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Topologia Geral Daniel PDF
Topologia Geral Daniel PDF
DANIEL PELLEGRINO
Sumário
1. Introdução 2
2. Um pouco sobre Teoria de Conjuntos e Lógica 2
2.1. Notações e terminologia 2
2.2. Algumas convenções 2
2.3. O Axioma da Escolha e o Lema de Zorn 2
3. Espaços Métricos 4
4. Espaços Topológicos 6
5. Vizinhanças 8
6. Bases e sub-bases 10
7. Funções contı́nuas 12
8. Subespaços e topologia relativa 13
9. Homeomorfismos 15
10. Espaços produto e topologias fracas 18
11. Espaços Quocientes 20
12. Convergência de sequências 21
13. Redes 23
14. Filtros 27
15. ————-Cópia da primeira prova do curso————– 29
16. Espaços T0 , T1 , T2 e T3 30
17. Conjuntos compactos 31
17.1. O Teorema de Tychonoff 34
18. Uma aplicação do Teorema de Tychonoff à Análise Funcional: O Teorema de Banach-
Alaoglu-Bourbaki 35
19. Teorema da Extensão de Tietze 37
20. Compactificação de Alexandrov 41
21. Compactificação de Stone-Cech 43
21.1. Espaços completamente regulares 43
21.2. Compactificação de Stone-Cech 44
22. ———————————-Cópia da segunda prova do curso—————————- 46
23. Topologias em espaços de funções 47
23.1. Topologia da convergência pontual 47
23.2. Topologia compacto-aberta 47
23.3. Topologia da convergência uniforme 47
23.4. Topologia da convergência compacta 49
24. Homotopias 50
25. Grupos Fundamentais 53
26. Seminário: O Teorema de Baire 55
Referências 56
1
2 DANIEL PELLEGRINO
1. Introdução
Essas notas de aula não têm pretensão alguma em relação à originalidade. Seu conteúdo é baseado
em livros clássicos de Topoloigia Geral e é direcionado a um curso introdutório, com certa tendência
às aplicações da topologia à Análise Funcional.
usá-lo sem hesitação! É bom que saibamos, entretanto, que essa equivalência é apenas uma dentre
numerosas outras conhecidas. Curiosamente, vários resultados que foram obtidos como consequências
do AE, posteriormente mostraram-se equivalentes ao AE. Esse é mais um ponto muito interssante a
respeito do AE: mesmo sendo aparentemente inofensivo, ele é equivalente a muitos resultados forte-
mente não intuitivos. Por exemplo, o Teorema da Boa-Ordenação, que afirma que qualquer conjunto
pode ser bem-ordenado, é equivalente ao AE.
Nesse curso, precisaremos apenas do Lema de Zorn. O LZ é peça fundamental na construção de
vários teoremas dos mais diversos ramos da matemática. É claro que por ser equivalente ao AE,
toda demonstração que usa o LZ poderia usar o AE no seu lugar. Entretanto, curiosamente, o LZ
parece ter mais fácil aplicação em algumas situações, e se consagrou em várias demonstrações de
resultados clássicos: Teorema de Hahn-Banach e Teorema de Bishop-Phelps, na Análise Funcional, a
demonstração de que todo espaço vetorial possui uma base de Hamel, na Álgebra Linear, Teorema de
Tychonoff, em Topologia Geral, etc.
Para enunciar o Lema de Zorn, precisamos de uma nomenclatura adequada.
Seja P um conjunto munido de uma relação de ordem parcial ≤.
Dizemos que Q ⊂ P é totalmente ordenado se para quaisquer q1 , q2 ∈ Q tivermos que q1 ≤ q2
ou q2 ≤ q1 . Dizemos ainda que um elemento p ∈ P é cota superior para um conjunto R ⊂ P se para
todo r ∈ R tivermos r ≤ p. Um elemento m ∈ P é dito maximal se sempre que x ∈ P for tal que
m ≤ x, tivermos x = m. Por fim, dizemos que um P é indutivo se para todo subconjunto R ⊂ P,
totalmente ordenado, existe uma cota superior pR ∈ P .
