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23º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental

II-305 - ALAGADOS CONSTRUÍDOS NO TRATAMENTO DE ÁGUAS


RESIDUÁRIAS DO JARDIM BOTÂNICO MUNICIPAL DE BAURU/SP

Eduardo Luiz de Oliveira(1)


Engenheiro Civil pela Faculdade de Engenharia de Bauru (1978); Especializações: Hidráulica e Saneamento
USP São Carlos (1982), Engenharia Sanitária (1984) USP São Paulo; Mestre e Doutor em Irrigação e
Drenagem na UNESP Botucatu (1993 e 1997); Pós-Doutorado em Engenharia Ambiental na Universidade de
Trento – Trento/Itália (2003); Docente do Dep. de Engenharia Civil/FE/UNESP – Bauru.
Jandira L.B.TALAMONI
Bióloga pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Ribeirão Preto – USP (1974); Mestre e Doutora em
Ecologia e Recursos Naturais (Limnologia) pela Universidade Federal de São Carlos (1989 e 1995); Docente
do Departamento de Ciências Biológicas e do Programa de Pós-Graduação em Educação para a Ciência/
FC/UNESP –Bauru.
Marta Enokibara
Arquiteta e Urbanista pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo – PUC-Campinas (1991); Doutora em
Estruturas Ambientais Urbanas pela Universidade de São Paulo (2003); Docente do Departamento de
Arquitetura, Urbanismo e Paisagismo/FAAC / UNESP-Bauru.
Gilberto Sebastião Castilho Filho
Técnico Químico do DAE - Departamento de Água e Esgotos de Bauru. Responsável pelo laboratório de
Análise de Águas Residuárias do convênio DAE/FEB-UNESP, atua em atividades de coordenação, coletas e
análises água em sistemas de abastecimento público e de esgotos sanitários
Luiz Carlos de Almeida Neto
Engenharia Agronômica, conclusão em 1993, pela Universidade de Marília. Engenheiro Agrônomo, na
Secretaria Municipal do Meio Ambiente. período de 1994 a 1996 Atualmente é Diretor da Divisão de Jardim
Botânico Municipal de Bauru e Presidente do Conselho Gestor das Áreas de Proteção Ambientais Municipais
/ Bauru.

Endereço(1) Av. Luiz Edmundo Carrijo Coube S/N Dep. Eng. Civil – Vargem Limpa – Bauru – CEP 17033-
360 Fone: (14) 3103-6112 Fax: (14) 3103 6101 E-mail: eduoliv@feb.unesp.br.

RESUMO
A utilização de alagados construídos para tratamento de águas residuárias tem sido uma prática alternativa em
diversos países, tais como: Itália, Espanha, Nova Zelândia, Brasil, Austrália, Malásia, Egito, Estados Unidos,
Holanda e Alemanha (TAUK-TORNISIELO, 1998), tais estudos mostram as vantagens e a maneabilidade
destes sistemas para esta finalidade. A aplicação do mesmo, devido à característica de não exalar odores
indesejáveis, possibilitou sua aplicação para o tratamento das águas residuárias do Jardim Botânico da Cidade
de Bauru, recebendo uma abordagem paisagística de forma a permitir que ali fossem desenvolvidas atividades
de educação ambiental, tais como aquelas voltadas para a sensibilização e conscientização relativas à
preservação dos recursos hídricos.
O sistema foi projetado para tratar um volume médio de 5.000 m3 por dia, produzidos por 11 funcionários
permanentes e pela população flutuante, acrescido da água proveniente da irrigação do orquidário, visando à
mitigação do impacto causado ao corpo d’água que normalmente recebia os resíduos in natura. Sua conclusão
deu-se em fevereiro de 2004, e o início do monitoramento em 19 de abril do mesmo ano, sendo monitorado
continuamente até a presente data.
O sistema conta com um alagado de fluxo horizontal (FH) cujo afluente é pré-sedimentado em uma fossa
séptica que atua como decantador primário, seu efluente é conduzido a um sistema de alagados construídos
por fluxo horizontal de lâmina livre.
Para monitorar a eficiência do sistema foram realizadas análises químicas semanais (pH; OD; condutividade
elétrica; DBO5; DQO; Amônia; Nitrato e Nitrito), durante os meses de abril de 2004 a março de 2005, em
amostras coletadas em três pontos, sendo o primeiro estabelecido no afluente do alagado de fluxo horizontal
(P1); o segundo no efluente deste mesmo sistema (P2) e o terceiro na saída da lagoa de polimento (alagado de
lâmina livre - P3). Os resultados preliminares mostram uma alta eficiência já no primeiro alagado (FH –
P1/P2), com relação a redução de carga orgânica (DBO5), da condutividade elétrica e do nitrogênio amoniacal,
sendo de 90%, 54% e 83%, respectivamente. Quanto às eficiências totais do sistema FH e de lâmina livre
(P1/P3), verificou-se valores de 90%, 82% e 98% para DBO5, condutividade elétrica e nitrogênio amoniacal,
respectivamente.

