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PROGRAMA DE

DESENVOLVIMENTO
PESSOAL PARA
LÍDERES

Artigos:
s Usos (e abusos) da influência
s Você é bom como chefe ou excelente?
s Como um gerente vira líder
s Estreia no comando
Foco: entrevista com Robert Cialdini

Usos
(e abusos)
da influência
ROBERT CIALDINI, considerado o principal cientista social no campo da
influência, foi originalmente atraído para o tema ao constatar a facilidade
com que as pessoas ultrapassavam os limites da ética e descambavam para
a manipulação ou até o abuso. Seu livro de 2001, Influence, descreveu seis
princípios da persuasão e foi eloquente quanto aos perigos de técnicas de
persuasão nas mãos erradas. Um popular artigo publicado na HBR naquele
mesmo ano (“Harnessing the Science of Persuasion”) examinou o lado
positivo da persuasão: como o gestor poderia usar esses princípios
para tocar a organização de forma mais eficaz?
Cialdini é professor emérito de psicologia e marketing (Regents Professor
Emeritus of Psychology and Marketing) na Arizona State University, nos
Estados Unidos, além de presidente da consultoria Influence at Work.
Nesta entrevista à editora-executiva da HBR, Sarah Cliffe, Cialdini explora
o uso diário da persuasão nas empresas e fala de novos estudos sobre
a ética da influência.
USOS (E ABUSOS) DA INFLUÊNCIA

HBR: Vou descrever um punhado de situações aumentar a probabilidade de conseguir um grande


e pedir que o senhor aponte qual seria a retorno sobre o investimento ao caracterizar sua aju-
melhor maneira de influenciar os outros nessas da como uma parceria de mão dupla.
circunstâncias. Suponhamos, primeiro, que
um funcionário esteja tentando agir de forma Outra situação: um executivo precisa convencer
mais empreendedora. O problema é que precisa um grupo de que uma grande mudança de rumos
de recursos para tirar do papel a ideia. Como é indispensável. O que o senhor sugeriria?
conseguir o apoio dos outros? Conduzir as pessoas em meio a um clima de incerte-
Cialdini: É preciso um trabalho preliminar. Os outros za é difícil — o primeiro que fazem é serem tomadas
vão ajudar se sentirem que estão em dívida por algo por uma paralisia, ficarem com medo de tudo aqui-
que você fez no passado para promover as metas de- lo que podem perder. Logo, é bom deixar bem claro
les. É o princípio da reciprocidade. às pessoas o que irão perder se não agirem. Daniel
Cultive o hábito de ajudar os outros e — atenção, Kahneman ganhou um Nobel por mostrar que, na
pois o que vou falar é muito importante — quando hora de tentar mobilizar os outros em condições de
vierem lhe agradecer, não faça de conta que não im- incerteza, a possibilidade de perda é psicologica-
porta. Nunca diga: “Ah, não foi nada”. Nosso poder mente mais forte do que a de ganho. Um gestor pode
de persuasão dispara assim que alguém nos agrade- converter o vento contra em vento a favor se mostrar
ce por algo. O certo, então, é responder com algo co- não só o que todos vão ganhar se seguirem em frente,
mo: “Claro, é isso o que um parceiro faz pelo outro”. mas também o que será perdido ou prescindido se
Rotule o que ocorreu como um ato de parceria. Com ninguém arredar o pé.
esse trabalho preliminar, um gerente que mais tarde Outra coisa que acontece em momentos de incer-
precise de apoio, de pessoal, quem sabe até de verba, teza é que a pessoa não busca respostas dentro de
vai ter uma probabilidade de sucesso consideravel- si — ela enxerga apenas a ambiguidade e sua própria
mente maior. falta de confiança. O que faz, nesses casos, é buscar,
lá fora, fontes de informação que possam reduzir
O trabalho de Adam Grant sobre a importância do sua incerteza. A primeira coisa que analisa é a auto-
ato de “dar” em organizações também vai por aí, ridade: qual a opinião dos mais entendidos sobre a
certo? questão?
Vai sim. Grant fez uma análise brilhante. Outro es-
tudo fascinante veio de Frank Flynn, que foi da Co- Essa pessoa não é necessariamente o chefe. Podia
lumbia University e hoje está em Stanford. Ao exami- ser alguém que entende mais do assunto.
nar o comportamento de colaboração numa grande É uma distinção importante. Não estamos falando de
empresa de telecomunicações, Flynn descobriu que ocupar um posto de autoridade, mas de ser uma au-
quando alguém ajudava os colegas ocorriam duas toridade em algo. O gestor precisa reunir evidências
coisas. A primeira é que as pessoas que ajudavam de especialistas comprovados, talvez até de fora, que
eram consideradas de altíssimo valor por quem rece- estejam em sintonia com as razões para a iniciativa.
bia a ajuda. E a segunda — e aqui o negócio complica As pessoas também buscam a opinião de colegas.
— é que a produtividade em seus próprios projetos Se durante uma reunião duas pessoas estiverem
caía. Ou seja, a pessoa dedicava tempo e energia de- meio alheias, o gerente não devia acossar as du-
mais aos problemas dos outros. as, tentando fazer com que entrem no jogo. Devia,
antes, buscar um membro respeitado do grupo, al-
Como administrar essa discrepância entre guém que esteja de acordo com o plano, e pedir que
generosidade e produtividade? essa pessoa intervenha. Em geral, um colega é muito
Flynn descobriu uma coisa que elevava tanto o valor mais convincente do que executivos quando os ou-
social de quem colabora como a produtividade des- tros estão tentando decidir como proceder.
sa pessoa. Não era o número de favores feitos: era o
número de favores trocados. Vejamos outro cenário. Num congresso do qual
Se aquele que dá a contribuição inicial cria um participei há pouco, pediram a uma turma de
senso de reciprocidade — a noção de que há uma re- presidentes que participasse de uma iniciativa
de de parceiros não só dispostos, mas loucos por aju- importante no plano cívico — importante para o
dar —, essa pessoa vai receber muito em troca. Pode mundo, embora não necessariamente algo que
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FOCO INFLUÊNCIA

Os seis princípios da persuasão


O mecanismo da persuasão é apelar a respostas
humanas profundamente enraizadas. Experimentos
em psicologia social conduzidos por Robert Cialdini so enquanto ainda estão juntas. É preciso perguntar
e outros identificaram seis dessas respostas, que o que irão fazer e, se possível, obter uma resposta por
Cialdini descreveu originalmente no livro Influence. escrito.

Simpatia Por que é importante botar tudo no papel?


Por algum motivo, as pessoas cumprem aquilo que
Se os outros gostam de você — porque acham que você
está escrito: a impressão é que a decisão se torna
gosta deles, ou por coisas que vocês têm em comum —, mais consciente. Também é preciso pedir que as-
é mais provável que digam sim a você. sumam compromissos sobre os próximos passos
Reciprocidade e agendem outra conversa; a essa altura, já estarão
Em geral, as pessoas retribuem favores. Se ajudar alguém, prontas para descrever o progresso que fizeram. Pou-
essa pessoa irá ajudá-lo. Se agir de certa forma (cooperar, co a pouco, o compromisso se torna mais concreto.
por exemplo), os outros vão pagar na mesma moeda.
O que fazer para melhorar suas redes informais?
Prova social É aqui que a internet ajuda. É possível obter muita
Ao ver os outros fazendo algo, um indivíduo fará o mesmo informação sobre os outros pela página no Facebook
— sobretudo se os outros forem semelhantes a ele. ou a conta no LinkedIn. Busque coisas em comum
Compromisso e coerência — vai ver que é correr, tricotar, a escola frequentada.
Todo mundo quer ser coerente, ou pelo menos parecer que Descobrir algo em comum ajuda muito, pois gosta-
mos de gente como a gente; esse é outro princípio
é. Se assumirem publicamente um compromisso voluntário,
da influência. Se usar essa semelhança como ponto
vão tentar honrá-lo.
de partida, e se agir com sinceridade, você cairá nas
Autoridade graças dos outros, e passará a gostar deles. Agora, há
As pessoas se curvam a especialistas e a gente em posição gente disposta a fazer parte de sua rede devido a se-
de autoridade (e, em geral, subestimam a tendência a agir melhanças que estavam sob a superfície.
dessa forma).
Que conselho dar a alguém que não gosta de
Escassez negociar em favor próprio e precisa se sair melhor
As pessoas dão mais valor àquilo que consideram ser escasso. nessa área? Estou pensando particularmente em
estudos que sugerem que a mulher normalmente
não pede o que quer.
Já trabalhei com Jeffrey Pfeffer, da Stanford, para in-
os investidores da empresa fossem aplaudir. O vestigar se é preciso um terceiro para defender seu
organizador era muito respeitado, mas não tinha lado numa negociação. Descobrimos que essa figura
qualquer autoridade formal. Numa situação do agente ou defensor pode ser muito útil.
dessas, como convencer os outros a assumir Ter uma figura dessas a seu lado traz dois bene-
compromissos que durem além daquele momento fícios quando, por exemplo, você está sendo con-
geral de euforia? siderado ou recrutado para um cargo. Uma delas é
Duas coisas me parecem importantes. A primeira é que você passa a impressão de ter mais prestígio se
algo que venho matutando nesse exato instante pa- alguém defende seu nome. É o princípio da autori-
ra um livro que estou escrevendo: o poder do “nós”. dade em ação.
Quando se veem como parte de um grupo maior, O princípio da simpatia também tem seu papel.
com uma identidade comum, as pessoas aceitam fa- Se tiver de dar informações sobre si mesma, é co-
zer coisas que não fariam se estivessem consideran- mum a pessoa parecer que está enchendo a própria
do só os próprios interesses. Estudos sobre isso são bola, o que causa má impressão nos outros. Na pes-
muito claros. Logo, o organizador teria de cultivar quisa que fizemos, descobrimos que se o defensor de
esse senso de propósito comum no momento. um candidato fizer exigências fundadas nos méritos
Quando se dispersam, as pessoas voltam para o do mesmo, isso não prejudica o candidato. Já se o
“nós” rotineiro — no caso, as empresas que tocam. candidato defender a mesma coisa, prejudica. Essa
Logo, é preciso garantir a mudança ao fazer com que postura desagrada o pessoal sentado do outro lado
as pessoas assumam publicamente um compromis- da mesa, que considera a pessoa cheia de si.

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USOS (E ABUSOS) DA INFLUÊNCIA

Isso é particularmente relevante para a mulher. rem fazendo algo, o ímpeto para que você faça o
Em estudos que fizemos, mostramos que a mulher mesmo é muito maior do que para um indivíduo em
que não é absolutamente modesta quanto a suas re- culturas mais individualistas, onde a pessoa se guia
alizações é prejudicada em relações interpessoais. O por sua bússola interna e não segue o grupo na hora
homem também pode se prejudicar por ficar se ga- de decidir.
bando, mas todos esperam que seja agressivo. O pre- Fizemos, por exemplo, um estudo nos Estados
juízo, em seu caso, é muito menor do que o da mulher. Unidos e na Polônia, que tem um estilo mais comu-
Por causa dessa diferença, a mulher se sairá me- nal do que os EUA. Perguntamos a uma série de in-
lhor em organizações nas quais os chefes estão acos- divíduos se estariam dispostos a participar de uma
tumados a defender seus subordinados, onde a nor- pesquisa de mercado. Também perguntamos se ti-
ma cultural é essa. nham feito algo parecido no passado e se achavam

Conduzir os outros em meio à incerteza é difícil.


As pessoas ficam paralisadas, com medo de tudo
o que podem perder. Logo, é bom deixar bem
claro o que realmente irão perder se não agirem.
Toda organização tem minorias — gente que seus amigos tinham. Nos EUA, o fator de maior
considerada até certo ponto “diferente”. Esse correlação com a participação das pessoas naquela
“outro” tem dificuldade na hora de influenciar o pesquisa específica era se já tinham feito o mesmo
pessoal a sua volta? antes. É o princípio da coerência. Na Polônia, era se
Sim, devido ao fator de semelhança que citamos lá as pessoas achavam que os amigos já tinham partici-
atrás. Mas há um jeito de contornar isso. Essas carac- pado de uma pesquisa dessas no passado.
terísticas aparentes — raça, etnia, naturalidade estran-
geira — se tornam irrelevantes quando há semelhan- Um lugar-comum da literatura administrativa
ça em termos de valores. Todo mundo quer trabalhar ocidental é que a organização de “comando e
com gente que dá importância às mesmas coisas que controle” está morta. Quando afirmamos algo
nós — nossas prioridades no trabalho, ou mesmo fora assim nas páginas da HBR, nunca sei se faz
dali. Logo, uma solução possível é estabelecer pontos sentido para o resto do mundo.
comuns que não sejam imediatamente visíveis. Em Há certas evidências a esse respeito. O Citibank fez
geral, leva um tempo para que essas coisas sejam re- a gerentes de vários países a seguinte pergunta: su-
conhecidas; uma saída para abreviar o processo é falar ponhamos que o projeto de outro gerente do banco
sobre valores de maneira mais espontânea. esteja com dificuldades, e que essa pessoa peça sua
ajuda. Ajudar vai consumir tempo e energia, talvez
Há tanta empresa globalizada hoje em dia. Que até recursos e pessoal. Em que circunstâncias você
tipo de problema esse caldeirão de culturas traz se sentiria mais impelido a dizer sim? Em Hong Kong
para o processo de persuasão? e na China, a resposta foi “Eu me perguntaria se o
A boa notícia é que os seis princípios da influência gerente que está pedindo ajuda é ligado a algum su-
parecem existir em toda cultura. São parte da condi- perior da minha área”. O dever o levaria a dizer sim a
ção humana. A má notícia é que o peso de cada um alguém acima dele na hierarquia. Na Espanha, a res-
muda de cultura para cultura. posta foi: “Eu me perguntaria se o gerente que está
Em nossa pesquisa, descobrimos que, em cultu- pedindo ajuda é ligado a algum amigo meu”. Aqui,
ras mais coletivistas e comunais, certas formas de não é o dever, mas a lealdade. É o princípio da simpa-
convencimento surtem mais efeito. A prova social tia. É preciso estar ciente dessas variações de ênfase
tem muita força. Se muitos de seus colegas estive- em cada cultura a fim de otimizar sua eficácia.

