação da Palavra, mas também da iluminação do espírito". Esta
chamada efetiva é um dos MEIOs da eleição: "Ainda que, na escolha dos
Seus, o Senhor os adota como filhos, vemos que eles não tomam posse de
um tão grande bem, se não forem chamados; inversamente, quando eles são
chamados, eles já gozam da participação de Sua eleição".
"É fácil explicar porque a eleição geral de um povo nem sempre é firme e
eficaz: Aqueles com quem Deus faz um concerto, Ele não dá, em seguida,
o espírito de regeneração que os habilitaria a perseverar no concerto até o
fim. Mais do que isto, a mudança externa, sem a operação da graça interior
- que poderia ter eficácia para guardá-los -, é intermediada entre a rejeição
da humanidade e a eleição de um pequeno número de piedosos".
"Se alguém se dirige a uma pessoa e lhe diz que se ela não crê, a razão está
no fato de ela ter sido ordenada para a destruição, ao dizer isto não só adota
uma atitude indolente, mas, também, da lugar à má intenção, Se alguém
estende ao futuro também a afirmação de que os que ouvirão, também não
hão de crer porque foram condenados, também estará mais amaldiçoando
do que ensinando. Pois não sabemos quem pertence ao número dos
predestinados ou quem não pertence, mas devemos estar atentos quanto ao
desejo de que todos os homens desejam ser salvos. Assim acontecerá que
nós tentaremos fazer com que cada um que encontramos, seja mais
participante da nossa paz... Pertence a Deus, contudo, tornar efetiva a
recompensa daqueles a quem preconheceu e predestinou".
"Portanto, desde que, segundo a nossa doutrina, Cristo regenera para uma
vida santificada àqueles a quem Ele justifica, e depois de libertá-los do
domínio do pecado, os conserva no domínio da justiça, e transforma-os na
imagem de Deus e, assim, pelo Espírito Santo, os exercita à obediência de
Sua vontade, não há base para a alegação de que a luxúria fica livre para
reinar. Mais ainda, como é gratuito o fim da eleição, do mesmo modo o é a
justificação, assim podemos viver vidas puras e não contaminadas diante de
Deus. Porque o dito de Paulo é verdadeiro, quando diz que "fomos
chamados não para a impureza, mas para a santificação" (I Ts 4.7).
"Desta maneira, àqueles a quem Deus adotou como seus filhos, dizemos
que foram escolhidos, não em si mesmos, porém, em Cristo (Ef 1.4), pois a
menos que Deus os amasse em Cristo Ele não os honraria com a herança do
Seu Reino se eles, previamente, não se tivessem tornado participantes dele.
Porém, se fomos escolhidos nele, não encontramos a segurança da nossa
eleição em nós mesmos, nem mesmo em Deus, o Pai, se nós o julgamos tão
severo com seu Filho. Cristo, portanto, é o espelho onde nós, sem ficarmos
decepcionados, podemos contemplar nossa própria eleição. Porque, desde
que o Pai destinou enxertar no seu Corpo aqueles que Ele, desde a
eternidade, quis que fossem seus filhos afim de que Ele possa sustentar
como filhos a todos os quais Ele reconhece serem seus membros temos um
testemunho suficientemente claro e firme de que fomos inscritos no livro
da vida(cf.Ap 21.27), se estamos em comunhão com Cristo”
Olhar para Cristo como espelho de nossa eleição pode dar segurança no
presente, porém, e quanto ao futuro? Algumas pessoas parecem ter
verdadeira Fé e parecem estar ligadas a Cristo; contudo, elas fraquejam
depois. Calvino enfrentou também este problema. Para o futuro, Cristo
também é o espelho da eleição e da segurança para nossa perseverança
(preservação). "Porém, Cristo nos libertou da ansiedade, pois estas
promessas se aplicam certamente ao futuro: "Todo aquele que o Pai me dá,
esse virá a mim; e o que vem a mim, de modo algum o lançarei fora" (João
6.37). Calvino mencionou outras passagens e concluiu com a pergunta:
"Que é que Cristo deseja que aprendamos disto senão que permaneceremos
para sempre seguros, uma vez que fomos feitos dele de uma vez por
