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A intimidade em tempos de rede social digital – O

Facebook e a midiatização do íntimo

José Antonio Martinuzzo


Professor Doutor no Departamento de Comunicação Social da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)
e no Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Territorialidades, na mesma instituição, do qual é
coordenador-adjunto. Lidera os grupos de pesquisa Laboratório de Comunicação e Cotidiano (ComC) e
Sociedade Midiatizada e Práticas Comunicacionais Contemporâneas.

Heryck Luiz Jacob Sangalli


Graduado em Jornalismo pelo Departamento de Comunicação Social da Universidade Federal do Espírito
Santo (UFES), pesquisador nos grupos de pesquisa Laboratório de Comunicação e Cotidiano (ComC) e
Sociedade Midiatizada e Práticas Comunicacionais Contemporâneas.

Resumo
Este artigo consiste de uma investigação sobre o conceito de intimidade no âmbito da rede social digital
Facebook. As perguntas iniciais foram constituídas para saber qual a visão que os usuários da rede social têm
acerca dessa esfera da vida cotidiana, e quais são os critérios para a publicação de conteúdos íntimos na era do
Facebook. A metodologia utilizada inclui revisão de literatura específica, abordando temas como intimidade,
tecnologia, sociedade em rede, redes sociais na internet, entre outros; e aplicação de uma pesquisa on-line junto
aos usuários da rede social digital por intermédio de um questionário. Os resultados obtidos evidenciam que o
conceito de intimidade mudou com o surgimento de redes sociais digitais.

Palavras-chave
Intimidade; Público; Privado; Rede Social Digital; Facebook.

Abstract
This article consists of an investigation into the concept of intimacy within the Facebook online social network.
The initial questions were set up to find out what the vision that social network users have about that sphere of
everyday life; and what are the criteria for publishing intimate content in the age of Facebook. The methodology
includes reviewing literature concerning topics such as intimacy, technology, network society, social networking
sites, among others; and implementation of an online survey of users of digital social network through a
questionnaire. The results showed that the concept of privacy has changed with the emergence of online social
networks.

Keywords
Intimacy; public; private; Digital Social network; Facebook.

Introdução

As redes sociais são as estruturas dos agrupamentos humanos, constituídas pelas


interações, que viabilizam grupos e comunidades os mais diversos (RECUERO, 2014, p.16).
A partir da mediação das tecnologias digitais, essas redes passaram por transformações
significativas, sendo o uso da Comunicação Mediada por Computador (CMC) um dos
motores dessa mudança. A partir dele, o espaço comunicacional das antigas redes sociais

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também se alterou, migrando para a internet e atualizando os meios de interação humana por
meio das tecnologias digitais.
Investigar essa nova forma de sociabilidade é algo impositivo, tendo em vista que suas
reverberações no conjunto do modo de existir atual são evidentes. Com a pesquisa que
redundou neste artigo, buscamos analisar um tema específico no conteúdo publicado no site
da rede social Facebook, a intimidade. Assim, nossa pergunta central é: qual a visão que os
usuários da rede social têm acerca dessa determinante da vida cotidiana?
Fundado em 2004, o Facebook atualmente é a maior rede social na internet. Além
disso, o próprio slogan da empresa direciona uma relação pessoal entre os usuários e a
plataforma na web: “No Facebook você pode se conectar e compartilhar o que quiser com
quem é importante em sua vida”.
Para desenvolvermos este estudo, além de pesquisa empírica on-line, executada por
meio de um questionário dirigido aos usuários do Facebook, realizamos uma revisão de
literatura ligada ao tema e à nossa problemática. Assim, vamos discutir, a partir da
diferenciação entre os ambientes público e privado, o aparecimento e as transformações do
conceito da intimidade.
Em seguida, estão os estudos teóricos referentes ao pano de fundo em que se enquadra
o objeto de estudo, a midiatização, em especial a era das redes sociais na internet, além de
conceitos como Comunicação Mediada por Computador (CMC), ciberespaço, redes e Web
2.0. Apresentaremos uma breve análise psicológica do sujeito em rede, problematizando a
questão da subjetividade e da intimidade na sociedade midiatizada.
Numa terceira seção, apresentaremos os dados sobre o Facebook e os principais
resultados da pesquisa acerca das concepções de intimidade que regem as publicações na
maior rede social digital do mundo.

Intimidade – um conceito em contínua transformação

O conceito de intimidade está diretamente ligado ao surgimento da diferenciação entre