Agora, podemos enunciar o Lema de Zorn:
Lema 2.2. (Lema de Zorn). Todo conjunto parcialmente ordenado, indutivo, não-vazio, admite um
elemento maximal.
4 DANIEL PELLEGRINO
3. Espaços Métricos
Definição 3.1. Um espaço métrico é um par ordenado (M, d) formado por um conjunto M e uma
função d : M × M → R satisfazendo, para quaisquer x, y, z em M :
a) d(x, y) ≥ 0,
b) d(x, x) = 0 e d(x, y) = 0 implica x = y,
c) d(x, y) = d(y, x),
d) d(x, z) ≤ d(x, y) + d(y, z).
A função d é chamada métrica em M . Se todas as condições acima são satisfeitas com a exceção
da segunda parte do item (b), dizemos que d é uma pseudométrica e (M, d) é um espaço pseu-
dométrico. Quando não houver dúvidas quanto à natureza de d, escreveremos apenas M no lugar de
(M, d).
s
P
n
Exemplo 3.2. A reta com a função d(x, y) = |x − y| , o Rn com a função d(x, y) = (xi − yi )2
i=1
são exemplos de espaços métricos.
Exemplo 3.3. Qualquer conjunto X pode ser munido de uma métrica. Por exemplo, a função
d(x, y) = 1 se x =
6 y e d(x, y) = 0 se x = y é uma métrica em X, chamada métrica discreta.
A noção de métrica nos abre o caminho para definirmos continuidade sob um ponto de vista mais
abstrato do que estamos acostumados no cálculo:
Definição 3.4. Se (M, d1 ) e (N, d2 ) são espaços métricos, uma função f : M → N é contı́nua em
x ∈ M se para cada ε > 0, existir um δ > 0 tal que d2 (f (x), f (y)) < ε sempre que d1 (x, y) < δ.
Uma forma equivalente e também útil de se definir continuidade será dada adiante, com a noção de
conjunto aberto.
Definição 3.5. Seja (M, d) um espaço métrico e x um ponto de M Para ε > 0, definimos
(1) Ud (x, ε) = {y ∈ M ; d(x, y) < ε},
que é chamado de bola de raio ε em torno de x. Sempre que não houver possibilidade de confusão,
escreveremos U (x, ε) no lugar de Ud (x, ε).
Se E e F são subconjuntos de M, definimos a distância entre E e F como sendo
d(E, F ) = inf{d(x, y); x ∈ E e y ∈ F }.
Se E possui apenas um ponto, é comum escrever d(x, F ) no lugar de d({x}, F ). Agora, imitando (1),
definimos
Ud (E, ε) = {y ∈ M ; d(E, y) < ε}.
Perceba que com as noções introduzidas acima, podemos dizer que uma função f : M → N é contı́nua
em x ∈ M se para cada ε > 0, existir um δ > 0 tal que f (Ud (x, δ)) ⊂ Ud (f (x), ε). Essa observação
e a próxima definição de conjunto aberto, nos darão uma caracterização de função contı́nua que nos
servirá como modelo para a definição de função contı́nua num contexto ainda mais geral.
Definição 3.6. Um conjunto E num espaço métrico (M, d) é aberto se, e somente se, para cada
x ∈ E, existe um ε > 0 tal que U (x, ε) ⊂ E. Um conjunto é dito fechado se seu complementar for
aberto.
Exercı́cio 3.7. Mostre que um conjunto F é fechado se, e somente se, sempre que toda bola centrada
em x possuir pontos de F , isso implicar que x ∈ F.
Exercı́cio 3.8. Mostre que se F é um subconjunto fechado de um espaço métrico, então, d(x, F ) =
0 ⇔ x ∈ F.
