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A LITURGIA NA HISTORIA

Cada geração cristã que passou pela história deixou sua marca na liturgia, deve-
se afirma-lo com especial razão acerca das primeiras comunidades cristãs. É importante
recordar aqui, a íntima conexão entre liturgia e Escritura nos primórdios da experiência
cristã. Não basta dizer que a Bíblia foi o primeiro livro litúrgico da comunidade a
inspirar a pregação e a prece; falta acrescentar que o culto comunitário teve um notável
papel na própria gestação do Novo Testamento: A Bíblia nasceu da Liturgia, e a
Liturgia é Teologia em ato.
O estudo histórico da liturgia foi oficialmente reconhecido pelo concilio
Vaticano II, que o integra na formação aos ministérios pastorais e à vida religiosa. Além
disso, ele serve como guia para todas as reformas litúrgicas (SC 16 e 23). A liturgia está
no coração da tradição da Igreja, ela é uma herança católica transmitida de geração em
geração, de forma viva. A história da Tradição, da qual a liturgia constitui o coração, é o
lugar onde se manifesta a vontade fundadora de Cristo.
O conhecimento das grandes linhas da história é essencial para entender as
estruturas celebrativas da liturgia atual. O estudo crítico da história passada tem força de
abertura para o futuro.
Apesar da raridade das fontes, que foram salvas das destruições, temos uma
riqueza imensa que nos ajuda a entender a evolução da liturgia no tempo. O que
podemos adiantar que em todo o primeiro milênio, a liturgia era diferente da atual. Era o
regime da tradição oral e de autonomia institucional das Igrejas locais.
Sobre o culto no NT, não encontramos nada além de notas fragmentárias e
incidentais. Além do mais, as primeiras comunidades se caracterizavam pela pluralidade
e sensibilidades muito diferenciadas nas suas expressões litúrgicas. A “falta de
sistemática”, que se observa ser característica do movimento de Jesus, parece refletir-se
também na primeira literatura cristã.Um problema forte que se faz notar é a relação
entre a Torá e a nova aliança vivida em Cristo – que dá lugar a posturas contrapostas
entre os grupos judeu-cristãos e heleno-cristãos. Se não temos muitos dados sobre as
formas litúrgicas, as fontes neotestamentárias nos oferecem maior riqueza e respeito de
uma teologia do culto cristão.
O culto, na qualidade de manifestação típica e universal da religião, exprime o
reconhecimento da união radical que liga o homem com Deus.

I – As raízes judaicas da liturgia cristã:


As atuais investigações acentuam fortemente a conexão genética do culto
cristão, em suas origens, com o mundo judaico, tanto bíblico como extra-bíblico.
Diferentemente das outras religiões, a religião judeu-cristã refere-se fundamentalmente
a acontecimentos históricos, sendo a coluna vertebral do seu culto o conceito de
memória (zikkarôn). A fé de Israel tem seu centro Iahweh, Deus único e pessoal, cuja
presença ativa na história busca libertar salvar seu povo e estabelecer uma aliança de
amor com ele. A experiência básica do Êxodo, como movimento de libertação e
constituição do povo no nível político, traz consigo, no plano religioso, um movimento
de conversão e aceitação da fé em Iahweh, que implica, por sua vez, uma nova categoria
de culto. Todo o culto, na história de Israel, está internamente orientado para relembrar
este acontecimento-chave.
A celebração da Páscoa, que tem suas raízes cósmico-naturalistas, adquire uma
nova significação no nível histórico, chegando a ser um memorial para as sucessivas
gerações. Memorial cuja organização segue a tríplice dimensão: passado, presente e
futuro, à espera de um novo Êxodo definitivo.
A berakah ou bênção judaica, típica do povo judaico, exprime uma percepção
original da realidade divina. Em sua estrutura formal, inclui como prólogo uma
explosão admirativa (bendito seja Iahweh) e uma explicitação dos motivos desse louvor,
com a recordação das grandes obras que Deus realizou em favor do seu povo; comporta
de hábito um duplo tema básico, a criação e a história da salvação. Nessa criação da
alma de Israel, a berakah ou bênção judaica, temos de ver a matriz da eucaristia cristã.
Mas o culto que Iahweh espera do seu povo não pode limitar-se ao louvor
formal, ao gesto puramente exterior, nem a uma atitude interna de adoração, isolados da
vida (cf. Dt 10,12-13; Js 24). Pressupõe uma atenta escuta da Palavra de Deus e um
prolongamento lógico na fidelidade prática à aliança. O encontro com Iahweh
libertador na história, sua celebração agradecida no culto e a resposta coerente na
fidelidade à aliança constituem três momentos básicos e em perfeita continuidade
dentro da vida do povo de Israel. É certo que no decorrer da história, demasiadas vezes
o povo estabeleceu um divórcio prático entre estes componentes. Os profetas atacam
com veemência um culto vazio e formalista, que procura encobrir e justificar, diante de
Deus, os crimes sangrentos e as profundas injustiças no plano social (Am 5,21-24; Is
29,13; Os 6,6; Mq 6,5-8; Is 1,10-17; Is 58,1-8; Jr 7,1-15; Eclo 34, 18-26...). Uma
pequena mostra do que deve ser o verdadeiro culto, encontramos em Dn 3,38-41. A
prática da lei é em si mesmo o novo culto (Eclo 35,1-10). Esta utopia não poderá
concretizar-se se o próprio Deus não se comprometer a transformar os corações pela
raiz, a purificar o interior do homem derramando profusamente seu espírito e
capacitando-o a um novo culto (Jr 31,31-34; Ez 36,25-27), aberto à comunidade de
todos os povos.

II – Os tempos Apostólicos – séc. I:


Jesus de Nazaré vive e atua dentro do sistema de culto do seu povo. Freqüenta
a reunião sinagogal dos sábados, “segundo seu costume” (Lc 4,16; Mc 1,21-39; 3,1-6;
Mt 4,23; 9,35;12,9; 13,54...); participa regularmente também, como um judeu piedoso
de sua época, do culto do templo e das festas anuais de peregrinação (Lc 2,41-42; Jo
2,13; 5,1; 7,2-14; 10,22-23...). Mas por outro lado Jesus transgride com freqüência,
inclusive de modo provocativo, essa ordem cultual de Israel, manifestando sua liberdade
soberana sobre ela, manifestando assim, sua vontade reformadora, como um
prolongamento e uma plenificação da tradição profética. O valor ou a nulidade do culto
dependem do amor e do perdão ao irmão (Mt 5,23-24; Mt 15,5-9, retomando a crítica
aos culto de Is 29,13). Longe de uma mentalidade que busca atribuir virtualidades
mágicas à reiteração de gestos rituais (Mc 7,11, Mt 15,5) e à multiplicação de palavras
nas orações (Mt 6,7), Jesus proclama, no diálogo com a samaritana, um culto em
espírito e verdade (Jo 4,20-24), que Deus espera de seus verdadeiros adoradores e que
Jesus não se limita a ensinar, mas também o vive pessoalmente em toda a sua
existência.
A passagem da antiga para a nova Aliança, não se fez num piscar de olhos, foi
necessário mais de uma geração para que as primeiras comunidades cristãs se separem
definitivamente de Israel e do seu culto. Isto se deu com a destruição do templo, no ano
70. Várias passagens mostram que Paulo continuava a freqüentar o templo. Foi o
judaísmo oficial que decidiu excluir os partidários “da seita” do Nazareno.
O fundamento do novo culto é Jesus Cristo e o seu evangelho. Se a profissão de
fé judaica confessa “o Senhor, nosso Deus é o único Senhor”, a comunidade primitiva
aclama que “Jesus é o Senhor” (Fl 2,11). Cristo é a realidade íntima e perene da
celebração litúrgica e que, em conseqüência, a liturgia é o exercício da fé e a epifania de
Cristo na fé.
A existência íntegra do fiel no mundo, vivida na fidelidade ao espírito de Cristo,
pode chegar a converter-se em “culto espiritual”, no culto perfeito dos últimos tempos
(cf. Rm 12,1ss).
Características da liturgia cristã: Quando o NT fala da celebração litúrgica
usa normalmente os verbos congregar-se e reunir-se (cf. Mt 18,20; 1Cor 11,17.20.33-
34; 14,23.26; At 4,31; 20,7-8; Hb 10,25; Tg 2,2,...). O fato de “reunir-se junto” dos fiéis
é o elemento significativo do serviço litúrgico cristão. Vemos as comunidades
primitivas no NT celebrando, reunidas em assembléia litúrgica, efetuando ritos. O termo
ekklèsia, que evoca na Bíblia grega a assembléia de Israel no deserto, designa, no NT, a
assembléia litúrgica como lugar em que se manifesta a própria existência da Igreja. O
rito de introdução nessa assembléia é o batismo “em nome do Senhor Jesus”, que é
constituído de três elementos: evangelização, fé (metanoia) e batismo (At 2,41; 8,12;
18,8...).
At 2,42 nos apresenta um retrato idealizado da vida da comunidade primitiva. A
descrição desse “sumário” inclui os quatro elementos seguintes: o ensinamento dos
apóstolos e a comunhão fraterna (koinonia), a fração do pão e as orações. Pode-se
concluir que a assembléia cúltica reflete e reproduz as dimensões fundamentais de toda
comunidade cristã que busca o seguimento fiel do seu Mestre.
Os primeiros cristãos, conforme narram os Atos, a fração do Pão: “partiam o
pão nas casas, tomando as refeições com alegria e simplicidade de coração” (At 2,46). É
sem dúvida o ponto culminante da assembléia litúrgica, no qual a cristologização do
culto adquire sua maior densidade. Nisto deve-se reconhecer, à luz de outros textos
bíblicos, seja a “ágape” = refeição fraterna, seja a “ceia eucarística” (cf. 1Cor 11,17-34),
ainda que não possamos definir, na maior parte dos textos, trata-se da refeição religiosa
ordinária, ou da Eucaristia propriamente dita. No séc. I, a Eucaristia é celebrada junto
com uma refeição, especialmente nas comunidades de origem judaica. Junto com a
refeição há o ensinamento dos apóstolos: as comunidades primitivas começavam por
uma didaché, que compreende a recordação das palavras e ações de Jesus, como
certamente a leitura do AT à luz do cumprimento de Jesus; a comunhão fraterna
(koinonia): a refeição em grupo e o serviço de ajuda mútua (coleta de donativos para os
mais necessitados). Percebemos nitidamente esta preocupação com a conexão entre
refeição comunitária e ajuda aos pobres em 1Cor 11,17-34. Essa conexão interna entre a
refeição comunitária e o serviço de ajuda mútua permaneceu cristalizado num duplo
relato arquetípico: o relato da ceia e o da multiplicação dos pães, ambos unidos pelo
mesmo gesto de Jesus, que preside à refeição, dá graças, parte o pão e o distribui. Por
esta razão, a refeição cristã deve dar prosseguimento e prolongar a multiplicação dos
pães. A palavra Koinonia, bem como diaconia, designam no NT a comunhão de mesa
e, ao mesmo tempo, o serviço de ajuda mútua. Este serviço era conhecido e habitual no
judaísmo do séc. I e exibia diversas formas: o dízimo dos peregrinos para os pobres de
Jerusalém, o pouso para os peregrinos estrangeiros, a “escudela para os pobres” em
trânsito e, sobretudo, o costume das sinagogas, nas tardes de sexta-feira, de distribuir a
ajuda semanal para os pobres e viúvas que viviam no país; e as orações. Era normal que
neste conjunto se manifestassem formas de oração judaica, por exemplo a birkat há-
mazon ou oração de bênção (=Eucaristia) e elementos individuais, como aleluia, amém,
hosana... O autor dos Atos, quando fala em oração parece referir-se aos três momentos
tradicionais de oração, dentro da jornada judaica. Com efeito, vemos estes três
momentos de oração serem praticados pelos apóstolos: a oração da hora nona; da hora
sexta; e da hora terça. No final do séc. I é prescrito que a tríplice oração seja feita com o
pai-nosso: “Não rezem como os hipócritas, mas como o Senhor ordenou no evangelho,
rezai assim: Pai-Nosso...” (Didaché, 8)
A comunidade apostólica, embora não tendo ainda uma regulamentação estável
da liturgia, já dispunha de algumas formas litúrgicas próprias. Além dos testemunhos
bíblicos, a Doutrina dos doze apóstolos, e especialmente a Didaché, são duas fontes que
nos dão uma visão da liturgia no primeiro século. “Pela eucaristia, daí graças desta
maneira: primeiramente sobre o cálice: Nós te damos graças, nosso Pai, pela santa vinha
de Davi, teu servidor, que nos revelaste por Jesus, teu servidor. Glória a ti nos séculos!
Depois pelo pão partido: Nós te damos graças, nosso Pai, pela vida e o conhecimento,
que nos revelaste por Jesus, teu servidor. Glória a ti nos séculos! Como este pão partido,
disseminado sobre as montanhas, foi juntado para ser um, que tua Igreja seja ajuntada
da mesma maneira das extremidades da terra dentro do teu reino. Pois a ti pertencem a
glória e o poder por Jesus Cristo nos séculos!” (Didaché, 9).

