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O VERBO DA VIDA

1 João 1:1-4

1 O que era desde o princípio, o que temos ouvido, o que temos visto com os nossos próprios olhos, o que
contemplamos, e as nossas mãos apalparam, com respeito ao Verbo da vida
2 ( e a vida se manifestou, e nós a temos visto, e dela damos testemunho, e vo-la anunciamos, a vida eterna, a
qual estava com o Pai e nos foi manifestada,
3 o que temos visto e ouvido anunciamos também a vós outros, para que vós, igualmente, mantenhais comunhão
conosco. Ora, a nossa comunhão é com o Pai e com seu Filho, Jesus Cristo.
4 Estas coisas, pois, vos escrevemos para que a nossa alegria seja completa.

INTRODUÇÃO

Iniciamos a exposição da carta de 1 João. A epístola, não se distanciando do enfoque


comum das cartas gerais, trata de orientar a igreja acerca dos perigos dos falsos mestres e
das heresias que tentavam se estabelecer em seu meio. Ademais, 1 João traz incentivos à
santificação e a firmeza em Cristo, confirmando a consciência dos crentes para que saibam
que “tendes a vida eterna, a vós outros que credes em o nome do Filho de Deus” (5.13).

I – UM PANORAMA DA EPÍSTOLA

O autor da epístola é o apóstolo João. As evidências internas apontam que o estilo,


linguajar e outros elementos se assemelham muito ao evangelho de João, o que, indicam,
terem saído da pena do mesmo escritor. Os pais da igreja quase que unanimemente
concordam com essa posição.
Augustus Nicodemus mostra que o testemunho da igreja ao longo dos séculos confirma
a autoria joanina, cita, dentre outros, Policarpo (69-155 d.C.), Papias (60-130 d.C.), Irineu
(140-200 d.C.), Clemente de Alexandria (150-215 d.C.) e Tertuliano (155-220 d.C.). Todos
confirmando de alguma forma que o apóstolo João era o autor da carta1.
Foi escrita por volta das últimas décadas do primeiro século, possivelmente entre 80-
90 d.C, após a publicação do quarto evangelho.
O público alvo é difícil de se identificar possivelmente porque a carta pode ter sido
escrita para circular pelas igrejas de uma região inteira, provavelmente as mesmas igrejas
as quais são direcionadas posteriormente o livro do Apocalipse; Éfeso, Esmirna, Laudiceia,
etc. “João escreveu essa carta às igrejas dessa região, talvez às mesmas (ou a algumas delas)
para as quais enviaria, mais tarde, o livro de Apocalipse (Ap 1.11)”2.
Além dos dados como autoria, data e público alvo, é importante informar o que estava
acontecendo espiritualmente nas igrejas daquela região, ou seja, identificar o problema
básico causador da missiva, além de mostrar, como consequência, o objetivo do apóstolo
com o ensino propagado.
Existe uma concordância entre os comentaristas bíblicos de que naquele momento a
igreja estava sendo alvo da ação de falsos mestres com suas heresias. Apesar da dificuldade
em clarificar detalhes do falso ensino, pontos gerais são reconhecíveis. Os principais
problemas giravam em torno da encarnação de Cristo, do reconhecimento de sua Divindade
além de problemas com a moralidade, doutrina e convício social. Tudo isso, pode ter sido
gerado por uma espécie de gnosticismo embrionário, uma heresia que atacou ferozmente a
igreja nos três primeiros séculos.
Assim, o objetivo do texto é duplo:

1
LOPES, Augustus Nicodemus. Interpretando o Novo Testamento: Primeira Carta de João. São Paulo: Cultura Cristã, 2004.
2
Idem. p. 11.
Primeiro, expor os erros doutrinários dos falsos mestres que estavam disseminando
essas doutrinas, conforme ele mesmo afirma: "Isto que vos acabo de escrever é acerca
dos que vos procuram enganar’' (2.26). Segundo, confirmar os verdadeiros crentes na
doutrina dos apóstolos e na certeza de salvação: "Estas coisas, pois, vos escrevemos
para que a nossa alegria seja completa” (1.4). “Estas coisas vos escreví, a fim de saberdes
que tendes a vida eterna, a vós outros que credes em o nome do Filho de Deus” (5.13).