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PALAVRAS-CHAVE: Alagados Construídos; Tratamento de águas residuárias, Wetlands, Educação


Ambiental.

INTRODUÇÃO
Os Alagados Construídos são ecossistemas artificiais que, com diferentes tecnologias e plantas, utilizam os
princípios básicos da qualidade da água dos alagados naturais. Um resumo dos sistemas de Alagados
Construídos utilizando macrófitas foi realizado por Brix, H. (1993), os quais podem ser classificados
basicamente em três grupos: Alagados com Plantas Flutuantes, com Plantas Submersas e com Plantas
Emergentes: com fluxo superficial, com fluxo horizontal subsuperficial e com fluxo vertical. (Fig. 1)

Sistema de tratamento com macrófitas


emergentes com fluxo de superfície

Sistema de tratamento com macrófitas


emergentes com fluxo horizontal de
subsuperfície

Sistema de tratamento com macrófitas


emergentes com fluxo vertical de
subsuperfície (percolação)

Figura 1: Representação esquemática de sistemas de tratamento de águas residuárias com macrófitas


emergentes. (Fonte: Brix In: Moshiri,, 1993).

As macrófitas aquáticas de maior interesse para uso em sistemas de purificação hídrica podem ser
classificadas em:

Macrófitas flutuantes: que flutuam livremente sobre ou logo abaixo da superfície da água. Ex. Lemna spp.,
Salvinia., Eichhornia crassipes (aguapé).
Macrófitas emergentes: que ficam enraizadas em solos periodicamente inundados ou submersos, com a parte
superior da planta exposta. Ex: Phragmites spp.(caniço), Scirpus spp.(junco), Typha spp.(taboa),

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Macrófitas emergentes com folhas flutuantes: que ficam enraizadas no leito e apresentam folhas flutuando na
superfície da água. Ex: Nymphaea spp (lírio d’água), Nuphar spp.
Macrófitas submersas: que crescem completamente submersas na água. Ex. Elodea spp.; Potamogeton spp.;
Hydrilla spp.; Egeria spp.

Os ecossistemas dominados por macrófitas aquáticas são dos mais produtivos do mundo, como resultado de
alta luminosidade, das disponibilidades de água e de nutrientes e da presença de plantas bioquímica e
morfologicamente adaptadas para tirarem vantagem dessas condições ótimas (WESTLAKE,1963). As
macrófitas aquáticas submersas são as menos produtivas, em virtude da atenuação da luminosidade na coluna
d’água e à baixa disponibilidade de Carbono inorgânico (WESTLAKE,1963; MADSEN e SAND-
JENSEN,1991).
A alta produtividade destes ecossistemas alagados dominados por macrófitas aquáticas resulta em alta
atividade microbiana e, portanto, em alta capacidade de decomposição da matéria orgânica e de outras
substâncias.

Nos Alagados (“Wetlands”), a troca gasosa entre o sedimento e a atmosfera é muito reduzida (BRIX, 1990) e,
como resultado, os sedimentos são anóxicos ou anaeróbicos (PONNAMPERUMA, 1972), o que determina
baixas taxas de decomposição da matéria orgânica produzida e, portanto, acúmulo desta na superfície do
sedimento. Este sedimento orgânico resultante tem altas capacidades de retenção de água e de troca catiônica.
As camadas superficiais do sedimento, bem como as macrófitas emergentes provêm uma extensa área de
superfície para o crescimento de microorganismos; assim, os alagados têm alto potencial para acumular e
transformar materiais orgânicos e nutrientes ( REDDY et al, 1989).