III – Liturgia nos séculos II – III – A liturgia na era dos mártires


Entre os anos 70 e 140, o cristianismo se estende em diversas regiões e
comunidades cristãs se afirmam em sua própria originalidade; todavia, nesse período, o
desenvolvimento é mais constatável na vida interna da Igreja do que em sua
configuração externa. Permanecem as formas do pensamento judeu-cristão. A
multiplicação das seitas gnósticas (uma das características fundamentais do movimento
gnóstico, é sem dúvida, o dualismo, que implica o desprezo pelo material e corpóreo),
representam um perigoso inimigo do cristianismo nascente. Os autores cristãos vêem-se
obrigados a defender também o lado exterior e material da religião cristã e do seu culto.
Irineu de Lion, perto de final do séc. II, valoriza a oferenda interior do coração, mas
acentua e defende os elementos materiais da fé cristã. Ele mostra que a eucaristia tem
suas raízes na criação material, no pão e no vinho, que são da terra; esses elementos da
criação receberam sucessivas transformações de sentido até chegarem a ser o corpo e o
sangue de Cristo. Para ele, a eucaristia é constituída internamente, por um elemento
celestial, a invocação de Deus, e de um elemento terreno, que é parte da criação material
que procede do próprio Deus (AH 4,18,5 e 5,2,3). No final do século II e no começo do
século III, o cristianismo se liberta do mundo judaico e se difunde por todo o mundo
greco-romano. Destacam-se no discernimento da fé cristã nesta época, Clemente de
Alexandria e Tertuliano.
Enquanto que nos primeiros séculos as características do culto cristão são ainda
vagas e tênues, a partir do século III se mostram muito mais vigorosas e claras. Existe
um certo desenvolvimento da literatura litúrgica. Observam-se novos impulsos
criadores de novas formas litúrgicas, em resposta às necessidades das comunidades
cristãs – cada vez mais robustas na Igreja universal. Duas realidades essenciais marcam
o cristianismo: o batismo e o martírio, marcados por uma forte consciência eclesial. Os
temas como mater ecclesia, sponsa Christi, retornam com freqüência nos autores do
século III.
Nos primeiros séculos a celebração eucarística conhece um tríplice momento
evolutivo: 1) A ceia de Cristo celebrada pelo próprio Jesus Cristo, durante um banquete
situado entre dois ritos, preexistentes, mas transformados por Jesus – rito do pão e do
cálice. 2) A época apostólica logo realizou um esclarecimento, reunindo esses dois ritos
e situando-os no fim do banquete. 3) Mais tarde ocorre uma mudança transcendental
(talvez a maior de toda a história): o abandono do banquete como suporte da celebração.
Assim desaparecem as mesas, com exceção a do presidente, caem em desuso os termos
neotestamentários “fração do pão” e “ceia do Senhor”; a oração de ação de graças, já
unificada, se enriquece progressivamente e alcança uma excepcional importância, a
ponto de dar o nome à celebração em seu conjunto. A partir do séc. II, a designação
empregada de modo mais generalizado é “eucaristia”. As informações litúrgicas, nesta
época nos são fornecidas pelos Padres Apostólicos: a Didaché (70-90), Clemente
Romano (96), Inácio de Antioquia (+130), Policarpo de Esmirna (+156). Entre os
Padres apologistas é importante o testemunho do filósofo e mártir Justino (150):
“No dia que se chama do Sol, celebra-se uma reunião de todos os que habitam nas
cidades e nos campos. Nela se lêem, à medida que o tempo o permita, as Memórias dos
Apóstolos ou os escritos dos profetas. Em seguida, quando o leitor termina, o
presidente, em suas próprias palavras, faz uma exortação e um convite para que
imitemos esses belos exemplos. Levantamo-nos seguidamente todos de uma vez e
elevamos nossas preces; quando terminam, como já dissemos, oferecem-se pão, vinho
e água e o presidente, segundo suas forças, também eleva a Deus suas preces e
eucaristias e todo o povo aclama dizendo: Amém. Prosseguindo vem a distribuição e
participação dos alimentos eucaristizados e o seu envio, por meio dos diáconos, aos
ausentes. Os que tem bens e querem, cada um segundo sua livre determinação, dão o
que bem lhe parece; e o que é recolhido é entregue ao presidente, que com ele socorre
órfãos e viúvas, aos que, por enfermidades ou outras causas, estão necessitados, aos
que estão nos cárceres, aos forasteiros de passagem. Em uma palavra, ele se constitui
provedor dos quantos se acham em necessidade. Celebramos essa reunião no dia do
Sol por ser o primeiro dia, no qual Deus, transformando as trevas e a matéria, fez o
mundo, bem como por ser o dia em que Jesus Cristo, nosso Salvador, ressuscitou
dentre os mortos (Apologias 65 e 67).
Considerações deste texto de Justino: manifesta-se claramente que a celebração
eucarística se afastou do seu quadro natural, o banquete; contudo percebemos a
presença da tríplice dimensão interna da celebração (e da comunidade), tal como nos era
mostrado no sumário de At 2,42: a palavra, a eucaristia propriamente dita e a Koinonia
ou preocupação com os irmãos necessitados.
Por volta de 215, na Tradição Apostólica atribuída ao presbítero romano
Hipólito, pela primeira vez encontramos alguns textos litúrgicos na regulamentação
eclesiástica. Ele, como representante dos círculos conservadores, procura preservar a
tradição de falsificações. Mesmo tradicional, ele reconhece o direito de livre formulação
por parte do Bispo, se este se julgar à altura. Ele deixou escrita uma fórmula de oração
eucarística. A sua oração foi adaptada aos nossos tempos e é mais ou menos a atual
Oração Eucarística nº 2.
Em Tertuliano (+225) e Cipriano (+258), encontramos múltiplas informações
sobre a celebração da Páscoa anual, do domingo, dos sacramentos de iniciação cristã, da
eucaristia e sobre a estruturação da oração e a ordenação do bispo, presbítero e diácono.
No campo litúrgico, como em outros setores da vida da Igreja, é um período de
improvisação e de criatividade. A improvisação pressupunha a fiel observância de
alguns cânones ou princípios tradicionais, isto é, estáveis transmitidos de uma geração a
outra. Por volta da metade do séc. III, como nos atesta a Didascália siríaca, havia em
todas as comunidades cristãs uma organização comum da liturgia eucarística, ao menos
em suas características básicas e fundamentais.
A instituição catecumenal é uma das mais acabadas realizações da Igreja nos
séc. II e III; é o desenvolvimento estruturado do que estava, em germe, presente no
Novo Testamento. Motivos de sua instituição: a importante ação evangelizadora e a
forte vontade de manter a “qualidade” dos novos convertidos e das jovens comunidades
cristãs; mas também a ameaça crescente das seitas heréticas. Segundo Hipólito, o
catecumenato vem a ser um longo tempo de formação religiosa, que costuma durar três
anos e que se caracteriza por um duplo exame: a) Entrada no catecumenato: admissão
e triagem dos candidatos. Estes devem ter como fiador (padrinho) um cristão conhecido,
que possa dar garantia inicial da vontade de conversão do aspirante; b) Formação
doutrinal: período de catequese, garantida pelos “doutores”, que podem ser tanto
eclesiásticos como leigos; c) Preparação precedente ao batismo: o candidato, pela
ajuda do fiador dá provas de sua conversão a Cristo, através da prática do amor, na
visita aos doentes e na ajuda às viúvas. Ritos:
No momento em que o galo canta, serão feitas orações, em primeiro lugar sobre a
água... Eles se desnudarão, e serão batizadas, primeiramente, as crianças. Todos os
que puderem falar por si mesmos o farão. Com relação aos que não possam, seus pais
falarão, ou algum membro da família. Depois serão batizados os homens e, por fim, as
mulheres... No momento fixado para o batismo, o bispo dará graças sobre o óleo... E o
presbítero, tomando cada um dos que recebem o batismo, lhe ordenará que renuncie
dizendo: “Renuncio a ti, Satanás, a toda a tua pompa e a todas as tuas obras”. Depois
que cada um tiver renunciado, (o presbítero) o unge com óleo de exorcismo, dizendo:
“Que todo espírito maligno se afaste de ti”. Dessa maneira, o confiará desnudo ao
bispo ou ao presbítero que se encontra perto da água para batizar. Um diácono
descerá com ele dessa maneira. Quando o que é batizado tiver descido na água, aquele
que batiza lhe dirá, impondo-lhe a mão: “Crês em Deus Pai Todo-poderoso?” e aquele
que é batizado dirá, por sua vez: “Creio”. E então (aquele que batiza), tendo a mão
posta sobre sua cabeça, o batizará uma vez. E depois dirá: “Crês em Jesus Cristo,
Filho de Deus, que nasceu do Espírito Santo da Virgem Maria, foi crucificado sob
Pôncio Pilatos, morreu e ressuscitou ao terceiro dia vivo dentre os mortos, subiu aos
céus e está sentado à direita do Pai; que virá julgar os vivos e os mortos?” e quando (o
que é batizado) tiver dito: “Creio”, será batizado pela segunda vez. Novamente (o que
batiza) dirá: “Crês no Espírito Santo, na Santa Igreja?” O que é batizado dirá:
“Creio”, e assim será batizado pela terceira vez. Depois, quando tiver subido, será
ungido pelo presbítero com o óleo de ação de graças com estas palavras: “Unjo-te com
óleo santo em nome de Jesus Cristo”. Assim, cada qual, tendo-se enxugado, voltará a
vestir-se e, depois disso entrarão na igreja...
Hipólito menciona repetidas vezes uma série de ritos pós-batismais realizados
pelo bispo: imposição das mãos com invocação, unção com óleo de ação de graças,
marca na testa e beijo da paz. Depois os neófitos se unem à comunidade dos fiéis e
participam com eles da eucaristia.
A passagem das casas aos Templos. A partir da segunda metade do séc. III, as
casas não comportando mais o número de novos cristãos, passa-se a construir recintos
próprios para o culto, com uma forma diferente das moradias. É o despertar de uma
arquitetura cristã.
IV _ O Culto cristão na Igreja do Império (313-590) – De Constantino
a Gregório Magno.
A igreja tem diante de si a imensa tarefa de transformar o mundo pagão num
mundo cristão. A nova situação não traz só benefícios, mas também problemas. A
liberdade e a tranqüilidade de que agora goza influem na qualidade de seus numerosos
adeptos. São abundantes as infiltrações do paganismo na base e as intromissões políticas
nos dirigentes da Igreja. Além das esplêndidas “Basílicas”, construídas sobretudo, com
a ajuda do imperador e de membros da sua família, os Bispos são equiparados aos mais
altos funcionários do Império.
É imposta a celebração do domingo, protegida pela lei do Estado. Na segunda
parte do séc. IV delineia-se a estrutura definitiva do ano litúrgico, com a ciclo pascal
e natalício.Os formulários litúrgicos começaram a ser redigidos na segunda a metade do
séc. IV (350) e vão até pelo fim do século VII (680). Muitas fórmulas começaram a
aparecer. Algumas até com falhas. Santo Agostinho, pelo fim do séc. IV, se admira de
que até bispos usavam fórmulas de orações escritas por autores incompetentes e até
heréticos.
Com o fim das perseguições, os mártires da fé se tornam objeto de atenção
especial e de veneração. Por volta da metade do séc. II, a comunidade de Esmirna na
Ásia Menor já celebra a memória anual do seu Bispo o mártir Policarpo.
Neste período vemos o florescer e a rápida expansão do monacato. Esta
instituição vem, em certa medida, substituir o martírio da época precedente. Numa
Igreja favorecida pelos privilégios imperiais, há a nostalgia do combate e da valentia
heróica das épocas de perseguição por causa do Senhor. A “fuga do mundo” procura
suprir, com renúncia e mortificação, a entrega do martírio; como explicarão mais tarde
os monges irlandeses, o martírio branco substituiu o martírio vermelho.
As empreitadas missionárias e as peregrinações constituem um dos fatores da
evolução da liturgia neste período. O famoso Diário de Viagem da peregrina Egéria
(381-384) é um testemunho de grande riqueza para a investigação litúrgica desses
séculos.
Durante mais de três séculos, a liturgia de Roma foi celebrada em grego. A
latinização da Igreja de Roma realizou-se de maneira progressiva, passando
necessariamente por uma época de bilingüismo. A passagem do grego para o latim
viria a ser efetuada no pontificado do papa Dâmaso (366-384). Até o séc XX elas
permaneceriam no latim.
Durante o período que vai do séc. VI ao VIII, as liturgias latinas apresentam-se
regionalmente diversificadas, não tendo ainda a liturgia de Roma a predominância que
adquiriria nos períodos seguintes. Os Padres, como Santo Agostinho e São Gregório
Magno, tem consciência das diferenças litúrgicas e afirmam que estas não quebram a
unidade da fé.

V - De Gregório Magno a Gregório VII – (590 –1073)