Nesse contexto é que o apóstolo escreve sua epístola visando fortalecer a igreja do
Senhor. Evidentemente, tal carta, apesar dos objetivos imediatos, tem muita serventia à
igreja do Senhor em toda parte e tempo, uma vez que os problemas, mesmo com formato
diferentes, ainda podem vir com a mesma essência: heresias que tentam negar o Soberano
Senhor Jesus Cristo!

II – O VERBO DA VIDA: A ENCARNAÇÃO

O gnosticismo é uma heresia complexa, um amálgama de várias influências religiosas,


com filosofia grega e misticismo. Um de seus fundamentos proveio do neoplatonismo fazendo
com que se negasse a matéria, que seria intrinsicamente má, pecado, e afirmasse o espírito,
que seria bom. Assim, havia uma oposição entre matéria e espírito. Um princípio bom contra
outro ruim. Só esse falso entendimento da realidade era capaz de conturbar todo o sistema
cristão. Senão vejamos.
A ameaça do equívoco gnóstico logo foi sentida por suas consequências desastrosas.
Se o pensamento de que a matéria era intrinsicamente má fosse verdadeiro, logo, não seria
viável a encarnação de Cristo, uma vez que o Senhor não viria e se misturaria com o mal.
Assim, o efeito da heresia já atingia um ponto crucial do evangelho: a encarnação de Jesus
Cristo.
Mas, como os gnósticos explicavam a dinâmica da encarnação? Duas foram as
principais explicações.
A primeira vindo de Basílides. Segundo ele Jesus somente poderia ter sido um homem
comum. Contudo, em seu batismo, o ‘éon’ Cristo teria descido sobre o homem Jesus e teria
ficado com ele até a cruz, ocasião em que o deixou. Por outro lado, Valentino propunha outra
explicação, negando que Jesus realmente era humano. Segundo ele, Jesus não podia ter um
corpo humano como o nosso: deve ter sido um corpo etéreo, eônico. Parecia um corpo, mas
não era. Esse ensino se chamou “docetismo”, do grego dokeo, ‘aparentar, parecer’. Jesus
parecia homem, mas não o era em realidade3.
Diante disso, o apóstolo não tem nenhuma letargia em imediatamente escancarar: “a
vida se manifestou, e nós a temos visto” (v.1), numa clara alusão à encarnação de Cristo. O
termo ‘manifestar’ é muito utilizado pelo apóstolo e geralmente com o sentido da vinda de
Jesus Cristo. Então, o manifestar aqui está relacionada à verdadeira encarnação, ao
momento em que o Senhor assumiu a forma de homem, a vida humana.
Ademais, o Senhor realmente veio em carne, ao contrário do que falava Valentino, que
Jesus apenas parecia homem, mas não era. O apóstolo disse que seus olhos viram, seus
ouvidos ouviram e suas mãos apalparam! Ele era de carne e osso de fato! Era 100% homem.
A grande mensagem de João é que a vida se manifestou (1.2). O verbo se fez carne e
habitou entre nós (Jo 1.14). Deus veio morar com o homem. O infinito entrou no finito.
O eterno entrou no tempo e foi manifestado aos homens. O divino fez-se humano. Aquele
a quem nem os céus dos céus podiam conter deitou numa manjedoura e foi enfaixado
com panos. Ele comunicou-se com os homens, fazendo-se homem. O Criador do
universo nasceu entre os homens. A encarnação é uma verdade bendita e gloriosa, é o
raiar do Sol da Justiça na escuridão da história humana 4.
APLICAÇÃO

É muito perigoso um falso ensino sobre a encarnação. Qualquer que seja a direção que
ele leve, conduzirá para distante da realidade salvífica da obra de Jesus Cristo. Vejamos
alguns sérios problemas.