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FOCO INFLUÊNCIA

Uma coisa que mudou desde que o senhor siga inabalado.


começou a estudar a influência é o espaço que a A outra questão que vem despertando meu inte-
internet e as redes sociais passaram a ocupar na resse é a ética da influência, que ainda não foi exa-
vida das pessoas. Quando não estamos falando ao minada de forma rigorosa e científica. Quais as con-
vivo com alguém, essa coisa da influência muda? sequências de ser ético ou antiético? Naturalmente,
As redes sociais abrem acesso a fontes de informação sabemos que a reputação de uma pessoa — e sua
que no passado não tínhamos, mas não creio que te- capacidade de influenciar — é abalada se descobri-
nham mudado nossa resposta a tentativas de exercer rem que atropelou a ética, sobretudo dentro de uma
influência. Uma coisa que estamos vendo, porém, é organização. Só que esse fato não coíbe, necessaria-
que as pessoas começam a ser influenciadas pelos mente, a conduta menos que ética. Eis o porquê: as
pares mais do que por especialistas. pessoas não acham que serão desmascaradas. Sobre-
Se pegarmos o TripAdvisor ou o Yelp, veremos tudo nos escalões mais altos do poder, o indivíduo se
que não são especialistas em turismo ou críticos de sente blindado.
restaurantes que estão influenciando a decisão dos É por isso que estamos abordando a questão de
outros. É gente como eu e você, que agora pode rela- outro ângulo, mais individual: existe um argumen-
tar suas experiências. to básico para ser escrupulosamente ético em rela-
ções com clientes, fornecedores, autoridades e por
Esse efeito da influência dos pares me faz aí vai? Nossa hipótese é que, se uma organização
lembrar do estudo que o senhor fez com hotéis permite ou cultiva uma cultura de desonestidade
que instavam o hóspede a usar a mesma toalha na relação com o mundo lá fora, o pessoal da orga-
mais de uma vez. Embora apelar para o meio nização que se sente incomodado com essa atitude
ambiente tivesse surtido efeito, o melhor mesmo vai puxar o carro — e, até lá, vai seguir incomodado
foi informar o número de hóspedes que haviam e estressado. Já aqueles que se sentem à vontade
reutilizado as toalhas. com a desonestidade vão ficar. A certa altura, a or-
É verdade. E em estudos posteriores que fizemos, o ganização vai estar cheia de gente que não tem ne-
discurso que mais surtiu efeito não foi o que dizia nhum pudor em ludibriar — e que vai enganar até a
que a maioria das pessoas que se hospedou no ho- própria organização.
tel tinha reutilizado as toalhas, mas o que dizia que Junto com Adriana Samper (Arizona State Univer-
a maioria das pessoas que havia ficado ali naquele sity) e Jessica Li (University of Kansas), fiz uma série
quarto tinha reutilizado as toalhas. de experimentos para testar essa hipótese. Primeiro,
montamos equipes e demos a certos membros mo-
Acho isso tão interessante. tivos para achar que os colegas do projeto tinham
Não é? Uma coisa que aprendi é que as técnicas mais conspirado para trapacear. Posteriormente, quando
primitivas de influência são as melhores. Uso “pri- receberam um problema difícil de resolver, esses
mitivo” aqui sem qualquer sentido pejorativo. O que voluntários tiveram um desempenho considera-
está claro é que quanto mais local e personalizada a velmente pior do que aqueles que não tinham sido
fonte de informação, maior a probabilidade de que expostos à trapaça. Estavam estressados. Seu grau
as pessoas sigam a direção que queremos. de preocupação era tal que isso afetava seu desem-
penho. Num experimento correlato, gente que podia
Seu interesse hoje está em que temas nessa área? optar por trabalhar ou não numa equipe desonesta, e
Uma questão importante é a durabilidade da mudan- o fazia de bom grado, trapaceava 50% mais vezes do
ça que produzimos. Em geral, não foi um assunto es- que qualquer outra pessoa.
tudado. Junto com uma empresa chamada Opower, Ainda são resultados preliminares, mas suspeito
no entanto, estamos há quatro anos dando acesso às que sejam um indicador decente daquilo que ocorre
pessoas a informações sobre padrões de consumo de dentro de uma organização ao longo do tempo. Se
energia dos vizinhos. O último estudo indica que as uma organização decide agir sem ética com clien-
pessoas seguem de olho nessa informação e estão tes ou fornecedores, vai acabar sendo enganada por
ajustando seu consumo à luz dos dados. Temos de gente que não se importa em trabalhar numa cultura
dar às pessoas um motivo para seguirem atentas — desonesta. No final, a organização vai sentir o preço
no caso, é a evidência sobre aquilo que os vizinhos disso no balanço. Pode apostar.
estão fazendo —, para garantir que seu compromisso HBR Reprint R1307F–P

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Você é bom
como chefe —
ou excelente?
Se quiser continuar crescendo como líder,
faça a si mesmo duas perguntas cruciais.
Linda A. Hill e Kent Lineback

Linda A. Hill é titular da cátedra Wallace Brett Donham Professor of Business Administration na Harvard Business School, nos EUA. Kent Lineback
trabalhou, por muitos anos, na iniciativa privada e na administração pública. Os dois são autores de Being the Boss: The 3 Imperatives for Becoming
a Great Leader (Harvard Business Review Press, 2011), do qual este artigo foi adaptado.
“Sou bom o “Estou phargoranntdoe?
bastante?” oportunidade, massaegora
Essa é min
ão tenho certeza n
estou preparado.”

Estas dúvidas atormentavam Jason. Era um gestor de falta de liderança”. Você acha que está in-
experiente, mas naquela noite revirava-se na cama do bem até que, como Jason, recebe uma mis-
pensando no posto que acabara de assumir. Por mais são nova, intimidante. Recebe uma avaliação de de-
de cinco anos chefiara uma pequena equipe de edi- sempenho mais ou menos. Ou, um dia, simplesmen-
tores em Boston. Tinham produzido duas séries de te percebe que já não está crescendo e avançando —
grande sucesso de livros de engenharia para o bra- está estagnado.
ço de publicações pedagógicas de um conglomera-
do de mídia. Graças à reputação de excelente gerente A maioria para de investir
de desenvolvimento de produtos, fora escolhido pe- no próprio crescimento
la empresa para dirigir, em Londres, uma start-up de Passamos anos estudando, pensando e convivendo
ensino técnico via internet. com a questão de como um gerente cresce e progri-
Jason chegara ao novo trabalho numa segunda- de. No trabalho acadêmico com indivíduos de alto
feira cedo animado e confiante. Mas, ao final da pri- potencial, alunos de MBA e executivos do mundo to-
meira semana, começava a se perguntar se estava do, Linda está em contato com gente interessada em
à altura do desafio. No posto anterior, dirigira gen- contribuir para a respectiva organização e ter uma
te que já trabalhara junto antes e exigia coordena- carreira gratificante. Como executivo, Kent já traba-
ção, mas pouca supervisão. Havia problemas, é claro, lhou com administradores de tudo quanto é nível em
mas nada como o que descobrira nesse novo proje- organizações privadas e públicas. Toda a nossa expe-
to. Membros importantes do grupo mal se falavam. riência nos leva a uma observação simples, mas in-
Outros editores na empresa, cujo material e cuja co- quietante: a maioria dos chefes atinge um certo grau
laboração eram imprescindíveis, encaravam o novo de proficiência e para ali — ficando aquém do que
grupo como concorrência. As metas que Jason defi- poderia e deveria ser.
nira pareciam impossíveis — a equipe já ameaçava Discutimos essa observação com vários colegas —
não atingir marcos iniciais importantes. Uma parce- que, quase sem exceção, tinham constatado o mes-
ria crucial com uma organização de fora sofrera da- mo: uma organização costuma ter um grupinho de
nos, talvez irreparáveis. Para completar, seu chefe, gestores excelentes, outro punhado de competentes,
radicado em Nova York, dava pouca ajuda. Sempre uma leva de medíocres, alguns incompetentes e ou-
que Jason descrevia um problema, a resposta típi- tros péssimos. A grande maioria dos indivíduos com
ca era: “É por isso que você está aí”. Na sexta-feira, quem trabalhamos é bem-intencionada, inteligente,
Jason já temia não fazer jus às expectativas implíci- com um currículo de realizações. Muitos progridem
tas nessa resposta. e chegam aonde querem. Mas muitos outros perdem
O que Jason está sentindo soa familiar? Mesmo o rumo e não atingem seu potencial. Por quê? Porque
com anos de experiência em gestão, é comum sur- deixam de investir no próprio crescimento.
girem esses momentos de dúvida — de medo, até. É muito raro um gestor se perguntar “Sou bom?”
Uma série de coisas pode deflagrá-los: uma iniciati- e “Preciso ser melhor?” — a menos que seja obriga-
va sob seu comando não está indo conforme o espe- do a tal. Quando foi a última vez em que você se per-
rado. Seu pessoal não está se saindo como deveria. guntou o mesmo? Onde você se situa no espectro de
Você ouve dizer que “o verdadeiro problema aqui é chefes excelentes a péssimos?

Fevereiro 2011 Harvard Business Review 3


VOCÊ É BOM COMO CHEFE — OU EXCELENTE?

Ideia em resumo

Muitos gerentes subestimam os desafios de Três imperativos podem nortear um ges- (3) Administrar sua equipe. Um bom ges-
transformação de sua função — ou se aco- tor em sua jornada para virar um chefe tor cria um “nós” de alto desempenho a
modam no papel e param de crescer e me- excelente: (1) Administrar a si mesmo. A partir dos indivíduos que se reportam a ele.
lhorar. Na melhor das hipóteses, aprendem influência produtiva vem da confiança dos A autoavaliação constante e inquisitiva
a sobreviver; na pior, se tornam péssimos outros em sua competência e caráter. (2) nesses três imperativos é essencial, escre-
chefes. Às vezes, até o melhor deles, mes- Administrar sua rede. É preciso envolver a vem os autores. Artigo inclui uma útil fer-
mo com anos de experiência em gestão, é organização como um todo para criar as ramenta de avaliação para ajudar o leitor a
assolado por dúvidas e temores. condições para seu sucesso e o da equipe. iniciar o processo.

Ao assumir uma nova missão, o gestor geralmen- capaz disso” ou “Já sou bom o bastante”.
te parte aberto à mudança. Os mais talentosos e am- Você sabe o que está tentando atingir? To-
biciosos escolhem missões desafiantes, cientes de dos sabemos o quão desordenado, fragmentado e até
que terão muito a aprender logo de cara. Mas, ao se caótico é o dia de qualquer gestor. Diante dessa rea-
aclimatarem e perderem o medo do fracasso iminen- lidade — que se intensifica à medida que o trabalho
te, é comum se acomodarem. Toda organização tem e as organizações se tornam mais complexos e flui-
um jeito próprio de fazer as coisas: políticas, práticas dos —, como você, no papel de chefe, pode fazer al-
comuns e diretrizes tácitas como “promover por an- go mais do que lidar com aquilo que cada dia traz?
tiguidade” e “evitar conflitos”. Uma vez assimiladas, Para enfrentar o caos, é preciso ter uma noção
é comum o gestor usá-las para sobreviver — para “ge- clara daquilo que é importante e de onde você e seu
renciar” no pior sentido da palavra. grupo querem estar no futuro. É preciso um modelo
De nada ajuda que a maioria das organizações que mental que se sobreponha ao caos e no qual seja pos-
vemos dá mínimo apoio a seus gerentes e raramen- sível encaixar toda peça desencontrada que vier pa-
te incentiva os mais experientes a melhorar. Poucas rar em suas mãos. Esse modo de pensar começa com
esperam mais de seus líderes do que resultados de uma definição clara: administrar é ter a responsabili-
curto prazo — que, por si só, não indicam necessaria- dade pelo desempenho de um grupo de pessoas.
mente uma verdadeira habilidade gestora. Embora a ideia seja simples, tirá-la do papel é di-
Em nossa experiência, no entanto, o verdadeiro fícil, pois a gestão é definida pela responsabilidade,
vilão não é nem a acomodação da gerência nem uma mas se dá pelo exercício de influência. E para influen-
falha da organização: é uma falta de compreensão. ciar uma outra pessoa é preciso fazer diferença não
Quando gestores são questionados, fica patente que só no que faz, mas também em ideias e sentimentos
muitos deles deixaram de progredir simplesmente que norteiam seus atos. Como conseguir isso?
por não saber como. Para responder a esta pergunta, é preciso pensar
Você sabe o que é preciso para se tornar ver- sobre seu trabalho como gestor de um modo abran-
dadeiramente eficaz? É muito comum um gestor gente e integrado. A abordagem que oferecemos re-
subestimar o tempo e o esforço exigidos para seguir pousa em estudos de práticas de gestão, em nossas
crescendo e se desenvolvendo. Tornar-se um grande próprias observações e naquilo que sabemos sobre
chefe é um processo lento e difícil de aprendizado e onde um gerente tende a errar. É o que chamamos
mudança, movido majoritariamente pela experiên- de três imperativos: administrar a si mesmo, admi-
cia pessoal. Aliás, tanto tempo e esforço são necessá- nistrar sua rede, administrar sua equipe.
rios que é justo pensar no processo como uma jorna- Essa é a única maneira de descrever a gestão? Não,
da — uma jornada de anos. obviamente não. Mas é clara, direta e, sobretudo, fo-
O que torna essa jornada particularmente difí- cada naquilo que um gestor realmente deve fazer. É
cil é que as lições envolvidas não podem ser ensina- normal pensarem na “gestão” como apenas um im-
das. Liderar é usar a si mesmo como um instrumento perativo — o terceiro —, mas hoje os três são críticos
para levar as coisas a cabo na organização — logo, é para o sucesso. Juntos, englobam tudo aquilo que
questão de autodesenvolvimento. Não há segredos um bom gestor deve fazer para influenciar os outros.
e poucos atalhos. Você e qualquer outro gerente de- Dominá-los é a meta de sua jornada.
vem aprender as lições sozinhos, com base em sua
própria experiência como chefe. Se não entender a Administre a si mesmo
natureza da jornada, é mais provável que a interrom- A gestão começa com você, pois o que você é como
pa ou perca esperança e diga a si mesmo: “Não sou pessoa, o que pensa e sente, as crenças e valores por