Gregório Magno – nobre e solidamente formado nas artes e no direito, eleito
prefeito de Roma, renuncia e torna-se monge. Eleito bispo, desenvolveu uma ação
pastoral muito atenta à psicologia e às necessidades do povo. Deu muita importância à
liturgia como meio de catequizar o povo, como manifestam suas homilias. Desejoso de
que toda a liturgia servisse de fato de alimento espiritual para aquele povo simples e
inculto, realizou com grande liberdade uma profunda renovação litúrgica, orientada para
esta finalidade pastoral. Realizou diversas reformas no lecionário, no sacramentário e no
antifonário. Na área do canto e da expressão musical, reforçou a schola cantorum, e
com isso, o lado espetacular da liturgia cara ao povo. Situada entre o presbitério e o
povo, a schola serve de ponte entre os fiéis e o sacerdote. A obra litúrgica de Gregório
Magno, pensada e organizada para o povo de Roma, também teve êxito fora de Roma.
Diante disso, ele manifesta um grande espírito de liberdade no que toca a inculturação
e adaptação. Respondendo à Agostinho, enviado para evangelizar a Inglaterra, que
expressa sua dúvida acerca do que seguir, pois constata “que, sendo uma mesma fé, não
obstante são diferentes os costumes, e uma é a organização da missa na Igreja romana e
outra diferente nas Igrejas da Gália”, ele diz:
“Tem sempre presente a tradição da Igreja Romana, na qual foste educado, e
ama-a sempre. Mas a mim me agrada que, se encontras na Igreja Romana, ou
nas da Gália, ou em qualquer outra, alguma coisa que possa agradar mais a
Deus onipotente tu a recolhas com todo o cuidado e o leves à Igreja da
Inglaterra, ainda tão jovem na fé, juntando tudo quanto hajas podido reunir das
diversas Igrejas. Pois tens de amar, não as coisas pelos lugares, mas os lugares
pelas coisas boas que há neles. Assim, pois, escolhe de cada Igreja o que é de
piedoso, de religioso e de reto e, tendo tudo isso reunido como num ramalhete,
oferece-o como tradição à mente dos ingleses”.
Na história da Igreja, é o período em que o cristianismo se propaga por toda a
Europa. Nestes quatro séculos, as transformações são lentas no Ocidente, em quase
todos os níveis, assistimos a uma espécie de “hibernação”; a história do papado nunca
foi tão obscura como nos séculos VII-X; é talvez o período em que a Europa teve menor
relevância no universo. E no entanto, esses séculos mostram ser uma fecunda gestação
para o futuro da Igreja.
Nos séculos VII-VIII, há uma grande influência de orientais fugitivos para a
Itália; o domínio oriental afeta profundamente a vida eclesiástica, de maneira que sete
papas orientais ascendem à sede de Pedro entre os anos 642-752. A liturgia romana
recebe neste momento o impacto das influências orientais: a introdução na missa do
Agnus Dei, a adoração da cruz na sexta-feira e a aceitação das festas marianas
(Assunção, Natividade, Purificação e Anunciação). No séc IX, a situação romana
chegara a ser deplorável em muitos aspectos, incluindo aí o litúrgico. A vida litúrgica
estava ameaçada de morte.
Neste período acontece o progressivo afastamento entre o povo e a ação
litúrgica. O latim é a língua sagrada que envolve o mistério litúrgico, tornando-o cada
vez mais distante do povo. A partir do séc. VI, generaliza-se o batismo de crianças. A
iniciação cristã, que em épocas anteriores fora objeto de celebração solene e
comprometida de toda a comunidade, em datas relevantes do ano litúrgico (Páscoa,
Pentecostes), passará paulatinamente a ser um assunto individual ou familiar. A
instituição penitencial não-reiterável é substituída por uma nova disciplina penitencial.
Surgem os “livros com suas tarifas penitenciais, esvaziando o sacramento de toda sua
dimensão comunitária. O exemplo mais evidente do distanciamento entre o culto e a
comunidade é a aparição da missa privada, celebrada a penas pelo padre. Esta prática
surge no séc. VI e se generaliza no séc VIII.
Neste momento crítico, a Igreja franco-germânica salva a liturgia romana para a
própria Roma e para o mundo inteiro. No ano 754, Pepino, O Breve, decreta a adoção
da liturgia romana em todo o Império Franco. Os motivos dessa introdução da liturgia
romana devem ter sido vários: politicamente buscava-se uma unidade mais profunda de
todo o Império por meio de uma liturgia única e uniforme..., combater as liturgias
regionais, especialmente a gálica.
O rito romano, usado só em Roma e arredores, vem a ser com Carlos Magno
(coroado imperador do Império Franco-germânico, no ano 800) o Rito usado em quase
todo o ocidente. Carlos Magno, movido pelo apreço que ele tinha pela liturgia e
considerando-se custódio da doutrina e defensor da fé cristã por volta do ano 783, pediu
ao Papa Adriano I um sacramentário autenticamente romano. Ele tinha a idéia de
unificar o Reino no seu culto. No entanto, alguns lugares conservaram seus ritos como
Milão (Ambrosiano), Aquiléia, Ravena, Gália, Espanha. Da época Carolíngea até São
Gregório VII, acontece o deslocamento do centro de vitalidade da liturgia romana de
Roma à sede da Corte imperial, dos Carolíngeos e posteriormente dos Otonianos. A
divisão do império franco a partir do séc. IX terá, como conseqüência,
desenvolvimentos litúrgicos divergentes entre a parte oriental e a parte ocidental do
império.
Na história da Europa, esse período que vai da morte de São Bento (548) à de
São Bernardo (1156) costuma ser chamado “era monástica” ou “séculos
beneditinos”. A fundação de Cluny, em 909, terá uma excepcional importância na
renovação monástica dos séculos X-XI, chegando a ser, ao longo do século XI, o centro
espiritual da cristandade. Cluny vai difundir sua liturgia nos mosteiros que dele
dependem e estará na origem de uma liturgia menos ligada as igrejas diocesanas. Neste
período multiplicam-se as Ordens religiosas de monges e cônegos regulares
(cistercienses, cartuchos), cuja liturgia está ligada à comunidade-mãe.
Os séculos IX e XI viveram uma forte controvérsia sobre o modo de explicar a
presença real de Cristo na eucaristia. Acentuou-se a tensão entre o “realismo” e o
“simbolismo”. Pascásio de Radberto (Monge de Corbie), no seu tratado sobre a
eucaristia (De corpore et sanguine Domini, em torno de 831-833), exagera no realismo
da presença de Cristo na eucaristia afirmando que:
O corpo de Cristo presente na eucaristia é o corpo mesmo que nasceu de Maria.