Os alagados naturais e os construídos têm sido utilizados em sistemas de tratamento de águas residuárias
(NICHOLS, 1989; BRIX e SCHIERUP, 1989), visto que o alto tempo de retenção e uma extensa área de
superfície do sedimento em contato com a água que flui provêm efetiva remoção da matéria orgânica
particulada. A alta atividade microbiana da superfície do sedimento afeta a qualidade da água, em face da
oxidação da matéria orgânica e da remineralização.

Os alagados construídos, ao contrário dos naturais, podem ser usados, deliberadamente, como sistemas de
tratamento de águas residuárias, sem que haja a constante preocupação com a performance e eficiência do
processo, no sentido de minimizar os efeitos que as descargas de efluentes possam trazer ao ecossistema. Isto
porque nos alagados construídos o grau de controle é muito maior, permitindo que a experimentação com
relação à composição do substrato, tipo de vegetação, padrão de fluxo, tempo de retenção e procedimento
hidráulico conduzam a melhores eficiência e desempenho do processo de tratamento.

Quando comparado aos sistemas de tratamento secundários convencionais, os alagados construídos


apresentam vantagens quanto ao baixo custo de construção e, principalmente, de manutenção e baixa demanda
de energia. Além disso, não requer atuação de pessoal especialmente treinado e são sistemas mais flexíveis e
menos suscetíveis às variações de cargas de efluentes do que os sistemas de tratamento convencionais (BRIX
e SCHIERUP, 1989).

No entanto, requerem áreas maiores, quando comparadas aos sistemas de tratamento convencionais e podem
apresentar comprometimento, em termos de desempenho, durante o inverno de regiões temperadas. Apesar
destas considerações, ainda são especialmente atrativos como alternativas para o tratamento convencional de
águas residuárias produzidas por pequenas e médias comunidades, em áreas esparsamente povoadas.

As macrófitas desempenham funções chave no sentido de melhorar a qualidade dos efluentes. O fluxo da
água, no interior do sistema, ocorre como fluxo de superfície ou de subsuperfície e os poluentes são
removidos através de processos físicos, químicos e biológicos (WATSON et al, 1989).

O tratamento biológico do efluente está associado aos processos desempenhados pelos microorganismos que
vivem ao redor das macrófitas e pela remoção de poluentes, diretamente por assimilação pelos tecidos da
própria planta (BREENl, 1990). A transferência de oxigênio pelas plantas, para a região da rizosfera, é um
requisito importante para a remoção efetiva de alguns poluentes, pelos microorganismos (REDDY et al, 1989;
MOORHEAD e REDDY, 1990).

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Nos alagados construídos, após a preliminar remoção mecânica de sólidos suspensos, aqueles remanescentes
são removidos por sedimentação e filtração (processos físicos), assim como ocorre, em significante proporção,
com a DBO, nutrientes e patógenos.

Os compostos orgânicos solúveis são degradados aeróbicamente, na maior parte, por bactérias fixas às plantas
e à superfície do sedimento, embora a degradação anaeróbica também ocorra e possa ser, em alguns casos,
significante. O oxigênio necessário à decomposição aeróbica provém da atmosfera (difusão), da produção
fotossintética e da liberação pelas raízes das macrófitas (MOORHEAD e REDDY, 1990).

A remoção do nitrogênio se faz através dos processos de nitrificação e denitrificação (REDDY et al, 1989;
GERSBERG et al, 1989), quando a amônia (N-NH3) é oxidada a nitrato (N-NO3), aeróbicamente, pelas
bactérias, sendo este convertido a nitrogênio inorgânico (N2), anaerobicamente, por bactérias denitrificantes
das zonas anóxicas. Parte do nitrogênio também é utilizado pelas plantas e incorporado na biomassa das
mesmas. A conversão de amônium (NH4+).em gás amônia (NH3), com posterior volatilização, é um processo
importante que ocorre em sistemas em que a fotossíntese algal aumenta o pH da água (alta remoção de CO2)
até atingir valores maiores que o pKa (9,3) do amônium (EIGHMY e BISHOP, 1989).