4 Harvard Business Review Fevereiro 2011


trás de seus atos e, sobretudo, o modo como se co- chefe!”), de onde vem? Da confiança dos outros em
necta com os outros são de importância para aqueles você como gerente. Essa confiança tem dois com-
que precisa influenciar. Todo dia, esses indivíduos ponentes: a crença em sua competência (você sabe
examinam cada interação com você, tudo aquilo que o que fazer e como fazê-lo) e a crença em seu caráter
você faz ou diz, para descobrir suas intenções. “Pos- (seus motivos são bons e você quer o bem de todos).
so confiar nessa pessoa?” é a pergunta que se fazem. A confiança é a base de todas as formas de influ-
O esforço que farão, o grau de comprometimento ência que não a coação, e é preciso agir com os ou-
pessoal e sua disposição a aceitar sua influência tros de maneira a fomentar essa con-
vão depender, em gran- fiança. A gestão realmente começa

e de
A confiança é a bas
de medida, das qualida- com aquilo que você é como pessoa.
des que enxergam em

todas as formas dea coação.


você. E sua percepção Administre sua rede
vai determinar a respos- Certa vez, falamos com o chefe da di-

influência que não .


ta à questão fundamental visão de software de uma empresa
que todo gerente deve se quando este vinha saindo da reunião

É preciso fomentá-la
fazer: sou alguém capaz com uma força-tarefa formada de
de influenciar os outros colegas do mesmo escalão. Seu no-
produtivamente? me era Kim. Tinha proposto uma no-
A mostra mais evidente va forma de computar vendas inter-
de quem você é está nas re- divisionais — forma que, a seu ver, elevaria o fa-
lações que forja com os outros, especialmente aque- turamento ao incentivar cada divisão a vender
les pelos quais é responsável. É fácil errar nessas rela- também os produtos das demais. Na reunião,
ções cruciais. Um gerente eficaz tem o autoconheci- fizera uma defesa extremamente bem pesquisada,
mento e a autogestão necessários para acertar a mão. cuidadosamente fundamentada e até contundente
Chefe do departamento de marketing de uma da proposta — que o grupo rejeitou com pouquíssi-
grande fabricante de bens duráveis, José nos con- ma discussão. “Com quantas dessas pessoas você fa-
tou o caso de dois gerentes que trabalhavam para lou sobre a proposta antes da reunião?”, pergunta-
ele. Ambos estavam tendo dificuldade para produ- mos. Nenhuma, foi a resposta. “Mas previ todas as
zir os resultados esperados de seus grupos. E ambos, dúvidas e objeções”, protestou Kim, acrescentando
descobriu-se, estavam criando relacionamentos dis- com certo rancor: “É pura política. Se não puderem
funcionais. Um deles era francamente ambivalente enxergar o que é bom para a empresa e para eles, não
sobre ser “o chefe” e odiava quando alguém se refe- tenho como ajudá-los”.
ria a ele daquela maneira. Queria ser querido e, por Muitos gerentes resistem à necessidade de atuar
isso, tentava forjar relações pessoais próximas. Na de forma eficaz no palco político da organização. A
prática, dizia o seguinte: “Faça o que peço porque seu ver, esse jogo político é disfuncional — sinal de
somos amigos”. Isso funcionou por um tempo — até problema na organização. Não percebem que é fruto
que, por bons motivos, teve de negar uma promoção inevitável de três características inerentes a toda or-
a um “amigo” e um bônus a outro. Naturalmente, es- ganização: divisão do trabalho, o que cria grupos dis-
ses indivíduos se sentiram traídos e sua insatisfação tintos com metas e prioridades distintas e até confli-
começou a contagiar o resto do grupo. tantes; interdependência, o que significa que nenhum
O outro gerente, uma mulher, foi no caminho grupo desses pode fazer seu trabalho sem os outros; e
oposto. Com ela, era tudo trabalho. Nada de jogar recursos escassos, pelos quais todos necessariamente
conversa fora ou tratar alguém como um indivíduo. competem. Naturalmente, certas organizações lidam
Para ela, os resultados importavam. Virara chefe por- com o jogo político melhor do que outras, mas o con-
que era a única que sabia o que precisava ser feito; flito e a disputa entre grupos são inevitáveis. E como
cabia a seu pessoal executar. Não surpreende que são resolvidos? Com a influência organizacional. Gru-
sua mensagem sempre fosse “Faça o que digo por- pos cujos gestores têm influência tendem a conseguir
que sou a chefe”. Era eficaz — até que o pessoal co- o que precisam; outros grupos, não.
meçou a partir. Infelizmente, em vez de lidar com o conflito mui-
Se a influência produtiva não resulta de ser que- tos gerentes tentam evitá-lo. “Odeio fazer política
rido (“Sou seu amigo!”) ou de ser temido (“Sou o na empresa!”, dizem. “Só quero fazer meu trabalho.”

Fevereiro 2011 Harvard Business Review 5


VOCÊ É BOM COMO CHEFE — OU EXCELENTE?

Mas o bom gerente sabe que não pode fugir da raia. de verdade, a responsabilidade é assumida conjun-
Em vez disso, com integridade e para bons fins, en- tamente pelos integrantes, que partilham a genuí-
volve de maneira proativa a organização para criar na convicção de que irão triunfar ou fracassar jun-
as condições para seu sucesso. Constrói e consolida tos. Um propósito claro e convincente e metas e pla-
uma ampla rede de relações permanentes com aque- nos concretos fundados nesse propósito são cru-
les de que precisa e aqueles que dele precisam; é as- ciais. Sem isso, nenhum grupo virará uma equipe de
sim que influencia gente sobre quem não tem nenhu- verdade.
ma autoridade formal. Além disso, assume a respon- A cultura da equipe é igualmente importante.
sabilidade por fazer de seu chefe (membro importan- Seus integrantes precisam saber o que se exige deles,
te de sua rede) uma fonte de influência em seu favor. coletiva e individualmente; quais os valores, normas
e padrões da equipe; de que maneira seus membros
Administre sua equipe devem trabalhar juntos (que tipo de conflito é aceitá-
Como gerente, Wei trabalhava de perto com cada vel ou não, por exemplo); e como devem se comuni-
pessoa de sua equipe, gente espalhada pelos Esta- car. É sua função garantir que todos tenham essa in-
dos Unidos e pela Ásia. Mas raramente reunia virtu- formação crucial.
almente o grupo, e juntou todo mundo cara a cara Um gerente eficaz também sabe que, mesmo nu-
uma única vez. “Na minha experiência”, ela nos dis- ma equipe coesa, não dá para ignorar cada um de
se, “reuniões virtuais ou em pessoa geralmente são seus indivíduos. Toda pessoa quer ser um membro
perda de tempo. Certas pessoas não fecham a boca, valioso de um grupo e precisa de reconhecimento
outras ficam em silêncio e pouco se faz. Para mim, é individual. O chefe deve ser capaz de dar a atenção
muito mais eficiente trabalhar com cada um e garan- que cada membro exige, mas sempre no contexto da
tir que se coordenem quando necessário”. Acontece, equipe.
porém, que Wei vinha gastando todo o tempo “co- E, por último, um gerente eficaz sabe como con-
ordenando”, o que incluía uma bela dose de media- duzir uma equipe pelo trabalho que faz dia após dia
ção de conflitos. O pessoal sob seu comando parecia — incluindo problemas e oportunidades inesperados
constantemente em conflito, brigando pelos escas- que volta e meia surgem — para avançar rumo à con-
sos recursos de que precisava para atingir metas de- secução de metas próprias e da equipe.
sencontradas e se queixando do que os outros esta-
vam ou não fazendo. Seja claro sobre seu progresso
Muitos gerentes ignoram a possibilidade de criar Esses três imperativos irão ajudá-lo a influenciar tan-
uma equipe de verdade e de to aqueles que trabalham para você quanto aqueles
administrar o pessoal como um que não. Acima de tudo, dão um
todo. Não percebem que geren-
Um bom gesto mapa claro e prático para sua

mesmo numa er sabe que,


ciar cada um isoladamente não jornada. É preciso dominá-los
é o mesmo que gerenciar um para se tornar um gestor plena-

não dá para ign quipe coesa,


grupo e que é muito mais efi- mente eficaz.
caz influenciar o comporta- Esses imperativos não são

um de seus ind orar cada


mento individual através do apenas competências geren-
grupo, pois a maioria de nós ciais distintas. São atividades
somos criaturas sociais que ivíduos. fortemente integradas, cada
querem se integrar e ser acei- uma delas dependente das ou-
tas como parte da equipe. Co- tras. Acertar a mão no relaciona-
mo converter quem trabalha para você, num pro- mento com cada pessoa é funda-
jeto ou em caráter permanente, numa equipe de ver- mental para montar uma equipe bem azeitada e
dade — um grupo de gente mutuamente comprome- dar a cada membro, individualmente, a atenção
tida com um propósito comum e com metas ligadas de que necessita. Um propósito contundente para
a tal propósito? a equipe, respaldado por metas e planos claros, é a
Para fazer um trabalho coletivo que exija habili- base de uma rede forte, e uma rede é indispensável
dades, experiência e conhecimento diversos, equi- para atingir as metas da equipe.
pes são mais criativas e produtivas do que grupos de Saber para onde está indo é apenas a primeira
indivíduos que se limitam a cooperar. Numa equipe metade do que é necessário. Também é preciso saber,

6 Harvard Business Review Fevereiro 2011


Como você se sai nos três imperativos? RATE YOURSELF

Você está fazendo tudo o que é necessário para ser um chefe eficaz? Para ter uma
PRECISO FAZER ESSE É UM
noção do ponto em que se encontra, use as seguintes perguntas para se avaliar: PROGRESSO PONTO FORTE

1. Você usa sua autoridade ESSE É UM PONTO FORTE SE você o considera um instrumento útil, mas 1 2 3 4 5
formal de forma eficaz? não o principal meio de influenciar os outros. Você deixa claro por que faz
o que faz — e até divide sua autoridade com os outros quando possível e
ADMINISTRAR A SI MESMO

apropriado. Você se concentra mais nas responsabilidades que a autori-


dade traz do que nos privilégios pessoais que confere.

2. Você estabelece relações ESSE É UM PONTO FORTE SE seus relacionamentos são ricos em contato hu- 1 2 3 4 5
de consideração, mas não mano, mas sempre focados no propósito e nas metas da equipe e da orga-
excessivamente pessoais? nização. Você evita fazer amizade com as pessoas para tentar influenciá-las.

3. Os outros confiam em ESSE É UM PONTO FORTE SE as pessoas, sobretudo as de sua equipe, 1 2 3 4 5


você como gerente? acreditam em sua competência, suas intenções e seus valores. Você
mostra interesse no sucesso individual de cada um.

4. Vocês exerce sua ESSE É UM PONTO FORTE SE você sempre identifica as partes interessadas, 1 2 3 4 5
influência com ética? pesa seus interesses e tenta mitigar qualquer dano que seus atos possam
causar no processo de buscar o bem maior.

5. Você identifica sistematica- ESSE É UM PONTO FORTE SE você está sempre ciente de que indivíduos e 1 2 3 4 5
mente quem deveria estar grupos sua equipe depende, e vice-versa, à medida que as circunstâncias
em sua rede? vão mudando.
ADMINISTRAR SUA REDE

6. Você cultiva e mantém ESSE É UM PONTO FORTE SE você estabelece e mantém relacionamentos 1 2 3 4 5
proativamente sua rede? com indivíduos de sua rede, trava contato frequente com eles e dá apoio
a suas necessidades.
7. Você usa sua rede para ob- ESSE É UM PONTO FORTE SE você protege sua equipe de distrações e mal- 1 2 3 4 5
ter a proteção e os recursos entendidos, usa a rede para resolver problemas dentro e fora da equipe e
de que sua equipe precisa? consegue fundos, pessoas e outros recursos de que o time necessita.

8. Você usa sua rede para ESSE É UM PONTO FORTE SE você forma coalizões de membros da rede para 1 2 3 4 5
atingir as metas da equipe? respaldar as metas da equipe e ajudar outros em sua rede a atingir as deles.
Seus colegas de rede confiam em sua competência e em seu caráter.

9. Você define e aprimora ESSE É UM PONTO FORTE SE você tiver definido o propósito da equipe e as 1 2 3 4 5
constantemente a visão da metas, estratégias e ações que a levarão até lá. Você está sempre colhendo
ADMINISTRAR SUA EQUIPE

equipe para o futuro? informações, discutindo seus planos com os outros e burilando suas ideias.