É a carne física de Cristo que vem como que velada sob as aparências do pão e
do vinho. As aparências do pão e do vinho são como que um envelope que
escondem a carne e o sangue reais. Se fosse possível tirar este envelope a carne
o e sangue de Cristo apareceriam na sua consistência natural. Ele diz que na
comunhão recebemos a natureza humana e divina de Cristo e pelo metabolismo
natural da digestão, ele é assimilado e se transforma em carne e sangue do fiel.
Este exagero encontra imediatamente reação da parte de um outro monge do
mesmo mosteiro chamado Retramno, mas a reação mais forte veio no século XI, com
Berengário de Tours, que nega categoricamente a presença da Cristo na eucaristia,
dizendo que ela é uma simples representação, uma simples figura de Cristo,
deslanchando assim, um movimento teológico de remarcável importância na Idade
Média e até os dias de hoje. Negando a presença real de Cristo na Eucaristia, ele não é
somente considerado como herético, mas como heresiarca, chefe de uma escola que se
perpetua no tempo. Em 1059, no sínodo romano foi imposto a professio fidei a
Berengário, que dois séculos depois foram consideradas excessivamente “sensualistas”
e criticáveis por São Boaventura e São Tomás de Aquino.
Toda esta controvérsia, distancia cada vez mais o povo da eucaristia, chegando
ao ponto de não comungarem mais. A eucaristia de alimento passa a ser unicamente
objeto de adoração, o altar, de mesa de refeição sagrada passa a ser unicamente “altar de
sacrifício”, o padre de pastor e presidente da celebração da eucaristia passa a ser
somente “sacrificador de Cristo”, e único com dignidade para receber o Cristo
eucarístico. No IV Concílio de Latrão (1215), a Igreja se viu obrigada a introduzir a lei
de que cada cristão deveria ao menos comungar uma vez no ano.

VI - Da reforma gregoriana (1073-1085) até o Concílio de Trento


(1546-1563).
Superada a decadência e a perda de importância sofrida por Roma no séc. X, os
papas voltam a assumir as rédeas da liturgia romana. Cedidas durante quase três séculos
aos soberanos e aos bispos do norte dos Alpes. A partir de Gregório VII e da reforma da
liturgia da Igreja latina da qual ele foi o principal instigador, a unidade litúrgica
realizada por Carlos Magno em seu império é erigida em princípio eclesiológico e os
papas se reconhecem como responsáveis em termos de decisões litúrgicas por todas as
Igrejas. Direito de canonização (Alexandre III e Inocêncio III). Direito de instituição de
festas, como: Corpus Christi, por Urbano IV (1264).
Gregório VII, em sua reforma litúrgica teve também como perspectiva a
moralização do clero. Neste contexto explica-se o específico interesse pela liturgia,
interpretada, porém, como atividade própria e quase exclusiva do ministério sacerdotal.
A liturgia em verdade, exige, de quem tem o dever de presidi-la, dignidade e coerência
de vida.
A retaguarda eclesiológica de toda a reforma gregoriana tem características
hierárquicas e ao mesmo tempo jurídicas. Os fiéis tinham se afastado pouco a pouco da
liturgia clericalizada de maneira muito profunda. Gregório VII não se propõe a diminuir
a preponderância clerical da liturgia nem a tornar mais fácil sua compreensão. Os
objetivos que ele tem são: aumentar o apreço pelo sacerdócio; cultivar o sentido do
mistério diante da ação litúrgica e abrir espaços para as devoções, ainda que sob a
roupagem litúrgica.
Os ideais de unidade litúrgica do Ocidente, cultivados por Gregório VII, se
consolidam nos séculos seguintes pela atuação de outros papas, como por exemplo
Inocêncio III (1198-1216) que se empenha na reforma dos livros litúrgicos. O
sacerdote vem a ser o único verdadeiro ator, enquanto os fiéis assistem passivamente.
Para ser mais prático, evitando o incômodo de vários livros litúrgicos ao mesmo tempo
(Sacramentário, Lecionário, Antifonário, etc.), ele resolveu juntá-los num livro só,
chamando-o de Missal Pleno, (que foi amplamente difundido por toda a Europa pelos
pregadores itinerantes da recém fundada Ordem Frades Menores). Este Missal era
próprio para ser usado pelos padres nas missas privadas e tarifadas que neste tempo se
tornaram de uso comum. A Santa Missa como benefício para vivos e mortos torna-se o
tema fundamental da pregação sobre a missa, enumerando-se os frutos dela obtidos,
mesmo com a mera assistência. Esses “frutos da missa” adquirem um perfil cada vez
mais materializado; como a multiplicação de missas votivas, as missas gregorianas,
aumentando desmesuradamente o número de “altaristas”, um proletariado clerical (de
baixa qualidade) que vive praticamente de salários. No final do séc. XV, Breslau, tinha
para duas Igrejas, 236 padres altaristas. Isso tudo incorreu em sérios abusos. Já no séc.
XII, Pedro Cantor advertia: “Fazem falta menos igrejas, menos altares, menos
sacerdotes, mas melhor escolhidos”. Isto acarreta uma multiplicação desmesurada de
altares laterais dentro das Igrejas. Em torno do ano 1500, certas catedrais possuíam mais
de 40 altares. Não faltaram reações e resistências em relação ao predomínio das missas
privadas. Destaco a exortação feita por Francisco de Assis aos seus frades: “Advirto os
meus irmãos e exorto-os no Senhor que, nos lugares onde moram, seja celebrada uma
só missa por dia, segundo a forma da Santa Igreja. E se houver vários sacerdotes no
lugar, contente-se um sacerdote, por amor à caridade, com ouvir a missa do outro”
(Carta a toda a Ordem 30-31).
É o período em que o povo não comunga mais. Se contenta em ver a eucaristia.
Os padres adotam o costume de elevar a hóstia (1200 – Paris). O que antes era
assembléia, caridade, sacrifício e comunhão, se reduz em adoração das espécies
eucarísticas. De modo semelhante, Corpus Christi se converte na festa méis importante
do ano litúrgico, solenemente superior até mesmo à Páscoa...
A liturgia no “outono da Idade Média”. O século que se situa entre dois
Concílios ecumênicos, o de Vienne na França (1311-1312) e o de Constância (1414-
1418), marca a manifestação progressiva de uma acentuada decadência da vida e da
espiritualidade litúrgicas. O fato não deve surpreender se considerarmos os efeitos
desastrosos naquele século do exílio de Avinhão (1305-1377) e do cisma ocidental.
Verifica-se uma separação, considerada providencial para alguns, entre hierarquia e
fiéis: a primeira voltada para uma vida mundana e os outros abrigados numa ardente
piedade popular.