O seguinte teorema servirá de referência para a definição abstrata de conjunto aberto no nosso curso
de Topologia Geral.
TOPOLOGIA- PERÍODO 2005.1 5
4. Espaços Topológicos
Como dissemos, o Teorema 3.9 da seção anterior será nosso modelo para uma definição mais abstrata:
Definição 4.1. Uma topologia em um conjunto X é uma coleção τ de subconjuntos de X, chamados
conjuntos abertos, satisfazendo as seguintes propriedades:
a) Qualquer união de elementos de τ é um elemento de τ .
b) Qualquer interseção finita de elementos de τ pertence a τ .
c) X e o conjunto vazio pertencem a τ .
Dizemos que (X, τ ) é um espaço topológico, que naturalmente abreviaremos para X quando não
houver possibilidade de confusão.
Exercı́cio 4.2. Seja X um conjunto. Seja τc a coleção de todos os subconjuntos U de X tais que
X − U é enumerável ou é X. Verifique que τc é uma topologia em X.
Exemplo 4.3. Se (M, d) é um espaço métrico, o Teorema 3.9 nos garante que o conjunto formado
pelos abertos de M forma uma topologia em M, chamada topologia métrica τd .
Sempre que (X, τ ) for um espaço topológico e sua topologia τ for uma topologia métrica τd para uma
métrica d em X, dizemos que (X, τ ) é um espaço topológico metrizável .
Se X é um conjunto qualquer, a coleção de todos os subconjuntos de X, que de agora em diante
será denotada por P(X), é uma topologia em X, chamada topologia discreta. Uma outro topologia
”patológica”é a topologia τ = {X, φ}, chamada de topologia trivial.
Exercı́cio 4.4. Mostre que (X, P(X)) é um espaço metrizável.
Exercı́cio 4.5. Mostre que se X tem mais de um elemento, (X, τ ), com τ = {X, φ}, não é metrizável.
Novamente, seguindo o que foi feito na seção anterior, definimos:
Definição 4.6. Se X é um espaço topológico e E ⊂ X, dizemos que E é fechado se e somente se
X − E é aberto.
Aplicando as leis de De Morgan, temos:
e) E é fechado em X se e somente se E = E.
Demonstração. Vamos mostrar que (c) vale, e deixar o resto como exercı́cio (feito na sala). Logo
A ∪ B é fechado e contém A ∪ B. Daı́ A ∪ B ⊂ A ∪ B. Por outro lado, como A ⊂ A ∪ B e B ⊂ A ∪ B,
temos, pelo lema anterior, que A ⊂ A ∪ B e B ⊂ A ∪ B, e o resultado segue.
Definição 4.11. Se X é um espaço topológico e E ⊂ X, o interior de E em X é o conjunto
int(E) = ∪{G ⊂ X; G é aberto e G ⊂ E}.
Note que o interior de um conjunto é uma união de abertos, e portanto é um conjunto aberto.
Exercı́cio 4.12. Mostre que int(E) = X − X − E e que X − E = int(X − E).
5. Vizinhanças
Definição 5.1. Se X é um espaço topológico e x ∈ X, uma vizinhança de x é um conjunto U
contendo um conjunto aberto V, com x ∈ V . A coleção Ux de todas as vizinhanças de x é chamada de
sistema de vizinhanças de x.
Teorema 5.2. O sistema de vizinhanças de x em um espaço topológico X tem as seguintes pro-
priedades:
a) Se U ∈ Ux , então x ∈ U.
b) Se U, V ∈ Ux , então U ∩ V ∈ Ux
c) Se U ∈ Ux , então existe um V ∈ Ux , tal que U ∈ Uy para cada y ∈ V.
d) Se U ∈ Ux e U ⊂ V , então V ∈ Ux .
e) G ⊂ X é aberto se e somente se G contém uma vizinhança de cada um de seus pontos.
