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Departamento de Matemática
Prof. Celius A. Magalhães
Cálculo III
Texto 06/1 ∗
Derivadas Parciais
Uma ideia importante no estudo de funções de várias variáveis é, a menos de uma, fixar todas as
demais. Com isso, o estudo fica reduzido ao caso de uma variável, e é possível usar tudo o que já
se sabe sobre derivada de funções de uma variável. É essa a ideia por traz das derivadas parciais.
Definição e Interpretação Geométrica
d f (x0 , y0 + t) − f (x0 , y0 )
f (P(t))t=0 = lim
fy (P0 ) =
dt t→0 t
Assim, fy (P0 ) é a inclinação da reta tangente ao gráfico de f (P(t)) no instante t = 0, e é claro
que esse número é importante no estudo da função f . Veja a figura acima. Várias outras notações
são usadas para denotar a deriva parcial, como por exemplo
∂
fy (P0 ) = f (P0 ) = ∂y f (P0 ) = Dy f (P0 ) = D2 f (P0 )
∂y
Analogamente define-se a derivada parcial com respeito à variável x como sendo
f (x0 + t, y0 ) − f (x0 , y0 )
fx (P0 ) = lim
t→0 t
∂
e são usadas também as notações fx (P0 ) = ∂x f (P0 ) = ∂x f (P0 ) = Dx f (P0 ) = D1 f (P0 )
Exemplo 1 Calcular as derivadas parciais da função f : R2 → R dada por f (x, y) = x2 + y2 em
um ponto genérico P0 = (x0 , y0 ).
Função de Cobb-Douglas
As derivadas parciais ocupam um lugar de destaque tanto na Física como na Matemática, e isso
deste meados do século XVIII. Mais recentemente, muitas outras áreas têm buscado modelar seus
problemas usando a linguagem matemática, e fazem uso exaustivo das derivadas parciais. É o
caso da Economia, com a função de produção de Cobb-Douglas. Charles Cobb e Paul Douglas
usaram um modelo matemático para descrever o produto interno americano, e os resultados foram
tão bons que o modelo passou a ser usado em muitas outras situações.
Para descrever o modelo considere, primeiro, o caso em que a produção g(x) de uma industria
seja função do número x de horas trabalhas. Em geral, em uma industria, x assume valores muito
grandes e, comparado com ele, o número 1 é próximo de zero. Assim
g(x)
g′ (x) = α . (2)
x
Essa é uma maneira interessante de modelar problemas, por meio de equações diferenciais.
No caso, por uma equação diferencial ordinária, pois é a derivada ordinária em relação à uma
única variável. A equação (2) pode ser escrita na forma g′ (x)/g(x) = α /x, que integrada resulta
em ln(g(x)) = ln(xα ) + k. Finalmente, tomando a exponencial, obtém-se que
g(x) = Kxα
para alguma constante positiva K. Assim, como consequência do modelo proposto pela equação
(2), a função g(x) deve ser necessariamente da forma acima.
Mas por que essas observações estão relacionadas com funções de duas variáveis? Porque, em
uma industria, os gastos estão classificados segundo duas categorias: a quantidade x de trabalho
e a quantidade y de capital usadas na produção. Nesse caso, a produção é uma função f (x, y) de
duas variáveis, e vale a interpretação feita acima, isto é:
i) fx (x, y) = produtividade marginal do trabalho
ii) fy (x, y) = produtividade marginal do capital
f (x, y) f (x, y)
fx (x, y) = α e fy (x, y) = β (3)
x y
Estas são equações diferencias parciais, por envolverem as derivadas parciais. Entretanto, são
equações muito simples e, comparando com o que se fez acima, não é difícil perceber que as
soluções agora são da forma
f (x, y) = Kxα yβ
Esta é, afinal, a função de produção de Cobb-Douglas, que ilustra bem o uso das derivadas parciais
em áreas distintas da Matemática e da Física. Essa função será estudada em detalhes mais adiante,
em conexão com os multiplicadores de Lagrange.
Derivadas Segundas
Voltando pao caso geral, as derivadas parciais podem ou não existir. Por exemplo, a função
f (x, y) = x2 + y2 , definida em R2 , possui derivadas parciais em (x, y) 6= (0, 0), onde
x y
fx (x, y) = p e fy (x, y) = p .