VII - Do concílio de Trento ao Vaticano II (1546-1962) – “No século XVI a


situação da liturgia no Ocidente é lamentável. Pode comparar-se a um cadáver
ricamente adornado, mas sem vida e com sintomas de decomposição. Os ritos e as
cerimônias são executadas sem sentido pastoral e acompanhadas de uma série de
abusos e superstições” (J. Llopis, La liturgia a través de los siglos)
Estes 400 anos entre um concílio e outro, podem ser divididos em três partes: a)
os primeiros e os últimos 50 anos se caracterizam por um intenso florescimento
litúrgico; b) No meio estão 300 anos de imobilidade, rubricismo e uniformidade
litúrgica; c) com o documento conciliar sobre a Sagrada Liturgia, publicado a 4 de
dezembro de 1963, inicia uma nova era na liturgia.
O “outono da Idade Média” (período de intensa crise eclesial) constitui o
condicionamento histórico básico da reforma protestante. Numa situação de crise
eclesial (problemas internos de extraordinária gravidade e a inovação protestante), da
qual a liturgia é parte essencial, toma força no começo do século XVI a aspiração para
uma reforma da Igreja “na cabeça e nos membros”.

- Linhas da evolução litúrgica.


Os reformadores e o culto. Os primeiros escritos de Lutero estão plenos de
preocupação pastoral, devido aos abusos do seu tempo, mas se mantém na perspectiva
da tradição. Seus companheiros Karlstadt e Zwilling são os primeiros a organizar uma
“missa evangélica”, a abolir as missas privadas e proibir a adoração ao Santíssimo
Sacramento. Pouco depois do De captivitate babylonica (1520), Lutero escreveu seu
Abroganda missa privata (1522), onde ataca não apenas a missa privada, mas o
sacrifício da missa em geral. Apesar da radicalidade dessa obra, Lutero ainda vacila em
introduzir um novo culto. No Natal desse mesmo ano, Karlstadt celebra diante de uma
grande assembléia a “missa alemã”, pronunciando o relato da instituição em voz alta e
em alemão e omite o resto do cânon com a elevação; a comunhão é feita sob as duas
espécies e, na celebração, ele enverga vestes seculares. Dias depois, Zwilling dá a
senha para que destruam as imagens e se suprimam todos os altares laterais. Em 1525,
Lutero celebra na igreja paroquial de Wittenberg, pela primeira vez, uma missa
completa em alemão, que logo aparece impressa e difundida em outros lugares. Um dos
mais importantes pontos das reformas litúrgicas luteranas foi o uso da língua vernácula
na celebração. O culto cristão é para Lutero um culto da Palavra; ora, esse culto da
Palavra não pode ser realizado de maneira frutífera pela comunidade se a Palavra não
for compreendida.
Trento assumiu como objetivo essencial a tarefa de discernir a verdade católica
da doutrina não-católica, evidenciando os aspectos unilaterais e reducionistas da
doutrina dos reformadores diante das fontes da fé (sola Scriptura = só a Escritura), do
processo salvífico (solus Deus, sola fides = só Deus, só a fé) e da concepção
espiritualista e subjetiva da Igreja. Alguns aspectos da reforma intra-eclesial (terceiro
período do Concílio 1562-1563): criar um novo clero por meio de seminários:
ressuscitar a imagem do bispo como pastor, presente à sua comunidade e nela residindo.
- O trabalho litúrgico do Concílio de Trento
Nos três períodos sucessivos do Concílio, esteve muito presente o tema
sacramental, como réplica às proposições dos reformadores. Na sessão VII (3/3/1547), e
como complemento da doutrina sobre a justificação, aprovam-se os cânones sobre os
sacramentos em geral, sobre o batismo e a confirmação. Na sessão XIII (11/10/1551),
examinam-se o decreto e os cânones sobre a eucaristia, vista da perspectiva da presença
real. Na sessão XIV (25/11/1551), é tratada a doutrina sobre o sacramento da penitência
e da extrema-unção. Na parte conclusiva do Concílio, na sessão XXI (16/7/1562), são
aprovados os decretos sobre a comunhão sob as duas espécies e sobre a comunhão das
crianças; na sessão XXII (17/9/1562), retorna-se ao tema da eucaristia, desta feita sob o
ângulo de sua dimensão sacrificial, fortemente combatido pelos protestantes. Na sessão
XXIII (15/7/1563), trata-se dos sacramentos restantes: a ordem e o matrimônio. Na
sessão XXII, imediatamente depois do decreto sobre o sacrifício da missa, é aprovado o
Decretum de observandis et evitandis in celebrationes missae. Já no início do concílio,
20 de julho de 1547, fora formada uma comissão especial para recopilar os abusos que
ocorriam no sacrifício da missa. Do lado dos abusos, deviam se destacar propostas
concretas para a sua eliminação. A comissão teve de elaborar o seu projeto varas vezes,
para torna-lo aceitável à assembléia conciliar.
De todo o trabalho acumulado, só foram aprovados pelo plenário de 10 de
setembro de 1562 nove cânones de reforma: 1) a cobrança de honorários pela missa; 2)
a missa sicca; 3) a celebração de várias missas ao dia; 4) a substituição da missa
dominical por missas votivas ou de mortos; 5) introduzir nas catedrais e igrejas uma
missa de mortos conventual; 6) o lugar da missa é a igreja consagrada, embora o
ordinário possa admitir exceções; 7) prescrições sobre a limpeza de vasos e ornamentos
usados na missa; 8) todos os textos recitados e cantados da missa devem ser inteligíveis
aos ouvintes; 9) os excomungados e pecadores públicos devem manter-se longe da
missa.
No decreto que veio a ser aprovado em 17 de setembro, faz-se recair sobre os
bispos a principal responsabilidade pela liturgia da missa. O Concílio que já estava
reunido havia demasiado tempo, confiou ao Papa, na sessão XXV, a reforma do missal
e do breviário.
A questão da língua litúrgica foi abordada na sessão XXII, abrindo uma pequena
possibilidade para a língua vulgar, mas conservando a língua latina como expressão da
unidade da Igreja e remédio eficaz contra as heresias:
Embora a missa contenha uma grande instrução do povo fiel, não pareceu aos Padres
que fosse conveniente celebra-la de ordinário em língua vulgar (cânon 9). Por essa
razão, mantido em toda parte o rito antigo de cada Igreja e aprovado pela Santa Igreja
Romana, mãe e mestra de todas as Igrejas, a fim de que as ovelhas de Cristo não
padeçam fome nem os pequeninos peçam pão e não haja quem reparta, ordena o santo
Concílio aos pastores e a quantos caiba a cura de almas, que freqüentemente, durante
a celebração das missas, diretamente ou representados, exponham algo acerca do que
se lê na missa e, entre outras coisas, declarem alguns mistérios desse santíssimo
sacrifício, em especial aos domingos e dias festivos.
A reforma dos livros litúrgicos não tardou a ser realizada. Pio V editou o
Breviarium romanum (1568) e o Missale romanum, que deveria ser a única forma para
todas as Igrejas (1570); Clemente VIII, o Pontificale romanum (1596) e o Cerimoniale
episcoporum (1600) e, Paulo V, o Rituale romanum (1614). Sisto V, criou, em 1588, a
Sagrada Congregação dos Ritos com a missão de vigiar para que o modo prescrito da
celebração da missa e das demais partes da liturgia sejam rigorosamente observados.
Inicia-se a era dos rubricistas.
- A liturgia na época do barroco
O século XVII é o século barroco. A consciência católica renovada e reforçada
pelo Concílio tridentino, ainda essa expressão artística peculiar, que foi denominada
“arte da contra-reforma”. O grandioso, o sentimento exaltado, a “fúria heróica”
caracterizam o barroco, assim como o entusiasmo da vitória e do triunfo, expresso com
um vigor autenticamente criativo. O barroco encarna a consciência eufórica de ter salvo
a fé e a Igreja e de estar com a verdade.
Depois do Concílio de Trento, emana do interior da Igreja católica um
sentimento de segurança, uma atmosfera de triunfo e de festa invade o recinto e a
expressão cúlticos. As igrejas construídas no barroco tem o ar de um elegante salão de
espetáculos, com paredes de mármore e ouro, com pinturas no teto, ao qual não faltam
palcos e galerias.
É também o século de ouro da polifonia. A música eclesiástica segue apenas
critérios estéticos, deixando de lado a funcionalidade a serviço da liturgia.
A festa do Corpus Christi. A controvérsia com os protestantes acerca da
presença real leva a Contra-Reforma a uma ênfase especial nesse aspecto da eucaristia,
tanto na teologia como na expressão litúrgica e popular. A festa de Corpus Christi, tem
como objeto, precisamente, a veneração dessa presença sacramental como proximidade
entre Deus e os homens. É também o “século da exposição freqüente”. Intensificam-se
as exposições do Santíssimo Sacramento, a devoção das “quarenta horas”, a adoração
perpétua, adoração reparadora, etc.
Outro pólo fundamental da piedade do barroco é Maria, Mãe de Deus.
Multiplicam-se as grandes peregrinações marianas e as novas festas em sua honra: as
festas do rosário, do Nome de Maria, das Mercês, do Carmo, da Imaculada conceição,
etc. Os altares laterais vão se multiplicando e se tornando privilegiados; as imagens que
presidem esses altares representam majoritariamente, não Cristo, mas os santos. A
liturgia passa a ser, quase toda, um espetáculo a que se assiste ou se ouve; a pregação se
desliga da missa e se torna autônoma. A manutenção do latim, língua estranha ao povo,
contribui sobremaneira para que o culto já não seja, sobretudo, participação ativa da
comunidade no mistério de Cristo, mas, no máximo, sua representação quase teatral,
que anima a oração pessoal e subjetiva do fiel. O culto permanece, como na Idade
Média, uma prerrogativa do clero e da hierarquia.
- O iluminismo
Já no final do século XVII desponta o Iluminismo, uma civilização baseada no
direito, na consciência individual e na razão do homem e do cidadão. Esta nova
concepção empreende um trabalho inicial de demolição do antigo edifício fundado
sobre a religião revelada, a hierarquia, a disciplina, a ordem e autoridade; mas, em
seguida, tenta construir os alicerces da futura cidade: uma política sem direito divino,
uma religião sem mistério, uma moral sem dogmas. O século XVIII confia na ciência,