A remoção do Fósforo (P) ocorre principalmente por adsorção, complexação, precipitação com Alumínio (Al),
Ferro (Fé), Cálcio (Ca) e argila mineral, no sedimento (BAYLEY, 1985; SAH e MIKKELSEN, 1986). A
assimilação pelas plantas também pode ser significante, quando a velocidade de carga de efluentes é baixa
(BREENl, 1990; REDDY e DEBUSK, 1985).

Os patógenos são removidos por sedimentação e filtração, de organismos mortos em conseqüência natural da
exposição a um ambiente desfavorável (LANCE et al, 1976; GERSBERG et al, 1987; WATSON et al, 1989),
visto que existe a possibilidade de muitos dos metabólitos produzidos pelas raízes das macrófitas terem efeito
antibiótico para as bactérias.

Os metais traço têm alta afinidade (adsorção e complexação) com materiais orgânicos e se acumulam no
sedimento, quando não são adsorvidos pelas plantas ou transformados pelas bactérias (WATSON, op. cit.).
Nos alagados construídos podem ser utilizadas macrófitas flutuantes de raízes submersas, macrófitas
enraizadas e emergentes, macrófitas submersas ou uma combinação delas; as plantas podem ser usadas em
sistemas únicos (isolados) ou em sistemas combinados. Dentre as flutuantes, o “jacinto d’água” ou “aguapé”
(Eichhornia crassipes) é considerada uma das plantas mais produtivas do mundo e recomendada para uso em
tratamento terciário (remoção de nutrientes, especialmente N e P) ou em tratamento integrado, secundário e
terciário (remoção de nutrientes e DBO), em que a degradação da matéria orgânica e a transformação do
Nitrogênio (nitrificação e desnitrificação) ocorrem simultaneamente no sistema (DINGES, 1978; DINGES e
DOERSAM, 1987). Este sistema pode incluir aeração, com a superfície da água livre, para permitir
transferência de oxigênio da atmosfera para a água. O tempo de retenção varia de 5 a 15 dias para regiões
temperadas (DE BUSK et al, 1989; JOHN, 1984).

As macrófitas flutuantes são consideradas eficientes na remoção de sólidos suspensos, mas a alta densidade
das mesmas reduz os efeitos do vento e, portanto, minimiza a mistura térmica; o sombreamento reduz o
crescimento algal e as raízes da macrófita impedem o movimento horizontal da matéria orgânica particulada
(DINGES, 1982). O extenso sistema das raízes provê superfície de fixação para microorganismos e, portanto,
aumenta o potencial de decomposição da matéria orgânica e alta capacidade de transporte do oxigênio das
folhas para a rizosfera (com liberação para a água) (REDD et al, 1989; JEDICKE et al, 1989), permitindo alta
eficiência em remoção da DBO e provendo boas condições para a nitrificação microbiana. São plantas
severamente afetadas pelo frio e, portanto, são indicadas para uso em regiões tropicais e subtropicais.

Sistemas de alagados com macrófitas enraizadas e emergentes são comuns quando a lâmina d’água tem
profundidade de 50 a 150 cm. As plantas possuem extensivos sistemas de raízes e rizomas fixos, caule e
folhas emergentes. São comumente utilizadas: o junco (Scirpus lacustris), a taboa (Typha latifolia) e o caniço
(Phragmites australis). Parte do oxigênio liberado pelas raízes cria condições oxidantes na região do
sedimento anóxico, estimulando a decomposição da matéria orgânica e o crescimento de bactérias nitrificantes
(REDDY et al, 1989). Estas plantas podem ser utilizadas em sistemas de fluxo de superfície, fluxo de
subsuperfície horizontal ou fluxo de subsuperfície vertical.

