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Alguns Conceitos e Definicgdes A termodinamica é a ciéncia da energia e da entropia. Essa € uma definigao excelente de termodinamica, Entretanto, uma vez que ainda nao definimos energia e entropia, vamos adotar uma definigo alternativa, formulada com termos mais familiares no momento, que é: A termodinamica €a ciéncia que trata do calor, do trabalho e daquelas propriedades das substincias relacionadas ao calor e ao trabalho. A base da termodinamica, como a de todas as ciéncias, é a observaciio experi- mental. Na termodin&mica, essas descobertas foram formalizadas através de certas leis basicas, conhecidas como primeira, segunda e terceira leis da termodinamica. Além dessas, a lei zero, que no desenvolvimento l6gico da termodinamica precede a primeira lei, também foi estabelecida. Nés apresentaremos, ao longo do texto, essas leis, as propriedades termodindmicas pertinentes e as aplicaremos a varios exemplos representativos. O objetivo do estudante deve ser o de obter uma profunda compreenso dos fundamentos da termodinamica e a habilidade para a aplicagao dos mesmos na solucdo de problemas. O propésito dos exemplos e problemas propostos é auxiliar 0 estudante nesse sentido. Deve ser ressaltado que ndo ha necessidade de memorizar numerosas equagdes porque os problemas siio melhor resolvidos pela aplicagao direta das definigdes e das leis da termodinamica. N6s apresentaremos, neste capitulo, algumas definigdes e conceitos basicos da termodinamica. 2.1 O Sistema Termodinamico e 0 Volume de Controle Um sistema termodinamico € definido como uma quantidade de matéria, com massa e identidade fixas, sobre a qual nossa atengao € dirigida. Tudo 0 que é externo ao sistema é denominado meio ou vizinhanga. O sistema é separado da vizinhanga pelas fronteiras do sistema essas fronteiras podem ser méveis ou fixas. Considere 0 gas contido no cilindro mostrado na Fig. 2.1 como o sistema. Se um bico de Bunsen é colocado sob 0 cilindro, a temperatura do gas aumentard e 0 émbolo se elevaré. Quando © émbolo se eleva, a fronteira do sistema move. Posteriormente nés mostraremos que calor ¢ trabalho cruzam a fronteira do sistema durante esse proceso, mas a matéria que compe o sistema pode ser sempre identificada. Um sistema isolado é aquele que nao é influenciado, de forma alguma, pelo meio, ou seja calor e trabalho no cruzam a fronteira do sistema. A anélise termodinamica de equipamentos que apresentam um escoamento de massa para dentro e/ou para fora do equipamento é um procedimento usual na engenharia (veja 0 compressor de ar esbogado na Fig. 2.2). O procedimento seguido em tal andlise consiste em especificar um volume de controle que envolve 0 equipamento a ser considerado. A superficie desse volume de controle € chamada de superficie de controle. Note que massa, assim como calor e trabalho (€ quantidade de movimento), podem ser transportados através da superficie de controle. Pesos Embolo Fronteira do sistema Figura 2.1 — Exemplo de um sistema. 14 Fundamentos da Termodinamica sph ‘Admissto de ar { b Descarga dear ‘a baba prossdo t t alta pressio Haul es 1 yeas 1 Superiie —~a!| compressor d ' e controle 3 rt Moto Figura 2.2 — Exemplo de um t a volume de controle Assim, um sistema 6 definido quando se trata de uma quantidade fixa de massa e um volume de controle € especificado quando a andlise envolve fluxos de massa. A diferenga entre essas duas maneiras de abordar o problema serd tratada detalhadamente no Cap. 6. Deve-se observar que os termos sistema fechado ¢ sistema aberto so usados de forma equivalente aos termos sistema (massa fixa) e volume de controle (envolvendo fluxos de massa). O procedimento que serd adotado nas apresentagdes da primeira e da segunda leis da termodinamica é 0 de primeiro formular as leis para sistemas e depois efetuar as transformagdes necessérias para torné-las adequadas a volumes de controle. 2.2 Pontos de Vista Macroscépico e Microscépico Uma investigaco sobre o comportamento de um sistema pode ser feita sob os pontos de vista macroscépico ou microscépico. Consideremos brevemente o problema que terfamos se descrevés- semos um sistema sob 0 ponto de vista microscdpico. Suponhamos que o sistema seja constituido por um g4s monoatmico, a pressio e temperatura atmosféricas, contido num cubo com aresta igual a 25 mm. Esse sistema contém cerca de 10 tomos. Trés coordenadas devem ser especificadas para descrever a posigdo de cada dtomo e para descrever a velocidade de cada étomo siio necessérias as trés componentes do vetor velocidade. Assim, para descrever completamente 0 comportamento desse sistema, sob o ponto de vista microscépico, ¢ necessério lidar com, pelo menos, 6 x 10° equacdes. Esta tarefa seria ardua mesmo se tivéssemos um computador digital de grande capacidade. Entretanto, dispomos de duas abordagens diversas que reduzem significativamente 0 niimero de varidveis necessérias para especificar 0 problema e, deste modo, facilitando sua soluga0. Uma dessas abordagens é a estatistica que, baseada na teoria da probabilidade ¢ em consideragdes estatisticas, opera com os valores "médios" das particulas que estamos considerando. Isso é feito, usualmente, em conjunto com um modelo de molécula. Essa forma é a utilizada nas disciplinas conhecidas como teoria cinética e mecfinica estatfstica. ‘A outra forma de abordar 0 problema é a que utiliza a