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The Portuguese Empire in Asia, 1500-1700

Sanjay Subrahmanyam

Creating an Empire, 1498-1540 (pp. 55-79)

As hostilidades entre portugueses e mouros na Índia começaram logo na segunda


viagem, a da armada comandada por Cabral enviada para o Oriente em 1500.

Os portugueses distinguiram logo desde o início os “mouros da terra” (populações


muçulmanas autóctones) dos “mouros de Meca” (muçulmanos provenientes do Médio
Oriente). Inicialmente não são reconhecidas as populações hindu e budista. Os não-
muçulmanos são entendidos como cristãos pelos portugueses. Deve-se certamente ao
mito da pregação de S. Tomé na Índia, a qual teria originado comunidades cristãs.

O tempo decorrido entre a viagem de Bartolomeu Dias (1487-88) e a de Vasco da Gama


(1497-98) pode ser devido às conturbações políticas na Corte, onde uma vasta facção
dos nobres se opunha à empresa indiana por esta colocar o rei numa posição de grande
poder graças a ser o principal agente do comércio e por se interessarem na expansão no
Norte de África, que lhes traria mais vantagens. Outro motivo apontado é o total
desconhecimento da geografia da Índia e da navegação no hemisfério sul, o que
requereu aos portugueses que avançassem com cautela e primeiro organizassem várias
viagens de exploração das melhores rotas.

A viagem do Gama foi alvo de hostilidades ao longo da costa oriental de África, mas foi
relativamente bem recebida em Calecut. As fontes enfatizam bem o objectivo de,
através da chegada à Índia, D. Manuel afirmar o seu poder perante os outros monarcas
europeus.

Devido à falta de preparação diplomática (presentes de reduzido valor), a embaixada do


Gama não obteve grande sucesso em captar a simpatia do Samorim de Calecut.
Regressaram a Portugal insatisfeitos e desconfiados. A segunda armada, enviada em
1500 e comandada por Cabral, já ia preparada para entrar em combate. Consistia em 13
embarcações e levava cerca de 1000 homens a bordo. Cabral preteriu Calecut devido
aos conflitos de despoletaram e instalou-se em Cochim.

Na primeira fase da instalação portuguesa na Índia (1498-1505), não existe uma


hierarquia estabelecida. As operações são controladas pelo capitão-mor que chefia a
armada, podendo haver mais do que um em simultâneo. Em 1505, D. Francisco de
Almeida foi nomeado vice-rei da Índia, o primeiro a ocupar tal cargo.

1502 – Vasco da Gama, na sua segunda viagem, instala a primeira feitoria na Índia, em
Cochim.

Durante o período 1503-04, gera-se um conflito entre dois capitães-mor, D. Francisco


de Albuquerque e o seu meio-irmão Afonso de Albuquerque. O primeiro era um
fidalgo, desconfiado, portanto, das políticas expansionistas do rei. O segundo era um
bastardo apadrinhado por D. Manuel, o que fazia dele um exímio representante das
políticas régias.
Gerou-se um triângulo comercial entre Lisboa, a África Oriental e a Índia. Os navios
portugueses compravam têxteis na Índia para trocar em África por ouro para com este
comprarem as especiarias na Índia para trazerem para Lisboa.

O regimento entregue a D. Francisco de Almeida quando este partiu para a Índia em


1505 reconhecia a actividade de corso, reservando uma quinta parte do saque para os
cofres reais, embora esta prática não fosse de tanto interesse para a Coroa, mas sim para
a fidalguia.

A abertura da rota do Cabo e a chegada das especiarias à Casa da Índia em Lisboa, a


qual depois as comerciava pela Europa, destruiu os mercados das cidades italianas e dos
potentados muçulmanos que serviam de intermediários na rota do Levante. Os
venezianos aliaram-se ao Sultanato do Egipto e a outras potências que participavam no
comércio do Índico para fazer frente à ameaça portuguesa no Oriente. A frota
muçulmana foi derrotada pelos portugueses junto ao porto de Diu em 1509.

Durante o seu vice-reinado (1505-09), D. Francisco de Almeida tratou de cumprir o


plano de construir uma fortaleza em Socotorá para controlar o fluxo comercial entre o
Índico e o Mar Vermelho. D. Manuel pretendia interceptar a rota do Levante e garantir a
sua exclusividade no comércio das especiarias na Europa.

Afonso de Albuquerque sucedeu a D. Francisco de Almeida no governo do Estado da


Índia em 1509, embora com o título de governador e não de vice-rei, visto que esta
nomeação recebia bastante oposição por parte da fidalguia da Corte que se opunha à
centralização do poder na figura do rei. Albuquerque tratou de ocupar e fortificar vários
pontos-chave do Índico, incluindo Goa (1510), Malaca (1511) e Ormuz (1514).

