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=I 2 s = © Conhecimento Comum Michel Maffesoli Dialética da Familia Massimo Canevacei(org.) Dialética do Individuo Massimo Canevacc (org.) A Felicidade Imaginada ‘Newton Cunha ‘Teoria Critica Ontem ¢ Hoje Barbara Freitag Estado e Capitalismo Octavio Tanai Culeura Brasileira © Mlentidade Nacional Colegio Primei O que & Socalog Carlos Benedivo Martins O que € Paticpasio. Juan E., D. Bordenave — PIERRE BOURDIEU COISAS DITAS tradugio Céssia R. da Silveira e Denise Moreno Pegorim revisto téenica Paula Montero editora brasiliense Espago social e poder simbélico* Eu gostaria, nos limites de uma Jeitura, de tentar apresen- tar os principios teéricos que estdo na base da pesquisa, cujos resultados sio aprgsentados em La distinction, e extair certas, implicagées te6ricas com mais probabilidade de escapar a0 leitor, sobretudo aqui, em virtude dos descompassos entre as tradigdes culturais. Se eu tivesse que caracterizar meu trabalho fem duas palavras, ou seja, como se faz muito hoje em dia, se tivesse que the aplicar um rétulo, eu falaria de constructivist structuralism ou de structuralist constructivism, tomando a pa- lavra “estruturalismo” num sentido daquele que the € dado pela tradiglo saussuriana € lévi-straussiana, Por estruturalismo ou estruturalista, quero dizer que cxistem, no proprio mundo Social € no apenas nos sistemas simbélicas — linguagem, mito, etc. —, estruturas objetivas, independentes da conscién. cia € da vontade dos agentes, as quais sao capazes de orientar ‘ou coagir suas priticas © representagées. Por construtivi quero dizer que ha, de um lado, uma'génese social dos esqy mas de percepedo, pensamento © agio que sio constitutivos do que chamo de habitus e, de outro, das estruturas sociais, ‘em particular do que chamo de campos e grupos, ¢ particular: ‘mente do que se costuma chamar de classes soci Penso que esse esclarecimento se impée particularmente * Texto franeés da confestncta pronunciada na Universidade de San Diego, em smargo de 1986, 150 PIERRE BOURDIEU ‘aqui: de fato, © acaso das tradugdes faz com que se conheca A reproducao, por exemplo, o que levara, como alguns comenta- dores nio hesitaram em fazer, a me classificar entre os estrat 8, 40 asso que nao se conhecem trabalhos bem anterio- res (tio antigos que so até mesmo anteriores 20 surgimento dos trabalhos tipicamente “construtivistas” sobre os mesmos te- mas) que com certeza me valeriam ser percebido como “cons- ttutivista’: assim, num livro intitulado Rapport pédagogique et communication, mostramos como se constréi uma relay cial de compreensio no e pelo mal-entendido, ou apesar do mal-entendido; como professores ¢ alunos poem-se de acordo, mediante uma espécie de transagio ticita e tacitamente orien- tada pela preocupacio de minimizar os custos e os riscos, para aceitar uma definigao minima da situagio de comunicagio. Do ‘mesmo modo, num outro estudo, intitulado “Les eatégories de Fentendement professoral”, tentamos analisar a génese e o fun- cionamento das categorias de percepcio € apreciagao através das quais 0s professores constroem a imagem de seus alunos, de suas performances, de seu valor, e produzem, mediante priticas de cooptacdo orientadas por essas mesmas categorias, © proprio grupo de seus colegas e 0 corpo de professores. Depois desse paréntese, volto & minha questo inicial Em termos muito gerais, a ciéncia social, tanto a antropolo- gia como a sociologia € a histéria, oscila entre dois pontos de vista aparentemente incompativeis, entre duas. perspectivas aparentemente inconcilidveis: 0 objetivismo e o subjetivismo, 0u, se preferirem, o fisicalismo e o psicologismo (que pode to- mar diversas coloragées — fenomenoldgica, semiol6gica, etc). De um lado, ela pode “tratar os fatos sociais como coisas’, segundo a velha maxima durkheimiana, e assim deixar de lado tudo 0 que eles devem ao fato de serem objetos de conheci- mento — ou de desconhecimento’ — na existéncia social. De outro lado, ela pode reduzir o mundo social as representagoes que dele se fazem os agentes, ¢ entio a tarefa da ciéncia social consistiria em produzir uma “explicagao das explicagdes” (account of the accounts) produzidas pelos sujeitos sociais. Raramente essas duas posigdes se exprimem ¢ sobretudo se concretizam na pritica cientifica de maneira tao radical e to contrastada, Sabe-se que Durkheim, juntamente com Marx, & ESPAGO SOCIAL E PODER SIMBOLICO 151 com certeza quem expressou de maneira mais conseqiiente a osicdo objetivista. “Acreditamos fecunda", dia ele, “esta idéia de que a vida social deva ser explicada niio pela concepgio dos que dela participam, mas pelas causas profundas que esca. pam a consciéncia.” Mas ele no ignorava, como bom kantia- No, que $6 € possivel apreencler essa realidade empregando instruments I6gicos. Dito isto, o fisicalismo objetivista costuma associar-se & inclinag2o positivista para conceber as classifica- bes como recortes “operatérios” ou como um registro mecini co de cortes ou descontinuidades “objetivas” (por exemplo, nas distribuigdes). £ ceramente em Schiitz € nos etnometoddlogos que poderiam ser encontradas as expresses mais puras da visto subjetivista. Assim, Schitz vai exaiamente na direcio posta a Durkheim: “O campo observacional do social scien- Hist, a tealidade social, possui um sentido ¢ uma estrutura de pertin€ncia especificos para os seres humanos que nela vivem, agem e pensam, Medliante uma série de construgdes de senso comum, eles pré-selecionaram e pré-interpretaram esse mundo que apreendem como a realidade de sua vida cotidiana. S40 esses objetos de pensamento que determinam seu comporta- mento, motivando-o. Os objetos de pensamento construidos pelo soctal scientist a fim de apreender essa realidade social devem se basear nos objetos de pensamento construidos pelo pensamento de senso comum dos homens que vivem sua vida cotidiana em seu mundo social. Assim, as construgdes das cién- Cias sociais 580, por assim dizer, construgdes de segundo grau, isto €, construgdes das construcbes feitas pelos atores da cena social”, A oposigao € total: no primeito caso, 0 conhecimento cientifico 86 € obtido mediante uma ruptura com as representa- ‘ses primeiras — chamadas “prenogées” em Durkheim e “ideologia” em Marx — que conduz as causas inconscientes No outro caso, ele esté em continuiddade com 0 conhecimento de senso comum, j& que construgdes". ; Se abordei de maneira um pouco pesada ess oposi¢io — um dos mais funestos pares de conceitos (paired concepts) passa de uma “construcao das * A Schote, Collected papers, 1, The problom of social reali, Ls Haye, Martinus Nil, sd, p59.

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