os ambientes público e privado, notadamente a partir dos séculos XVIII e XIX. O sentido e o
emprego das palavras "público" e "privado" são diferentes conforme a época, ressalta Sennett
(2014), para quem:
As primeiras ocorrências da palavra "público" em inglês identificam o
"público" como bem comum na sociedade. Em 1470, por exemplo, Malory
falou do imperador Lucius "[...] ditador ou procurador do bem público [grifo
do autor] em Roma". Setenta anos mais tarde, havia-se acrescentado ao
sentido de público aquilo que é manifesto e está aberto à observação geral
(p. 33).
O âmbito privado nasceria a partir do que é relacionado, no contexto moderno, ao que
o Sennett (2014, p. 16) diz ser "um florescimento da vida psíquica diante do isolamento”.
Neste âmbito, é que as relações íntimas são criadas.
Para o termo "privado" também houve mudança de significado quanto a cada época.
No século XIV, como é referenciado por Sennett (2014), a palavra "privado" estava
relacionada, em alguns casos, ao sentido de "privilégio". Já Sibilia (2008), diz que:
[...] a separação entre o público e privado é uma invenção histórica e datada,
uma convenção que em outras culturas não existe ou se configura de outras
formas. Inclusive entre nós, essa distinção é bastante recente: a esfera da
privacidade só ganhou consistência na Europa dos séculos XVIII e XIX,
ecoando o desenvolvimento das sociedades industriais que um certo espaço
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de refúgio para o indivíduo e a família nuclear começou a ser criado, no seio
do mundo burguês, fornecendo a esses novos sujeitos aquilo que tanto
almejavam: um território a salvo das exigências e dos perigos do meio
público, aquele espaço "exterior" que começava a ganhar um tom cada vez
mais ameaçador (p. 60).
Para Sennett (2014, p. 33), a partir do século XVII, "a oposição entre 'público' e
'privado' era matizada de modo mais semelhante ao atual". "Público" significava aberto à
observação de qualquer pessoa, enquanto "privado" significava uma região protegida da vida,
definida pela família e pelos amigos.
Segundo Saldanha (2005), o "privado" também está relacionado à convivência íntima
e familiar. Além disso, o autor conclui que "[...] a família sempre se entendeu como
concentração do existir privado, diretamente ligado aos afetos mais pessoais e aos
componentes domésticos [...]” (p. 21).
Sibilia (2008) também relaciona o lar como o ambiente de surgimento da privacidade
e da intimidade. A autora destaca: "as casas se tornaram lugares privados e, como explica
Rybczynski, junto com essa privatização do lar surgiu um sentido cada vez maior de
intimidade, de identificar a casa exclusivamente com a vida familiar" (p. 62, grifo da autora).
Por falar em intimidade, iremos recorrer à definição de Sasaki (2015) quanto ao termo:
"a palavra 'intimidade' deriva do superlativo latino intìmus, isto é, 'o mais afastado, o mais
recôndito; o âmago, o mais secreto'” (p. 152, grifo do autor).
A privacidade e a intimidade tomaram significados quase que sinônimos para o senso
comum. No entanto, Sasaki faz a distinção entre os dois conceitos. Para o autor, a intimidade
diz respeito a uma instância mais profunda em relação à privacidade e conclui: "Nela,
encontram-se os atributos, questionamentos e sentimentos mais particulares de uma
existência, o que faz de 'intimidade', por conseguinte, uma noção mais psicológica" (p. 152).
Sennett (2014) defende que, a partir do século XVIII, com o surgimento da vida
cosmopolita, "público" veio a significar um local em que a pessoa passa fora da convivência
familiar. Na região pública, grupos sociais diferentes teriam que entrar em contato. E o centro
dessa convivência era o capital. Para o autor, nesse século,
[...] a divisão entre a vida pública e a vida privada era constituída por um
local em que haviam exigências de civilidade, no caso do comportamento
público cosmopolita, e eram confrontadas pelas exigências da natureza,
representadas pelo âmbito familiar (2014, p. 36).
Juntos, esses dois âmbitos criaram o que Sennett iria chamar de um universo de
relações sociais. Entretanto, a vida pública não começou no século XVIII. É atribuída a essa
época uma nova versão dela (SENNETT, 2014, p. 78-79). Nesse período, a vida pública era
centralizada em dois marcos: a burguesia em ascensão e uma aristocracia em declínio.
Essa conclusão mostra que o século XVIII foi um divisor de águas quanto à vida
pública e à vida privada que, somado ao surgimento da burguesia mercantil, proporcionou a
convivência entre "estranhos". Isso significa uma mudança no olhar para o outro, agora visto
como sinônimo de forasteiro.
O começo do século XVIII apresentou ainda a ascensão dos cafés nas cidades de
Londres e Paris. Esses ambientes eram "os centros de informação mais importantes em ambas
as cidades nessa época" (SENNETT, 2014, p. 124). Nesses locais, "as pessoas então
experimentavam a sociabilidade [...] sem revelar muito seus sentimentos próprios, de sua
história pessoal, ou de sua posição social". O autor denomina este fenômeno como "a arte da
conversação".
Perrot (2009) defende que, desde então, o equilíbrio entre o público e o privado é
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incessantemente reformulado, mas sempre de forma precária. Tais modulações instáveis,
nota-se, estão ao sabor das contingências socioeconômicas, político-culturais e tecnológicas.
Nesse sentido, a partir do final do século XX, com o florescer das tecnologias digitais,
os limites entre o público e o privado vêm se liquefazendo, e modificando o conceito de
intimidade, por consequência. É nesse ambiente que, segundo Sibilia (2008), a intimidade
toma novas proporções, deixando de ser algo do interior do indivíduo para o seu exterior, o
que ela denomina ser extimidade.
Essa autora ressalta a falta de segurança presente nos espaços públicos como fator que
influencia um isolamento das pessoas, protegidas pelos muros de suas residências e que
buscam refúgios virtuais, como na internet. Sibilia conclui que "[...] por isso não surpreende
que se multipliquem os convites para acompanhar em detalhe os aspectos mais íntimos das
próprias rotinas domésticas de qualquer um" (p. 262).
Além disso, também é possível concluir que o "fascínio suscitado pelo exibicionismo
e pelo voyeurismo encontra terreno fértil em uma sociedade atomizada por um individualismo
com beiradas narcisistas, que precisa ver sua imagem refletida no olhar alheio para ser"
(SIBILIA, 2008, p. 263).
O narcisismo também é pontuado por Sennett (2014) como algo que permeia a
vertigem de interação. Quanto a isso, o autor diz que:
[...] o narcisismo é o princípio psicológico para a forma de comunicação que
chamamos de representação da emoção para outrem, ao invés de uma
apresentação corporificada de emoção. O narcisismo cria a ilusão de que
uma vez que se tenha um sentimento ele precisa ser manifestado - porque, no
final das contas, o "interior" é uma realidade absoluta. A forma de
sentimento é apenas um derivativo do impulso de sentir (p. 481).
Segundo Martín-Barbero (2006), os ambientes público e privado também sofreram
transformações após a evolução das tecnologias da informação:
[...] o uso alternativo das tecnologias e de redes informáticas (R. Kroes, S.
Finquelevich, J.L. Molina) na reconstrução da esfera pública passa, sem
dúvida, por profundas mudanças nos mapas mentais, nas linguagens e nos
desenhos de políticas, exigidos, todos eles, pelas novas formas de
complexidade que revestem as reconfigurações e hibridações do público e do
privado. Começando pela própria complexidade que, a respeito, a Internet
apresenta: um contato privado entre interlocutores que é, ao mesmo tempo,
mediado pelo lugar público que constitui a rede: processo que, por sua vez,
introduz uma verdadeira explosão do discurso público (p. 69).
Como efeito dessas transformações e evoluções tecnológicas, comumente, hoje, ao
entrarmos em locais públicos ou privados, nos deparamos com o aviso "Sorria, você está
sendo filmado". Isso mostra que cada vez mais a indagação clichê "o que você faria se não
estivessem olhando?" torna-se difícil de se responder. A questão de privacidade é corrompida
para garantir a sensação de segurança – ou porque esta já fora afetada.
Outro ponto a ser observado diante das novas tecnologias é quanto à utilização da
internet como meio de interação pessoal, o que acabou constituindo o nosso objeto de
pesquisa. Destacamos aqui que a Comunicação Mediada por Computador (CMC), que será
mais bem abordada na próxima seção, proporcionou mudanças nessa interação social
proveniente da conversação, cujas origens remontam há cerca de três séculos.
Atualmente, os sites de redes sociais "[...] acabam gerando uma nova forma
conversacional, mais pública, mais coletiva, que chamaremos de conversação em rede"
(RECUERO, 2014, p. 17, grifo da autora). Por falar em atualidade, veremos, a seguir, como
ocorreram as transformações tecnológicas que vislumbramos no cotidiano contemporâneo.
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Pontuaremos fatores históricos relacionados à midiatização, ao surgimento da internet e uma
nova configuração social, agora, conectada em rede.