como poder que está nas mãos do homem para os fins do domínio da natureza, da
organização do seu próprio futuro e da conquista do bem-estar e da felicidade.
No século XIX, a Igreja depara com uma cultura em larga medida a-religiosa e
anti-eclesiástica, uma cultura não cristã que se tornou pouco a pouco independente dela.
Acontece um cisma entre a Igreja e o mundo moderno, a apostasia da classe
trabalhadora e o distanciamento cada vez maior, no próprio seio da Igreja, entre as
esferas hierárquicas e os fiéis mais presentes no mundo da ciência, do trabalho e da
cultura.
Bento XIV (1740-1758), ainda como bispo de Bolonha, ensaiou alguma
reforma, sem êxito. As liturgias das dioceses da França, que se multiplicam de maneira
anárquica ao longo do século XVIII, não receberam o assentimento da Santa Sé. O
Sínodo de Pistoia – Itália (1786), restringiu-se a condenações doutrinais e à sinalização
de alguns pontos a reformar no campo litúrgico, como: um só altar em cada templo,
participação dos fiéis, abolição da cobrança da missa, redução das procissões, música
simples, grave e adaptada ao sentido das palavras, ornamentação que não ofenda nem
distraia o espírito, reforma do breviário e do missal, um novo ritual, redução de
excessivo número de festas, leitura em um ano da Sagrada Escritura no ofício, etc. A
maioria dessas questões encontrou eco no Concílio Vaticano II.
Para a época do Iluminismo, a liturgia se reduz a um meio de educação
destinado à humanização do indivíduo; mas já não é entendida como “adoração de Deus
em espírito e verdade”.
- A restauração no século XIX
Em reação a uma religião confinada aos limites da pura razão, o século XIX
reafirma o princípio da revelação, do dogma e da tradição, assim como o respeito
devido à hierarquia. Esta valorização da Tradição tem o seu reflexo na liturgia: o gosto
pelas orações latinas, pelas cerimônias e rubricas, bem como o entusiasmo pela música
gregoriana caracterizam essa época da Restauração.
Esse movimento ainda não patrocina a participação do povo na ação litúrgica; o
culto cristão chega a ser considerado como realidade intangível e misteriosa, obra
perfeitíssima do Espírito, ao abrigo da toda evolução histórica, envolto pelo halo
protetor da língua sagrada: a língua latina. Neste contexto, surge a figura, sob tantos
aspectos meritória, do abade Próspero Guéranger (1805-1875). Adversário acérrimo das
“liturgias neogalicanas” surgidas no século anterior, Guéranger exige um retorno
incondicional aos livros autênticos da liturgia romana pura. Autor de grandes obras
como Institutions liturgiques e L’année liturgique, D. Guéranger, no entanto, é
partidário de uma explicação completa dos textos e cerimônias do culto diante do povo;
segundo ele, o culto deve manter-se sempre encoberto para o povo cristão pelo véu de
mistério.
A mentalidade de Guéranger pode ser condensada nas seguintes teses: a liturgia
é por excelência a oração do Espírito na Igreja, é a voz do corpo de Cristo, da esposa
orante do Espírito; há na liturgia uma presença privilegiada da graça; nela se encontra a
mais genuína expressão da igreja e de sua tradição; a chave de inteligência da liturgia é
a leitura cristã do Antigo Testamento, bem como a do Novo apoiada no Antigo. A Igreja
como corpo e esposa de Cristo contrasta com a piedade individualista pós-tridentina que
Guéranger critica.
- Movimento Litúrgico – início de uma Pastoral Litúrgica.
No Congresso de Obras Católicas (Malines – Bélgica, 23/09/1909), foi lançado
propriamente o movimento litúrgico. Seu promotor foi D. Lamberto de Beaudoin (1873-
1960), que de sacerdote dedicado ao mundo operário passara a monge beneditino de
Monte César, defende a renovação da vida litúrgica da Igreja. A partir de então, este
monge beneditino lança uma verdadeira cruzada em favor da participação dos cristãos
nas celebrações. É famosa a frase dele: “É necessário democratizar a liturgia”.
Beaudoin deu continuidade, desenvolveu e deu novo direcionamento a obra
iniciada por D. Guéranger: 1) a pastoral litúrgica nas paróquias, que impunha um raio e
um ritmo de ação novos. Era necessário inspirar a piedade e a vida cristã no culto da
Igreja; para isso, cumpria promover a participação dos batizados na liturgia; 2) a difusão
do Missal Popular traduzido como a livro do cristão; 3) o aumento do caráter litúrgico
da piedade por meio da participação na missa paroquial; 4) a promoção do canto
gregoriano segundo as orientações de Pio X; 5) a organização de retiros anuais para os
responsáveis pela pastoral litúrgica.
Em 1920, J. Seitz, reeditando o Manual de Teologia Pastoral de J. E. von Pruner,
usa pela primeira vez o termo “Pastoral Litúrgica”. Depois dele, em 1924, o monge
Athanasius Wintersig retoma esta expressão e diz que uma disciplina com o referido
nome é necessária ao lado da história da liturgia e da ciência litúrgica sistemática. Trata-
se de um estudo científico pastoral da liturgia. Seu objetivo é descobrir o significado da
liturgia para o conjunto da pastoral e como se pode alimentar a vida das comunidades
através dela. Em 1956, J. Jungmann, colocou a pastoral como chave de interpretação da
história da liturgia.
Para Beaudoin, os grandes meios de ação foram: a revista Questions Liturgiques
paroissiales (Questões litúrgicas paroquiais), as semanas de liturgia destinadas à
mentalização do clero, publicadas em Cursos e conferências. Ambicionava-se
interromper a descristianização e renovar a Igreja.
A expansão do movimento litúrgico ficou um tanto paralisada no decorrer das
duas guerras mundiais, voltando a propagar-se com mais vigor nos respectivos períodos
pós-guerra. Contribuíram para essa difusão pastoral, na Bélgica, além da abadia de
Monte César, a de Santo André: na França, o Centro Nacional de Pastoral Litúrgica de
Paris (1943), ao qual estiveram vinculados além de Dom Lamberto Beaudoin, Dom
Bernard Botte, Roguet, Martimort, Pierre Gy, Jounel, etc. O centro fundou a revista La
Maison-Dieu, dele nasceu a coleção Lex Orandi e, junto com a Abadia de Monte César,
o Instituto Superior de Liturgia de Paris. Na área germânica, a abadia de Maria Laach
destacam-se Mardini, Odo Casel, Doelger, Baumstark, Mayer, etc., o Instituto de
Liturgia de Trier (Wagner e Fischer), Pio Parsch e os cônegos regulares de
Klosterneuburg (Áustria); e, em toda a Igreja, os Congressos Internacionais de Liturgia,
organizados pelo Centro de Pastoral Litúrgico de Paris e pelo Instituto de Liturgia de
Trier: 1) Abadia de Maria Laach (1951); 2) Lugano – Suíça (1953); 3) Assis – Itália
(1956), que se destaca graças à assistência dos hierarcas e pastores de todo o mundo, à
sua difusão e ao clima criado em torno da expectativa de uma reforma litúrgica. Este
congressos foram preparando as bases da futura constituição de liturgia do Vaticano II.
- O magistério da Igreja sobre a liturgia
Pio X se distinguiu pelo seu interesse litúrgico já antes de chegar ao supremo
pontificado. Três meses depois da eleição como Papa, tornou público o motu próprio
Tra le sollecitudini (1903), destinado a renovar a música religiosa e restaurar o
gregoriano. Dois anos depois, promulgou o decreto Sacra tridentina synodus (1905),
para fomentar a comunhão fraquente, e cinco anos mais tarde, o decreto Quam singulari
(1910), para promover a admissão das crianças à comunhão em tenra idade. Em 1911,
publicava a constituição apostólica Divino aflanti, sobre a reforma do breviário e a
revalorização da liturgia dominical. E, em 1913, Abhinc duos annos, que inspirava um
novo plano de reforma profunda do ano litúrgico do breviário.
Três linhas claras aparecem no magistério litúrgico de Pio X; a renovação da
música sagrada, porque “não devemos cantar e orar na missa, mas cantar e orar a
missa”; a aproximação entre batizados e a comunhão eucarística, aplainando o caminho
para a participação sacramental da eucaristia, mesmo que a catequese oferecida acerca
dessa comunhão devesse ser aperfeiçoada; a reforma do ano litúrgico e do breviário.
No amplo magistério de Pio XII, se destacaram: a encíclica Mediator Dei
(1947), considerada “a carta magna” do movimento litúrgico, na qual pela primeira vez
o Magistério apresenta uma doutrina litúrgica completa e estruturada. Conteúdos
fundamentais do documento papal:
a) A teologia da liturgia como culto público integral do corpo místico de Cristo, da
cabeça e dos membros, e como presença privilegiada da mediação sacerdotal de
Cristo-cabeça;
b) A espiritualidade da liturgia, a dimensão interior e profunda do culto da Igreja:
“Estão inteiramente equivocados aqueles que consideram a liturgia como o mero
lado exterior e sensível do culto divino ou como cerimonial decorativo; e não
estão menos aqueles que pensam ser a liturgia o conjunto de leis e preceitos com
que a hierarquia eclesiástica configura e ordena os ritos”.
c) O equilíbrio teológico, não oportunista, entre: panliturgismo e subestimação do
culto; piedade objetiva e subjetiva; comunitarismo e individualismo; celebração
e culto da eucaristia; progressismo e conservadorismo.
Foi marcante o discurso aos participantes do Congresso Internacional de Pastoral
Litúrgica celebrado em Assis (1956). Ele declara: “O movimento litúrgico surge como
um sinal das disposições providenciais de Deus para o tempo presente, como uma
passagem do Espírito Santo em sua Igreja, para aproximar os homens dos mistérios da
fé e das riquezas da graça, que decorrer da participação ativa dos fiéis na vida litúrgica.
Podemos citar outros dados da renovação litúrgica efetuada por Pio XII, como: a
Instrução sobre a formação do clero no ofício divino (1945); a extensão ao sacerdote,
am alguns casos, da faculdade de confirmar (1946); a multiplicação dos rituais bilíngües
(1947); a reforma da vigília pascal (1951) e do jejum eucarístico (1953 e 1957); a
reforma da Samana Santa (1955); lecionários bilíngües (1958). A obra litúrgica do Papa
Pacelli é coroada, em 1958, com a Instrução sobre a música sagrada e a liturgia, nos
termos da encíclica Misicae sacrae disciplinae.