2
x +y 2 x + y2
2
♦ f ❖❖❖❖
♦♦♦♦♦ ❖❖❖
♦ ♦♦♦ ❖❖❖
❖❖❖
♦ ♦♦♦ ❖❖'
w ♦
fx ❄ fy ❄
⑧⑧ ❄❄ ⑧⑧ ❄❄
⑧⑧ ❄❄❄ ⑧⑧ ❄❄
⑧⑧ ❄❄ ⑧⑧ ❄❄
⑧⑧ ⑧⑧ ❄
fxx fxy fyx fyy
Solução. A função pode ser escrita na forma f (x, y) = eyln(x) , e é fácil calcular as derivadas
y y
fx (x, y) = eyln(x) = xy = yxy−1 e fy (x, y) = eyln(x) ln(x) = xy ln(x)
x x
que estão definidas para x > 0 e y ∈ R. Pode-se então estudar as derivadas de fx , que são
fxx (x, y) = y(y − 1)xy−2 e fxy (x, y) = (y)y xy−1 + y(xy−1 )y = xy−1 + yxy−1 ln(x)
Teorema 1 Seja f : D → R uma função dada e P0 ∈ D um ponto tal que B(P0 , δ ) ⊂ D para
algum δ > 0. Se as funções fx , fy e fxy existem em B(P0 , δ ) e, além disso, são funções contínuas
nessa bola, então existe fyx (P0 ) e fyx (P0 ) = fxy (P0 ).
A igualdade entre as derivadas parciais mistas será muito usada ao longo do curso. É neces-
sário, entretanto, verificar com cuidado as hipóteses do teorema, pois existem casos em que essas
derivadas não coincidem. Esse é o conteúdo do
Exemplo 3 Seja f : R2 → R dada por
2 2
xy(x − y )
se (x, y) 6= (0, 0)
f (x, y) = x2 + y2
0 se (x, y) = (0, 0).
f (0 + t, y) − f (0, y) y(t 2 − y2 )
fx (0, y) = lim = lim 2 = −y
t→0 t t→0 t + y2
e
f (x, 0 + t) − f (x, 0) x(x2 − t 2 )
fy (x, 0) = lim = lim 2 2 = x
t→0 t t→0 x + t
fx (0, 0 + t) − fx (0, 0) −t
fxy (0, 0) = lim = lim = −1
t→0 t t→0 t
e
fy (0 + t, 0) − fy (0, 0) t
fyx (0, 0) = lim = lim = 1
t→0 t t→0 t
Finalmente vale notar uma analogia interessante entre os casos de uma e várias variáveis.
No caso de uma função de uma variável g(x), os pontos críticos x0 são aqueles para os quais
′
g (x0 ) = 0. Além disso, esses pontos podem ser classificados como de mínimo ou máximo local
de acordo com o sinal da derivada segunda: o ponto x0 é de mínimo local se g′′ (x0 ) > 0, e de
máximo local se g′′ (x0 ) < 0.
No caso de funções de duas variáveis f (x, y), os pontos críticos (x0 , y0 ) são aqueles para os
quais fx (x0 , y0 ) = fy (x0 , y0 ) = 0. A pergunta natural agora é se as derivadas segundas podem ser
usadas para classificar esses pontos como de mínimo ou de máximo local. Para isso, o primeiro
passo é organizar as derivadas parciais de acordo com a matriz Hessiana
fxx (x, y) fxy (x, y)
H f (x, y) =
fyx (x, y) fyy (x, y)
Nas hipóteses do teorema acima essa matriz é simétrica, o que facilita muito o seu estudo. Por
exemplo, sendo simétrica, ela certamente possui dois auto-valores reais λ1 e λ2 . Pode-se mostrar
então o seguinte critério: o ponto crítico (x0 , y0 ) é de mínimo local se λ1 > 0 e λ2 > 0, e de máximo
local se λ1 < 0 e λ2 < 0. Esse fato é curioso por estabelecer um paralelo interessante entre os casos
de funções de uma e de duas variáveis.