10. Você deixa claros papéis, re- ESSE É UM PONTO FORTE SE sua gente tem uma forte noção do “nós” — 1 2 3 4 5
gras de trabalho, cultura da de que estão todos trabalhando juntos rumo às mesmas metas. Sabem
equipe e feedback sobre o qual sua contribuição individual e o que o trabalho da equipe envolve.
desempenho para a equipe? Recebem feedback regular de você.

11. Você conhece e trata cada ESSE É UM PONTO FORTE SE você interage de forma equitativa com todo 1 2 3 4 5
pessoa como indivíduo, não membro da equipe individualmente. Você delega, se esforça para ajudar
só como membro da equipe? os outros a crescer e está sempre avaliando seu desempenho. Você con-
trata gente que combina com a equipe e agrega diversidade, e lida com
problemas de desempenho prontamente.

12. Você utiliza atividades diá- ESSE É UM PONTO FORTE SE você regularmente considera como cada pro- 1 2 3 4 5
rias e problemas para tra- blema, obrigação ou fato pode ajudar a fortalecer a equipe, a promover
balhar os três imperativos? suas metas, a desenvolver as pessoas e a reforçar sua rede.

COMO VOCÊ SE SAIU? Suas respostas cobriram toda a escala de 1 a 5? Se sua nota em cada quesito foi reiteradamente de 3 ou
mais, é bom duvidar. Nossa experiência nos diz que poucos líderes merecem uma nota alta em toda área. A maioria de suas notas
foi 3? Cuidado para não se esconder no meio, dizendo a si mesmo: “Estou bem — não sou excelente, mas tampouco sou um fiasco”.
E não fique satisfeito em permanecer ali. “Não sou um fiasco” pode indicar que a pessoa está acomodada — e estagnada.

Fevereiro 2011 Harvard Business Review 7


VOCÊ É BOM COMO CHEFE — OU EXCELENTE?

a todo e qualquer momento, em que ponto da jorna- Preparar. Comece cada manhã com uma rápida
da você se encontra e o que precisa fazer para progre- panorâmica dos eventos daquele dia. Em cada caso,
dir. Estamos todos cientes de que, quanto mais ele- pergunte a si mesmo como usá-lo para melhorar co-
vado seu posto na organização, menos feedback se mo gerente e, em particular, como trabalhar em suas
recebe sobre seu desempenho. É preciso estar prepa- metas específicas de aprendizagem. Considere dele-
rado para avaliar regularmente a si mesmo. gar uma tarefa da qual normalmente cuidaria e pen-
Um número excessivo de gerentes parece supor se em como faria isso — a quem a repassaria, que per-
que o desenvolvimento se dá automaticamente. Têm guntas deveria fazer, que limites deveria definir, que
apenas uma vaga noção da meta e de onde se situam orientação preliminar poderia dar. Aplique o mesmo
em relação a ela. Dizem a si mesmos: “Estou no cami- raciocínio durante o dia quando surgir um problema
nho certo” ou “À medida que assumir mais desafios, inesperado. Antes de tomar qualquer medida, pare e
vou melhorar”. Por conseguinte, acabam deixando a considere como isso o ajudaria a melhorar. Ponha-se à
desejar. Nada substitui um exame regular de si mes- prova. Se não deixar de lado padrões familiares e pra-
mo e de seu progresso (o quadro “Como você se sai ticar novas abordagens, dificilmente aprenderá algo.
nos três imperativos?” vai ajudá-lo nessa tarefa). Fazer. Tome toda medida exigida por seu tra-
Não desanime se achar várias áreas nas quais po- balho diário e, ao fazê-lo, use as abordagens novas
deria melhorar. Nenhum gestor vai cumprir todos os e distintas que planejou. Não perca a determinação.
requisitos implícitos nos três imperativos. A meta não Por exemplo, se sua tendência é abafar o conflito em
é perfeição. É desenvolver os dotes de que precisa pa- reuniões (mesmo o conflito construtivo), faça de tu-
ra triunfar e compensar eventuais deficiências fatais. do para se conter de modo que divergências possam
Examine seus pontos fortes e deficiências no contex- ser expressas e trabalhadas. Só interfira se a discus-
to da organização. Que conhecimento e habilidades são se tornar pessoal ou se certos pontos de vista es-
ela precisa — ou precisará — para atingir seus objeti- tiverem sendo reprimidos. As ideias que surgem po-
vos? Como seus pontos fortes podem ajudá-la a avan- dem levá-lo a um resultado melhor.
çar? Dadas suas necessidades e prioridades, que defi- Avaliar. Depois de agir, examine o que fez e qual
ciências você precisa abordar de imediato? As respos- foi o resultado. É aqui que o aprendizado realmente
tas se tornam suas metas pessoais de aprendizado. ocorre. Refletir é algo fundamental — e funciona me-
lhor se for uma prática regular. Reserve um tempo ao
O que é possível fazer já fim de cada dia, por exemplo (talvez no caminho de
O progresso virá apenas de sua experiência de tra- volta para casa). Que ações deram certo? O que pode-
balho: de provar e aprender, de observar e interagir ria ter sido feito de forma diferente? Pense nas con-
com os outros, de experimentar e, às vezes, ir além versas que teve. Compare o que fez com o que pode-
de sua zona de conforto — para, então, avaliar a si ria ter feito se fosse o gestor que aspira ser. Em que
mesmo nos três imperativos reiteradamente. Acima decepcionou a si mesmo, e como isso ocorreu? Pra-
de tudo, assuma a responsabilidade pelo próprio de- ticou algum comportamento novo ou fez algum pro-
senvolvimento; ao fim e ao cabo, todo desenvolvi- gresso em sua jornada?
mento é autodesenvolvimento. Certos gestores tomam nota de como empregam
A menos que aja conscientemente, você não irá o tempo. Anotam, ainda, reflexões sobre o que apren-
avançar. Antes de abrir uma empresa, qualquer um deram. Um presidente que trabalhava numa estratégia
montaria um plano de negócios dividido em etapas ad- de globalização nos contou que começou a registrar, às
ministráveis com metas; faça o mesmo ao pensar sobre sextas, suas reflexões sobre a semana anterior. Passa-
sua jornada. Adote metas pessoais. Peça o feedback dos das seis semanas, disse, tinha adquirido maior discipli-
outros. Tire proveito de programas de treinamento na na para dizer não a qualquer coisa que não estivesse na
empresa. Crie uma rede de conselheiros de confiança, “rota crítica”, o que lhe deu tempo para falar com regu-
incluindo indivíduos que sirvam de exemplo e mento- ladores importantes e impulsionar a estratégia.
res. Use seus pontos fortes para buscar experiências de Se o leitor ainda precisa avançar em sua jornada,
desenvolvimento. Sabemos que você já ouviu tudo isso isso deve impeli-lo à ação, não desanimá-lo. Você po-
antes; são bons conselhos. Mas o mais eficaz, a nosso de se tornar o que quer e precisa ser. Mas é preciso
ver, é inserir a aprendizagem em seu trabalho diário. se responsabilizar pessoalmente por dominar os três
Para tanto, sugerimos um esquema simples que imperativos e determinar onde se encontra agora.
chamamos de preparar, fazer, avaliar. HBR Reprint R1102C–P

8 Harvard Business Review Fevereiro 2011


Como um
gerente
vira líder
Sete transformações
sísmicas na perspectiva
e em responsabilidades
Michael D. Watkins

Michael D. Watkins é um dos fundadores da Genesis Advisers, consultoria de desenvolvimento


de lideranças especializada em “onboarding” e aceleração da transição de executivos. Watkins é
professor do IMD, na Suíça, e autor dos best-sellers Os Primeiros 90 Dias e Your Next Move.
FOCO LIDERANÇA

H
arald (o nome foi mudado) é equipe mais experiente e de alçar sua capacidade de
um líder de alto potencial com liderança ao nível seguinte em um cenário livre de
15 anos de experiência em uma complicações ou crises. A situação parecia perfeita.
grande fabricante de produtos Mas, com meses no novo posto, Harald estava viven-
químicos europeia. Começou co- do sérias dificuldades.
mo gerente assistente de produtos na unidade de Assim como ele, muita gente promissora se dá
plásticos. Logo foi transferido para Hong Kong, para mal ao passar do comando de um departamento ao
ajudar a montar o novo centro de negócios da uni- de uma divisão — ao assumir, pela primeira vez, a
dade na Ásia. Quando as vendas ali dispararam, não responsabilidade por um balanço e pela supervisão
tardou a ser promovido a gerente de vendas. Três de executivos de áreas distintas da empresa. É, de fa-
anos depois, voltou à Europa para ser diretor de to, diferente lá no alto. Para saber como, fiz um exa-
marketing e vendas no bloco Europa, Oriente Mé- me em profundidade desse ponto de inflexão, reali-
dio e África, supervisionando uma turma de 80 pro- zando uma longa série de entrevistas com mais de 40
fissionais. O passo seguinte nessa sequência de êxi- executivos, incluindo gerentes que tinham cultivado
tos foi a promoção a vice-presidente de marketing talentos de alto potencial, altos executivos de RH e
e vendas da divisão de polietileno, responsável por indivíduos que há pouco tinham feito, pela primeira
várias linhas de produtos, serviços correlatos e uma vez, a transição para a liderança de um negócio.
equipe de quase 200 pessoas. O que descobri é que, para ter sucesso nessa tran-
A dedicação de Harald culminou com a nomea- sição, o executivo precisa lidar com uma complicada
ção para o comando da unidade de resinas plásticas série de mudanças no foco de sua liderança e em suas
da empresa, uma operação com mais de 3 mil fun- competências — o que chamo de sete transformações
cionários em todo o mundo. De caso bem pensado, a sísmicas. Precisa saber como ir de especialista a gene-
empresa o destacara para tocar um braço que, embo- ralista, de analista a integrador, de tático a estrategis-
ra pequeno, estava crescendo e já tinha uma equipe ta, de pedreiro a arquiteto, de solucionador de proble-
forte. A ideia era dar ao executivo a oportunidade de mas a definidor da agenda, de guerreiro a diploma-
ir além da gestão de vendas e marketing, de assumir ta e de coadjuvante a protagonista. Como tantos de
o controle de um negócio inteiro, de descobrir o que seus pares, Harald sentiu dificuldade para lidar com a
significava chefiar uma unidade com a ajuda de uma maioria dessas mudanças. Para entender por que são
tão difíceis, sigamos sua trajetória em cada uma delas.
Vejamos como enfrenta surpresas desnorteantes, faz
suposições injustificadas, é obrigado a usar o tempo
Sete e a imaginação de forma totalmente inédita, toma de-

transformações
cisões na ignorância e aprende com os erros.

sísmicas De especialista a generalista


O desafio imediato de Harald era passar do coman-
do de um único departamento à supervisão de todo

Toda mudança que o chefe de ESPECIALISTA ANALISTA TÁTICO


uma seção ou departamento A GENERALISTA A INTEGRADOR A ESTRATEGISTA
precisa promover ao passar Compreender modelos men- Integrar o conhecimento Transitar com fluidez de de-
a dirigir uma operação intei- tais, ferramentas e termi- coletivo de equipes multi- talhes para o quadro geral,
ra envolve o aprendizado de nologia empregados nas disciplinares e fazer trade- detectar padrões importan-
principais áreas do negócio offs condizentes para resol- tes em ambientes comple-
novas competências e o cul- e criar modelos para avaliar ver complexos problemas xos e prever e influenciar
tivo de novas maneiras de líderes desses setores. organizacionais. reação de atores externos
pensar. Confira ao lado as importantes.
mudanças exigidas e o
que cada uma requer
do executivo:
2 Harvard Business Review Junho 2012
COMO UM GERENTE VIRA LÍDER

Ideia em resumo
Poucas transições na liderança são tão difíceis o executivo precisa se trans- o negócio inteiro enfrenta? Co-
quanto passar pela primeira vez do comando formar num generalista que mo posso garantir o sucesso de
de uma área específica ou departamento da entende todas as atividades toda a organização?
empresa para a chefia de um negócio inteiro. do negócio. Precisa aprender a Nesse crucial ponto de infle-
contratar, julgar e mediar com xão, o executivo precisa passar
O escopo e a complexidade do burilou em papéis anteriores — uma variedade muito maior de por sete transformações sísmi-
trabalho crescem radicalmente domínio de uma área específi- pessoas. Precisa enfrentar toda cas — uma série complicada
— e de um jeito que pode dei- ca, know-how organizacional, uma nova série de perguntas de mudanças no foco de sua li-
xar o novo líder de uma unida- capacidade de montar e moti- difíceis: quais as grandes ques- derança que exige o cultivo de
de se sentindo assoberbado e var uma equipe — já não são tões na agenda do negócio? novas competências e novos
inseguro. As competências que suficientes. Pela primeira vez, Que oportunidades e ameaças modelos conceituais.