Demonstração. Fácil. vamos mostrar (e). Se G é aberto, o próprio G é uma vizinhaça de seus
pontos (veja definição de vizinhança).SReciprocamente, se para cada x em G existe uma vizinhaça Vx
de x, contida em G, temos que G = int(Vx ).
x∈G
Exercı́cio 5.3. Mostre que se cada ponto x de um conjunto X é associado a uma coleção não-vazia
Ux de subconjuntos de X satisfazendo a), b), c) e d) do teorema anterior, a coleção
τ = {G ⊂ X; para cada x em G, x ∈ U ⊂ G para algum U ∈ Ux }
é uma topologia para X, e cada coleção Ux é o sistema de vizinhanças de x.
Definição 5.4. Uma base de vizinhanças em x em um espaço topológico X é uma subcoleção
Bx , Bx ⊂ Ux , tendo a propriedade que cada U ∈ Ux contém algum V ∈ Bx . Assim, Ux pode ser
determinado por Bx da seguinte forma:
Ux = {U ⊂ X; V ⊂ U para algum V ∈ Bx }.
Uma vez escolhida uma base de vizinhanças em x, seus elementos são chamados vizinhanças básicas.
Exemplo 5.5. Em qualquer espaço topológico, as vizinhanças abertas de x formam uma base de
vizinhanças em x.
Teorema 5.6. Seja X um espaço topológico e para cada x em X, seja Bx uma base de vizinhanças
em x. Então:
a) Se V ∈ Bx , então x ∈ V.
b) Se V1 , V2 ∈ Bx , então existe um V3 ∈ Bx tal que V3 ⊂ V1 ∩ V2 .
c) Se V ∈ Bx , então existe um V0 ∈ Bx , tal que se y ∈ V0 , então existe um W ∈ By com W ⊂ V.
d) G ⊂ X é aberto se e somente se G contém uma vizinhança básica de cada um de seus pontos.
Demonstração. Fácil. Vamos mostrar (c) e (d).
(c) Seja V ∈ Bx ⊂ Ux . Existe, portanto, V1 ∈ Bx ⊂ Ux com V1 ⊂ V . Podemos encontrar V0 aberto
com V0 ⊂ V1 . Se y ∈ V0 , existe W ∈ By com W ⊂ V0 ⊂ V.
A demonstração de (d) também é fácil. Com efeito, se G é aberto, o próprio G é uma vizinhaça de
seus pontos, e existe uma vizinhança básica de cada um de seus pontos, contida em G. Reciprocamente,
S
se para cada x em G existe uma vizinhaça básica Vx de x, contida em G, temos que G = int(Vx ).
x∈G
Exercı́cio 5.7. Mostre que se para cada ponto x de um conjunto X, é associada uma coleção não-
vazia Bx , de subconjuntos de X, satisfazendo (a),...,(c) do teorema anterior, com (d) usada para definir
abertos, teremos uma topologia em X, na qual os Bx são uma base de vizinhanças de x.
Teorema 5.8. Seja X um espaço topológico e suponha que uma base de vizinhanças tenha sido fixada
em cada x ∈ X. Então
a) G ⊂ X é aberto se e somente se G contém uma vizinhança básica de cada um de seus pontos.
b) F ⊂ X é fechado se e somente se cada ponto x ∈ / F tem uma vizinhança básica disjunta de F .
c) E = {x ∈ X; cada vizinhança básica de x intercepta E}
TOPOLOGIA- PERÍODO 2005.1 9
Teorema 5.9. (Critério de Hausdorff ) Para cada x ∈ X, seja Bx1 uma base de vizinhanças de x para
uma topologia τ1 em X, e seja Bx2 uma base de vizinhanças em x para uma topologia τ2 em X. Então
τ1 ⊂ τ2 se e somente se para cada x ∈ X, dado B 1 ∈ Bx1 , existe um B 2 ∈ Bx2 tal que B 2 ⊂ B 1 .