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Nos sistemas de alagados construídos que utilizam macrófitas submersas, deve ser oferecida boa oxigenação e
a carga de águas residuárias não deve apresentar alto conteúdo de matéria orgânica prontamente
biodegradável, porque a decomposição microbiana da matéria orgânica cria condições anóxicas. São
normalmente utilizados para “polimento” de águas residuárias tratadas por sistemas secundários, embora o uso
de Elodea nuttallii tenha mostrado bons resultados para o tratamento primário de esgoto doméstico (REED et
al, 1988). As macrófitas submersas diminuem a concentração do gás carbônico e aumentam a do oxigênio na
água, durante períodos de alta atividade fotossintética, portanto, produzem aumento do pH e criam condições
ótimas para a volatilização da amônia e para a precipitação química do fósforo, além de aumentarem a
mineralização da matéria orgânica. Os nutrientes liberados pelas partes senescentes das plantas são
rapidamente utilizados pela microflora fixa na própria planta (comunidade perifítica); a sugestão é de que
estes sistemas sejam instalados na fase final de tratamentos combinados (BISHOP e EIGHMY, 1989).

Os diferentes tipos de tratamentos de águas residuárias através de alagados construídos podem ser combinados
com outras tecnologias de tratamento convencional. Um exemplo de sistema multiestágio consiste em: 1)
tratamento primário convencional para clareamento mecânico; 2) sistema de tratamento secundário com
macrófitas flutuantes e 3) tratamento terciário com macrófitas flutuantes, emergentes ou submersas. Os tipos
de tratamento secundário e terciário dependem das características das águas residuárias, do clima, do
tratamento requerido e da disponibilidade de área.

A utilização de alagados construídos para tratamento de águas residuárias tem sido uma prática alternativa em
diversos países, tais como: Itália, Espanha, Nova Zelândia, Brasil, Austrália, Malásia, Egito, Estados Unidos,
Holanda e Alemanha (TAUK-TORNISIELO, 1998), onde diversas experiências têm sido também conduzidas,
no sentido de verificar a eficiência de sistemas combinados (fluxo horizontal e fluxo vertical; alagados e
processos convencionais) para a melhoria da qualidade do efluente final.

Algumas pesquisas têm demonstrado que os sistemas de fluxo horizontal são satisfatórios para utilização em
tratamentos secundários, quando os padrões requeridos são a DBO (Demanda Bioquímica de Oxigênio) e TSS
(Sólidos Suspensos Totais). Para se obter a nitrificação do efluente, o fluxo horizontal (FH) é eficiente como
tratamento terciário (GREEN, 1997; COOPER et al, 1996). Assim, o interesse por utilização de fluxo vertical
(FV), que mostra maior capacidade de transferência de oxigênio e que requer áreas menores (1 a 2 m2/pe) do
que o sistema de FH (5 a 10 m2/pe), bem como pela utilização de sistemas híbridos (combinados) que se
complementam em termos de benefícios e eficiência, tem sido crescente (parâmetros para países de clima
temperado).

Os sistemas de FH se mostram eficientes para a remoção de DBO e de TSS, bem como de bactérias e promove
boa denitrificação, mas é o sistema de FV que é mais eficiente com relação à nitrificação. Os sistemas híbridos
variam em função da posição dos estágios de FH ou FV à frente do sistema (COOPER e DE MAESENEER,
1996). Num modelo proposto numa Conferência, em Viena (JOHANSEN e BRIX, 1996) e que foi mais tarde
construído (CIUPA, 1996) para atender 55 pessoas, o leito de FH foi colocado à frente (485 m2) do leito de
FV (42 m2), tendo sido observado que a carga máxima de transferência de oxigênio no leito de FV foi o dobro
(30 mg O2/ m2 d) daquela observada no leito de FH (JOHANSEN e BRIX, 1996; CIUPA, 1996). A remoção
da DBO ocorreu no leito FH e a nitrificação no de FV.

Além dos muitos benefícios e da eficácia dos alagados construídos no tratamento para águas residuárias,
produzindo efluentes de boa qualidade e, portanto, sendo importantes para a preservação dos recursos hídricos
(eventuais corpos receptores) e do ambiente, aqueles sistemas oferecem ainda excelentes oportunidades para
se trabalhar a educação ambiental e para a utilização dos espaços na recreação passiva, quando devidamente
integrados a um complexo paisagístico.

MATERIAIS E MÉTODOS
O Jardim Botânico Municipal de Bauru tem uma área de 321 ha, está localizado numa área de preservação
ambiental e apresenta vegetação nativa típica de Cerrado. Levantamentos fitossociológicos e florísticos
realizados na área mostram uma alta diversidade de espécies, o que justifica o programa de Educação
Ambiental que ali vem sendo desenvolvido, voltado, mais especificamente, para o atendimento de uma média
de 300 crianças semanalmente, provenientes das escolas da Região.