Midiatização – Tecnologia e subjetividade

“Na atualidade frenética, as relações humanas tendem a vitualizar-se ou telerrealizar-


se no cenário de midiatização, caracterizado por mediações e interações baseadas em
dispositivos teleinformacionais”, reporta Moraes (2006, p. 36), focalizando a ideia de
sociedade midiatizada apresentada por Muniz Sodré (2002).
A dar suporte a essa nova sociabilidade, podemos destacar, também a partir de Moraes
(p. 35), que "a digitalização favorece a convergência de redes e plataformas numa linguagem
única, forjando a base para a hibridação das infraestruturas de transmissão de dados, imagens
e sons", viabilizando a midiatização das interações humanas.
Cardoso (2007, p. 27) parte da observação de Castells para abordar o que seria um
imperativo na atual sociedade: uma cultura da virtualidade real. Sendo virtual, “pois está
construída com processos virtuais de comunicações de base eletrônica”; e real, diante do fato
de que constituímos, frente a esse aparato tecnológico, a nossa percepção de existência,
nossos sistemas de representação, afetando diretamente a nossa subjetivação. “Essa
virtualidade é nossa realidade”. Aprofundamos essa observação por meio desta citação de
Cardoso:
A cultura da era da informação é a da virtualidade real porque, uma vez mais
no continuum histórico, fez surgir um novo sistema de comunicação
simbólica diretamente associado àquilo que se designa como cristalização de
um contexto de alteração das relações de produção/consumo, de experiência
e de poder em territórios específicos, originando, assim, culturas e
identidades coletivas (CARDOSO, 2007, p. 27, grifos do autor).
Segundo Sodré (2006, p. 22), hoje verificamos “uma mediação social exacerbada, a
midiatização, com espaço próprio e relativamente autônomo em face das formas interativas
presentes nas mediações tradicionais”. Tal fato implica “uma qualificação particular da vida,
um novo modo de presença do sujeito no mundo, ou, pensando na classificação aristotélica,
um bios específico”.
Os fatores que possibilitam essa nova forma de viver se originam de uma articulação
em rede de mídias (CARDOSO, 2007, p. 17). Essa articulação é caracterizada entre duas
redes principais, respectivamente a internet e a televisão, que estabelecem nós com outras
tecnologias, como o telefone e o rádio. Por sua potencialidade interativa e participativa, a
internet energiza o novo modus vivendi planetário, em maior ou menor grau, de acordo com
cada região.
A evolução tecnológica no século XX foi um divisor de águas na constituição de uma
nova realidade, ou melhor, de uma “digitalidade”. Santella (2013, p. 35) reporta que a
evolução da informática foi pontuada por quatro grandes marcos: o primeiro, com os
semicondutores dos anos 1960; o segundo marco, com o computador pessoal; o terceiro, com
o advento da Internet Explorer e das interfaces gráficas de usuários. Atualmente, o quarto
grande marco da revolução digital são as redes sociais na internet. Ainda segundo essa autora,
A história, a economia, a política, a cultura, a percepção, a memória, a
identidade e a experiência estão todas elas hoje mediadas pelas tecnologias
digitais. Estas penetram em nosso presente não só como um modo de
participação, mas como um princípio operativo assimilado à produção
humana em todas as suas áreas (2013, p. 33).