todas?”. Desde que Cristo "é a eterna sabedoria do Pai, sua verdade
imutável, seu firme conselho, não devemos temer que aquilo que Ele nos
diz, em Sua Palavra, seja diferente nas mínimas coisas do que prevalece na
vontade do Pai, que buscamos. “Mais do que isso, Cristo nos revela
fielmente essa vontade como ela é desde o começo e como será para
sempre”. As palavras de Cristo devem ser acatadas, pois Suas promessas
são tão certas, que não é permitido ao crente orar e dizer: "O Senhor, se eu
sou eleito, ouve-me!", pois esta maneira de falar revela dúvida nas
promessas de Deus. As Escrituras não dizem que alguns que parecem
pertencer a Cristo se desviarão no fim. Calvino explicava que "é também
igualmente claro que tais pessoas (que abandonam a Fé) nunca foram fiéis
a Cristo com sincera confiança na qual a certeza da eleição, eu afirmo, foi
estabelecida para nós". E ele continua: "Assim, não permitamos que tais
circunstâncias nos induzam, afinal, a abandonarmos o seguro apoio da
promessa do Senhor, pela qual Ele declara que todos aqueles por quem Ele
é recebido, em verdadeira Fé, Lhe foram dados pelo Pai e nenhum deles,
uma vez que Ele é seu Guardião e Pastor, perecerá" (cf Jo 3.16 e 6.39).
Calvino não queria significar que a reprovação fosse uma dedução lógica
da eleição; ele fez a asserção acima plenamente convicto de que a Escritura
a exige. "Se não nos envergonhamos do Evangelho, devemos confessar que
a eleição está aí plenamente declarada. Deus, por sua eterna boa vontade,
que não tem causa fora de si mesma, destinou à salvação aqueles de quem
se agrada, rejeitando o resto. Aqueles a quem achou dignos da eleição
gratuita, Ele iluminou por Seu Espírito, de modo que recebessem a vida
oferecida por Cristo, ao passo que os outros descrêem voluntariamente, de
modo que permanecem nas trevas, destituídos da luz da Fé".
"Estamos dizendo que a Escritura mostra claramente que Deus, por ser
eterno e imutável desígnio, determinou, de uma vez por todas, aqueles a
quem queria receber para sempre à salvação e, por outro lado, aqueles a
quem queria entregar à perdição".
"Logo, Esaú, que não diferia em mérito de Jacó, foi repudiado, enquanto
Jacó foi distinguido pela predestinação de Deus".
2. A reprovação é particular.
3. A causa da Reprovação.
Está buscando algo maior e mais alto do que a vontade de Deus, coisa que
não pode ser encontrada. “Deixemos que a temeridade dos homens se
refreie a si mesma e não busque aquilo que não existe”. A esta atitude para
com a soberana vontade de Deus, Calvino chamou de "freio" que,
"efetivamente, restringirá a qualquer um que queira ajuizar, com
reverência, os segredos de seu Deus".
Calvino reconhecia, então, que Deus quis a queda de Adão, mas não
entendia nem compreendia isto plenamente:
Pode-se sentir com que desgosto Calvino ouvia as críticas que exigiam
explicações. "Como se fosse minha a obrigação de explicar a razão dos
secretos conselhos de Deus", escreveu ele retoricamente, "como se fosse
minha a obrigação de fazer os mortais entenderem o ponto crucial da
sabedoria divina, cuja altura e profundidade eles são ordenados a olhar e a
adorar". Em outro lugar, ele sugeriu que os perturbados por estes
problemas deveriam observar a advertência de Agostinho: " Vós, homens,
esperais de mim uma resposta; eu também sou homem. Portanto, vamos
nós (vós e eu) ouvir alguém que disse: O homem, quem és tu? (Rm 9.20).
A ignorância que crê é melhor do que o conhecimento temerário... Paulo
descansou porque reconheceu maravilha. Ele chamou insondáveis os juízos
de Deus e tu, ó homem, te aventuras a perquiri-los? Paulo fala dos
caminhos de Deus como inescrutáveis (Rm 11.33), e tu tens a pretensão de
esquadrinhá-los?". Seguindo ele mesmo a advertência de Agostinho,
Calvino simplesmente conclui: "Nada progrediremos, querendo ir mais
longe...".
