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Segue um texto interessante, publicado por Lynna Landstreet, em

junho de 1997.

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A Necessidade de Equilíbrio

Michael Berubé pergunta:

Por favor me ajude a entender isso. Não sendo wiccano, estou curioso
em saber por que muitos wiccanos na Net, insistem em afirmar que eles
não são um tipo de religião de "doçura luminosa" ou de "coelhos
macios da nova era". Eu sei que você quer levar isso com seriedade
mas, você vê a Wicca como uma religião do tipo "amarga e negra" ?

A idéia de que duas polaridades opostas como essas são as únicas


escolhas é muito comum aos não wiccanos. Eu creio que um dos
problemas maiores com nossa sociedade é que há uma grande ênfase no
que pode ser chamado de hostil, ou dualismo competitivo - tudo é
visto como luz e trevas, certo ou errado, bom ou mau, etc.
A essência da filosofia wiccana é holística, ou dualismo
complementar, no qual os opostos são vistos como sendo um equilíbrio
dinâmico, em preferência a um combate acirrado. O simbolismo da
Deusa/Deus que os reconstrucionistas célticos não gostam muito, é uma
expressão de que - ao invés do paradigma cristão de duas divindades
lutando pelo destino da humanidade com o vencedor ficando com tudo,
nós temos duas divindades unidas e em equilíbrio, e que unidas dão
nascimento a todas as coisas. Nesse sentido, o dualismo wiccano
está mais para uma triplicidade: dois pólos que em união trazem uma
terceira coisa que é maior do que a soma das partes.
Para retratar Wicca como somente luz e trevas, temos que deixar de
afirmar que eles são apenas duas coisas dentro da religião, perdendo
de vista as chaves de seu significado ! Num nível metafísico, a
Deusa e o Deus representam as forças da criação e da destruição,
nascimento e morte, Eros e Thanatos - e nesse equilíbrio dessas duas
coisas toda a vida acontece. Num artigo editado por mim e que
apareceu na revista pagã The Blade & Chalice, afirmei
objetivamente: "Bruxos cultuam sexo e morte", uma verdade essencial
sobre a nossa religião.
Eu acho que pintar a nossa religião no sentido de atenuar as
percepções negativas geradas pela palavra "bruxaria" tem, numa grande
escala, nos trazido para a situação atual acerca do que eu estava
comentando.
Devido ao fato da Wicca ser principalmente uma religião de mistérios,
na qual o ensinamento central é tradicionalmente dado num nível
iniciático, fora da visão do público em geral, muitos dos modernos
livros sobre Wicca não eram como manuais, mas como trabalhos que
visavam um público não wiccano, com a intenção de destruir
estereótipos e propiciar a nossa imagem. E como eles tendiam a não se
aprofundar muito a respeito da cosmologia e teologia wiccanas, porque
os que estavam realmente interessados as encontrariam quando achassem
covens e professores, exageraram nesse ponto de que nós não somos
psicopatas matadores de criancinhas ("Nós não fazemos isso ! Nós
somos bons, verdadeiramente bonzinhos ! Nós somos tão bonzinhos que
fazemos a mãe do Bambi parecer com Baba Yaga ! Nós somos tão bons,
que fazemos Barney o dinossauro parecer com Dennis Leary !").
Agora, isso era tudo muito bom e legal, porque fez a aproximação que
era necessária naquele tempo, mas o problema veio com a desgovernada
popularidade da Wicca, que eu acho que os primeiros escritores não
previram. Foi tudo muito rápido, milhares de pessoas querendo se
envolver com a Arte, mas não tinham nenhum acesso a nenhum coven
tradicional. Assim, em sua imensa maioria, eles fizeram o que eu fiz
no início dos anos 70, na mesma situação: começaram praticando
solitariamente ou com um grupo de amigos inexperientes, usando
quaiquer sobras de rituais que eles podiam encontrar nos livros que
estavam disponíveis na época. (1)
Alguns, evidentemente, tiveram a sorte de encontrar um caminho na
comunidade wiccana que já existia, mas muitos outros continuaram
voando em seus próprios fundilhos, e alguns continuaram
confortavelmente fazendo isso, não indo longe pois não tinham
interesse em encontrar um coven tradicional. Provávelmente o
maior 'boom' do "faça você mesmo", veio com a publicação de The
Spiral Dance, que continha mais material do tipo "como fazer" que
qualquer outro livro já publicara, e era também o primeiro a mostrar
a auto-iniciação e auto-treinamento como coisa normal, até que você
encontrasse um professor real ou coven.
Para ser honesta, The Spiral Dance também continha uma análise mais
profunda dos aspectos da filosofia e da teologia da Arte que a
maioria dos livros de sua geração, e certamente mais do que muitos
livros ecléticos anteriores da Arte. Mas julgando pela falta de
profundidade da maioria dosescritores ecléticos de hoje, muitas
pessoas parecem ter pulado para pegar a parte do "como fazer".
Houve coisas realmente problemáticas quando essas pessoas começaram a
publicar os livros delas. O que você começou a ter naquele tempo era
o que nós ainda temos hoje: uma geração inteira de pessoas que
desejam ser wiccanas, que estão apenas às tontas no nevoeiro, mas tem
praticamente institucionalizado os tropeços no nevoeiro como O
Caminho Certo Dado.
Tem sido afirmado, de muitos tipos diferentes de grupos, que quando
você começa a acreditar em seu próprio reconstrucionismo pagão, você
estará com problemas. E nós agora temos uma geração inteira de
pessoas cujo conceito de sua religião é inteiramente, ou quase
inteiramente, baseado no reconstrucionismo pagão dos anos 70, e
repartem as características de muito daquele material: uma marcante
falta de profundidade, uma grande ênfase na bondade e na beleza, e um
completo desconhecimento das chaves do ensinamento da Wicca
tradicional. Agora, no caso dos escritores desse reconstrucionismo
pagão, eles estavam perfeitamente familiarizados com o ensinamento
secreto, mas deliberadamente optaram por não escrever sobre ele, para
manterem seus juramentos e preservarem alguns mistérios para os
iniciados. Entretanto, no caso da nova geração de wiccanos auto-
iniciados, eles simplesmente não estavam cientes de que não havia
nada por trás da superfície mostrada nos livros, o que continuou nos
livros posteriores escritos por pessoas que aprenderam naqueles
anteriores.
Os que tem algum tipo de treinamento e linhagem tradicional são agora
uma minoria dentro da Arte. (2) E enquanto nós podemos desejar
sinceramente que os "Coelhinhos Fofos" comecem a chamar-se de
qualquer outra coisa e nos devolvam o nosso nome, isso provávelmente
não acontecerá num tempo rápido real. E nós, que recebemos um
treinamento tradicional mas que também acreditamos em ensinar a Arte
(parte dela, pelo menos), publicamente temos que andar numa linha
muito tênue onde, por um lado se perpetua o mesmo conhecimento
superficial de Wicca que hoje nos contamina, e por outro dar de
presente muita coisa, o que poderia acarretar um total perjuro ou
simplesmente sermos destratados por pessoas iniciadas por darmos de
presente tudo isso de modo rápido.

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(1) O que ainda acontece atualmente, promovendo uma total mistura de
conceitos, filosofias e práticas totalmente alienígenas à verdadeira
Wicca.
(2) O que mostra claramente, que nem sempre ou quase nunca a verdade
está com a maioria.

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