CONCILIO VATICANO II
Primeiro anúncio: Dia 25 de janeiro de 1959, menos de três meses depois de sua
eleição, João XXIII, manifestou aos Cardeais reunidos no Mosteiro de São Paulo, seu
desejo de convocar um concílio. (Motivos: abuso e comprometimento da liberdade, a recusa
da fé em Cristo, a busca dos pretensos bens da terra, a atividade do príncipe das trevas, que é
também príncipe deste mundo, a luta contra a verdade e o bem, a divisão entre as duas cidades,
o esforço da confusão, a debilitação das energias do espírito, a tentação e a atração das
vantagens de ordem material que o progresso da técnica moderna engrandece e exalta...). Os
Cardeais foram tomados de surpresa. Os concílios são convocados, normalmente, para
resolver problemas de ordem doutrinal (heresias, etc). Falando aos assistentes da Ação
Católica Italiana, no dia 09/08/59, ele diz: “A idéia do concílio não amadureceu como
um fruto de prolongada consideração, mas como uma flor de inesperada primavera”.
No motu próprio de 05/06/60, diz: “Consideramos inspiração do Altíssimo a idéia de
convocar um Concílio Ecumênico, que desde o início de nosso pontificado se
apresentou à nossa mente como flor de inesperada primavera”. No dia 25/12/61, na
solene bula de indicção Humanae Salutis, exprime-se nestas palavras: “Acolhendo
como vinda do alto uma voz íntima no nosso espírito, julgamos estar maduro o tempo
para oferecermos à Igreja Católica e ao mundo o dom de um novo Concílio
Ecumênico”.
A finalidade do Concílio: Dois objetivos básicos: união e adaptação aos novos tempos.
No dia 17/05/59, João XXIII, declara que o concílio iria dar: grande santificação do
clero, consoladora edificação do povo cristão e espetáculo encorajador para todos que se
elevam em pensamento de fé e de paz. A Igreja católica na fulgurante variedade de seus
ritos e na sua inquebrantável unidade se propõe atingir um novo vigor para a sua missão
divina.
O Documento no qual Sua Santidade mais formal e solenemente formula os
objetivos do Concílio, é a primeira encíclica Ad Petri Cathedram, de 29/06/59:
“Profundamente animado por esta suavíssima esperança, anunciamos publicamente o
nosso propósito de convocar um Concílio Ecumênico, em que hão de participar os
Sagrados Pastores do Orbe Católico para tratarem dos graves problemas da religião,
principalmente para (1) conseguirem o incremento da Fé Católica e (2) a saudável
renovação dos costumes no povo cristão e para (3) a disciplina eclesiástica se adaptar
melhor as necessidades dos nossos tempos”.
Preparação remota: A importância do Movimento Litúrgico. O sacro mistério
eucarístico, a Eucaristia como banquete ritual e como liturgia comunitária, passa outra
vez a ser o centro da piedade cristã. Desde o motu próprio de Pio X até a reforma da
disciplina do jejum eucarístico e das missas vespertinas de Pio XII, tornou-se mais
freqüente e mais consciente a união eucarística dos fiéis com o Divino Salvador. Com o
Missal nas mãos, os fiéis aprenderam a rezar a missa e não apenas rezar na missa. O
movimento litúrgico, coroado com a Mediator Dei e outros documentos pontifícios
recentes, inquietou sacerdotes e fiéis e suscitou discussões, propostas, sugestões e
estudos que só podem levar a uma vida cristã mais autêntica, mais consciente, mais
profunda e mais piedosa.
Abertura do Concílio: Após fervorosa novena ao Divino Espírito Santo, ao som dos
sinos de todos os países do mundo, num ambiente de intensa comoção espiritual e de
grande entusiasmo, inaugurou-se solenemente, na manhã do dia 11 de outubro de 1962,
Festa da Maternidade Divina de Maria Santíssima, na Patriarcal Basílica de São Pedro,
o XXI Concílio Ecumênico, chamado de Concílio Vaticano II, o concílio mais
ecumênico de toda a história.
Estavam presentes na celebração de abertura, 2540 bispos, provenientes de todos
os continentes, sendo que 204 destes eram bispos do Brasil. Faltaram uns 30, por
motivo de idade ou de doença.
Já no dia 22 de outubro começaram os debates em torno da liturgia em geral e da
renovação litúrgica (24/10), língua litúrgica (26/10), participação ativa na liturgia
(27/10), o princípio da adaptação (29/10), concelebração (30/10), Liturgia da Palavra
(31/10), Liturgia dos Sacramentos (06/11), o breviário (09/11)...
O primeiro Documento a ser aprovado, foi a Sacrosanctum Concilium, no dia 04
de dezembro de 1963.
Conceito de Liturgia:
A palavra “liturgia” é de origem grega: Leitourgie, do verbo: leitourgein; Ela
provém da composição de laós, leós = povo e de ergon = serviço, ação, trabalho. No
sentido civil, liturgia é um “serviço feito para o povo” ou “serviço diretamente prestado
para o bem comum”, um serviço em favor da vida. Ex. um mutirão comunitário.
No sentido religioso, liturgia refere-se ao culto que os antigos sacerdotes
prestavam a Deus em nome do povo, no alto da montanha ou no templo. Eram pessoas,
famílias ou grupos escolhidos para este serviço. Zacarias, pai de João Batista era um
desses liturgistas (Lc 1,23).
Para Paulo, o anúncio do Evangelho era um serviço litúrgico: “meu serviço
sagrado é anunciar o evangelho de Deus, a fim de que os pagãos se tornem oferta
aceita e santificada pelo Espírito Santo (Rm 15,16). Para ele, também são um “serviço
litúrgico” as ações em favor da comunidade necessitada. Na carta aos hebreus ele usa o
termo liturgia neste sentido: serviço em favor dos necessitados (Hb 1,7.14; 2Cor 9,12;
Fil 2,25).
Sacrosanctum concilium: (1963) A liturgia é tida como o exercício do múnus
sacerdotal de Jesus Cristo, no qual, mediante sinais sensíveis, é significada e, de modo
peculiar a cada sinal, realizada a santificação do homem; e é exercido o culto público e
integral pelo Corpo Místico de Cristo, Cabeça e membros (SC 7). Liturgia é o cume
para o qual tende a ação da Igreja e, ao mesmo tempo, é a fonte donde emana toda a
sua força, da é obtida a santificação dos homens em Cristo e a glorificação de Deus,
para a qual, como a seu fim, tendem todas as demais obras da Igreja (SC 10).
A própria Liturgia, impele os fiéis que, saciados dos “sacramentos pascais”,
sejam “concordes na piedade”; reza que, “conservem em suas vidas o que receberam
pela fé”; a renovação da Aliança do Senhor com os homens na Eucaristia solicita e
estimula os fiéis para a caridade imperiosa de Cristo. Da Liturgia portanto, mas da
Eucaristia principalmente, como de uma fonte, se deriva a graça para nós e com a
maior eficácia é obtida aquela santificação dos homens em Cristo e a glorificação de
Deus, para a qual, como a seu fim, tendem todas as demais obras da Igreja (SC 10).
A Liturgia, pela qual, principalmente no divino sacrifício da Eucaristia, “se
exerce a obra de nossa Redenção”, contribui do modo mais excelente para que os fiéis
exprimam em suas vidas e aos outros manifestem o mistério de Cristo e a genuína
natureza da verdadeira Igreja. Caracteriza-se a Igreja de ser, a um só tempo, humana e
divina, visível, mas ornada de dons invisíveis, operosa na ação e devotada à
contemplação, presente no mundo e no entanto peregrina. E isso de modo que nela o
humano se ordene ao divino e a ele se subordine, o visível ao invisível, a ação à
contemplação e o presente à cidade futura , que buscamos (SC 2).
Cristo está sempre presente em Sua Igreja, sobretudo nas ações litúrgicas.
Presente está no sacrifício da missa, tanto na pessoa do ministro, “pois aquele que
agora oferece pelo ministério dos sacerdotes é o mesmo que outrora se ofereceu na
Cruz”, quando sobretudo sob as espécies eucarísticas. Presente está pela Sua força nos
sacramentos, de tal forma que quando alguém batiza é Cristo mesmo que batiza.
Presente está pela sua Palavra, pois é Ele mesmo que fala quando se lêem as Sagradas
Escrituras na igreja...(SC 7).
- é uma ação sagrada: quer dizer: ação de uma comunidade – Igreja onde Cristo age.
É sagrada pois comunica Deus e por ela no comunicamos com ele. E aí entra a fé e o
amor.
- Ritos sensíveis: esta comunicação com Deus, por Cristo e em Cristo se faz através
de sinais e símbolos, isto é, de forma sacramental.
- O múnus sacerdotal de Cristo: É ele (Cristo) quem age e continua a realizar a obra
da salvação de modo que todos possam realizar a sua vocação sacerdotal recebida
no Batismo. A ação sagrada é de Cristo. Ele é o sacerdote principal – o oferente e a
oferta.
- Na Igreja e pela Igreja: Cristo não age sozinho mas se faz presente na e pela ação
da Igreja toda
- Para a santificação do homem e a glorificação de Deus: estes são os dois
movimentos de cada ação litúrgica: o movimento de Deus para o homem –
santificação. E o movimento do homem para Deus – a glorificação.
Medellín: (1968) A liturgia é ação de Cristo Cabeça e de seu Corpo que é a Igreja.
Contém, portanto, a iniciativa salvadora que vem do Pai pelo Verbo no Espírito Santo,
e a resposta da humanidade naqueles que se enxertam pela fé e pela caridade, no
Cristo, recapitulador de todas as coisas. A liturgia, momento em que a Igreja é mais
perfeitamente ela mesma, realiza, indissoluvelmente unidas, a comunhão com Deus e
entre os homens, e de tal maneira que a primeira é a razão da segunda. Se antes de
tudo procura o louvor da glória e da graça, também está consciente de que todos os
homens precisam da Glória de Deus para serem verdadeiramente homens (Medellín –
Lit. 9,2)
Puebla: (1979) A liturgia como ação de Cristo e da Igreja, e o exercício do
sacerdócio de Jesus Cristo; é o ápice e a fonte da vida eclesial. E um encontro com
Deus e os irmãos; banquete e sacrifício realizado na eucaristia; festa de comunhão
eclesial, na qual o Senhor Jesus, por seu mistério pascal, assume e liberta o Povo de
Deus e, por Ele, toda a humanidade, cuja história é convertida em história salvífica,
para reconciliar os homens entre si e com Deus. A liturgia é também força em nosso
peregrinar, para que se leve a bom termo, mediante o compromisso transformador da
vida, a realização plena do Reino, segundo o plano de Deus (Pb. 918).
Santo Domingo: (1992) A liturgia é o cume ao qual tende a atividade da Igreja e, ao
mesmo tempo, a fonte de onde emana a sua força (SC 10). A liturgia é ação do Cristo
total, Cabeça e membros. A liturgia é o anúncio e a realização dos feitos salvíficos (cf.
SC 6) que nos chegam a tocar sacramentalmente; por isso, convoca, celebra e envia
(SD 34, 35).