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Para Recuero (2009), o desenvolvimento da internet proporcionou mudanças na
sociedade, entre elas a possibilidade de expressão e sociabilização através das ferramentas de
Comunicação Mediada pelo Computador (CMC). As práticas conversacionais delimitadas por
trocas entre atores sociais é o que compreende a CMC (RECUERO, 2014, p. 27). Essas trocas
são possíveis através de uma rede de conexão.
Uma rede é um conjunto de interconectados (CASTELLS, 2003, p. 7). Como
ferramenta, umas das vantagens da rede é a flexibilidade e adaptabilidade, características
importantes em tempos de rápidas e intermitentes mudanças. Essas duas competências se
destacam ainda mais com as tecnologias de comunicação baseadas por computador e pela
internet. Diante disso, as redes estão se desenvolvendo em todos os domínios da existência.
Uma rede social digital é definida como um conjunto de dois elementos: atores
(pessoas, instituições ou grupos; os nós da rede) e suas conexões (interações ou laços sociais)
(RECUERO, 2009, p. 24). A atuação dos atores nesses espaços digitais constitui em "moldar
as estruturas sociais, através da interação e da constituição de laços sociais" (RECUERO,
2009, p. 25). Por laços sociais compreende-se as "conexões entre os indivíduos, criadas e
mantidas através da interação e conversação." (Idem, p. 16).
Já as conexões são os elementos que interligam os atores uns aos outros. "Nas redes
sociais, essas conexões são constituídas principalmente de relações sociais, ou seja, de
relações criadas através de eventos de fala e de troca de informações entre atores, que
terminam por construir laços sociais" (RECUERO, 2014, p. 129).
Outro fato importante para esta pesquisa, em decorrência desse ponto da discussão
sobre as redes sociais na internet, mais especificamente com o foco para a intimidade, são as
interações a partir dos laços sociais fortes. Sob a análise de Recuero (2014, p. 129), "os
[laços] fortes são aqueles que compreendem mais intimidade, relacionados a uma maior
quantidade de valores construídos entre os interagentes".
Nessa observação, a autora fala da construção de uma relação íntima direta entre as
pessoas (os atores) em uma rede social. No entanto, é preciso observar, a intimidade entre os
atores por laços fortes pode estar aberta ao público, sob a possibilidade de observação de
todos, como aqui se discute.
Conforme apontado, com o advento da internet, houve a atualização das redes socais
para os meios digitais. Assim, vários sites de redes sociais são utilizados atualmente, como
exemplo, o Twitter, o Instagram, o Flicker, e, o nosso objeto de análise, o Facebook.
Esses sites são o grande diferencial da Web 2.0, caracterizada pela possibilidade da
interação e intervenção dos utilizadores. Segundo Recuero (2014, p. 131), tais sites são
peculiares em razão da publicização das redes sociais dos atores e pela possibilidade de se
construir um perfil individualizado.
Além disso, a estrutura dessas plataformas, para a autora, é caracterizada pela
"exposição pública da rede dos atores, que permite mais facilmente divisar a diferença entre
esse tipo de site e outras formas de comunicação mediada por computador" (Idem).
Recuro, reportando-se a Sibilia (2008), destaca como fator determinante para o
exibicionismo no ambiente da web o "imperativo da visibilidade". "É preciso ser 'visto' para
existir no ciberespaço" (RECUERO, 2009, p. 27). Essa exibição tem terreno fértil nas redes
socais na internet, pois permitem aos usuários estarem mais conectados e interativos. Como
ressalta Recuero (p. 108), "isso significa que há um aumento da visibilidade social desses nós.
A visibilidade é constituída enquanto um valor porque proporciona que os nós sejam mais
visíveis na rede". Já Santaella (2013) pontua que:
As redes [sociais na Internet] operam a partir da criação de perfis que
representam os usuários. Assim, elas oferecem serviços de mensagem
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instantânea, murais de mensagens, postagem de fotos e vídeos, entre outros.
A popularização desses serviços faz com que, cada um desses perfis, criem-
se pontos de referência para a identidade digital de alguém. Esses pontos de
referência podem se multiplicar em bolhas identitárias sem limites
predefinidos (p. 42).
Toda esse novo modo de se viver e se relacionar está produzindo mudanças na forma
de subjetivação contemporânea. Türcke (2010, p. 39) explica que, para existir na sociedade
excitada, em meio às sensações, é preciso ser visto, ou melhor, "ser é ser percebido" – Esse
est percipi –, o que implica uma outra determinante: “ser é perceber” – Esse est percepire.
Nessa direção, Melman defende que estamos vivendo sob uma “nova economia
psíquica”. Diante de tal perspectiva, "estamos lidando com uma mutação que nos faz passar
de uma economia organizada pelo recalque a uma economia organizada pela exibição do
gozo" (2008, p. 16).
O psicanalista utiliza como exemplo dessa nova economia uma exposição
contemporânea de arte anatômica que exibe cadáveres humanos conservados da putrefação a
partir de processos químicos, como se fossem corpos plastificados. O autor demonstra
surpresa e estranhamento com o grande número de pessoas que vão a essa exposição, que já
circulou os quatro cantos do mundo, para ver corpos abertos com as vísceras à mostra.
Essa nova economia, defendida por Melman, implica um ser disposto a tudo em busca
de seus prazeres, da exibição do seu mais íntimo ou do espreitar o outro: "não há limites"
(MELMAN, 2004).
Contextualizando a visão de Melman (2008; 2004) e de Türcke (2010), podemos nos
direcionar para o ciberespaço. Pois, as redes estariam propiciando profundas transformações
nos dispositivos de produção das subjetividades devido aos novos formatos de relações
intersubjetivas que nelas se consubstanciam, aponta Santaella (2013, p. 39), afirmando que:

[...] a instabilidade, que é constitutiva do eu e da subjetividade, encontrou


agora no ciberespaço vias muito propícias de encenação e representação. Ou
seja, encontrou no ciberespaço os ambientes lúdicos nos quais se tornou
possível brincar com as construções subjetivas e intersubjetivas (p. 40).

Portanto, podemos chegar a constatação, sob uma ótica geral, de que os indivíduos são
afetados diretamente pelas construções sociais tecnológicas, midiáticas e comunicacionais. As
pessoas estão constantemente buscando uma significância para sua timeline pontilhada,
fragmentada e midiatizada.
O eu deve estar sempre se comunicando e se exibindo para ser lembrado e fazer-se
existir. Como observado por Melman, "não há limites!" nessa nova economia psíquica, sendo
as redes sociais digitais um locus privilegiado desse novo existir, notadamente o Facebook, a
maior delas.