3
Idem. p. 22-23.
4
LOPES, Hernandes Dias. 1, 2 e 3 João: como ter garantia da salvação. São Paulo: Hagnos, 2010. p. 44.
1- Negar a encarnação. Não aceitar a encarnação é dizer não à toda obra realizada por
Jesus Cristo. Ele mesmo se considera aquele que fora enviado por Deus, que entrou
no mundo para salvá-lo. Ele é o Emanuel, o Deus conosco! Negar a encarnação é
admitir, na melhor das hipóteses, um evangelho apenas social, terreno. É esvaziar o
sentido sobrenatural da ação, tirar a obra do Deus-homem de cena! Sem a encarnação,
não haveria nenhuma identificação real de Jesus Cristo com o homem. Não seria
possível o pagamento do pecado, a redenção, a obra substitutiva. O Senhor não levaria
sobre si “nossas dores”, o “castigo que nos traz a paz” não poderia estar sobre ele.
Quem pecou e transgrediu a lei de Deus foi um homem, logo somente um homem
poderia pagá-la. “Não foi alguém estranho à raça humana que morreu na cruz. Ele era
um dos nossos e, portanto, poderia realmente oferecer um sacrifício em nosso favor”5.
2- Desprezar a encarnação. O evangelho não é apenas falar do nascimento de Jesus, de
sua obra em vida, de seu sofrimento e sua morte. Somente essa mensagem está
distante do padrão de alcance da mensagem bíblica. É preciso considerar a
encarnação. O evangelho não é apenas a narrativa de um nascimento, é o fato da
encarnação de Deus, o nascimento do Deus-homem. A vinda de Deus à terra em forma
humana. A visita do Soberano a nossa terra. A entrada do Criador no espaço/tempo.
É fácil para muito aceitar o nascimento do belo bebê em datas como o natal, por
exemplo, contudo, isso não é a essência do evangelho! O evangelho clama para que se
aceite, além do nascimento, a encarnação do Deus-homem. Além da vida do menino
Jesus, a realidade do Deus-homem.
3- Negar a humanidade. Sem a encarnação de Cristo não teríamos a realidade do Deus-
homem, não teríamos a humanidade de Cristo. Isso poderia causar algumas
dificuldades. Concordando com Erickson, a humanidade de Cristo é essencial, pois
assim: a) Jesus pode realmente ter empatia para conosco e interceder por nós. Ele
experimentou tudo o que podemos sofrer. Quando sentimos fome, cansaço, solidão,
ele compreende plenamente, pois ele mesmo passou por tudo isso (Hb 4.15); b) Jesus
pode ser nosso exemplo. Ele não é algum superastro celestial, mas alguém que viveu
onde vivemos. Podemos, portanto, voltar-nos para ele como a um modelo da vida cristã.
Nele, vê-se que os padrões bíblicos de comportamento humano, que nos parecem tão
difíceis de atingir, estão dentro da possibilidade humana; c) a natureza humana é boa.
Quando tendemos para o ascetismo, considerando a natureza humana e, em especial,
a natureza física, algo inerentemente mau ou, pelo menos, inferior ao espiritual e
imaterial, o fato de Jesus ter assumido sobre si toda a nossa natureza humana é um
lembrete de que ser homem não é mau, é bom; d) Deus não é totalmente
transcendente. Ele não está tão distante da raça humana. Se pôde realmente viver
entre nós por um tempo como uma verdadeira pessoa humana, não é de surpreender
que possa atuar e de fato atue no âmbito humano também hoje6.

III – O VERBO DA VIDA: A DIVINDADE

Se por um lado é errado negar a humanidade de Jesus Cristo, por outro lado é
igualmente ruim negar sua divindade. A heresia de Basílides ia nesse sentido. Ele afirmava
que Jesus não era divino, que “o Cristo” somente havia descido sobre ele após o batismo
para usá-lo em sua obra; quando da crucificação “o Cristo” se retirara, deixando Jesus
sozinho na cruz!
Nesse sentido, corrigindo as deturpações quanto à divindade de Jesus Cristo, João
trabalha a deidade do Senhor.
O primeiro versículo dispara: “O que era desde o princípio” (v. 1) em alusão à
eternidade de Jesus Cristo. O mesmo apóstolo escreveu em seu evangelho: “No princípio era
o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no princípio com Deus”.
(João 1.1-2).