Demonstração. Suponha τ1 ⊂ τ2 . Seja B 1 ∈ Bx1 . Então, como B 1 é vizinhança de x em (X, τ1 ), x
está contido em algum elemento B de τ1 , com B ⊂ B 1 . Como τ1 ⊂ τ2 , temos que B ∈ τ2 e portanto
B é vizinhança de x em (X, τ2 ). Logo existe B 2 ∈ Bx2 tal que B 2 ⊂ B e daı́ B 2 ⊂ B 1 .
Reciprocamente, se B ∈ τ1 , então B contém algum B 1 ∈ Bx1 para cada x ∈ B. Logo B contém
algum B 2 ∈ Bx2 para cada x em B. Daı́ B ∈ τ2 .¤
6. Bases e sub-bases
Definição 6.1. Se (X, τ ) é um espaço topológico, uma base para τ (às vezes dizemos base para X) é
uma coleção B ⊂ τ tal que
½ ¾
S
τ= B; C ⊂ B .
B∈C
Em palavras, todo aberto da topologia pode ser representado como união de abertos da base.
Exercı́cio 6.2. Seja (X, τ ) um espaço topológico e B ⊂ (X, τ ). Mostre que B é uma base para X se e
somente se sempre que G é um aberto em X e p ∈ G, então existe um B ∈ B tal que p ∈ B ⊂ G.
Exemplo 6.3. Na reta real, a coleção de todos os intervalos abertos é uma base para a topologia usual.
Mais geralmente, num espaço métrico M , a coleção de todas as bolas abertas centradas em pontos de
M, é uma base para M .
Teorema 6.4.
S B é uma base para uma topologia em X se e somente se
a) X = B e
B∈B
b) sempre que B1 e B2 estão em B, com p ∈ B1 ∩ B2 , existe um B3 em B tal que
p ∈ B3 ⊂ B1 ∩ B2 .
Demonstração.SSe B é uma base para S
uma topologiaSem X, (a)
S segue claramente, pois X é aberto,
e portanto X = B com C ⊂ B. Mas B⊂X= B⊂ B.
B∈C B∈B B∈C B∈B
(b) também segue fácil, pois como B1 e B2 estãoSem B, são abertos, assim como B1 ∩ B2 . Logo
B1 ∩ B2 ∈ τ e p ∈ B1 ∩ B2 . Assim, temos B1 ∩ B2 = B com C ⊂ B, e segue que existe B3 ∈ B, com
B∈C
p ∈ B3 ⊂ B1 ∩ B2 .
Reciprocamente, suponha que X é um conjunto e B é uma coleção de subconjuntos de X com as
propriedades ½
(a) e (b). ¾
S
Seja τ = B; C ⊂ B . Então a união de elementos de τ ainda pertence a τ. Além disso, se
B∈C S S
B1 ⊂ B e B2 ⊂ B são tais que Be C são elementos de de τ, então
B∈B1 B∈B2
à ! à !
S S S S
B ∩ C = (B ∩ C) .
B∈B1 C∈B2 B∈B1 C∈B2
Mas, por (b) note que interseção (finita) de elementos de B é ainda união de elementos de B. Logo
interseção finita de elementos de τ ainda pertence a τ.
Finalmente X ∈ τ por (a) e φ ∈ τ , pois φ é a união de elementos da subcoleção vazia de B. Logo, τ
é uma topologia para X, e, pela definição de τ, segue que B é uma base para a topologia τ em X.¤
O próximo terorema mostra que a diferença essencial entre as noções de base de vizinhanças em
cada ponto e base para a topologia de X está no fato de que as bases de vizinhanças não são formadas
necessariamente por conjuntos abertos.
Teorema 6.5. Se B é uma coleção de abertos em X, B é uma base para X se e somente se para cada
x ∈ X, a coleção Bx = {B ∈ B; x ∈ B} é uma base de vizinhanças em x.