Os feitores respondiam directamente perante o rei e não perante o governador, pelo que
Albuquerque encontrou algumas resistências, tendo procurado que fossem instalados
apoiantes seus nas feitorias. Os seus opositores pretendiam que houvesse uma ocupação
mais escassa na Índia e que houvesse maior liberdade para as actividades de corso e
outros empreendimentos privados, ao passo que Albuquerque levava a cabo uma
política de maior controlo por parte do poder régio ali representado por ele. Os seus
opositores conseguiram fazer valer a sua vontade junto da Corte e D. Manuel nomeou
Lopo Soares de Albergaria, sobrinho do Barão de Alvito, como seu sucessor no cargo
de governador após a sua morte em 1515.

Desde cedo que os portugueses tiveram o objectivo de controlar o comércio a leste do


Cabo Comorim. A ocupação de Malaca em 1511 permitiu estabelecer rotas comerciais
regulares no Índico Oriental e no Extremo Oriente. Importa clarificar que este comércio
interasiático não era feito em navios portugueses, mas sim em embarcações locais com
representantes portugueses a bordo. Este sistema de carreiras (empreendimentos
comerciais entre a Coroa e privados) permitia que houvesse um fluxo constante de
mercadorias entre Pulicat e o arquipélago das Molucas via Malaca, no Índico Oriental, e
entre Ormuz e Goa, no Índico Ocidental.

A política de “grande soltura” comercial do governador Lopo Soares, por oposição ao


dirigismo de Albuquerque, deu grande abertura aos empreendimentos privados
(carreiras e corso) no Índico.
Os governadores que sucederam (Diogo Lopes de Sequeira e D. Duarte de Meneses)
procuraram levar a cabo uma acção mista entre a que Albuquerque e de Lopo Soares,
dando liberdades a privados, mas também controlando as actividades levadas a cabo
sem o consentimento da Coroa. A partir da década de 1520, as feitorias portuguesas no
Índico Ocidental aproximaram-se mais do modelo das praças norte-africanas, sendo
compostas por uma guarnição de algumas centenas de homens armados e contando com
a presença permanente de mercadores (os “casados”).

No Índico Oriental, a presença portuguesa era feita por um número muito mais reduzido
de feitorias (sobretudo Malaca e as Molucas). A principal presença portuguesa era a de
mercadores privados que agiam muitas vezes à revelia da Coroa para proveito próprio,
convertendo-se ao Islão e agindo em nome dos monarcas locais. Esta situação era
problemática para o poder central sediado em Goa.

Os portugueses instalaram-se no arquipélago das Molucas não só para controlar o


comércio na região, mas também para assegurar o domínio face às pretensões de
Castela.

Por volta de 1525 estavam então estabelecidos dois padrões diferentes de ocupação e
exploração. No Índico Ocidental, uma presença militar mais forte e contínua e maior
capacidade de acção por parte dos representantes do poder régio (governador, capitães e
feitores). No Índico Oriental, decorria uma maior actividade de privados devido à
existência dum controlo mais ténue por parte das autoridades oficiais, contexto que
permitia a ascensão dos elementos mais marginais da sociedade.

Há que ter em conta que os valores das vendas da Casa da Índia em Lisboa não
traduzem a totalidade do comércio português no Oriente. Visto que o Médio Oriente era
também ele um mercado para a venda das especiarias e muito dificilmente se podia
abastecer em Lisboa, os portugueses começaram a comerciar as especiarias também em
Ormuz a fim de melhor explorar o mercado do Levante. É preciso conjugar não só o que
chegava a Portugal, mas também o que era comerciado na Ásia e em África para se ter
uma noção da dimensão do comércio português.

Juridicamente, o direito ao comércio e navegação na Índia, que D. Manuel condensou


no seu título de “senhor da conquista, navegação e comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e
Índia”, adveio-lhe da bula Romanus Pontifex concedida pelo papa Nicolau V a D.
Afonso V em 1455, a qual outorgava ao rei português o direito exclusivo de controlo
sobre a navegação feita até à Índia (usque ad indos). D. Manuel, ao estender o seu poder
a todo o Oceano Índico, estava a fazer uma interpretação muito lata da bula Romanus
Pontifex.

D. Manuel pretendeu tornar-se soberano de tantos monarcas asiáticos quanto possível


com vista à cobrança de “páreas” (tributos). Aos navios asiáticos das potências aliadas e
súbditas que comerciavam no Índico concedeu “cartazes” (salvo-condutos que lhes
permitiam efectuar comércio mediante o pagamento duma taxa à Coroa portuguesa).
Mais do que o montante das páreas, interessava ao rei o aumento do número de
monarcas submetidos ao pagamento delas. D. Manuel e D. João III procuraram um
domínio mais extensivo do que intensivo, interferindo pouco nas políticas dos príncipes
locais e respeitando a organização administrativa destes reinos. Este cenário, contudo,
começou a mudar a partir da década de 1540.
A partir da década de 1530, visto que começara então a ocupação do Brasil mediante o
sistema de capitanias-donatárias, gerou-se uma crise de recursos humanos, pois um
reino que os tem tão escassos, como era o caso de Portugal, tem agora de os dividir
entre três continentes: África, Ásia e América.

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