5
ERICKSON, Millard J. Introdução à teologia sistemática. São Paulo: Vida Nova, 1997. p. 297.
6
Idem.
O princípio está relacionado ao começo absoluto de todas as coisas, aquele mesmo
começo do evangelho de João. Assim, o autor está afirmando que antes mesmo da criação,
Jesus Cristo já existia. Ele é o eterno. O atributo da eternidade é divino. Ninguém é eterno a
não ser o próprio Deus. Não se pode dizer de mais nada nem ninguém que existia desde o
princípio! “O Filho Eterno era antes de sua manifestação histórica. Ele nunca passou a
existir, porque ele sempre existiu em comunhão perfeita com o Pai, na harmonia do amor da
trindade divina” (5.7; Jo 17.24)7.
Assim, claramente João já postula a divindade do Senhor Jesus Cristo. Tal
reconhecimento é extremamente importante para a igreja, na verdade, indispensável.
Quando João utiliza o termo “Verbo” também está apontando para a divindade. O
Verbo, ou Logos, já era uma expressão conhecida no mundo grego. “A filosofia grega daquela
época afirmava a existência do Logos, um princípio racional e impessoal que governava o
universo e o destino dos homens, e que interpenetrava todas as coisas”8. Contudo, João faz
uso diferenciado, com novo sentido. O Logos não era impessoal, mas o próprio Jesus Cristo!
Assim, ele está falando que Jesus Cristo é o princípio racional, pessoal que governa o
universo e o destino dos homens, descrição que cabe perfeitamente com Deus. Augustus
Nicodemus ainda arrisca a dizer:
É possível também que João se refira a Jesus como a palavra de Deus, pensando no
relato da criação em Gênesis, onde se diz que Deus criou todas as coisas meramente
com a sua palavra. Assim, este título aponta para a plena divindade de Cristo,
enfatizando em especial seu papel como agente de Deus, aquele que executa os planos
divinos (veja Jo 1.3) e traz vida e luz aos homens (Jo 1.4) 9.

Cristo como a palavra de Deus evidencia ainda mais outros atributos da divindade
como a onipotência. Ele esteve participando da criação, formando todas as coisas com seu
poder, o que, está em consonância com outras afirmações das Escrituras, como: “Tudo foi
criado por meio dele e para ele” (Colossenses 1.16).
João ainda diz que Jesus Cristo é a vida eterna. Novamente a eternidade sendo
mencionada. O Senhor Jesus além de ser a vida eterna, trouxe a vida eterna aos homens.
Vida eterna não apenas no sentido de infinidade, mas no sentido de uma vida em abundância
para sempre. Vida eterna traz o sentido ideal de toda aquela existência perfeita com Deus.
“Em Jesus e nele somente o homem pode vencer a morte e viver abundantemente tanto agora
como na eternidade. Em Jesus a própria vida de Deus jorra dentro de nós como uma fonte
que salta para a vida eterna. Em Jesus temos vida maiúscula, superlativa, abundante e
eterna”10. Somente Deus pode ser a vida eterna e trazer a vida eterna!
Em outro momento o apóstolo irá reafirmar, com outros argumentos, que Jesus Cristo
é inquestionavelmente Deus! Ele é o Deus-Filho.

