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questões e desafios que circundam os três eixos de atuação institucional. As
contribuições originais e o resgate de artigos balizadores ajudam no processo
fundamental que nos levará à elaboração da agenda científica do novo ins-
tituto. Compreender a complexidade do urbano e a problemática do rural,
diagnosticar os problemas e potencialidades dos sistemas de produção do
Estado, compreender o tecido social e econômico e o papel do Estado para o
desenvolvimento nacional através de um sistema de dados confiáveis e ampla-
mente disponíveis para a sociedade, entender e aplicar os principais conceitos
durante o processo de investigação científica e reconhecer o volume de conhe-
cimento acadêmico já produzido sobre os temas, fazem parte desta primeira
contribuição do Idesp para a sociedade. O objetivo é que o instituto retome o
seu relógio institucional com vigor, confiança e uma preocupação com o diálo-
go com a realidade. Esta é a primeira corda no carrilhão.
p Ma d t l d
Presidente do Idesp
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r vi a d e ud pa a
Edição de recriação do Idesp
G v ad a
Ana Júlia Carepa
Vic -g v ad
Odair Santos Correa
s c a ia d e ad d G v
Cláudio Castelo Branco Puty
I iu d D v lvim ec ômic ,
s cial Ambi al d pa á - Id
Peter Mann de Toledo
o ga izad
Peter Mann de Toledo
Erika de Souza Morhy
janeiro, 2008
3
ÍnDICe
4
o DesAFIo DA CoMpreensão Do UrBAno
no estADo Do pArÁ
A a Cláudia Ca d
Secretária Adjunta de Governo
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ainda não foi possível articular mecanismos que ajudem o municí-
pio a organizar a gestão das terras de modo socialmente justo. A
dissociação existente entre mecanismos oferecidos para a gestão
de terras urbanas através de leis federais (Estatuto da Cidade e o
novo Código Civil), e a legislação que regulamenta a regularização
de terras rurais, na região aplicados pelos órgãos federais (Incra,
SPU, MMA e Funai) e estadual (Iterpa), mantêm milhares de pesso-
as vulneráveis à violência e exclusão, revelando que, na Amazônia,
a negociação entre entes federados (municípios, Estado, União) e
o alinhamento entre poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário)
no enfrentamento das lacunas existentes é condição básica para o
avanço (MPEG/UFPA, 2005; UFPA, Funpea, ELN, 2006). Diante da
complexidade de interesses e multiplicidade de atores, a simples
compreensão do processo depende de acesso à informação (car-
tografia, marco legal, cadastros) organizada no tempo para que os
padrões de evolução possam ser capturados e usados na tomada
de decisão e formulação de políticas públicas.
b) As políticas sociais – o processo de urbanização acelerado da re-
gião não tem paralelo no mundo contemporâneo, na medida em
que as atividades atratoras de população não eram localizadas
nas cidades existentes. A atração massiva de mão-de-obra para a
execução de grandes obras, para os garimpos, para a exploração
de madeira ou para a prestação de serviços às grandes empresas
de mineração, desvinculada de soluções de habitação e capacita-
ção, potencializou a formação de novas aglomerações e a posterior
periferização das cidades existentes, por processos de expansão
absolutamente descontrolados por parte do poder público. A for-
mação de exércitos de trabalhadores para atuação nessas ativida-
des favoreceu processos de exploração do trabalho e a exploração
sexual de mulheres, crianças e adolescentes, assim como a deses-
truturação do ambiente familiar por problemas como o alcoolismo
e a dependência de drogas, envolvendo adultos pouco qualificados
que perderam a posição de trabalho (UFPA/ PMM, 2006; FVPP/
UFPA, 2005; MPEG, UFPA, 2005). Tais processos são evidentes,
mas não são contabilizados na estruturação de sistemas federais,
como o de assistência, também por falta de informação. Muitas
vezes, os critérios utilizados para a implantação de equipamentos
de assistência não são suficientes para que os problemas citados
sejam considerados, e áreas urbanas extremamente vulneráveis,
mas com população quantitativamente pequena, não se creden-
ciam para o direcionamento de políticas sociais. Diante desse fato,
nos perguntamos o quanto sabemos do modo como populações
tradicionais e migrantes se amalgamaram na formação de uma
nova sociedade paraense? Que estratégias e políticas públicas pre-
cisam ser implementadas para que todos tenham acesso a direitos
sociais e tantos não sejam cooptados pelo crime organizado?
c) A econômica – a dependências da maioria dos municípios paraen-
ses dos repasses do Fundo de Participação dos Municípios revela o
quanto as suas sedes, em que pese seu status de cidade, não têm
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sido capazes de agregar e ampliar riquezas. A observação de es-
pacialização de dados de renda nas cidades, entornos imediatos e
municípios, revela o quanto as cidades tendem a abrigar populações
mais pobres, na medida em que o padrão de ocupação fundiária
do entorno, seja o de propriedades maiores, como em Ulianópolis,
casos em que a riqueza produzida no meio rural é investida não na
sede do mesmo município, mas em outras cidades, onde o grau de
acúmulo da infra-estrutura é mais elevado e onde já é clara a con-
dição de pólo regional (Cardoso et all, 2007; FVPP/UFPA, 2005).