o conjunto de operações de um negócio. Nos dois O que é “suficiente”? O líder de uma empre-
primeiros meses, a mudança o deixou desorientado sa ou negócio deve ser capaz de (1) tomar decisões
e com menos confiança na própria capacidade de to- boas para o negócio como um todo e (2) avaliar os
mar boas decisões. Isso o levou ao clássico erro de talentos em suas equipes. Nos dois casos, precisa
superadministrar a área que conhecia bem e subad- entender que cada departamento ou setor do negó-
ministrar as demais. Para sorte de Harald, isso ficou cio é uma subcultura gerencial distinta, cada qual
ultraclaro quando sua diretora de RH opinou, com com modelos mentais e linguagem próprios. Um
toda franqueza, sobre a relação dele com a diretora líder eficaz entende que profissionais de finanças,
de vendas e marketing: “Você está enlouquecendo a marketing, operações, RH e P&D abordam proble-
Claire. Precisa dar espaço para ela”. mas de negócios de modo distinto, e que cada dis-
A tendência de Harald a permanecer nessa zo- ciplina dessas aplica ferramentas distintas (fluxo de
na de conforto funcional é uma reação compreensí- caixa descontado, segmentação de clientes, fluxo de
vel à tensão de assumir um papel muito mais amplo. processo, planejamento da sucessão, stage-gates e
Seria maravilhoso se todo líder empossado no co- por aí vai). O líder precisa falar a língua de cada área
mando de uma divisão fosse um especialista tarim- dessas e traduzi-la para as demais, se necessário. E
bado em todas as operações do negócio, mas obvia- muito importante: o líder precisa saber o que per-
mente nunca é. Em certos casos, o indivíduo adqui- guntar e que critérios adotar para avaliar e recrutar
riu experiência por ter passado por vários departa- gente para administrar áreas nas quais ele próprio
mentos ou trabalhado em projetos multidisciplina- não é especialista.
res, o que certamente ajuda (veja o quadro “Como A boa notícia para Harald foi que, além de colocá-
cultivar fortes líderes de negócios”). Mas o fato é lo no comando de uma unidade de alto desempenho,
que a transição para o comando de um negócio exi- sua empresa contava com fortes sistemas para ava-
ge que um executivo até então especializado rapi- liar e desenvolver talentos em áreas cruciais. Isso in-
damente se transforme num generalista com do- cluía sistemas bem formulados para avaliação de de-
mínio suficiente de todas as atividades para tocar o sempenho e feedback de 360 graus, e para coleta de
negócio. subsídios de departamentos da empresa. Embora se

PEDREIRO SOLUCIONADOR GUERREIRO COADJUVANTE


A ARQUITETO DE PROBLEMAS A A DIPLOMATA A PROTAGONISTA
Entender como analisar e DEFINIDOR DA AGENDA Moldar de forma proativa o Ser um modelo dos compor-
projetar sistemas organiza- Definir problemas nos quais a ambiente no qual a empresa tamentos certos para a or-
cionais para que estratégia, organização deve se concen- opera, influenciando públi- ganização e aprender a se
estrutura, modelos operacio- trar e detectar questões que cos externos importantes, comunicar com e a inspirar
nais e bases de competências não se encaixam perfeitamen- incluindo poder público, grandes grupos de pessoas
se encaixem de forma eficaz te neste ou naquele departa- ONGs, imprensa e diretamente e, cada vez mais,
e eficiente, e explorar essa mento, mas que ainda assim investidores. indiretamente.
compreensão para promo- são importantes.
ver mudanças organizacionais
necessárias.

Junho 2012 Harvard Business Review 3


FOCO LIDERANÇA

reportassem diretamente a ele, por exemplo, seus di- mento geral dessas distintas áreas para resolver con-
retores de finanças e RH também eram subordinados flitos como esses. Só que isso não basta. As compe-
aos respectivos departamentos na matriz, que ajuda- tências necessárias não envolvem tanto a análise —
va Harald com sua avaliação e desenvolvimento. Lo- mas sim entender como fazer trade-offs e explicar
go, o executivo tinha recursos de sobra para poder en- a lógica dessas decisões. Aqui, também, a experi-
tender o que a “excelência” significava em cada área. ência anterior com equipes multidisciplinares ou
Ao investir diretamente na criação de esquemas de desenvolvimento de novos produtos deixaria o
de avaliação padronizados para cada atividade, a líder recém-alçado ao comando de um negócio em
empresa garante que novos líderes de negócios ad- boa posição, bem como um estágio anterior como
quiram mais depressa o domínio da nova situação. chefe de gabinete de um alto executivo. Mas, no fi-
Mas, ainda que a empresa não possua um sistema nal, como descobriu Harald, não há nada que subs-
desses, o aspirante a líder de negócios pode se prepa- titua a experiência de tomar as decisões na prática e
rar. Como? Forjando relações com colegas de outros aprender com os resultados.
departamentos, buscando aprender com eles (talvez
em troca de informações sobre sua própria área) para De tático a estrategista
poder desenvolver seus próprios mecanismos. Nos primeiros meses, Harald mergulhou fundo na
miríade de detalhes do negócio. Ser tático era uma
De analista a integrador tentação: as atividades eram concretas, os resulta-
A responsabilidade primordial do líder de um depar- dos, imediatos. Daí ter se perdido no movimento
tamento é recrutar, formar e gerenciar gente que se diário de participar de reuniões, de tomar decisões,
concentre com profundidade analítica em ativida- de fazer projetos avançar.
des empresariais específicas. Já o papel do líder de O problema com isso, obviamente, é que um as-
um negócio inteiro é administrar e integrar o conhe- pecto central do novo papel de Harald era ser o es-
cimento coletivo dessas equipes setoriais para resol- trategista-chefe da unidade que agora liderava. Para
ver importantes problemas organizacionais. tanto, teria de esquecer muitos dos detalhes e abrir
Harald teve dificuldade com essa mudança logo espaço na cabeça e na agenda para se concentrar em
no início, quando precisou lidar com as várias neces- assuntos mais elevados. De modo geral, precisava
sidades conflitantes das operações. Seu diretor de adotar uma mentalidade estratégica.
vendas e marketing, por exemplo, queria ser agres- E o que um líder taticamente forte faz para desen-
sivo no lançamento de um novo produto no merca- volver essa mentalidade? Cultiva três competências:
do; já o chefe de operações temia que fosse impossí- mudança de nível, reconhecimento de padrões e si-
vel aumentar a produção com rapidez suficiente pa- mulação mental. A mudança de nível é a capacida-
ra dar conta da demanda projetada pelo pessoal de de de se deslocar com fluidez de um nível de análi-
vendas. A equipe de Harald esperava que ele equili- se para outro — de saber quando se concentrar em
brasse as necessidades do lado da oferta (operações) detalhes, quando olhar para o quadro geral e qual a
do negócio com as do lado da demanda (vendas e relação entre os dois. O reconhecimento de padrões
marketing), que soubesse quando se concentrar nos é a capacidade de discernir importantes relações
resultados trimestrais do negócio (finanças) e quan- causais e outros padrões importantes num negócio
do investir no futuro (R&D), que decidisse quanta complexo e em seu entorno — ou seja, de separar o
atenção dar à execução e quanta à inovação — e que sinal do ruído. A simulação mental é a capacidade
tomasse um sem-fim de outras decisões parecidas. de prever como terceiros (concorrentes, regulado-
Repetindo, o executivo precisa ter um conheci- res, imprensa, figuras importantes do público) irão

N ão há nada que substitua a


experiência de tomar as decisões na
prática e aprender com os resultados.
4 Harvard Business Review Junho 2012
COMO UM GERENTE VIRA LÍDER

Como cultivar fortes líderes de negócios


Desde o início Quando sua promessa Se for o caso, antes da Na primeira promoção
da carreira, dê a como líder se tornar primeira promoção a do indivíduo ao
potenciais líderes… evidente, dê ao líder de um negócio comando de uma
Experiência em projetos in- indivíduo de alto inteiro, envie o astro operação inteira,
terdisciplinares e, mais tarde, potencial… em ascensão… coloque o novo líder
responsabilidade por um
projeto desses
Um posto em uma alta equipe A um programa consistente numa unidade…
de gestão de educação executiva que Pequena, distinta e em boa
Uma missão fora do país aborde competências como situação
Experiência com stakeholders
(se o negócio for desenho organizacional,
externos (investidores, im- Aparelhada com uma equipe
internacional) melhoria de processos de
prensa, clientes importantes) experiente e assertiva com a
Exposição a uma ampla gama negócios e gestão de transi-
Uma missão como chefe de ções, e que permita ao indi- qual o líder possa aprender
de situações de um negócio:
gabinete de um líder expe- víduo forjar redes externas
start-up, crescimento ace-
riente de negócios
lerado, sucesso sustentado,
realinhamento, recuperação, A atribuição de liderar a
encerramento integração de uma empresa
adquirida ou uma reestrutu-
ração importante

responder ao que você faz, de prever seus atos e re- explícitas para identificar e, até certo ponto, prote-
ações para poder definir o melhor rumo a tomar. No ger esse indivíduo no início da carreira.
primeiro ano de Harald, por exemplo, uma concor-
rente na Ásia lançou uma alternativa mais barata a De pedreiro a arquiteto
uma resina crucial fabricada por sua unidade. Harald É muito comum um alto executivo dar uma de pro-
teria não só de considerar a ameaça imediata, mas fissional do desenho organizacional sem credencial
também pensar com mais amplitude sobre a inten- para tal — e acabar errando feio. Essa pessoa che-
ção futura da concorrente. Será que iria usar o produ- ga ao primeiro papel de gestão geral com comichão
to barato para estabelecer relações fortes com clien- para deixar sua marca e vai logo mirando elemen-
tes e, aos poucos, lançar uma gama maior de produ- tos da organização que parecem relativamente fá-
tos? Se assim fosse, que saídas a unidade de Harald ceis de mudar, como a estratégia ou a estrutura —
deveria buscar? Qual seria a resposta da concorrente sem entender plenamente o efeito que as mudan-
às medidas tomadas por Harald? Não eram pergun- ças terão na organização como um todo.
tas que o executivo tivera de responder quando dire- Com uns quatro meses no cargo, por exemplo,
tor de marketing e vendas. No final, tendo analisado Harald concluiu que precisaria reestruturar o negó-
vários cursos de ação com a alta equipe, o executivo cio para se concentrar mais em clientes e menos em
resolveu derrubar os preços, abrindo mão de certo linhas de produtos. Ex-diretor de vendas e marke-
lucro no presente na tentativa de conter a perda de ting que era, era natural que pensasse assim. A seu
mercado — decisão da qual não se arrependeu. ver, era óbvio que o negócio estava enraizado demais
Um estrategista nasce pronto ou é cultivado? As no desenvolvimento de produtos e nas operações e
duas coisas. Não há dúvida de que o raciocínio es- que sua estrutura era um legado ultrapassado do
tratégico, como qualquer outra habilidade, pode modo como a unidade surgira e crescera. Logo, ficou
melhorar com a prática. Mas a capacidade de transi- surpreso quando a proposta de reestruturação foi re-
tar por distintos níveis de análise, de reconhecer pa- cebida primeiro com o pasmo silêncio da equipe e,
drões e de construir modelos mentais requer certa em seguida, com feroz oposição. Rapidamente ficou
propensão nata. Um dos paradoxos do desenvolvi- claro que a atual estrutura naquela bem-sucedida di-
mento de lideranças é que, embora o indivíduo seja visão da empresa estava ligada de forma intrincada e
promovido a cargos de chefia funcional basicamen- nada óbvia a seus principais processos e bases de ta-
te por ser bom para carregar pedras, profissionais lentos. Para vender os produtos químicos da empre-
com talento estratégico podem penar em escalões sa, por exemplo, o pessoal de vendas precisava ter
inferiores justamente por focar menos em detalhes. conhecimento profundo do produto e a capacidade
Forças darwinianas podem expulsar quem tem ra- de consultar clientes sobre aplicações. A mudança
ciocínio estratégico do pipeline de desenvolvimen- para uma abordagem centrada no cliente teria exi-
to cedo demais caso a empresa não adote políticas gido que vendessem uma gama maior de produtos

Junho 2012 Harvard Business Review 5


FOCO LIDERANÇA

complexos e adquirissem um imenso volume de no- com mudanças organizacionais de grande escala pa-
vos conhecimentos. Logo, ainda que a adoção de ra chegar a esses insights pela mera observação.
uma estrutura com foco no cliente tivesse benefícios Nisso, Harald não fugia à regra: o líder de uma
potenciais, certos trade-offs deviam ser avaliados. A empresa ou de um negócio precisa conhecer os prin-
implementação exigiria, por exemplo, ajustes consi- cípios da mudança organizacional e da gestão de
deráveis em processos e investimentos substanciais mudanças, incluindo a mecânica do desenho organi-
na reciclagem do pessoal. Eram mudanças que pe- zacional, da melhoria de processos de negócios e da
diam uma grande dose de reflexão e análise. gestão de transições. Só que poucos executivos em
Quando ascende a esse nível geral na empresa, o ascensão recebem qualquer orientação formal nes-
líder se torna responsável por projetar e alterar a ar- sas áreas, o que torna a maioria mal aparelhada pa-
quitetura da organização — sua estrutura, sua estra- ra agir como arquiteto das respectivas organizações
tégia, seus processos e bases de competências. Para — ou até para ser um consumidor esclarecido do tra-
ser um bom arquiteto organizacional, precisa pensar balho de profissionais do desenvolvimento organiza-
em termos de sistemas. Precisa entender como ele- cional. Aqui, de novo, Harald teve a sorte de contar
mentos cruciais da organização se encaixam, em vez com uma equipe experiente — e o bom-senso de usá-
de ingenuamente pensar, como fez Harald lá atrás, la. Essa equipe lhe deu conselhos pertinentes sobre
que é possível mexer num elemento sem pensar an- muitas interdependências que o executivo não con-
tes nas implicações para todos os demais. Harald siderara originalmente. Nem todo líder como ele tem
aprendeu isso na marra, pois nada em sua experiên- essa sorte, é claro. Mas, se a empresa tiver investido
cia como líder de um departamento lhe dera a opor- em programas de educação para ensinar executivos
tunidade de pensar sobre uma organização como a promover mudanças na organização, o líder vai es-
um sistema. Tampouco tinha experiência suficiente tar mais bem preparado para essa novidade.