Demonstração. Suponha que B é uma base para X. Para cada x em X, considere Bx = {B ∈
B; x ∈ B}. É claro que os elementos de Bx são vizinhanças de x. Seja U uma vizinhança de x.
Então x ∈ int(U ) e, como int(U ) é uma união de elementos de B, existe algum B em B tal que
x ∈ B ⊂ int(U ). Logo B ∈ Bx e B ⊂ U . Daı́ concluı́mos que Bx é base de vizinhanças em x.
Reciprocamente, suponha que B é uma coleção
S de abertos em X e para cada x, Bx = {B ∈ B; x ∈ B}
é uma base de vizinhanças em x. Então B ⊃ Bx . Seja U um aberto de X. Para cada p em U, existe
x∈X
TOPOLOGIA- PERÍODO 2005.1 11
S
um elemento Bp de Bp ⊂ B tal que p ∈ Bp ⊂ U . Logo U = Bp e portanto U é união de elementos
p∈U
de B. Daı́ concluı́mos que B é base para X. ¤
Podemos também descrever a topologia com uma coleção menor que uma base:
Definição 6.6. Uma sub-base C para uma topologia em X é uma coleção de subconjuntos de X cuja
união é igual a X. A topologia gerada por uma sub-base C é definida como a coleção τ definida por
[ \n
τ ={ B; S ⊂ F}, e com F = { Sj ; n ∈ N, Sj ∈ C}
B∈S j=1
7. Funções contı́nuas
Definição 7.1. Sejam X e Y espaços topológicos e seja f : X → Y uma função. Então f é contı́nua
em x0 ∈ X se e somente se para cada vizinhança V de f (x0 ) em Y , existir uma vizinhança U de x0
em X tal que f (U ) ⊂ V. Dizemos que f é contı́nua em X se f for contı́nua em cada ponto de X.
Exercı́cio 7.2. Mostre que na definição acima podemos trocar “vizinhança” por “vizinhança básica”.
Exercı́cio 7.3. Mostre que na definição acima podemos trocar “vizinhança” por “aberto”
O próximo teorema nos dá caracterizações bastante úteis de funções contı́nuas:
Teorema 7.4. Se X e Y são espaços topológicos e f : X → Y é uma função, as seguintes afirmações
são equivalentes:
a) f é contı́nua,
b) para cada aberto H em Y , temos que f −1 (H) é aberto em X,
c) para cada fechado K em Y , temos que f −1 (K) é fechado em X
d) para cada E ⊂ X, f (ClX (E)) ⊂ ClY (f (E)).
Demonstração.
(a) ⇒ (b). Se H é aberto em Y , então para cada x ∈ f −1 (H), H é uma vizinhança de f (x). Pela
continuidade de f , existe uma vizinhança V de x tal que f (V ) ⊂ H. Logo V ⊂ f −1 (H). Concluı́mos
que f −1 (H) contém uma vizinhança de cada um de seus pontos, e portanto f −1 (H) é aberto.
(b) ⇒ (c). Se K é fechado em Y , então f −1 (Y − K) é aberto em X. Então
f −1 (K) = X − f −1 (Y − K)
e portanto f −1 (K) é fechado em X.
(c) ⇒ (d). Seja K um fechado em Y , com f (E) ⊂ K. Pela parte (c), temos que f −1 (K) é fechado
em X e contém E. Então ClX (E) ⊂ f −1 (K). Daı́ f (ClX (E)) ⊂ K. Como isso vale para qualquer
conjunto fechado K contendo f (E), temos que
f (ClX (E)) ⊂ ClY (f (E)).
(d) ⇒ (a). Seja x ∈ X e seja V uma vizinhança aberta de f (x). Defina E = X − f −1 (V ) e
U = X − ClX (E).
Como, por hipótese, f (ClX (E)) ⊂ ClY (f (E)), temos que x ∈ U . De fato, se fosse x ∈
/ U , terı́amos
x ∈ ClX (E) e daı́
(2) f (x) ∈ f (ClX (E)) ⊂ ClY (f (E)).