APLICAÇÃO

Tão pernicioso quanto negar a humanidade de Cristo é negar sua divindade. Não
reconhecer que Cristo é o próprio Deus igualmente impossibilita a aplicação de sua obra na
vida do homem. Infelizmente, ainda temos muito pseudocristianismo insistindo nessa torpe
heresia, negando a divindade do Senhor Jesus Cristo. A igreja deve manter-se sempre alerta
e renegar tais ensinos. De fato, nosso brado deve expressar: Jesus Cristo é Deus!
Vejamos algumas implicações de se considerar a divindade de Cristo, de acordo com
Erickson.
1) Podemos ter conhecimento real de Deus. Jesus disse: “Quem me vê a mim vê o Pai”
(Jo 14.9). Enquanto os profetas vinham trazendo uma mensagem de Deus, Jesus
era Deus. Se quisermos saber como é o amor de Deus, a santidade de Deus, o poder
de Deus, só precisamos olhar para Cristo.

7
LOPES, Hernandes Dias. 1, 2 e 3 João: como ter garantia da salvação. São Paulo: Hagnos, 2010. p. 38.
8
LOPES, Augustus Nicodemus. Interpretando o Novo Testamento: Primeira Carta de João. São Paulo: Cultura Cristã, 2004.
8
Idem. p. 29.
9
Idem.
10
LOPES, Hernandes Dias. 1, 2 e 3 João: como ter garantia da salvação. São Paulo: Hagnos, 2010. p. 41.
2) A redenção está à nossa disposição. A morte de Cristo é suficiente para todos os
pecadores de todos os tempos, pois quem morreu não foi um mero homem finito,
mas um Deus infinito. Ele, a Vida, o Doador e o Mantenedor da vida, que não
precisava morrer, morreu.
3) Deus e a humanidade foram religados. Não foi um anjo ou um homem que veio da
parte de Deus para nós, mas o próprio Deus cruzou o abismo criado pelo pecado.
4) É correto adorar a Cristo. Ele não é apenas o mais elevado das criaturas, mas é
Deus no mesmo sentido e no mesmo grau que o Pai. Ele merece, tanto quanto o
Pai, nosso louvor, nossa adoração e nossa obediência11.

IV – O ANUNCIO DO VERBO DA VIDA E A COMUNHÃO

Diante dessa realidade, da encarnação, da humanidade e divindade de Jesus Cristo,


o apóstolo, como testemunha ocular não pode ficar simplesmente quieto. Sua missão como
apóstolo é justamente trazer o entendimento à igreja, ser pilar da verdade, e orientar a
comunidade na sã doutrina.
O testemunho de João é recheado de sinceridade. Ele afirma que é testemunha ocular
de tudo. Ressalta que viu, ouviu e tocou no Senhor. Os seus principais sentidos estavam em
alerta testificando a realidade.
No evangelho ele chega a dizer: “Vimos a sua glória, glória como do unigênito do Pai”
(João 1.14). Nesse sentido, acompanha o que disse Pedro: “Porque não vos demos a conhecer
o poder e a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo seguindo fábulas engenhosamente
inventadas, mas nós mesmos fomos testemunhas oculares da sua majestade” (2 Pedro 1.16).
O motivo desse anúncio a cristãos é um pouco diferente do que foi feito no evangelho.
No evangelho, João nitidamente tinha o objetivo de ‘evangelizar’ não crentes “(...) Estes
(sinais), porém, foram registrados para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus”
(João 20.31). Nesta carta, fortalecer cristãos! “Estas coisas vos escreví, a fim de saberdes que
tendes a vida eterna, a vós outros que credes em o nome do Filho de Deus” (5.13).
Por isso ele introduz o tema da comunhão. Ele está anunciando esses fatos para que
a igreja mantenha comunhão com ele e os apóstolos. Mas, qual o sentido dessa comunhão?
A ideia é a igreja manter a unidade no pensamento e entendimento acerca do Filho de Deus.
A comunhão vista aqui ultrapassa quaisquer projetos ou compromissos externos, ela
está relacionada realmente com o aspecto doutrinário! A doutrina, ao contrário do que muitos
pensam, ao contrário de causar divisões, é vista como motivo de união!
Essa unidade de pensamento abriria a janela para a comunhão com Deus Pai, pois a
comunhão dos apóstolos era com o Senhor. “Ora, a nossa comunhão é com o Pai e com seu
Filho, Jesus Cristo” (v. 3).
A religião cristã é de comunhão, de reconciliação, de restauração. Segundo Hernandes
Dias Lopes:
O pecado separa, o evangelho une. O pecado separou o homem de Deus, de si mesmo e
do próximo. O evangelho reconcilia o homem com Deus, consigo e com o seu próximo.
Onde o pecado cava abismos, o evangelho constrói pontes. Onde o pecado gerou a morte,
o evangelho trouxe a vida. Onde o pecado abriu fissuras, o evangelho promoveu
comunhão e restauração12.