Como avaliar um executivo de vendas?


Quem lidera uma operação inteira precisa avaliar o trabalho de executivos de todas as seções da
empresa, não só daqueles da mesma área da qual ele, o líder, veio. Um modelo simples que relacione
sistematicamente os indicadores mais importantes a monitorar para uma área específica, e aponte quais
indicam problemas no horizonte, vai ajudar um novo líder a tomar as rédeas da situação. Veja abaixo o
exemplo de um modelo para vendas:

Principais Indicadores
indicadores de gestão Indicadores
de desempenho de pessoas de clientes Sinais de alerta
Vendas dos principais Taxa de vagas abertas Taxas de satisfação e Perdas lamentáveis de pessoal de vendas
produtos compara- por região ou distrito retenção de clientes Estagnação ou queda nas vendas
das com vendas dos Taxa de promoções Evidências de com-
principais produtos da Falta de desenvolvimento interno para futuros
internas e força do preensão de padrões líderes de vendas
concorrência pipeline interno de de compra
Crescimento da partici- sucessão Promoções internas com resultados fracos
Volume médio de inte-
pação no mercado de Número de perdas ração de vendedores Incapacidade de comunicar vantagens e desvan-
principais produtos lamentáveis de profis- com clientes tagens de produtos
Execução à luz de com- sionais e motivos Avaliação insatisfatória de pontos fortes e defi-
promissos assumidos Sucesso em recruta- ciências da organização
em planos de negócios mento e seleção Falta de tempo em campo ou de interação com
clientes
Falta de competências para parceria com marke-
ting e outras áreas essenciais

6 Harvard Business Review Junho 2012


COMO UM GERENTE VIRA LÍDER

De solucionador de problemas camente em conduzir as tropas para derrotar a con-


a definidor da agenda corrência. Agora, via que era preciso dedicar uma in-
Muito gerente é promovido a um nível superior na crível quantidade de tempo para influenciar uma sé-
hierarquia pela pura capacidade de resolver proble- rie de públicos externos, incluindo autoridades, im-
mas. Quando vira líder de um negócio todo, no en- prensa, investidores, ONGs. Seus assessores eram
tanto, precisa se concentrar menos em solucionar bombardeados com pedidos: Harald poderia partici-
problemas e mais em definir que problemas a orga- par de fóruns do setor ou do poder público patroci-
nização deveria estar abordando. nados pelo departamento de relações com o gover-
Para isso, Harald teria de enxergar o leque intei- no? Estaria disposto a dar uma entrevista ao editor
ro de oportunidades e ameaças diante do negócio de uma importante publicação de negócios? Poderia
e fechar o foco da equipe só nos mais importantes. se reunir com uma turma importante de investidores
Também teria de identificar “espaços em branco”— institucionais? Alguns desses grupos, até conhecia;
questões que não pertencem exatamente a esse ou de outros, nem ouvira falar. Mas o que era totalmen-
àquele departamento, mas que seguem sendo im- te inédito para ele era a responsabilidade não só de
portantes para o negócio, como a diversidade. interagir com stakeholders distintos, mas também
O volume de coisas que Harald agora tinha de de abordar de modo proativo suas preocupações, de
considerar era desnorteante. Quando fora diretor de modo que se mesclassem com os interesses da em-
vendas e marketing, tinha adquirido certa compre- presa. Pouco da experiência anterior o preparara pa-
ensão do difícil que era para líderes de um negócio ra o desafio de ser um diplomata empresarial.
inteiro priorizar todas as questões que chegavam a E o que faz um bom diplomata empresarial? Usa
sua mesa em um dia, uma semana, um mês. Ainda as ferramentas da diplomacia —negociação, per-
assim, ficou surpreso com o escopo e a complexida- suasão, gestão de conflitos e construção de alianças
de de alguns dos problemas naquele nível. Não sa- — para levar o ambiente de negócios externo a apoiar
bia ao certo como dividir seu tempo e imediatamen- suas metas estratégicas. No processo, é comum se
te se sentiu sobrecarregado. Sabia que teria de dele- ver colaborando com gente com quem compete
gar mais, mas ainda não sabia bem que tarefas e atri- agressivamente no mercado todo dia.
buições poderia repassar com tranquilidade a outros. Para se sair bem na empreitada, o líder de um ne-
As competências que burilara no comando de um gócio precisa ter uma nova mentalidade — precisa ver
departamento — o domínio de ferramentas e técni- como distintos interesses se alinham (ou poderiam
cas de vendas e marketing, know-how organizacio- se alinhar), entender como decisões são tomadas em
nal e até a capacidade de mobilizar talentos e pro- cada tipo de organização e traçar estratégias eficazes
mover o trabalho em equipe — não bastariam. Pa- para influenciar os outros. Precisa, ainda, saber como
ra definir em que problemas sua equipe deveria se recrutar e administrar trabalhadores de uma catego-
concentrar — ou seja, para definir a pauta —, teve de ria que até então provavelmente nunca chefiou: pro-
aprender a lidar com um ambiente muito mais in- fissionais em funções de apoio importantes, como re-
certo e ambíguo do que estava acostumado. Tam- lações com o governo e comunicação institucional. E
bém precisou aprender a transmitir prioridades, de precisa reconhecer que esse pessoal trabalha com um
modo que a organização pudesse responder. Dado horizonte mais longo do que o das operações em si,
seu passado em vendas e marketing, Harald penou focadas que são no resultado trimestral ou até anual.
menos com a forma de comunicar sua pauta. O de- Certas iniciativas, como uma campanha para influen-
safio foi descobrir o que era essa agenda. De certo ciar o texto de novas regulamentações, podem levar
modo, teria apenas de aprender com a experiência anos. Harald demorou para entender isso. Foi orien-
— mas aqui, de novo, recebeu a ajuda dos membros tado pela equipe, que contou como certas questões
da equipe, que o pressionaram por orientação sobre eram administradas ao longo de grandes períodos de
questões que, sabiam, ele precisava considerar. Ha- tempo e como periodicamente lamentava o resulta-
rald também pôde contar com o processo anual de do quando alguém se desviava do objetivo.
planejamento da empresa, que dava uma estrutu-
ra para a definição de metas cruciais para a unidade. De coadjuvante a protagonista
Por último, virar líder de uma divisão ou empresa
De guerreiro a diplomata inteira significa passar para o centro do palco, estar
Em papéis anteriores, Harald se concentrara basi- sob fortes holofotes. A intensidade da atenção e a

Junho 2012 Harvard Business Review 7


FOCO LIDERANÇA

É
bom que o líder de um negócio
destaque outra pessoa para cuidar
da execução. Com isso, abre espaço
na agenda para sua nova função.
necessidade quase constante de manter a guarda pe- simplesmente sair e vender ele mesmo a ideia; te-
gou Harald de surpresa. O executivo sentiu certo es- ria de agir mais por meio dos subordinados diretos
panto ao descobrir o peso que as pessoas atribuíam a e achar outros canais, como o vídeo, para difundir a
tudo o que dizia e fazia. Numa conversa com o diretor palavra. Depois de visitar a maioria das instalações
de P&D pouco depois de assumir o posto, por exem- da unidade, Harald igualmente temia não ter se in-
plo, falou por alto de uma nova forma de embalar um teirado de verdade do que estava acontecendo na
produto já existente. Duas semanas depois, um rela- linha de frente. Logo, em vez de se reunir apenas
tório preliminar de viabilidade aparecia em sua mesa. com a chefia durante uma visita dessas, instituiu a
Em parte, essa mudança está ligada ao impacto prática de almoços informais com pequenos grupos
muito maior do líder como exemplo a seguir. Gesto- de funcionários da linha de frente. Passou, ainda, a
res em todos os níveis servem de exemplo, em certa acompanhar grupos de discussão online nos quais o
medida. Mas, no comando de um negócio, sua influ- pessoal fazia comentários sobre a empresa.
ência é ampliada, pois todos se voltam ao líder em
busca de inspiração, visão e pistas sobre condutas DE MODO GERAL, as sete transformações envolvem a
e atitudes “certas”. Para o bem ou para o mal, o es- migração do raciocínio analítico do lado esquerdo
tilo pessoal e os hábitos de um alto líder contagiam do cérebro para o lado direito, mais conceitual. Mas
os demais, seja pela observação direta por funcioná- isso não significa que o líder de uma operação nun-
rios ou pela transmissão indireta dos subordinados ca se dedique à tática ou a questões funcionais. É
do líder para gente no escalão inferior e, dali, para só que dedica muitíssimo menos tempo a essas res-
toda a organização. Embora não haja como evitar es- ponsabilidades do que dedicava no cargo anterior.
se efeito, o líder pode torná-lo menos involuntário. Aliás, em geral é bom que o líder de um negócio des-
Como? Tendo mais autoconsciência e cultivando taque outra pessoa — um chefe de gabinete, um di-
mais empatia com o ponto de vista dos subordina- retor de operações, um gerente de projetos — para
dos. Afinal, não faz tanto tempo assim que ele mes- se concentrar na execução, abrindo com isso espaço
mo foi um subordinado e fez inferências como essas na agenda para sua nova função.
a partir do comportamento dos chefes. No caso de Harald, a história acabou bem. O exe-
Há, ainda, a questão do que significa, em termos cutivo teve sorte de trabalhar para uma empresa que
práticos, liderar grandes grupos de gente — como acreditava no desenvolvimento de lideranças e de
conceber uma visão contundente e difundi-la de contar com uma equipe experiente que foi capaz de
modo inspirador. Até Harald, que já era um comuni- (e estava disposta a) lhe dar bons conselhos. Logo,
cador forte e habituado a vender ideias (não só pro- apesar dos muitos solavancos no caminho, o negócio
dutos), precisou ajustar seu raciocínio a esse respei- continuou a prosperar e Harald no final achou seu rit-
to (embora talvez menos do que alguns de seus pa- mo como líder do negócio. Três anos depois, munido
res). No posto anterior, tinha mantido um grau ra- de toda essa experiência, foi convidado a assumir
zoável de contato pessoal — embora por vezes es- uma unidade muito maior de empresa, à época em
porádico — com a maioria dos funcionários. Agora dificuldades. Lá, promoveu uma triunfal recupera-
que chefiava mais de 3 mil pessoas espalhadas pelo ção. Olhando hoje, Harald diz: “As competências que
globo, era algo simplesmente impossível. o levaram ao posto atual podem não ser as compe-
O que isso implicava ficou claro quando traba- tências necessárias para que chegue aonde precisa
lhou com a equipe para formular a estratégia anu- chegar. Isso não diminui as conquistas do passado,
al. Chegada a hora de anunciar a estratégia à orga- mas significa que não serão suficientes para a próxi-
nização, o executivo percebeu que não poderia ma etapa da jornada”. HBR Reprint R1206C–P

8 Harvard Business Review Junho 2012


ESTREIA NO
COMANDO
por Linda A. Hill

Linda A. Hill é titular da cátedra Wallace Brett Donham Professor of


Business Administration na Harvard Business School, em Boston, e autora
de Novos Gerentes: Assumindo Uma Nova Identidade (Makron, 1993).
ESTREIA NO COMANDO

Até para o mais brilhante dos indivíduos, o processo de conversão em líder é uma
jornada árdua, embora gratificante, de constante aprendizado e autodesenvolvimento. O
primeiro teste nessa rota é tão fundamental que chega a ser ignorado: assumir o primeiro
posto de chefia. É pena, porque as provações que esse rito de passagem traz têm sérias
consequências tanto para o indivíduo como para a organização.

Durante uma década e meia a autora estudou indivíduos – sobretudo profissionais de


desempenho estelar – em grandes transições para a gerência. Segundos novos gerentes,
essa transição só se complica à medida que a empresa fica mais enxuta e dinâmica. Essa
transição muitas vezes é mais difícil do que deveria ser devido à noção equivocada que
o gerente tem do papel. Quem está ciente dessas ilusões tem muito mais chances de
sucesso.

Quem estreia na chefia, por exemplo, costuma achar que o posto lhe trará mais
autoridade e liberdade para fazer o que julga ser o melhor. Em vez disso, o gerente
acaba enredado em uma teia de relacionamentos com subordinados, chefes, colegas e
outros indivíduos – todos  fonte  de  demandas  incessantes,  muitas  vezes  conflitantes.  “A  
verdade  é  que  não  temos  o  controle  de  nada”,  diz  um  novo  gerente.

Outro mito reza que o gerente é responsável apenas por assegurar que suas operações
corram sem problemas. Contudo, o novo gerente precisa entender que cabe a ele, ainda,
sugerir e deslanchar mudanças – até fora de sua esfera de comando – que melhorem o
desempenho do grupo.

É grande o número de novos gerentes que relutam em pedir a ajuda do superior. Mas
quando o faz – em geral devido a uma crise que se avizinha -, é com alívio que
percebem que o chefe é mais tolerante com suas dúvidas e erros do que o esperado.

O primeiro teste de liderança vem com a missão de chefiar os outros. A maioria


dos gerentes de primeira viagem é reprovada – devido a noções comuns e
equivocadas sobre o que significa estar no comando.

Até para o mais brilhante dos indivíduos, o processo de conversão em líder é uma
jornada árdua, embora gratificante, de constante aprendizado e autodesenvolvimento. O
primeiro teste nessa rota é tão fundamental que chega a ser ignorado: assumir o primeiro
posto de chefia. É pena, porque as provações que esse rito de passagem traz têm sérias
consequências tanto para o indivíduo como para a organização.
O primeiro cargo de gerência molda irrevogavelmente o executivo. Décadas depois,
segue viva a memória daqueles primeiros meses como uma experiência transformadora
que marcou a filosofia e o estilo de liderança do gestor – marca que pode assombrá-lo
durante toda a carreira. Uma organização arca com custos humanos e financeiros
consideráveis quando uma pessoa promovida devido ao desempenho e a qualificações
excelentes é incapaz de se ajustar às responsabilidades do comando.