Nos lugares onde Calvino discutiu estas questões com mais detalhes, ele
apenas ampliou a mesma resposta e introduziu certas distinções. Por
exemplo, Calvino sugeriu que se aceitarmos a idéia de que Deus é a autor
do pecado, porque decretou a queda de Adão, podemos dizer também,
forçosamente, que Deus é o autor daquele ato iníquo pelo qual os judeus
crucificaram a Jesus Cristo. Os judeus fizeram "aquilo que Tua mão e Teu
conselho determinaram, de antemão, que deveria ser feito". E lembrai-vos,
disse Calvino, que "estas não são as palavras de Calvino, mas do Espírito
Santo, de Pedro e toda a Igreja Primitiva".
Uma distinção que Calvino considerava de grande auxílio, aqui, é a que
existe entre a vontade de Deus e a vontade de Satanás: "Há uma poderosa
diferença, porque ainda que Deus e Diabo queiram a mesma coisa, eles a
querem de maneira inteiramente diferente... o homem quer para o mal
aquilo que Deus quer para o bem. Calvino insistiu em que Deus está, e
deve estar sempre, inteiramente longe do pecado". De acordo com Calvino,
o piedoso "confessará, na verdade, que a queda de Adão não ocorreu sem o
governo e direção da secreta providência de Deus [arcana Dei providentia),
mas também nunca duvidará de que o fim e o objetivo do Seu secreto
conselho são retos e justos. Porém, como a razão (desse conse¬lho) está
escondida na mente de Deus, os piedosos, sóbria e reverentemente,
esperam a sua revelação que será feita no dia em que veremos a Deus "face
a face", a quem vemos agora por espelho, e obscuramente".
Outra distinção que Calvino considerou útil levar em conta, nesta questão,
é a que existe entre causa última e causa remota. No juízo de Calvino, esta
distinção muito simples é de grande importância. Ele não se surpreendeu de
que seu opositor Pighius "confundisse tudo indiscriminadamente no
discernimento de Deus, quando deixa de distinguir entre causa próxima e
causa remota". Calvino considerou "ímpia e caluniosa" a acusação que
Pighius fez contra ele, quando disse que o Reformador transformou a
"queda do homem em obra de Deus", uma vez que Calvino "retirou de
Deus toda acusação próxima do agir... ao mesmo tempo em que remove
dele toda culpa e deixa o homem responsável sozinho". Contudo, esta útil
distinção não resolve o mistério, para Calvino: "... porém, a maneira como
foi ordenado pela presciência e decreto de Deus, que no futuro do homem
Deus não estivesse implica¬do como associado no seu pecado, como autor
ou aprovador da transgressão, é claramente um segredo que excede, em
muito, a capacidade de compreender da mente humana, e eu não tenho
vergonha de confessar ignorância".
"Como mostra a Escritura, claramente, dizemos que Deus, uma vez, por seu
eterno e imutável decreto, estabeleceu aqueles a quem, de antemão,
determinou, de uma vez por todas, receber para a salvação, e aqueles a
quem, por outro lado, devotou a destruição. Afirmamos que, com respeito
aos eleitos, este plano funda-se na sua livre graça oferecida, sem
consideração das obras humanas; porém, por seu justo e irrepreensível, mas
incompreensível juízo, ele fecha a porta da vida àqueles que devotou
inteiramente à danação"
Ele definiu a predestinação como o "Eterno decreto de Deus pelo qual ele
pactuou consigo mesmo o que ele quis que ocorresse a cada homem... A
vida eterna é preordenada a uns, a danação eterna a outros". E-se
predestinada ou para a vida ou para a morte. Por este "plano secreto", Deus
"escolhe livremente aos que são do seu agrado e rejeita outros". Depois de
discutir a base bíblica da eleição e da reprovação, Calvino conclui: "Vede
como Paulo atribui só a Deus ambas as decisões? Se, pois, não podemos
determinar a razão pela qual ele não concede a sua graça, a não ser àqueles
de quem se agrada, não podemos igualmente descobrir qualquer razão para
ele rejeitar outros, a não ser a sua vontade. Porque onde se diz que Deus
endurece a quem quer e tem misericórdia de quem quer, há uma
advertência para o homem não procurar qualquer causa fora da vontade de
Deus".
