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Como identificar os truques do marketing eleitoral

por Revista Superinteressante

Listados abaixo estão alguns dos truques mais comuns que os marqueteiros usam
para enganar os eleitores na época das campanhas:

Nome de guerra

O que você vê - Um candidato que se apresenta sem sobrenome

Eles querem que você veja - Seu futuro genro

O truque - Qual dessas cenas poderia acontecer no seu almoço do próximo


domingo: “Papai, esse é meu novo namorado, o Geraldo”? Ou então: “Papai, esse
é meu novo namorado, o Alckmin”? A escolha do nome é uma das etapas iniciais
da campanha. Ali está o primeiro fator de empatia entre candidato e eleitor. Assim,
sobrenomes difíceis de gravar perdem força. Na disputa pela prefeitura de São
Paulo, em 2000, muitas propagandas apresentavam um dos concorrentes como
Geraldo Alckmin. Na corrida governamental de 2002, surpresa, o mesmo
candidato chamava Geraldo. Quem entende do riscado jura que a troca de nome
faz parte do projeto presidencial do governador paulista. Como Alckmin, seria
muito mais difícil vender-se nas áreas mais pobres do país.

Fonte da juventude

O que você vê - Um jovem praticando esportes

Eles querem que você veja - Um homem moderno, com estilo arrojado

O truque - Relembrar dá frio na barriga: Collor luta caratê. Collor no jet ski.
Collor pilota um caça da Força Aérea. Foi essa imagem de moderninho, construída
antes e depois das eleições, que o ex-governador de Alagoas encampou para ser
nosso primeiro presidente eleito no pós-ditadura militar. Há uma explicação:
esporte é sinônimo de juventude. E um candidato com pouca idade era o desejo do
país, que saía da ditadura e queria novidade política. Em 1997, o trabalhista inglês
Tony Blair usou tática parecida para tirar do poder conservadores que
governavam havia 18 anos. Mais jovem primeiro-ministro britânico no século,
Blair abusou da música pop. Foi embalado por “Things Can Only Get Better”, hit
do D:Ream, e “Praise”, do DJ Fatboy Slim. Se você tem vergonha do presidente
esportista, imaginar Blair requebrando ao som da música eletrônica talvez traga
consolo. Ajuda?

Família, famíla

O que você vê - O candidato ao lado da família


Eles querem que você veja - Uma pessoa íntegra, que pensa no futuro

O truque - Paulo Maluf queria ser prefeito de São Paulo em 1992 e tinha um
problema: o PT exibiu no horário eleitoral a fita em que ele dizia a famosa frase:
“Está com vontade sexual? Estupra, mas não mata”. Era a primeira comprovação
de que Maluf realmente falara o que não se fala. A solução publicitária: um filme
em que, cercado pelas mulheres da família, o candidato pedia desculpas pela
declaração. Esposa, filhas, noras, netas. O objetivo era mostrar que Maluf não
poderia desejar para a mulher dos outros o que não desejaria para a sua. Exibir a
família é um elixir da integridade. E deixa mais simpático no vídeo qualquer
sujeito com fama de arrogante e durão. Quem pode fazer o mal sabendo que suas
pessoas mais queridas também serão vítimas do erro? Seguindo a linha de
raciocínio, político que tem filhos pensa no futuro. E Maluf foi eleito.

A realidade é uma ilusão

O que você vê - Um político sem terno

Eles querem que você veja - Um homem ágil e trabalhador

O truque - A equipe de propaganda do americano George W. Bush é considerada a


mais insaciável de todos os tempos: todo dia é dia, toda hora é hora. Qualquer
evento que tenha participação do presidente é planejado como uma etapa da
construção de sua imagem. Para fazer o anúncio de um plano econômico, por
exemplo, escolheu-se um dia chuvoso. Bush apareceu ao ar livre, com os cabelos
molhados e sem gravata, para transmitir a imagem de trabalhador, como aqueles
que seriam influenciados pelo projeto. Publicitários também ordenaram que todos
os burocratas servindo de cenário para o anúncio retirassem as gravatas. Justiça
seja feita: John Kerry, adversário de Bush nas próximas eleições, usa o mesmo
expediente. Aparece de jaqueta, com a gola da camisa aberta e as mangas
arregaçadas. É para dar uma cara de povão e trabalhador à sua imagem de
aristocrata e palerma.

Promessa é número

O que você vê - Números piscando na televisão

Eles querem que você veja - A solução para todos os seus problemas

O truque - Especialistas em marketing político não dão bola para a teoria de que o
povo cansou de promessas. Para os publicitários, candidato que não promete é
como cerveja quente: mais sem graça, impossível. E na política, promessa é
número. Piscando na tela e bem grande, de preferência. É preciso mostrar quantas
casas serão construídas. Quantos carros de polícia serão comprados. O valor do
salário mínimo. Afinal, por que o eleitor votaria em alguém que não vai lhe trazer
benefícios? É por isso que Lula e Serra se engalfinharam prometendo 15 e 10
milhões de empregos, respectivamente, mesmo sabendo que cumprir a meta seria
difícil no mais positivo dos cenários econômicos. Aí mora o problema: números são
uma cilada. Ajudam a ganhar a eleição. Mas, quando não são cumpridos, viram
munição para os adversários no próximo pleito.
De líder sindical a metrossexual

O que você vê - Um político em situação oposta à que você imagina

Eles querem que você veja - Um novo homem, com novas propostas

O truque - Para provar que abandonou idéias que defendia no passado, um


candidato precisa surpreender o eleitor. Mudar a embalagem para mostrar que o
produto lá dentro tem novo sabor. Pegue o caso do presidente Lula, político com
fama de radical. Para demonstrar a veracidade das novas e moderadas propostas,
Lula deu um tapa no estilo. Foi de metalúrgico com faca nos dentes ao resumo do
macho moderno: ternos de grife, cuidados com a aparência e delicadeza no trato
com os adversários. Mudar também foi a tática para eleger Ariel Sharon primeiro-
ministro de Israel. Homem de guerra, truculento, ele precisava convencer o
eleitorado de que traria paz. Para isso, apareceu nas propagandas com os netos,
cuidando de seu rancho no interior (analistas dizem que ele parecia um idoso
sexualmente impotente). Deu tão certo que o bom velhinho foi eleito – inclusive
com votos da esquerda, sua inimiga histórica.

Fonte: Revista Superinteressante

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