Tal incapacidade não surpreende, dada a dificuldade da transição. Pergunte a um novo


gerente qualquer como foi, no início, ser chefe – aliás, pergunte a qualquer executivo
tarimbado qual foi a sensação de estrear na chefia. Se a resposta for franca, a pessoa
contará que se sentiu desorientada, totalmente confusa. O novo papel não era nada
daquilo que esperava. A impressão é que era coisa demais para uma pessoa só. E, fosse
qual fosse seu escopo, nada no posto parecia ter a ver com liderança.

É  como  disse  um  novo  gerente  de  uma  corretora  de  valores:  “Você  tem  ideia de como é
difícil ser chefe quando se está totalmente fora de controle? É difícil verbalizar. É a
mesma sensação de quando se tem o primeiro filho. Na véspera do dia X, a pessoa ainda
não tem filhos. No dia X ela vira, de repente, mãe ou pai, e todos esperam que saiba
tudo  o  que  é  preciso  saber  sobre  como  cuidar  de  uma  criança”.

Dada a relevância e a dificuldade desse primeiro teste de liderança, é surpreendente a


pouca atenção até aqui dedicada à experiência de novos gerentes e aos desafios que
enfrentam. As prateleiras estão abarrotadas de livros sobre líderes eficazes, bem-
sucedidos. Pouquíssimas obras, porém, abordam o desafio de aprender a liderar,
sobretudo para o gerente de primeira viagem.

Nos últimos 15 anos, estudei a trajetória de indivíduos em grandes transições para a


gerência, com especial atenção para gente de desempenho estelar promovida à chefia.
Minha intenção original era abrir um espaço para que novos gerentes falassem, com as
próprias palavras, o que significa aprender a comandar. A princípio acompanhei 19
novos gerentes durante o primeiro ano no cargo para ter uma visão rara sobre essa
experiência subjetiva. O que acharam mais difícil? O que tiveram de aprender? Como
aprenderam o que era necessário? Que recursos usaram para facilitar a transição e
adquirir o domínio da nova função?

Desde esse primeiro estudo, descrito na primeira edição de Novos Gerentes (publicada
em inglês em 1992), segui examinando a transformação pessoal ocorrida quando a
pessoa vira chefe. Redigi estudos de caso sobre novos gerentes em uma série de funções
e setores. Concebi e dirigi programas de liderança para novos gerentes em empresas e
entidades sem fins lucrativos. Segundo novos gerentes, essa transição fica cada vez mais
difícil à medida que a empresa se torna mais enxuta e mais dinâmica – com diversas
divisões atuando juntas para oferecer produtos e serviços integrados e com a empresa
trabalhando ao lado de fornecedores, clientes e concorrentes em uma série de alianças
estratégicas.

Gostaria de frisar que as dificuldades enfrentadas por novos gerentes são a regra, não a
exceção. Não trato, aqui, de gerentes deficientes operando em organizações
disfuncionais. Falo, isso sim, de gente comum diante de problemas de adaptação
comuns. A grande maioria sobrevive à transição e aprende a atuar no novo papel.
Imagine, porém, o quão mais eficaz essa turma seria se a transição fosse menos
traumática.

Para que o novo gerente saia triunfante desse primeiro teste de liderança é preciso
ajudá-lo a entender a natureza essencial do papel – o que significa, realmente, estar no
comando. A maioria se vê como gerente e como líder, emprega a retórica da liderança,
sente o ônus da liderança. Ainda assim, não entende.

Por que é tão difícil aprender a comandar


Uma das primeiras coisas que o novo gerente descobre é que seu papel, por definição
mais difícil, é ainda mais desafiante do que imaginara. Fica surpreso ao perceber que
habilidades e métodos exigidos para o sucesso profissional individual e para o sucesso
como gerente são radicalmente distintos – e que há um vão entre sua qualificação atual
e as exigências do novo cargo.

Até então, o sucesso profissional dependera sobretudo da tarimba e dos atos dele, do
indivíduo. Já como gerente sua responsabilidade é definir e implementar a agenda de
todo um grupo, algo para o qual sua carreira como colaborador individual não o
preparou.

Peguemos o caso de Michael Jones, o novo gerente da corretora de valores que citei
anteriormente (a identidade dos indivíduos mencionados neste artigo foi trocada).
Durante 13 anos Michael foi um corretor de desempenho estelar, um dos profissionais
mais destemidos e inovadores da região. Em sua empresa, era comum a pessoa chegar à
gerência de uma filial depois de galgar degraus na firma devido à competência e a
conquistas pessoais. Ninguém ficou surpreso, portanto, quando o diretor regional pediu
que o rapaz considerasse um posto de gerência.

Michael achava que sabia o que era preciso para ser um bom gerente. Em diversas
ocasiões tinha comentado que, se estivesse no comando, teria dado um jeito nessa ou
naquela situação e tornado a vida mais fácil na agência. Com um mês no novo posto,
contudo, estava vivendo momentos de intenso pânico; era mais duro do que imaginara
ver suas ideias executadas. Percebeu que deixara o conforto do posto anterior – e que
não havia volta.

A reação de Michael, embora um choque para ele, não é atípica. A pessoa aprende a
liderar na prática, e não em sala de aula. Liderar é uma habilidade adquirida com a
experiência – sobretudo com experiências adversas nas quais o novo gerente, ao dar
mais do que sua capacitação atual permite, avança por tentativa e erro. Como a maioria
dos profissionais de alto desempenho nunca cometeu muitos erros, isso é novidade para
eles. Além disso, poucos gerentes estão cientes, no momento estressante em que
cometem erros, que estão aprendendo algo. O aprendizado é incremental e gradual.

Com o lento avanço desse processo – e com o novo gerente abandonando a mentalidade
e os hábitos que tanto contribuíram para seu sucesso até ali – surge uma nova identidade
profissional. O indivíduo internaliza um novo jeito de pensar e agir e descobre um novo
jeito de medir o sucesso e obter satisfação no trabalho. Naturalmente, um ajuste
psicológico  desses  é  extenuante.  É  como  disse  um  novo  gerente:  “Nunca  imaginei  que  
uma  promoção  pudesse  ser  tão  dolorosa”.

Dolorosa – e estressante. Um novo gerente inevitavelmente pondera duas questões:


“Vou  gostar  de  ser  gerente?”  e  “Serei  um  bom  gerente?”.  Não  há,  é  claro,  respostas  
imediatas. Só a experiência dirá. E, muitas vezes, a essas duas questões se segue outra,
ainda  mais  desconcertante:  “O  que  estou  me  tornando?”.

.
Ilusões de um novo gerente
Virar chefe é difícil, mas não quero pintar, aqui, um retrato totalmente desanimador.
Minha pesquisa sugere que a transição muitas vezes é mais difícil do que deveria ser
devido à noção equivocada que o novo gerente tem do papel. A ideia que faz do que
significa ser gerente tem algo de verdade, mas, como é simplista e incompleta, gera
falsas expectativas – expectativas difíceis de serem conciliadas com a realidade da vida
do gerente. Um gestor ciente das ilusões que enumero a seguir – algumas próximas da
condição de mito, dada sua aceitação quase universal – tem muito mais chances de
sucesso (para  uma  comparação  de  ilusões  e  realidade,  veja  o  quadro  “Ilusões  de  
um novo gerente“).
.

Gerente tem considerável autoridade. Quando instado a descrever seu papel, um novo
gerente costuma se ater aos direitos e privilégios que ser chefe garante. Sua crença é que
o posto lhe trará mais autoridade e, com isso, mais liberdade e autonomia para fazer o
que, a seu ver, é melhor para a organização. Como disse um novo gerente, a pessoa
deixará  de  “carregar  o  fardo  de  exigências  descabidas  dos  outros”.  Quem acredita nisso
terá um bruto despertar. Em vez de ganhar autoridade, os gerentes novos que
acompanhei se sentiam tolhidos por relações de interdependência. Não se sentiam livres
– sobretudo quem estava habituado à relativa independência de que gozava devido ao
desempenho estelar. Ficavam enredados em uma teia de relacionamentos – não só com
subordinados, mas também com chefes, colegas e outros indivíduos dentro e fora da
organização, todos fonte de demandas incessantes, muitas vezes conflitantes. Disso
resulta uma rotina diária estressante, caótica, fragmentada.
“A  verdade  é  que  não  temos  o  controle  de  nada”,  diz  um  novo  gerente.  “Só  estou  no  
comando quando fecho a porta da sala – e aí sinto como se não estivesse cumprindo
meu  papel,  que  é  estar  em  contato  com  as  pessoas.”  Outro  novo  gerente  observa:  “Saber  
que alguém que trabalha para mim pode me levar a ser demitido é um golpe na
vaidade.”

Os indivíduos mais inclinados a fazer da vida do novo gerente um calvário são aqueles
fora de seu campo formal de autoridade: fornecedores externos, por exemplo, ou
gerentes de outras divisões. Sally McDonald, estrela em ascensão em uma indústria
química, chegou a um cargo de desenvolvimento de produtos com altas expectativas,
credenciais impecáveis na atuação individual e uma profunda noção da cultura da
empresa – e até com a suposta sabedoria adquirida em um curso de formação de líderes.
Três  semanas  depois  dizia,  sardônica:  “Virar  gerente  não  é  virar  chefe.  É  virar  refém.  
Essa empresa está cheia de terroristas querendo me sequestrar”.

Muitos gerentes ficam surpresos com o difícil que é conquistar o respeito e a confiança
dos outros. Ficam pasmos, até ofendidos, com o fato de que sua tarimba e seu currículo
não falam por si só. A pesquisa mostra que muitos, além disso, não sabem que atributos
contribuem para a credibilidade.

É preciso dar mostras de seu caráter – da intenção de agir do modo certo. É algo
particularmente importante para os subordinados, que tendem a analisar toda palavra e
todo gesto em busca de pistas sobre a motivação do novo chefe. Esse escrutínio pode
ser desconcertante.  “Eu  sabia  que  era  um  sujeito  decente  e  esperava  que  as  pessoas  me  
aceitassem  imediatamente  como  aquilo  que  era”,  disse  um  novo  gerente.  “Mas  o  pessoal  
se  mostrou  arisco  e  tive  de  fazer  por  merecer.”

É preciso dar mostras de sua competência – de saber como agir do modo certo. Pode ser
um problema, pois o novo gerente sente, a princípio, a necessidade de provar seu
conhecimento e sua tarimba técnica – pilares de seu sucesso na atuação individual. Mas,
embora indícios de competência técnica sejam importantes para ganhar o respeito dos
subordinados, não é nisso, em última instância, que os subordinados diretos estão
interessados.

Ao assumir o comando de uma mesa de operações em um banco de investimento


internacional, Peter Isenberg herdou uma equipe de corretores tarimbados. Para ganhar
credibilidade, adotou um estilo de alto envolvimento. Dizia a um operador que fechasse
essa ou aquela posição, que tentasse outra estratégia de corretagem. O pessoal rebatia,
queria saber a justificativa por trás de cada ordem. A situação ficou incômoda. A equipe
passou a dar respostas curtas e grossas aos comentários do novo chefe. Certo dia
Isenberg, ciente de seus conhecimentos insuficientes sobre mercados estrangeiros, fez a
um corretor experiente uma pergunta simples sobre preços. O sujeito parou o que estava
fazendo e passou minutos explicando a questão – até se ofereceu para voltar ao tema no
fim  do  expediente.  “Quando parei de falar por um instante e passei a ouvir, o pessoal da
mesa começou a me instruir sobre as operações e, curiosamente, a questionar muito
menos  minhas  ordens”,  diz  Isenberg.

No afã de exibir sua competência técnica, o novo gerente tinha minado a própria
credibilidade como gestor e líder. Sua inclinação a interferir para tentar resolver todo
problema suscitou questões implícitas sobre sua capacidade gerencial. Aos olhos dos
corretores, estava se tornando um micro gestor, um sujeito controlador que não merecia
o respeito deles.

O novo gerente precisa, por último, dar mostras de sua influência – da capacidade de
agir  e  de  executar  do  modo  certo.  Não  há  “nada  pior  do  que  trabalhar  para  um  chefe  sem  
poder”,  disse  um  subordinado  direto  de  um  novo  gerente  que  acompanhei.  Como  
observei, conquistar e exercer influência dentro da organização é particularmente difícil,
pois  o  novo  gerente  é  o  “chefinho”  na  empresa.  “Fiquei  empolgadíssimo  quando  soube  
que  finalmente  seria  promovido”,  contou  um  novo  gerente.  “Achei  que  tinha  chegado  ao  
topo da escada que vinha escalando havia anos. Mas, de repente, senti que estava lá
embaixo de novo – só que, agora, nem sabia ao certo quais eram os degraus e para onde
estaria  subindo.”

De novo, vemos o novo gerente cair na armadilha de apostar demais na autoridade


formal como fonte de influência. O que precisa, em vez disso, é adquirir influência com
a formação de uma rede de relações sólidas, interdependentes, fundadas na credibilidade
e na confiança – por toda a equipe e por toda a organização, uma a uma.

Gerente deve controlar os subordinados diretos. Em parte devido à insegurança no


novo papel, a maioria dos novos gerentes busca obediência de seus subordinados. Seu
medo é que, se não conseguirem isso logo de cara, o pessoal sob seu comando ficará
insubordinado. Para conquistar tal controle, é comum apostarem demais na autoridade
formal – técnica cuja eficácia é, conforme vimos, no mínimo questionável.