Quando ele refutava as "falsas acusações com que esta doutrina tem sido
sempre gravada", Calvino ligava, de novo, claramente, a reprovação final à
vontade de Deus. Ele afirmou que "estes a quem Deus repudia (praeterit),
ele condena (reprobat); e isto ele faz não por outra razão senão porque ele
quer exclui-los da herança que predestinou á seus "próprios" filhos".
Depois de citar as referencias chaves de Romanos 9, Calvino insistiu com
seus leitores a "notarem que Paulo, para não dar ocasião ao murmúrio e ao
descrédito, atribui a razão última ao soberano juízo e poder de Deus",
acrescentando que o "secreto plano é a causa do endurecimento". Ao
considerar a relação da queda de Adão com o decreto de Deus, Calvino
disse: "Naturalmente, eu admito que, nesta miserável condição em que os
homens estão agora enredados, todos os filhos de Adão caíram pela
vontade de Deus". E ele continuou: "É isto que eu tenho dito desde o
começo: que nós devemos sempre, em última análise, retornar à só decisão
da vontade de Deus, cuja causa está escondida nele". Não só a eleição e
salvação, mas também a reprovação e a condenação encontram sua causa
última na vontade de Deus. "Desde que a disposição de todas as coisas está
nas mãos de Deus, e desde que a decisão a respeito da salvação e da morte
está em seu poder, ele assim ordena por seu plano e vontade...". O
preconhecimento de Deus descansa sobre "o fato de que Deus decretou
aquilo que acontece" e "é claro que todas as coisas acontecem... por sua
determinação e ordem".
Quando Calvino falou dos meios pelos quais Deus execu¬ta seus decretos,
relacionou novamente a causa última da reprovação à soberana vontade de
Deus: "Porque todas as coisas não foram criadas em igual condição; porque
a vida eterna foi preordenada a uns, e a danação eterna a outros". Com
Agostinho, Calvino disse: "O Senhor criou aqueles a quem,
inquestionavelmente, preconheceu como destinados à destruição Isto
aconteceu, porque ele quis assim. Porém, por que ele quis assim não é para
a nossa razão indagar, pois não podemos compreender". Quando alguém
pergunta por que o Evangelho é pregado em algumas nações, e não em
outras, e por que alguns, aos quais ele é pregado, crêem,e outros não,
"aquele que procura uma causa mais profunda (causa altiorem) além do
secreto e inescrutável plano de Deus, se atormentará a si mesmo sem
nenhum propósito". Contu¬do, Calvino esteve sempre preocupado em
acrescentar que "ninguém perece imerecidamente". E quando a sua
discussão tinha como centro a responsabilidade pessoal, o acréscimo (ira
feito à soberania de Deus, como ilustra a seguinte passagem: "O fato de os
réprobos não obedecerem a Palavra de Deus, quando ela se torna conhecida
deles, será - com justiça contra eles -, atribuída à malícia e depravação dos
seus corações, acrescentando-se, ao mesmo tempo, que eles foram
levantados pelo justo e inescrutável juízo de Deus, a fim de, na sua
condenação, exibirem a glória de Deus".
"Da mesma forma pela qual Deus realiza a salvação dos eleitos, pela
eficiência da Sua vocação e segundo estabeleceu no seu eterno conselho,
assim também Ele, nos Seus juízos contra os réprobos, executa os desígnios
estabelecidos para eles. Portanto, aqueles a quem criou para a desonra na
vida e para a destruição na morte - para serem instrumentos de sua ira e
exemplos de Sua severidade, ora os priva da capacidade de ouvira Sua
palavra, ora os torna cegos e entorpecidos para não entenderem a sua
pregação. Portanto, esse Juiz Supremo conduz a sua predestinação, quando
deixa cegos aqueles a quem privou de Sua luz, quando uma vez os
reprovou".