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O sistema foi projetado para tratar um volume médio de 5.000 m3 por dia, produzidos por 11 funcionários
permanentes e pela população flutuante, acrescido da água proveniente da irrigação do orquidário, visando à
mitigação do impacto causado ao corpo d’água que normalmente recebia os resíduos in natura. Sua conclusão
deu-se em fevereiro de 2004, e o início do monitoramento em 19 de abril do mesmo ano, estando sendo
monitorado até a presente data.

Segundo a equação de degradação que determina a área necessária para um determinado potencial de redução
de carga orgânica (COOPER, 1996) nestes sistemas, foi estimada uma área total de 64 m2 para um alagado de
fluxo horizontal. O afluente deste sistema é pré-sedimentado em uma fossa séptica que atua como decantador
primário. A vazão estimada de projeto foi de 2.000 L dia-1. No local existe uma construção destinada ao
cultivo de orquídeas que, no verão, devido ao calor intensivo, tem o seu teto submetido a uma irrigação por
aspersão para se obter o resfriamento do interior; este volume de água (em torno de 3.000 L dia-1) também é
conduzido ao sistema de alagados construídos por fluxo horizontal e fluxo livre. O primeiro tem uma área
projetada de aproximadamente 64 m2, com uma variação da profundidade de 0,60 a 0,76 m, resultando em
uma declividade de fundo de 1%. Em seguida o efluente é encaminhado para o segundo alagado, de lâmina
livre, com aproximadamente 100 m2 e uma profundidade média de 0,40 m.

Os Tempos de Detenção Hidráulica médios são de 3 dias (quando o sistema de irrigação está a pleno
funcionamento) e 7,6 dias durante o inverno para o primeiro alagado e de 20 dias e 13 dias, respectivamente,
para o segundo alagado.

Nas porções inicial e final do sistema de alagados por fluxo horizontal foram colocadas pedras britadas nº2
(19 a 25 mm) e o espaço entre aquelas foi preenchido com areia grossa (0,6 a 2 mm segundo escala da
ABNT), na qual foram cultivadas macrófitas da espécie Typha sp.

Para monitorar a eficiência do sistema foram realizadas análises químicas semanais (pH; OD; condutividade
elétrica; DBO5; DQO; Amônia; Nitrato e Nitrito), durante os meses de abril de 2004 a março de 2005, em
amostras coletadas em três pontos, sendo o primeiro estabelecido no afluente do alagado de fluxo horizontal
(P1); o segundo no efluente deste mesmo sistema (P2) e o terceiro na saída da lagoa de polimento (alagado de
lâmina livre - P3).

Para as medidas de pH, OD e condutividade elétrica foram utilizadas sondas da Marca ORION, tipos: 210A;
810 – EL. 081010; 115 – CEL 011510, respectivamente. Para a DBO5, a DQO, nitrato e nitrito foram
utilizadas as metodologias colorimétricas indicadas pelo fabricante dos equipamentos HACH: DBOTraktTM e
DR2010.

Também foram realizadas medidas de temperatura da água e registradas as ocorrências de chuvas nas 24 horas
que antecederam a coleta de amostras.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
A utilização dos sistemas FH acoplados a um sistema de alagados por lâmina livre possibilita que, neste
ultimo, haja uma redução significativa nas concentrações dos nutrientes provindos da decomposição da
matéria orgânica, visto que estes também são utilizados pela biomassa de produtores primários (microalgas)
que ali encontram condições ideais para seu estabelecimento e manutenção.
Na tabela 01 são apresentados os resultados obtidos das análises realizadas, bem como as eficiências dos
sistemas com relação a algumas das variáveis monitoradas.