Mas, ainda que cheguem a obter algum controle, seja pela autoridade formal, seja pela
autoridade conquistada ao longo do tempo, a vitória é falsa. Obediência não significa
comprometimento. Quem não é comprometido não toma iniciativas. E se os
subordinados não tomarem a iniciativa, não há como o gerente delegar de modo eficaz.
Seus subordinados diretos não assumirão os riscos calculados que levam à mudança e
ao avanço contínuos exigidos no turbulento mundo empresarial de hoje.

Winona Finch, que liderou o lançamento da revista para adolescentes na América


Latina, sabia que, para superar o desafio, teria de contar com o total apoio da equipe.
Aliás, Finch fora alçada ao comando, em parte, devido a seu estilo pessoal – que,
esperavam seus chefes, fosse suprir a falta de experiência da gerente no mercado latino-
americano e na gestão de responsabilidades financeiras. Além de notória pelo raciocínio
claro, Finch era simpática, boa no trato com outras pessoas. Durante o projeto,
conseguiu alavancar esses dotes naturais para desenvolver seu estilo e sua filosofia de
liderança.
Em vez de recorrer à autoridade formal para conseguir o que queria da equipe, Finch
exerceu sua influência cultivando uma cultura inquisitiva. Com isso, o grupo se sentia
comprometido,  com  poderes,  responsável  por  concretizar  a  visão  da  empresa.  “Era  
gostoso trabalhar com a Winona, era tranquilo”,  diz  um  subordinado.  “Mas  ela  
perguntava e perguntava, até chegar ao xis da questão. A gente dizia algo, ela repetia
aquilo e, com isso, todo mundo tinha certeza daquilo que estava em discussão. Quando
ela recebia a informação e ficava ciente daquilo que alguém vinha fazendo, essa pessoa
não  podia  se  desviar.  Ela  dizia:  ‘Você  me disse X, por que está fazendo Y? Estou
confusa’.”  Embora  fosse  exigente,  Finch  não  obrigava  ninguém  a  fazer  as  coisas  do  seu  
jeito. Seus subordinados eram comprometidos com as metas da equipe porque tinham
autonomia para chegar lá – ninguém era coagido.

Quanto mais poder o gerente estiver disposto a partilhar com os subordinados, mais
influência ele tende a ter. Quando lidera de um jeito que permita aos subordinados
tomar a iniciativa, ele cultiva a própria credibilidade como gerente.

Gerente deve tratar de cultivar relações com cada pessoa. Para administrar
interdependências e exercer a autoridade informal derivada de sua credibilidade pessoal
o novo gerente precisa ter a confiança de uma série de pessoas, possuir influência sobre
elas, contar com expectativas mútuas. Para tanto, precisa estabelecer relações produtivas
com cada uma. Mas, em última instância, esse gerente precisa descobrir como explorar
a força da equipe. Cultivar apenas a relação individual com cada integrante do grupo
pode solapar tal processo.

Durante o primeiro ano no posto, muitos gerentes de primeira viagem não entendem,
muito menos enfrentam, a responsabilidade pelo cultivo da equipe. Em vez disso,
julgam que a gestão do pessoal significa, em seu caso, forjar a relação mais eficaz
possível com cada subordinado. Assim, caem no erro de equiparar a gestão da equipe
com a gestão de cada integrante do grupo.

Ficam de olho, sobretudo, no desempenho individual, e dão pouca ou nenhuma atenção


à cultura e ao desempenho da equipe. Raramente reúnem o grupo todo para identificar e
solucionar problemas. Alguns passam tempo demais com um grupinho de subordinados
de confiança, em geral os que parecem mais partidários seus. O novo gerente tende a
abordar questões de pessoa para pessoa – ainda que tenham implicações para toda a
equipe. Com isso, toma decisões com informações desnecessariamente limitadas.

Em sua primeira semana como gerente de vendas de uma fabricante americana de


software, Roger Collins foi procurado por um subordinado de olho em uma vaga que
acabara de ser desocupada no estacionamento. O vendedor tinha anos de casa e Collins,
querendo  partir  bem  com  o  veterano,  concordou:  “Claro,  por  que  não?”.  Dali  a  uma  
hora outro vendedor, um dos melhores, irrompeu na sala de Collins ameaçando se
demitir. Ao que parece, a bela vaga no estacionamento era cobiçada por questões
pragmáticas e simbólicas, e o beneficiário do gesto impensado de Collins era tido por
todos como incompetente. Para o astro das vendas, a decisão do gerente era
incompreensível.
Collins acabou solucionando o que, para ele, era um problema banal da administração –
“Não  devia  estar  perdendo  meu  tempo  com  isso”,  disse  -, mas começou a perceber que
toda decisão sobre um indivíduo afetava a equipe. Até ali, seguira o princípio de que se
pudesse estabelecer uma boa relação com cada pessoa sob seu comando a equipe toda
atuaria bem. O que descobriu foi que supervisionar cada indivíduo não era o mesmo que
liderar a equipe. Em minha pesquisa, ouvi novos gerentes descreverem reiteradamente
situações nas quais abriram uma exceção para um subordinado – em geral para
estabelecer uma relação positiva com essa pessoa – mas, no final, acabaram lamentando
as consequências negativas inesperadas do gesto sobre a equipe. Entender isso pode ser
particularmente difícil para quem acabou de ser instalado no comando e estava
habituado a fazer maravilhas no trabalho – sozinho.

Quando cuida apenas de relacionamentos individuais, o novo gerente negligencia um


aspecto fundamental da liderança eficaz: explorar o poder coletivo do grupo para
melhorar o desempenho e o compromisso de cada um. Ao moldar a cultura da equipe –
normas e valores do grupo – um líder pode permitir que o talento diversificado dos
membros da equipe seja aplicado à solução de problemas.

Gerente deve garantir que tudo corra sem atropelos. Assim como muitos mitos da
gestão, este tem algo de verdade – mas é enganoso, pois conta apenas parte da história.
Assegurar que as atividades transcorram sem problemas é de uma dificuldade incrível e
exige do gerente um verdadeiro – e constante – malabarismo. Aliás, a complexidade de
manter o status quo pode sugar todo tempo e energia do jovem gerente.

Contudo, o novo gerente precisa entender que cabe a ele, ainda, sugerir e deslanchar
mudanças que melhorem o desempenho do grupo. Em geral – o que é surpresa para
muitos – isso significa desafiar processos ou estruturas organizacionais situados além de
sua esfera formal de autoridade. É só quando entende esse aspecto da função que o novo
gerente começará a encarar de forma séria suas responsabilidades de liderança (veja o
quadro  “Um  último  lembrete:  crie  as  condições  para  seu  sucesso”).

.
Na verdade, a maioria dos novos gerentes se vê como alvo de iniciativas de mudança da
empresa, implementando com sua equipe mudanças impostas de cima. Não encara sua
figura como a de um agente de mudanças. A mentalidade hierárquica e a fixação na
autoridade que acompanha a promoção a chefe fazem com que defina suas
responsabilidades de modo limitado demais. Logo, o novo gerente tende a culpar
sistemas falhos, e os superiores diretamente responsáveis pelos sistemas, pelos reveses
da equipe – e tende a esperar que outros solucionem o problema. Há nisso um equívoco
fundamental em relação a seu papel na organização. Um novo gerente deve gerar
mudanças, dentro e fora de sua área de responsabilidade, para garantir que sua equipe
possa triunfar. Deve trabalhar para alterar o contexto no qual o grupo opera, ignorando a
falta de autoridade formal. Essa visão mais ampla é boa para a organização e para o
novo gerente. Toda empresa deve passar por um processo contínuo de revitalização e
transformação – desafio que só pode ser superado se tiver líderes eficientes, capazes de
administrar a complexidade do status quo e de fazer mudanças.
Novo gerente não está sozinho
À medida que avança no difícil processo que é virar chefe, um novo gerente vai adquirir
uma enorme vantagem se aprender a reconhecer as ilusões que acabo de delinear. Mas,
diante da natureza multifacetada de suas novas atribuições, seguirá cometendo erros ao
tentar montar o quebra-cabeça gerencial – e cometer erros, por mais importante que seja
para o processo de aprendizado, não é agradável. Esse gerente sofrerá ao ter sua
identidade profissional distendida e transformada. Na luta para incorporar o novo papel,
muitas vezes se sentirá isolado.

Infelizmente, minha pesquisa mostra que poucos nessa situação buscam ajuda. Em
parte, é fruto de outra noção equivocada: a de que o chefe deve ter todas as respostas – e
que, portanto, um novo gerente atrás de ajuda é sinal inequívoco de que a promoção foi
um  “erro”.  Um  gerente  experiente  naturalmente  sabe  que  ninguém  tem  todas  as  
respostas – e as que o gerente tem foram adquiridas ao longo do tempo, com a
experiência. Vários estudos comprovam que aprender é mais fácil quando é possível
recorrer ao apoio e à ajuda de pares e superiores.

Outro empecilho à busca de ajuda por novos gerentes é o perigo (às vezes mais
imaginário do que real) de relações voltadas ao desenvolvimento. Quando alguém
divide suas ansiedades, seus erros e suas fraquezas com colegas da organização, há o
risco de que essa informação venha a ser usada contra a própria pessoa. O mesmo vale
quando divide os problemas com o chefe. O conflito inerente entre o papel de avaliador
e o de formador é um velho dilema. Logo, o novo gerente deve ser criativo na hora de
buscar apoio. Pode, por exemplo, recorrer a colegas de outra região ou departamento –
ou até de outra organização. O problema com o chefe, embora difícil de ser totalmente
resolvido, pode ser aliviado – lição que vale não só para novos gerentes, mas também
para dirigentes tarimbados.

O novo gerente evita recorrer ao superior imediato para conselhos por encarar aquele
indivíduo como uma ameaça a seu desenvolvimento, e não como aliado. Por temer ser
punido por equívocos e falhas, não busca a ajuda capaz até de prevenir esses erros –
ainda que a queira desesperadamente. É como relatou um novo gerente:

“Sei  que,  de  certo  modo,  deveria  interagir  mais  com  meu  chefe,  pois  é  para  isso  que  ele  
está ali. Ele tem experiência e talvez seja minha obrigação mantê-lo informado sobre as
coisas. Ele provavelmente me daria bons conselhos. Mas não é seguro dividir as coisas
com ele. O resultado seria imprevisível. Se fizesse muitas perguntas,
ele poderia perder a confiança em mim e pensar que as coisas não andam lá muito bem.
Talvez achasse que estão fora de controle – o que só pioraria a situação. É que ele
passaria a se intrometer, a fazer todo tipo de pergunta sobre o que estou fazendo. A certa
altura, estaria totalmente envolvido com a questão. É uma situação muito incômoda. Ele
é a última pessoa a quem eu recorreria.  ”

Esse temor pode ser justificado. Muitos gerentes de primeira viagem se arrependem de
ter  atribuído  ao  chefe  o  papel  de  mentor.  “Não  ouso  fazer  uma  pergunta que possa ser
considerada  inocente  ou  tola”,  diz  um  deles.  “Certa  vez  perguntei  algo  e  ele  fez  com  que  
me  sentisse  no  jardim  da  infância  (.).  Foi  como  se  tivesse  dito:  ‘Essa  foi  a  coisa  mais  
imbecil  que  já  ouvi.  Que  raios  você  tem  na  cabeça?’.”

É uma trágica perda de oportunidade para o novo gerente, seu chefe e a organização.
Significa que o superior desse novo gerente perdeu uma chance de influenciar a noção –
correta e incorreta – que o novo gerente faz do novo cargo e de como deveria abordá-lo.
Já o novo gerente perde a chance de explorar ativos organizacionais – de recursos
financeiros a informações sobre as prioridades da alta gerência – que seu superior
estaria em ótima posição para oferecer.

Se o novo gerente é capaz de forjar uma boa relação com o superior, a diferença pode
ser enorme – embora não necessariamente aquela que o novo gerente espera. Minha
pesquisa sugere que, a certa altura, metade dos novos gerentes busca a ajuda do superior
– em geral devido a uma crise que se avizinha. Muitos sentem alívio ao ver que o
superior  é  mais  tolerante  com  suas  dúvidas  e  erros  do  que  o  esperado.  “Ele  entendeu  que  
eu ainda estava aprendendo e se mostrou mais do que disposto a ajudar, da maneira que
pudesse”,  recorda  um  novo  gerente.

Às vezes um mentor tarimbado transmite a falsa impressão de que não interfere. Uma
gerente  relata  como  aprendeu  com  uma  superiora  imediata:  “Ela  é  exigente,  mas  tem  a  
reputação de formar e ajudar os outros, e não de jogá-los aos lobos. Já eu, depois de 60
dias, estava em dúvida. Era tudo tão difícil, estava tão desanimada – mas ela não
ofereceu ajuda. Estava ficando louca. Quando perguntava algo, ela fazia outra pergunta.
Nunca dava respostas. Foi então que percebi o que ela pretendia. Tinha de chegar e dar
ideias sobre como enfrentaria a situação – e aí ela discutia essas ideias comigo, passava
o  tempo  que  fosse  necessário  ao  meu  lado”.

Essa experiência demonstra nitidamente por que é importante, para o superior de um


novo gerente, entender – ou simplesmente recordar – como é difícil assumir pela
primeira vez o papel de líder. Ajudar um novo gerente a triunfar não é bom só para o
indivíduo. Garantir o êxito do novo gerente é de importância crucial para o sucesso de
toda a organização.

Linda A. Hill é titular da cátedra Wallace Brett Donham Professor of Business


Administration na Harvard Business School, em Boston, e autora de Novos Gerentes:
Assumindo Uma Nova Identidade (Makron, 1993).

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