Qual o grau de viabilidade econômica dos novos municípios diante
de tal padrão de circulação de riquezas? Outro aspecto importante
é o da magnitude do setor informal em cidades ribeirinhas e em
cidades novas formadas na margem de rodovias: nas primeiras, a
feira funciona como motor propulsor da economia, envolvendo a
população ribeirinha de localidades próximas que comercializam
diariamente sua produção; nas segundas, o trabalhador rural, mo-
mentaneamente desocupado das tarefas do plantio e criação, ofe-
rece seus serviços na cidade, fortalecendo um amplo setor de ser-
viços estruturado na informalidade. Em ambos os casos, a cidade
se torna ponto de apoio importante, mas que assume o improviso
de instalações como algo aceitável e necessário para a absorção
de produtos e mão-de-obra disponíveis. Some-se a isso outra in-
compreensão desses padrões de produção por parte das políticas
sociais, tais como a inadequação do sistema de educação formal às
especificidades da vida desses trabalhadores (calendários e conte-
údos). Como podemos orientar a formulação de políticas inclusivas
de educação sem conhecer o perfil de quem queremos educar e
capacitar?
d) A ambiental – a dificuldade de submeter a ocupação do território
paraense ao controle do poder público aponta para conflitos entre
padrões de ocupação praticados historicamente e a legislação fe-
deral existente e que é sistematicamente descumprida por falta de
planejamento ou inadequação das normas às características físi-
cas da região e aos meios disponíveis (tecnológicos e financeiros).
Por exemplo, existem cidades inteiras construídas sobre Áreas de
Preservação Permanentes (APP´s), se considerarmos os parâme-
tros estabelecidos pelo Código Florestal Brasileiro (Lei Federal nº
4771/65) de definição da largura das APP´s proporcionalmente à
largura dos rios, dificultando processos de regularização fundiária
e do controle da ocupação que o mesmo código quer evitar. A pre-
sença freqüente de pequenos rios no interior das cidades também
nos coloca grandes desafios, na medida em que eles são sistema-
ticamente aterrados, para permitir a continuidade de ruas, ou têm
suas margens ocupadas por palafitas desprovidas de solução de
saneamento, que nos colocam cada vez mais distantes das de-
terminações das leis federais que protegem os recursos hídricos
(9433/97) e que regulamentam o saneamento básico (11445/07)
(ONU/MMA/PMM, 2006; UFPA/Funpea/ ELN, 2006; FVPP/UFPA,
2005; Cardoso et all, 2007). O aterro e o assoreamento dos rios,
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somados à falta de solução de drenagem urbana compatível com o
volume de precipitações típico da região, têm revelado a fragilidade
dos solos de alguns municípios e potencializado a abertura de vo-
çorocas, que rompem asfalto e descontinuam ruas, e nos remete a
seguinte pergunta: qual custo é maior? O custo de planejar e preve-
nir ou o custo de corrigir problemas causados pela incompreensão
das forças da natureza pelo homem? Quanto nos custará no futuro
ter eliminado rios e matas do interior das cidades? Custará redu-
ção da biodiversidade? Deterioração das condições ambientais e
de saúde pública? Quem tem poder para interferir na ordem dessas
ações?
e) A política – a disputa política existente no estado do Pará dificul-
ta a compreensão de qual projeto de desenvolvimento estaríamos
perseguindo. A disputa de poder permeia todas as áreas citadas,
refletindo-se no trato com o meio ambiente, nas condições de aces-
so aos direitos sociais, no fluxo e distribuição da riqueza, no padrão
de acesso à terra. Pouco se sabe que, onde comunidades têm se
organizado de modo mais coeso, a superação de limitações econô-
micas e tecnológicas (ex.: produção de energia, capacitação para
a produção) tem sido possíveis. Por que trabalhos dessa natureza
realizados na região da Transamazônica e Xingu resultariam em as-
sassinatos e ameaças de morte, se não fossem capazes de alterar
a correlação de forças existentes e favorecer os segmentos sociais
mais vulneráveis à pobreza e à violência? Por que, apesar das exi-
gências legais de participação popular e gestão democrática dos
municípios brasileiros, tão pouco avanço tem havido na pactuação
de parcerias que resultem na melhoria de qualidade de vida da po-
pulação? Onde estão as barreiras à superação dos conflitos? Quais
são os mecanismos utilizados para neutralizar direitos? Para disse-
minar o cepticismo quanto à possibilidade de construção de uma
sociedade mais justa? Qual o papel do Estado nesse processo?
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modo que possamos tomá-las como instrumentos de desenvolvimento e am-
pliação de condições de cidadania, a exemplo do que as cidades têm sido des-
de milênios atrás na história da humanidade. Iniciamos, assim, o resgate de
um débito histórico do poder público com a região, de povoá-la sem atenção à
necessidade de estruturar uma rede urbana ou de refletir a respeito do destino
das cidades em relação às intensas transformações ocorridas no meio rural no
decorrer das últimas décadas.
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