APLICAÇÃO

A comunhão na igreja e entre as igrejas é um tema precioso, porém difícil. Muitas vezes
tomamos iniciativas num caminho equivocado em busca de promover a comunhão.
A doutrina apostólica é a base para verdadeira comunhão. Boa parte dos esforços
modernos para a unidade entre os cristãos tem ignorado esse princípio fundamental e
tentado promover uma “unidade” que se baseia primariamente em trabalhos conjuntos

11
ERICKSON, Millard J. Introdução à teologia sistemática. São Paulo: Vida Nova, 1997. p. 284.
12
LOPES, Hernandes Dias. 1, 2 e 3 João: como ter garantia da salvação. São Paulo: Hagnos, 2010. p. 51.
de evangelização, obras de caridade, show gospel, marchas para Jesus ou luta em defesa
dos direitos humanos13.

Nossa comunhão não deve prescindir de fundamento doutrinário. De fato, o que faz os
irmãos imediatamente terem um tesouro em comum é o Senhor Jesus Cristo. Temos o
mesmo Senhor, a mesma fé, um só batismo, uma Palavra, um só Deus. A comunhão,
portanto, é estabelecida principalmente quando temos esses elementos espirituais em
comum.

V – A ALEGRIA COMPLETA

João escreve tais coisas, ainda, para que a sua alegria, e dos apóstolos, fosse
“completa”. Não que ele (ou eles) não se alegrassem com a obra, ou com as igrejas. Contudo,
somente com a certeza de que elas ouviriam a mensagem, expurgariam o erro e seguiriam a
sã doutrina, em comunhão com os apóstolos, em concordância doutrinária; somente assim,
e com tais demonstrações, os apóstolos poderiam dizer que sua alegria estaria completa.

APLICAÇÃO

Notemos o quão despojados de desejos humanos e vaidades eram os apóstolos. A


completitude da alegria do apóstolo João não é conseguida, aqui, com alguma conquista
material, com algum bem, valor, direito ou propriedade. Sua alegria se completa quando
desempenha eficazmente sua missão. Quando cuida e pastoreia adequadamente das ovelhas
e vê o resultado. Quando a ameaça do lobo que ronda o rebanho é destruída.
Essa atitude nos serve de ensino. O que tem sido buscado por nós para completar a
nossa alegria? Desenvolver a obra a nós confiada pelo Senhor? O crescimento e prosperidade
do Reino de Deus? ou algum outro elemento como: um carro novo, uma casa nova, um novo
relacionamento, uma conta bancária mais gorda, mais reconhecimento, mais poder. O que
temos buscado para completar nossa alegria?

CONSIDERAÇÕES FINAIS

João tem muito mais a falar para a igreja, essa parte poderia ser considerada apenas
o “prefácio” da obra. Mas, sem titubeios o apóstolo começa a orientar, com firmeza e
segurança, as igrejas.
João fala sobre o Verbo da vida, a encarnação de Jesus Cristo. Indiretamente reafirma
a divindade do Senhor. Mostra a credibilidade da mensagem, uma vez que ele, e outros
apóstolos (“nós” explícito desde o primeiro versículo), foram testemunhas oculares dos fatos.
Por fim, conclui que a unidade no conhecimento doutrinário de Cristo traria comunhão à
igreja e alegria completa a ele.

13
LOPES, Augustus Nicodemus. Interpretando o Novo Testamento: Primeira Carta de João. São Paulo: Cultura Cristã, 2004. p. 31.

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