Mas
f (E) = f (X − f −1 (V )) ⊂ Y − V
e V é aberto. Daı́ Y − V é fechado e, pela definição de fecho, ClY (f (E)) ⊂ Y − V. Como f (x) ∈ V ,
temos que f (x) ∈/ ClY (f (E)) (isso contradiz (2)). Logo x ∈ U.
Além disso, f (U ) = f (X − ClX (E)) ⊂ f (X − E) = f (f −1 (V )) = V e f é contı́nua.¤
Teorema 7.5. Se X, Y e Z são espaços topológicos e f : X → Y e g : Y → Z são funções contı́nuas,
então g ◦ f : X → Z é contı́nua.
−1
Demonstração. Se H é aberto em Z, (g ◦ f ) (H) = f −1 (g −1 (H)) é aberto em X, e portanto g ◦ f
é contı́nua. ¤
TOPOLOGIA- PERÍODO 2005.1 13
f) Exercı́cio.
Definição 8.5. Se f : X → Y e A ⊂ X, denotaremos por f | A a restrição de f a A, ou seja, a
função de A em Y dada por (f | A)(a) = f (a) para cada a em A.
14 DANIEL PELLEGRINO
9. Homeomorfismos
Na passagem de X para sua imagem f (X) por uma função contı́nua f , perdemos informação de
duas formas. A primeira delas no âmbito de conjuntos: f (X) terá menos (precisamente, não terá
mais) pontos que X. A segunda perda é topológica: para cada aberto de f (X), existe um aberto em X
associado a ele, mas f não leva necessariamente abertos em abertos. Funções contı́nuas bijetivas, que
levam abertos em abertos tem um papel importante em topologia, e são chamadas de homeomorfismos.
Vamos definir, entretanto, homeomorfismo de uma maneira diferente, mas a seguir veremos que as
noções coincidem.
Definição 9.1. Se X e Y são espaços topológicos, f : X → Y é bijetiva e f −1 é contı́nua, dizemos
que f é um homeomorfismo e que X e Y são homeomorfos.
Se f : X → Y é apenas injetiva, mas f : X → f (X) é um homeomorfismo, dizemos que f é um
mergulho (embedding, em inglês) de X em Y, e que X está mergulhado em Y por f.
O próximo resultado nos deixa à vontade para escolher dentre várias definições equivalentes de
homeomorfismos:
Teorema 9.2. Se X e Y são espaços topológicos e f : X → Y é bijetiva, as seguintes afirmações são
equivalentes:
a) f é um homeomorfismo,
b) se G ⊂ X, então f (G) é aberto em Y se e somente se G é aberto em X,
c) se F ⊂ X, então f (F ) é fechado em Y se e somente se F é fechado em X,
d) se E ⊂ X, f (ClX (E)) = ClY (f (E)).
Demonstração.
(a) ⇒ (b). Seja G aberto em X. Então, f (G) coincide com (f −1 )−1 (G), que é aberto em Y, pois
f −1 é contı́nua.
Analogamente, se f (G) é aberto em Y , então, como f é contı́nua, temos que G = f −1 (f (G)) é
aberto em X.
(b) ⇒ (a). Claro, pois se G é aberto em X, então (f −1 )−1 (G) coincide com f (G), que é aberto em
Y. Daı́ f −1 é contı́nua
Analogamente, se H é aberto em Y , então H = f (G) para algum G em X. Por hipótese, como H
é aberto, temos que G é aberto. Daı́ f −1 (H) = G (aberto), e portanto f é contı́nua..
(a) ⇒ (c). Seja F fechado em X. Então, f (F ) coincide com (f −1 )−1 (F ), que é fechado em Y, pois
−1
f é contı́nua.
Analogamente, se f (F ) é fechado em Y , então, como f é contı́nua, temos que F = f −1 (f (F )) é
fechadoo em X.