Participação: Tem sua origem no latim tardio: participatio-partem capere, tomar


parte. É sinônimo de adesão, intervenção responsável, interação. Cada membro é
sujeito ativo das celebrações litúrgicas. Elas pertencem a todo o corpo de Cristo, que é a
Igreja, e “o manifestam e afetam” (SC 26).
Nada menos que 25 números da SC falam da necessidade de participação do
fiéis na liturgia (cf. 11, 12, 14, 18, 19, 27, 30, 31, 33, 41, 48, 50, 53, 54, 55, 56, 59, 79,
100, 113, 118, 121, 124). Nesses números se fala da participação ativa e frutuosa,
consciente, plena, fácil, piedosa, interna e externa. Se fala também do dever dos bispos
de promover a participação.
Quando falamos em celebração, evocamos não apenas a eucaristia, mas cada
celebração sacramental ou não sacramental. De toda ação litúrgica tomam parte, de
forma diferente mas real, não só os ministros, mas todo o povo de Deus. E não se tolera
exclusão: “todos e cada um, ministro ou fiel, faça tudo e somente o que lhe compete...”
(SC14).
Dimensões que caracterizam nossas celebrações:
a) A rememoração (anamnese) que é mais do que a lembrança dos eventos do passado.
Traz-se à memória o que se passou com o povo e com o Cristo a fim de experienciar
uma vivência de aliança. Neste sentido não podemos celebrar apenas “a vida” sem
um referencial explícito com a pessoa de Jesus Cristo e com toda a revelação.
Lembrar e fazer são termos inseparáveis para que aconteça a celebração litúrgica. Se
a eficácia está garantida na sua causa, que é Deus agindo, ela se torna real no povo
que atualiza a memória da aliança para fazer parte dela.
b) “Dizer glória” é bendizer; lembra bênção. O termo “doxologia” antes de ser parte
da missa, é uma dimensão fundamental da liturgia cristã. Bênção também é
glorificação, louvação de alguém por suas maravilhosas obras em nosso favor.
Liturgia: lembrar o que Deus fez e faz na história, leva-nos a conceber essa mesma
história como salvação. Por isso, dar graças, louvar, bendizer são dimensões
necessárias no coração de quem se sente beneficiado. O bendizer litúrgico é de tipo
ofertorial e se consolida na oferta de si mesmo para realizar a vontade do Pai (Hb
10,5-7). Transformar nossas celebrações em puras análises da realidade de pecado,
deixando de contemplar as maravilhas de Deus seria perder a capacidade de dar
graças, louvar, bendizer, alegrar-se, esperar. As nossas análises devem conduzir a
uma mudança de vida, e as mudanças realizadas provocam a ação de graças. Se
nossas liturgias não expressam ação de graças é porque estão sendo ineficazes ou
porque não sabemos admirar a obra de Deus. Para bendizer é preciso conversão e
sentir-se implicado na ação de Deus que salva.
c) A invocação. Pedir, interceder para que se cumpra em nós a realidade que
celebramos. A oração cristã se caracteriza por essas dimensões e nesta ordem: ação
de graças de Deus que toma a iniciativa, ação de graças por sentir-se beneficiado e
ação de pedir para que se realize hoje a aliança. Súplica, pois, é antes o
reconhecimento da grandeza de Deus que nos socorre e, em seguida, a consciência
de nossa incapacidade. Esta dimensão da liturgia, desligada da Palavra de Deus, se
transforma em ladainha de necessidades mais do que em súplica, em pedidos
individualistas mais do que oração cristã. Toda oração litúrgica é feita “na unidade
do Espírito Santo”. Ele é quem vai ensinar-nos como se realiza o plano de Deus e
por que caminhos Deus quer conduzir-nos. As orações dos fiéis, muitas vezes,
parecem mais uma programação para Deus do que súplica para que se cumpra seu
plano e sua vontade e assim “venha a nós o seu reino”.
d) O sentido comunitário. Deus quer formar um povo. A palavra de Deus é dirigida à
comunidade e a primeira conversão que ela exige é a integração num povo, numa
comunidade. A religião nos transforma em “um só coração e uma só alma”, nos faz
“um corpo cuja cabeça é Cristo”.

Frei Carlos Rockenbach

Liturgia – 20 anos de caminhada pós-conciliar: Como está?


- Participação fraca, deficiente ou mesmo péssima. Porque? Linguagem
abstrata, difícil, incompreensível, inacessível ao povo. No transmitir da
Palavra, não se realiza o confronto com a realidade; não é traduzida em
atos nem explorada, não é refletida nem levada a sério, existe uma
dicotomia entre fé e vida. A Palavra é mal transmitida e mal proclamada.
A pregação não atinge o povo por ser teórica e mal preparada, cansativa,
monótona, feita sem convicção, acadêmica, desencaranda, aérea,
descomprometida, excludente e mal feita (A homilia não é um tratado de
teologia, de exegese, de moral ou de catequese, embora, por natureza
contenha também estas dimensões).
- Liturgia muito desligada, alienada, distante e fora da realidade; ritual e
mágica; livresca, desligada do aspecto social e comunitário. Falta de
conscientização e catequese litúrgica, folhetos que acomodam e
atrapalham, analfabetismo do povo, mentalidade de “assistir” como mero
espectador, presidentes péssimos “artistas” que não se comunicam e não
sabem promover a participação.
- Os folhetos litúrgicos provocam preguiça, imobilidade e não criam
espaço para a criatividade, impedindo a atualização e adaptação da
liturgia à comunidade concreta. É freqüente o uso frio e mecânico do
folheto litúrgico; as rubricas são seguidas à risca e o conceito de
autoridade no campo litúrgico ainda é mal interpretado; constata-se um
desconhecimento prático dos parâmetros razoáveis da criatividade
litúrgica; novas fórmulas e formas caíram na rotina; o clero se mostra
desatualizado em matéria litúrgica; há padres que criam e adaptam
sozinhos; há preocupação em cortar “abusos”, sem, no entanto orientar
nem analisar; as constantes restrições desanimam as equipes litúrgicas.

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