O Facebook e a atualização da intimidade

O Facebook, no Brasil muito conhecido como Face, foi um sistema desenvolvido pelo
estadunidense Mark Zuckerberg, em 2004. Em suas origens, houve a colaboração de colegas
de Zuckerberg - Chris Hughes, Dustin Moskovitz e Eduardo Saverin. Antes de se tornar uma
rede social na internet conhecida mundialmente, o sistema foi chamado de Facemash, o qual
era utilizado para classificar, entre duas fotos dispostas lado a lado, quem seria a pessoa mais
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O sistema funcionava na universidade de Harvard, nos Estados Unidos, e era
alimentado com imagens de identificação dos estudantes da instituição. Porém, o Facemash
foi fechado poucos dias após estar no ar, em outubro de 2003, pois foi considerado quebra de
segurança e violação de privacidade aos parâmetros da universidade2.
Mesmo com poucos dias de funcionamento, a criação de Zuckerberg ganhou
notoriedade no campus de Harvard. Devido ao sucesso, no ano seguinte, em 4 de fevereiro de
2004, Mark Zuckerberg relançou sua ideia. Agora, com o nome do site chamado
"thefacebook.com". Mas esse sistema ainda estava restringido ao âmbito acadêmico, servindo
como uma rede para conectar estudantes de diversas universidades.
Naquele mesmo ano, Sean Parker, fundador do Napster, assumiu o papel de investidor
anjo, e tornou-se presidente da empresa. Uma das primeiras mudanças após a parceria com
Parker foi no nome, que passara a chamar-se Facebook, logo após ter comprado o domínio de
internet Facebook.com em 2005 por US$ 200 mil.
Somente no ano de 2006, o site foi aberto ao público para cadastro (MARTINUZZO;
REZENDE, 2014). A partir deste ano, o número de usuários disparou. Sob uma ótica geral,
observamos que de fevereiro de 2005 a agosto de 2006, o uso de sites de redes sociais entre os
jovens internautas, com idades entre 18 e 29 anos, saltou de 9% para 49%3.
Nos primeiros anos de existência, o sucesso do Facebook pode ser explicado por
vários motivos, entre os quais se enquadram a possibilidade de modificação da plataforma
pelos usuários e pelo fato de o sistema ser percebido como mais privado que outros sites de
redes sociais, pois apenas usuários que fazem parte da mesma rede podiam ver o perfil uns
dos outros (RECUERO, 2009).
O Facebook proporciona ao usuário a possibilidade de publicar/postar textos, fotos e
vídeos. Além de possibilitar também a interação com outros usuários a partir de mensagens
inbox4, comentários ou curtidas em postagens, seja em perfis, páginas ou grupos.
Números recentes mostram que o Facebook é o maior site de rede social no mundo5.
Até março de 2015, cerca de 1, 44 bilhão de pessoas acessaram o site. Já em dezembro do ano
anterior, o público era de 1, 39 bilhão. Isso mostra que em cerca de 3 meses, 50 milhões de
novos usuários entraram nessa rede.
No Brasil, por exemplo, o número de usuários do Facebook chegou a 89 milhões, no
segundo trimestre de 2014. A estimativa é de que 8 a cada 10 internautas brasileiros estão no
Facebook, frente ao total de pessoas que navegam na internet no país – mais de 107 milhões.

1
Cf. GLOBO, O. A origem do Facebook. 2012. Disponível em
http://oglobo.globo.com/sociedade/tecnologia/aorigem-do-facebook-4934191>. Acesso em 19 maio 2015.
2
Cf. BUSINESS INSIDER, 2010. The full story of how Facebook was founded. Disponível em:<
http://www.businessinsider.com/how-facebook-was-founded-2010-3#we-can-talk-about-that-after-i-get-all-the-
basic-functionality-up-tomorrow-night-1>. Acesso em 19 maio 2015.
3
Cf. PEWINTERNET. Social Networking Fact Sheet. 2014. Disponível em: <http://www.pewinternet.org/fact-
sheets/social-networking-fact-sheet/>. Acesso em 19 maio 2015.
4
As mensagens inbox são privadas. Elas podem ser enviadas à caixa de mensagens de um outro
usuário do Facebook ou à caixa de mensagens de um grupo de usuários.
5
Cf. PEWINTERNET. Social Media Update 2014. 2015. Disponível em:
<http://www.pewinternet.org/2015/01/09/social-media-update-2014/>. Acesso em 19 maio 2015.

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Diante disso, o Facebook é o site de rede social mais popular no Brasil6.
É no âmbito dessa gigantesca e tentacular rede de sociabilidade digital, fundada na
exposição midiatizada, que vamos buscar entender o conceito de intimidade, a partir da visão
dos próprios usuários.
Conforme salientamos, os resultados foram obtidos com o levantamento proveniente
de um questionário on-line, direcionado aos utilizadores do Facebook. Foram 20 perguntas
sobre o tema, numa enquete que ficou disponível durante 15 dias, de 23 de maio a 06 de junho
de 2015, alcançando dias úteis e dois finais de semana. Nesse período, obtivemos 742
respostas.
A divulgação dessa pesquisa quantitativa foi realizada por meio do perfil do segundo
autor, com um total de três compartilhamentos em sua rede de amigos no Facebook. Nessa
mesma plataforma, o questionário foi divulgado em alguns grupos.
Identificamos, com a pesquisa, o alcance geográfico nacional de respondentes
residentes em 15 Estados (Acre, Alagoas, Amazonas, Bahia, Distrito Federal, Espírito Santo,
Goiás, Minas Gerais, Paraíba, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São
Paulo e Tocantins). Já do exterior, houve respondentes na Espanha, nos Estados Unidos, no
México e em Portugal. Esse tipo de identificação não era obrigatório na pesquisa.
A maior parte dos respondentes da pesquisa foi do gênero feminino (65,90%) e da
faixa-etária entre 21 a 30 anos (60,65%), como podemos observar nas Tabelas 1 e 2, abaixo.
Tabela 1 - Gênero dos respondentes

Gênero Respondentes Percentual

Feminino 489 65,90%

Masculino 249 33,56%

Outro 4 0,54%

Total 742 100%

Fonte: elaboração dos autores.

Tabela 2 - Faixa-etária dos respondentes

Idade Respondentes Percentual

Até 20 anos 229 30,86%

De 21 a 30 anos 450 60,65%

De 31 a 40 anos 46 6,20%

De 41 a 50 anos 10 1,35%

6
Cf. GLOBO.COM. Oito a cada dez internautas do Brasil estão no Facebook. Disponível em:<
http://g1.globo.com/tecnologia/noticia/2014/08/oito-cada-dez-internautas-do-brasil-estao-no-facebook-diz-rede-
social.html> Acesso em 19 maio 2015.