termodindmica clissica macroscépica. Conforme 0 préprio nome macroscépico sugere, nos preocupamos apenas com os efeitos totais ou médios de muitas moléculas. Além disso, esses efeitos podem ser percebidos por nossos sentidos medidos por instrumentos (na realidade, 0 que percebemos e medimos € a influéncia média temporal de muitas moléculas). Por exemplo, consideremos a pressiio que um gas exerce sobre as paredes de um recipiente. Essa presso resulta da mudanga na quantidade de movimento das moléculas quando estas colidem com as paredes. Entretanto, sob 0 ponto de vista macroscépico, no estamos interessados na ago isolada de uma molécula mas na forga média, em relagio ao tempo, que atua sobre uma certa area e que pode ser medida com um manémetro. De fato, essas observagées macroscépicas so completamente independentes de nossas premissas a respeito da natureza da matéria. Ainda que a teoria e 0 desenvolvimento adotado neste livro sejam apresentados sob 0 ponto de vista macrosc6pico, algumas observagdes suplementares sobre o significado da perspectiva microscépica serao inclufdas como um auxilio ao entendimento dos processos fisicos envolvidos. O livro Introduction to Thermodynamics: Classical and Statistical, de R. E. Sonntag G. J. Van Wylen, apresenta um tratamento, sob 0 ponto de vista microscépico e estatistico, da termodina- mica Alguns Conceitos e Definigdes 15 Algumas observagdes devem ser feitas em relagdo ao meio continuo. Sob o ponto de vista macroscépico, nés sempre consideraremos volumes que so muito maiores que os moleculares e, desta forma, trataremos com sistemas que contém uma enormidade de moléculas. Uma vez que niio estamos interessados nos comportamentos individuais das moléculas, desconsideraremos a agao de cada molécula e trataremos a substdncia como continua. Este conceito de meio continuo é, naturalmente, apenas uma hipétese conveniente que nao é valida quando o livre caminho médio das moléculas se aproxima da ordem de grandeza das dimensdes do sistema que esti sendo analisado. Por exemplo, a hipétese de meio continuo normalmente nao € adequada nas situagdes encontradas na tecnologia do alto-vécuo. Apesar disso, a premissa de um meio continuo é valida e conveniente em varios trabalhos de engenharia. 2.3 Estado e Propriedades de uma Substancia Se considerarmos uma dada massa de dgua, reconhecemos que ela pode existir sob varias formas (fases). Se ela é inicialmente liquida pode-se tornar vapor, apés aquecida, ou sGlida quando resfriada. Uma fase é definida como uma quantidade de matéria totalmente homogénea. Quando mais de uma fase coexistem, estas se separam, entre si, por meio das fronteiras das fases. Em cada fase a substancia pode existir a varias pressOes e temperaturas ou, usando a terminologia da termodinamica, em varios estados. O estado pode ser identificado ou descrito por certas propriedades macroscépicas observaveis; algumas das mais familiares sdo: temperatura, pressao e massa especifica. Outras propriedades sero apresentadas nos capitulos posteriores deste livro. Cada uma das propriedades de uma substincia, num dado estado, apresenta somente um determinado valor e essas propriedades tem sempre o mesmo valor para um dado estado, independente da forma pela qual a substancia chegou a ele. De fato, uma propriedade pode ser definida como uma quantidade que depende do estado do sistema e € independente do caminho (i. e. a historia) pelo qual o sistema chegou ao estado considerado. Do mesmo modo, o estado é especificado ou descrito pelas propriedades. Mais tarde consideraremos o mimero de propriedades independentes que uma substancia pode ter, ou seja, 0 ntimero minimo de propriedades que devemos especificar para determinar 0 estado de uma substancia. ‘As propriedades termodinamicas podem ser divididas em duas classes gerais, as intensivas e as extensivas. Uma propriedade intensiva € independente da massa e o valor de uma propriedade extensiva varia diretamente com a massa. Assim se uma quantidade de matéria, num dado estado, € dividida em duas partes iguais, cada parte apresentar4 o mesmo valor das propriedades intensivas e a metade do valor das propriedades extensivas da massa original. Como exemplos de propriedades intensivas podemos citar a temperatura, a pressio e a massa especffica. A massa ¢ 0 volume total siio exemplos de propriedades extensivas. As propriedades extensivas por unidade de massa, tal como o volume especffico, so propriedades intensivas. Freqiientemente nos referimos no apenas as propriedades de uma substancia, mas também as propriedades de um sistema. Isso implica, necessariamente, que o valor da propriedade tem significancia para todo o sistema, 0 que por sua vez implica no que é chamado equilibrio. Por exemplo, se 0 gés que constitui o sistema mostrado na Fig. 2.1 estiver em equilibrio térmico, a temperatura serd a mesma em todo o gés e podemos falar que a temperatura é uma propriedade do sistema. Podemos, também, considerar 0 equilfbrio mecnico, que esté relacionado com a pressio. Se um sistema estiver em equilibrio mecénico, ndo haverd a tendéncia da pressio, em qualquer ponto, variar com o tempo, desde que o sistema permanega isolado do meio exterior. Observe que \: Pesos Conjunto cillindro - pistéo Fronteira | do sistema I | Figura 2,3 — Exemplo de um proceso de quase-equilibrio num sistema.

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