Os meios que Deus emprega para executar seu decreto, ás vezes, assumem
formas diferentes e mais dramáticas. "É fora de dúvida que o Senhor envia
sua Palavra a muitos cuja cegueira ele quer aumentar". Faraó é notável
exemplo disto, como Paulo mostrou em Romanos 9: "Com que objetivo
Deus se mostrou a Faraó, por meio de Moisés? Terá sido porque esperava
amolecer o coração dele, com as sucessivas embaixadas? Não, pois antes
de começar ele sabia e tinha predito o que ia acontecer". Ilustrações de
Ezequiel, Jeremias, Isaías mostram que "Ele dirige sua voz com o propósito
de tornar os homens mais cegos; expõe sua doutrina, porém, com o
propósito de torná-los mais broncos; emprega o remédio de modo que não
sejam curados”. Jesus mostrou que várias de suas parábolas tinham
propósito semelhante (Mt 13.11). Daí dizer Calvino "que não se pode
controverter: Quando Deus não quer que os homens sejam iluminados,
transmite-lhes sua doutrina envolta em enigmas, para que nenhum proveito
obtenham dela, mas para que sejam entregues a maior embrutecimento".
“O apóstolo João, 12.39, citando o profeta Isaías, afirma que os judeus não
podiam crer no ensino de Cristo, porque a maldição de Deus pendia sobre
eles”.
O soberano uso que Deus faz destes meios para executar o seu decreto da
reprovação, não elimina nem reduz a responsabilidade humana. O homem
nunca é desculpado por sua descrença. Jesus disse aos seus discípulos que
lhes falava por parábolas, porque "a eles lhes era dado conhecer os
mistérios do reino de Deus, mas não aos outros... que vendo, não vêem, e
ouvindo não ouvem nem entendem" (Mt 13.11-13). "Que é que Jesus quer
significar", pergunta Calvino, "com ensinar àqueles que cuida para que não
entendam?". Aqui, a resposta de Calvino dá ênfase à descrença humana:
"Considera de onde vem a falha, e deixarás de perguntar, pois qualquer que
seja o ponto obscuro que haja na Palavra, há sempre, contudo, bastante luz
para convencer a consciência dos ímpios". Aqui, outra vez, a
responsabilidade humana e soberania divina se entrelaçam
incompreensivelmente. Os que foram "ordenados à vida eterna", ouvem e
obedecem pela sobera¬na instrumentalidade do Espírito Santo. Calvino
também pergunta: "Por que, então, Ele concede graça a estes e nega
àqueles?". Aqueles, como explica Lucas, "fora destina¬dos para a vida
eterna" (At 13.48), estes, como explica Paulo, "são vasos de ira, preparados
para a perdição" (Rm 9.22). À luz disto, Calvino sugeriu que nós não nos
envergo¬nhemos de dizer com Agostinho: "Deus poderia converter, para o
bem, a vontade dos maus,porque Ele é onipotente: é claro que poderia!
Então, por que não o faz? Porque não quer pois o não querer está nele".
Vimos que Calvino reconhecia uma variedade de meios empregados por
Deus, para executar seu soberano decreto da reprovação. Nega a uns sua
Palavra, e a envia a outros, mas os cega e endurece na descrença.
Naturalmente, a responsabilida¬de humana é entrelaçada com a soberana
ação de Deus. Contudo, Calvino sempre considerou a pregação do
Evangelho como evidência da bondade de Deus: "Quando Ele, primeiro,
faz brilhar a luz de sua Palavra sobre os indignos", afirma Calvino, "Ele dá
prova suficientemente clara de Sua livre bondade (gratuitae bonitatis)". E
Calvino continua: "Aqui, portanto, se manifesta a imensa bondade de Deus,
mas não para salvação de todos, porque juízo mais grave espera os
réprobos, visto que eles rejeitam o testemunho do amor de Deus
(testemonium amoris Dei). Ainda que a Palavra evidencie a livre e infinita
bondade de Deus, como testemunha do seu amor, a diferença das respostas
(dadas pelos homens) também envolve a soberana ação de Deus: "E Deus,
também para realçar a sua glória, retira deles a eficiência do Seu Espírito
isto é, retira dos réprobos. “Porém, aos seus eleitos, Ele assegura a efetiva
operação do Seu Espírito, para que eles creiam em Jesus Cristo”. "Ora, se
bem que a pregação do Evangelho jorra da fonte da eleição", e tem como
objetivo primeiro, levar os eleitos à fé em Jesus Cristo, contudo, o
Evangelho deve ser pregado a todas as pessoas indiscriminadamente, pois é
deste modo que Deus opera sua, soberana vontade. Porém, por que Deus
ordenou que o Evan¬gelho fosse pregado a todos? Aqui está parte da
resposta de Calvino: "Para que mais seguramente concordem as
consciências dos piedosos,, enquanto entendem não haver nenhuma
diferença entre os pecadores, á não ser que a fé esteja presente os ímpios,
porém, para não alegarem que lhes falta um refúgio onde possam abrigar-se
da servidão do pecado, rejeitam, por sua ingratidão, o asilo que lhes é
oferecido". A questão se torna mais enfática, quando perguntamos por que
o Evangelho deve ser pregado aos réprobos, bem como aos eleitos.