99
ECCOM, v. 6, n. 12, jul./dez. 2015
De 51 a 60 anos 7 0,94%

Mais de 61 anos 0 0,00%

Total 742 100%

Fonte: elaboração dos autores.

Além das características apresentadas nas Tabelas acima, a maioria dos entrevistados
possui ensino superior (72,37%), como podemos ver na Tabela 3.
Tabela 3 - Escolaridade dos respondentes

Escolaridade Respondentes Percentual

Ensino Fundamental 3 0,40%

Ensino Médio 134 18,06%

Ensino Superior 537 72,37%

Pós-graduação 68 9,16%

Total 742 100%

Fonte: elaboração dos autores.

Antes de abordarmos os resultados referentes à exposição de intimidade no Facebook,


vamos discutir como os usuários classificam a plataforma, como utilizam as ferramentas de
publicação e qual o fluxo de informações geradas por eles e por terceiros em sua rede.
Visando a verificar como os internautas classificam a rede social digital, levando em
consideração a hipótese de que há incidência de conteúdos íntimos sendo postados de forma
pública, perguntou-se se o Facebook era considerado um local público ou privado. Para a
grande maioria (89,08%), essa rede social digital é um local público. Apenas 10,92%
consideram-na como local privado (Tabela 4).
Tabela 4 - Facebook como local público ou privado

Você considera a rede social Facebook como: Respondentes Percentual

Público 661 89,08%

Privado 81 10,92%

Total 742 100%

Fonte: elaboração dos autores.

A sensação de segurança e de confiabilidade no local em que se apresenta algo pessoal


é de fundamental importância para que as relações se desenvolvam, fato que não foge ao
ciberespaço, dotado de ambientes destinados à apresentação e representação de si. Diante
disso, procurou-se averiguar se os internautas se sentem seguros ao fazerem publicações
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ECCOM, v. 6, n. 12, jul./dez. 2015
(Tabela 5). Cerca de 57% disseram que não se sentem seguros ao fazerem publicações no
Facebook. De forma contrária, cerca de 42% disseram que se sentem seguros ao realizarem
algum tipo de postagem na rede.
Tabela 5 - Sensação de segurança ao publicar no Facebook

Você se sente seguro ao postar/publicar algo no Respondentes Percentual


Facebook?

Sim 312 42,05%

Não 430 57,95%

Total 742 100%

Fonte: elaboração dos autores.

Outra condição importante para contextualizarmos o cerne desta pesquisa segundo a


ótica dos internautas foi saber se eles consideram o Facebook e as redes sociais digitais uma
instância diferente daquela da vida presencial. Esta perspectiva foi construída para nos ajudar
quanto à categorização do ambiente em que as publicações são feitas, e, também, averiguar,
caso seja observado um distanciamento de realidade frente ao mundo cibernético, se há uma
separação em relação ao trato com a intimidade nesses dois ambientes.
Sob este viés, o embate não obteve um peso muito grande em relação ao outro, pois
54,72% consideram o Facebook uma instância diferente da vida real (assim descrita para
designar a experiência presencial das relações humanas). Já outros 45,28% dos respondentes
disseram que a rede social digital não é uma instância apartada da vida real (Tabela 6).

Tabela 6 - Sobre as redes sociais digitais serem ou não uma instância distante da vida real

Você considera o Facebook e as redes sociais Respondentes Percentual


digitais como uma instância distante/diferente da
vida real?

Sim 406 54,72%

Não 336 45,28%

Total 742 100%

Fonte: elaboração dos autores.

Até aqui a pesquisa mostrou que o entendimento dos usuários do Facebook quanto à
plataforma é, em caráter de maioria, o de que a rede social digital é considerada um ambiente
público, em que não há a sensação de segurança durante a realização de publicações e que se
coloca como distante da vida tecida nas relações presenciais.
Além dos fatores expostos acima, também buscou-se saber como era a relação entre o
usuário com as ferramentas de postagem, a frequência de emissão de conteúdos e a que grupo
seria destinada tais informações. A importância dessa observação diz respeito ao fato de que
as publicações de cunho íntimo passam, antes de tudo, pela filtragem de mecanismos de
seleção disponibilizados aos usuários.
101
ECCOM, v. 6, n. 12, jul./dez. 2015
Então, procurou-se entender a média de publicação realizada pelos internautas (Tabela
7), sendo que mais da metade dos respondentes (50,27%) disseram que geralmente não fazem
postagens. Já entre os que publicam no Facebook (49,73%), 19,41% o fazem 1 ou 2 vezes por
semana; seguidos de 17,39%, que realizam publicações 1 ou 2 vezes por dia; os que postam
no Facebook 3 ou 4 vezes por semana representam 7%; já 5,93% dos respondentes disseram
que fazem postagens 3 ou 4 vezes por dia.
Tabela 7 - Frequência de postagem dos usuários

Em média, quantas postagens você faz por dia Respondentes Percentual


(como textos, fotos, vídeos, etc.)?

1 ou 2 por dia 129 17,39%

3 ou 4 por dia 44 5,93%

1 ou 2 por semana 144 19,41%

3 ou 4 por semana 52 7%

Geralmente não faço postagens 373 50,27%

Total 742 100%

Fonte: elaboração dos autores.

Perguntou-se a que grupo de pessoas as postagens, quando realizadas, são


direcionadas. Cerca de 47% dos entrevistados responderam que as postagens são direcionadas
a amigos. Já os que consideram que o direcionamento das informações pode mudar conforme
o conteúdo representam 40,43%. Em face contrária a esses dois grupos, 11,73% falaram que
as postagens, quando realizadas, são direcionadas a todos que visualizarem o perfil, como
podemos observar na Tabela 8.
Tabela 8 - Direcionamento das postagens realizadas

As suas postagens na rede social digital são Respondentes Percentual


direcionadas a:

Todos que visualizarem meu perfil 87 11,73%

Amigos 355 47,84%

Depende. Podem mudar conforme o conteúdo 300 40,43%

Total 742 100%

Fonte: elaboração dos autores.