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Tabela 01 – Valores médios obtidos para os vários parâmetros e eficiências (in-out) nos sistemas de
Alagados Construídos.
Unidad
Variáveis e Ponto 01 Ponto 02 Ponto 03 Eficiências (%)
(P1) (P2) (P3) (P1/P2) (P1/P3)
pH 7,06 6,70 8,63 - -
Condutividade μs/cm 675,74 308,22 121,13 54 82
OD mg/L 2,30 3,54 7,22 - -
DBO5 mg/L 198,68 19,84 19,75 90 90
DQO mg/L 265,67 44,62 66,82 83 75
Amônia (N- NH3) mg/L 36,62 6,05 0,89 83 98
Nitrato (N-NO3) mg/L 13,90 14,33 9,24 -3 36
Nitrito (N-NO2) mg/L 0,25 0,22 0,25 9 0
Temp. água ºC 20,55 20,74 19,46 - -

Os resultados preliminares mostram uma alta eficiência já no primeiro alagado (FH – P1/P2), com relação a
redução de carga orgânica (DBO5), da condutividade elétrica e do nitrogênio amoniacal, sendo de 90%, 54% e
83%, respectivamente. Quanto às eficiências totais do sistema FH e de lâmina livre (P1/P3), verificou-se
valores de 90%, 82% e 98% para DBO5, condutividade elétrica e nitrogênio amoniacal, respectivamente.
Os valores de pH, neutros nos primeiros pontos de coleta, mostram-se alterados para valores de pH alcalino no
alagado de lâmina livre, caracterizando o alto consumo de CO2 pela fotossíntese algal.
A Figura 2 mostra a relação entre a DBO aplicada e a DBO removida, no período estudado, levando-se em
consideração o valor da carga orgânica aplicada, evidenciando a boa adaptação do sistema para as várias
faixas de DBO aplicada.

400,0

Ponto 1 para Ponto 2


350,0

300,0

250,0
D B O R e m o v id o

200,0

150,0

100,0

50,0

0,0
0,0 50,0 100,0 150,0 200,0 250,0 300,0 350,0 400,0
DBO Aplicado

Figura 2- Relação entre DBO aplicada e a DBO removida, entre os pontos (P1 e P2) durante o período
estudo.

As concentrações de oxigênio dissolvido, relativamente baixas, características dos dois primeiros pontos de
amostragem, são praticamente duplicadas no alagado de lâmina livre, atingindo valores que possibilitam a
vida aquática, e que têm garantido a manutenção de peixes neste alagado.

As concentrações de nitrato e nitrito tiveram uma redução total (P1/P3) de 36% e 0%, respectivamente, em
função do consumo destas formas nitrogenadas pelos produtores primários (macrófitas e algas).

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Verificou-se que este sistema de tratamento de águas residuárias por alagados construídos não apresenta a
ocorrência de odores característicos de sistemas convencionais de tratamento. Tal fato se deve à manutenção
do nível do alagado FH abaixo da superfície do substrato (sistema subsuperficial), o que impede a liberação de
gases para a atmosfera.

Esta condição cria a possibilidade de utilização deste espaço que, além de estar integrado à paisagem natural
do entorno, permite que diversas atividades sejam nele desenvolvidas. O projeto recebeu uma abordagem
paisagística de forma a permitir que ali fossem desenvolvidas atividades de educação ambiental, tais como
aquelas voltadas para a sensibilização e conscientização relativas à preservação dos recursos hídricos. A
Figura 03 mostra os diferentes aspectos do sistema de tratamento, evidenciando estas particularidades.

Figura 3: Aspectos do local da implantação do sistema de tratamento das águas residuárias do Jardim
Botânico de Bauru.

CONCLUSÕES
Além dos resultados, considerados satisfatórios, o que já era esperado em função dos cálculos de projeto,
também tem sido observada a importância da utilização do local para atividades de educação ambiental,
especialmente aquelas relativas à reflexão sobre a importância da preservação e gerenciamento dos recursos
hídricos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. BAYLEY, S.E. The effect of natural hydroperiodic fluctuations on freshwater receiving added
nutrients. In: Godfrey, P.J. et al (eds.) Ecological Considerations in Wetlands Treatment of Municipal
Wastewaters. New York: Van Nostrand Reinhold, 1985. p.180.
2. BISHOP, P.L., EIGHMY, T.T. Aquatic wastewater treatment using Elodea nuttallii. J. Water Pllut.
Control Fed.n, v.61, p.641, 1989.
3. BREEN, P.F. A mass balance method for assessing the potential of artificial wetlands for wastewater
treatment. Water Res., v.24, p.689, 1990.
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