Naturalmente, no curso da história não sabemos quem são os réprobos. Mas
a ordem de Deus exige a pregação universal do seu Evangelho, e ele sabe
quem são os eleitos e quem são os réprobos. Calvino focalizou também esta
questão: "Quando Deus dirige a mesma Palavra aos réprobos, ainda que
não para corrigi-los, Ele faz a Palavra servir a outro propósito: Hoje, para
pressioná-los com o testemunho da consciência e, no dia do Juízo, para
torná-los mais inescusáveis... Paulo salienta que o ensino não é inútil aos
réprobos porque, para eles, "é cheiro de morte para a morte" (II Co 2.16),
contudo, para com Deus, "somos o perfume de Cristo" (II Co 2.15). Deste
modo, Calvino reconhecia que a Palavra pregada aos réprobos, torna-os
"sujeitos a um mais pesado juízo", e "é ocasião para mais severa
condenação", tornando-os, no Juízo Final, mais inescusáveis. Por isso, a
pregação geral do Evange¬lho funciona também como meio utilizado por
Deus para consumar o seu decreto da reprovação. Contudo, Calvino insistiu
em dizer que, o "fato de apenas a proclamação externa (do Evangelho)
tornar inescusáveis os que a ouvem, e não obedecem, mesmo assim é a
proclamação da Palavra consagrada testemunho da graça de Deus, pela
qual Ele reconcilia OS homens consigo".
Por estes diversos meios, Calvino entendeu que Deus executa seu soberano
decreto da reprovação. Ainda que Deus seja a causa última que opera
soberanamente, segundo SEU bom prazer, a mancha e a culpa do pecado
residem no homem, como causa próxima, pois o homem peca
voluntariamente, e é responsável por rejeitar a bondade de Deus. O decreto
de Deus é, finalmente, levado a efeito, quando Ele condena o descrente por
seu pecado. Nisso brilha claramente a justiça de Deus, que está incluída na
sua glória. "Por isso, os réprobos são abominá¬veis a Deus, e com muita
razão", insistiu Calvino, "porque são destituídos do seu Espírito e nada
podem apresentar senão a causa da maldição". Assim, Calvino sempre se
referiu à causa próxima da condenação (reprovação) -, que é o pecado
humano e a culpa; porém, a Escritura não lhe permitiu negar a causa última
da reprovação (a rejeição), que é a soberana vonta¬de de Deus. Sua
compreensão da Escritura e sua obediência a ela, como Palavra fidedigna
de Deus, serviram de base à sua teologia da predestinação. Com fé
confiante, ele acreditava na fidedignidade da Palavra de Deus, ainda que
reconhecesse a incapacidade da mente humana para compreender todo o
seu sentido. Assim, Calvino concluiu a discussão deste assunto controverso
da predestinação, com as seguintes palavras: "Agora, quando muitas noções
foram aduzidas de ambos os lados, deixemos que a nossa conclusão seja:
"Tremer com Paulo diante de profundeza tão grande, e, mesmo que clamem
lín¬guas atrevidas, não devemos nos envergonhar da proclamação do
Apóstolo: "Quem és tu, ó homem, para discutires com Deus?" (Rm 9.20).
Como diz Agostinho, os que medem a justiça divina pelos padrões
humanos de justiça, agem perversamente".
CONCLUSÃO
Foi deste modo que Calvino concluiu seu significativo tratado Concerning
the Eternal Predestination of God ("Tratado Referente à Eterna
Predestinação de Deus"):
Fim.