Para averiguarmos se as postagens eram direcionadas a cada tipo de grupo utilizando


os mecanismos de seleção, investigou-se se os usuários usavam as chaves de seleções de
público ao fazerem publicações.

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Um total de 52,96% afirmou selecionar os grupos a quem as mensagens devem ser
direcionadas, por meio da escolha de chaves. Já 35,98% dos respondentes disseram que não
fazem esse tipo de seleção. Em contrapartida aos que detêm conhecimento sobre este tipo de
procedimento, 11,05% afirmaram desconhecer as possibilidades de seleção de grupos por
meio das ferramentas no Facebook (Tabela 9).
Tabela 9 - Utilização de chaves de seleção de postagem no Facebook

Ao fazer publicações você utiliza as chaves para Respondentes Percentual


selecionar a quais grupos de pessoas será enviada a
informação?

Sim 393 52,96%

Não 267 35,98%

Desconheço essa ferramenta. 82 11,05%

Total 742 100%

Fonte: elaboração dos autores.

Além da questão abordando a utilização de ferramentas de seleção de grupos, como


visto acima, buscou-se saber como estava configurado esse mecanismo no momento em que
os usuários do Facebook estavam respondendo o questionário (Tabela 10).
A maior parte dos respondentes, representada por 62,94%, disse que as publicações
estavam configuradas na chave que seleciona somente os amigos na rede como destinatários
da mensagem. Já os que estavam com a configuração como público representam 16,98% dos
entrevistados.
Tabela 10 - Chave de seleção dos usuários no momento da pesquisa

Neste momento, suas publicações no Facebook estão Respondentes Percentual


configuradas em:

Público 126 16,98%

Amigos 467 62,94%

Amigos, exceto conhecidos 36 4,85%

Somente eu 19 2,56%

Personalizado 81 10,92%

Não sei 13 1,75%

Total 742 100%

Fonte: elaboração dos autores.

Sobre um panorama geral das respostas que mais foram escolhidas pelos usuários,
quanto às perguntas que estavam relacionadas à utilização do Facebook e suas ferramentas de
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seleção, a maior parte dos entrevistados disse não fazer postagens regularmente na rede social
digital; mas, entre os mais ativos, são realizadas de 3 a 4 publicações por semana, no mínimo.
Além disso, seguindo essa ótica, podemos destacar que a maioria das mensagens são
direcionadas aos amigos da rede, e, durante a realização de postagens, são utilizadas chaves
de seleção de grupos. A grande maioria disse também que, no momento da pesquisa, as
configurações para futuras publicações estavam configuradas em "amigos". No entanto, ao
responderem sobre quais tipos de conteúdo deveriam estar configurados como "público", os
internautas disseram que os não pessoais deveriam ser destinados a esta categoria.
Já entrando no cerne de nossa pesquisa, relacionado à intimidade, procuramos saber
dos internautas quais tipos de conteúdo devem ser classificados como "públicos" ao serem
postados. Essa indagação é relevante frente à variedade de definições da ferramenta e,
também, levando-se em consideração que a mensagem tem um direcionamento.
Diante disso, a maioria dos respondentes (86,52%) disse que os conteúdos
classificados como "públicos" ao serem postados devem ser os não pessoais, ou seja,
publicações que não tenham relação com características individuais, exclusivas das pessoas,
relacionadas à sua personalidade. Em contrapartida, 6,87% das repostas apontaram que as
postagens definidas como públicas podem seguir qualquer forma de conteúdo (Tabela 11).
Tabela 11 - Classificação de conteúdos públicos

Quais tipos de conteúdos devem ser classificados Respondentes Percentual


como "públicos" ao serem postados?

Todos 39 5,26%

Pessoais 10 1,35%

Não pessoais 642 86,52%

Tanto faz 51 6,87%

Total 742 100%

Fonte: elaboração dos autores.

Mas qual seria a visão dos usuários em relação a conteúdos íntimos publicados no
Facebook? Visando a esclarecer isso, à ótica de cada usuário, perguntamos sobre a incidência
de características de intimidade na rede de amigos. Além disso, vamos expor as alternativas
mais votadas, sem quantificar o percentual, de questões com múltipla escolha de mais de uma
resposta, direcionadas a saber de que forma e como a intimidade se configura; e, também,
qual a opinião relacionada ao motivo de publicação de tais conteúdos.
Para configuração geral do assunto frente às redes sociais digitais, 86,66% dos
usuários afirmaram que a intimidade deve ficar no âmbito privado (Tabela 12). O que
podemos confrontar, como visto anteriormente, com a classificação do Facebook como um
ambiente público. Logo, em uma visão ampla, a intimidade não deveria ser exposta na
plataforma, pelo menos da forma como é exibida. No entanto, na visão de 11,86% dos
entrevistados, a intimidade pode ficar no âmbito privado ou no âmbito público.

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Tabela 12 - Classificação da intimidade na era das redes sociais digitais

A intimidade, na era das redes sociais digitais, Respondentes Percentual


deve ficar:

No âmbito privado 643 86,66%

No âmbito público 11 1,48%

Tanto faz 88 11,86%

Total 742 100%

Fonte: elaboração dos autores.


Levando em consideração a hipótese de que conteúdos íntimos são postados no
Facebook, resolvemos saber se o usuário já viu postagens deste tipo feitas pela rede de
amigos. A grande maioria dos respondestes (93,40%) disse já ter presenciado publicações
íntimas em sua rede de contato. Apenas 6,60% dos entrevistados negaram ter visto, como
podemos observar na Tabela 13, abaixo.
Tabela 13 - Sobre a ocorrência de publicações íntimas no Facebook

Você já viu algo de cunho íntimo postado por algum Respondentes Percentual
amigo no Facebook?

Sim 693 93,40%

Não 49 6,60%

Total 742 100%

Fonte: elaboração do autores.

Tratando-se de intimidade exposta no Facebook, buscou-se também avaliar a


frequência em que se deparavam com tais tipos de publicação em sua rede de amigos. Diante
disso, um total de 55,80% disse que às vezes vê conteúdos de cunho íntimo postados por
amigos. Já 39,49% dos entrevistados afirmaram que sempre veem esse tipo de publicação
entre seus contatos (Tabela 14).
Os principais tipos de conteúdos íntimos apontados pelos usuários são veiculados por
meio de fotos, textos ou dizeres pessoais e vídeos. Além disso, para a maioria, a intimidade
está relacionada a sexo, família, nudez e coisas que acontecem dentro de casa. Os
respondentes também pontuaram que a postagem de conteúdos íntimos está relacionada aos
fatores exibicionismo, falta de atenção quanto às postagens e solidão.
Tabela 14 - Sobre a frequência de publicações íntimas no Facebook

Com que frequência você vê postagens de cunho Respondentes Percentual


íntimo em sua rede social digital?

Sempre 293 39,49%

Às vezes 414 55,80%

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Nunca 35 4,72%

Total 742 100%

Fonte: elaboração dos autores.

Além da observação de informações postadas por terceiros, também se investigou se


os respondentes já haviam realizado alguma publicação de cunho íntimo em seu perfil. A
maioria (67,25%) disse nunca ter postado esse tipo de conteúdo. Já entre os que afirmaram ter
realizado publicações de algo íntimo no Facebook (32,75%), o número dos que não se
arrependiam da publicação contabilizou 17,39%; já os que se arrependiam de ter publicado
algo relacionado a intimidade representou 15,36% das respostas, como podemos ver na
Tabela 15, abaixo.
Tabela 15 - Sobre a realização de alguma postagem íntima (continua)

Você já postou algo íntimo no Facebook? Respondentes Percentual

Sim. Me arrependi da postagem 114 15,36%

Sim. Mas não me arrependi da postagem 129 17,39%

Nunca postei 499 67,25%

Total 742 100%

Fonte: elaboração dos autores.

Anteriormente, expusemos, à ótica do arcabouço teórico arrolado, que a intimidade


surgiu no ambiente de distinção entre os âmbitos público e privado. Além disso, pudemos
constatar que, com o surgimento de tecnologias comunicacionais, como a internet, a questão
da intimidade também se coloca nas relações constituídas no meio cibernético.
Em face dessas mudanças e atualizações, buscou-se saber, do próprio utilizador da
internet, se a concepção de intimidade mudou devido à imersão nas redes sociais da internet.
A grande maioria (88,81%) afirmou que com o advento de locais digitais, como o Facebook,
o conceito de intimidade mudou (Tabela 16).
Tabela 16 - Mudança do conceito de intimidade devido às redes sociais na internet

Você acredita que o conceito de intimidade mudou Respondentes Percentual


devido às redes sociais na internet?

Sim 659 88,81%

Não 83 11,19%

Total 742 100%

Fonte: elaboração dos autores.

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Considerações finais

A intimidade, sob análise geral dos resultados da pesquisa realizada com usuários do
Facebook, é um conceito que está mudando em razão do uso sistemático das redes sociais da
internet. Também podemos chegar à conclusão que há grande incidência de conteúdos íntimos
sendo publicados, mesmo que eles estejam restringidos à rede de contatos do internauta
emissor da mensagem.
Ademais, observamos um descompasso entre a percepção ou ideia do que seja o
espaço do Facebook e a realidade, a apropriação da rede social. A contradição é a seguinte: se
a intimidade deveria ficar somente no âmbito privado, como apontou a opinião dos
respondentes, como há tantas publicações, inclusive percebidas como íntimas, num espaço
considerado público pelos mesmos internautas?
Uma simples verificação mais atenta leva qualquer observador a encontrar grande
quantidade de postagens públicas, inclusive referenciadas ao conceito moderno de intimidade.
Até porque há ferramentas disponíveis aos usuários do Facebook – como as que adicionam
fatores de subjetivação à mensagem – que proporcionam uma nova forma de exposição do
que é íntimo. Isso amplifica as possibilidades de exposição da intimidade, permitindo que esta
esteja à vista de todos ou de um determinado grupo.
Pelo viés do exibicionismo, podemos retomar a ideia de Türcke (2010), para quem
existir, nesta sociedade excitada em meio às sensações audiovisuais e aos fluxos
informacionais, é ser visto e percebido. Já sob outro viés, o do receptor, não fechamos os
olhos aos conteúdos íntimos de terceiros, pois, em contrapartida ao exibicionismo de outrem,
também é necessário perceber para existir.
Essas observações nos fazem lembrar, também como já exposto, a argumentação de
Sibilia (2008), que observou que, nos dias atuais, com o advento das novas tecnologias de
comunicação, a intimidade tomou novas proporções, deixando de ser algo do interior do
individuo para o seu exterior, o que a autora denominou ser extimidade.
Devemos remarcar, também, as observações de Sennett (2014), que vincula o
aparecimento do conceito de intimidade às mudanças capitalísticas que ocorreram durante os
séculos XVIII e XIX. Nesse período, observamos uma transformação estrutural no
capitalismo, que redundou num distanciamento dos lares (então, o ícone máximo do privado)
em relação aos ambientes públicos, firmando uma nova configuração comportamental e
psicológica, e, por consequência, constituindo a delimitação da intimidade.
Mais uma vez, no decorrer da história, percebemos hoje que as transformações
estruturais capitalísticas acabam interferindo de modo incisivo no universo da intimidade. Na
base dessas mudanças, tanto do capital quanto da visão do que é íntimo, estão as tecnologias
digitais de comunicação e informação, notadamente as redes sociais digitais. Ainda mais
quando o assunto é a peculiar subjetividade atual, especialmente quanto a sua percepção da
intimidade – cada vez mais midiatizada ou menos privada.

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