(c) ⇒ (a). Claro, pois se F é fechado em X, então (f −1 )−1 (F ) coincide com f (F ), que é fechado
em Y. Daı́ f −1 é contı́nua.
Analogamente, se H é fechado em Y , então H = f (G) para algum G em X. Por hipótese, como H
é fechado, temos que G é fechado. Daı́ f −1 (H) = G (fechado), e portanto f é contı́nua.
(a) ⇒ (d) Como f é contı́nua, temos
(3) f (ClX (E)) ⊂ ClY (f (E)).
−1 −1
Como f é contı́nua, temos f (ClY (f (E))) ⊂ ClX (f −1 (f (E))). Daı́, “aplicando f ”, temos
(4) ClY (f (E)) ⊂ f (ClX (E)).
De (3) e (4) segue o resultado.
(d) ⇒ (a). Como f (ClX (E)) ⊂ ClY (f (E)), temos que f é contı́nua. Resta-nos provar a continuidade
de f −1 .
Como ClY (f (E)) ⊂ f (ClX (E)) para todo E, escolha G em Y e E = f −1 (G). Daı́ segue que
ClY (f (f −1 (G))) ⊂ f (ClX (f −1 (G))).
Aplicando f −1 , temos
f −1 (ClY (G)) ⊂ ClX (f −1 (G))
16 DANIEL PELLEGRINO
Espaços topológicos homeomorfos, em topologia, são pensados como iguais. Se denotarmos a pro-
priedade “X homeomorfo a Y ” por X ∼ Y , a relaçao ∼ será uma relação de equivalência em qualquer
conjunto formado por espaços topológicos, pois:
• X ∼ X,
• se X ∼ Y, então Y ∼ X,
• se X ∼ Y e Y ∼ Z, então X ∼ Z.
Para provar que dois espaços topológicos não são homeomorfos, é comum procurarmos alguma
propriedade topológica que algum deles satisfaça e o outro não. Precisamente, uma propriedade
topológica é uma propriedade de espaços topológicos que, se X a possui, então todos espaços home-
omorfos a X também possuem.
Exercı́cio 9.3. A função caracterı́stica de um subconjunto A de um conjunto X é a função (denotada
por 1A ) de X em R que assume o valor 1 en pontos de A e o valor zero nos outros pontos de X.
Mostre que 1A é contı́nua em A se e somente se A é aberto e fechado em X.
Exercı́cio 9.4. Mostre que X é possui a topologia discreta (τ = P(X)) se e somente se para qualquer
espaço topológico Y e f : X → Y , f é contı́nua.
Exercı́cio 9.5. Mostre que X tem a topologia trivial se e somente se sempre que Y for um espaço
topológico toda função f : Y → X for contı́nua.
Exercı́cio 9.6. Mostre que se f : X → Y é tal que f −1 (A) é aberto para cada A aberto de uma
sub-base da topologia de Y , então f é contı́nua. A recı́proca vale?
Exercı́cio 9.7. Se f e g são funções contı́nuas de X em R, mostre que o conjunto dos pontos para os
quais f (x) = g(x) é um conjunto fechado.
Exercı́cio 9.8. Se f é uma função de um espaço topológico X no plano R2 , podemos associar a f as
funções coordenadas f1 e f2 , cada uma de X em R. Mostre que uma função f : X → R2 é contı́nua
se e somente se as suas funções coordenadas são contı́nuas.
Exercı́cio 9.9. Mostre que a reta R é homeomorfa aos intervalos abertos.
Exercı́cio 9.10. Mostre que em R, todos intervalos fechados e limitados são homeomorfos.
Exercı́cio 9.11. Mostre que “ser metrizável” é uma propriedade topológica.
Exercı́cio 9.12. Mostre que ”ter cardinalidade ℵ” é uma propriedade topológica.
Em um espaço vetorial X, às vezes temos uma forma de comparar a proximidade entre vetores
arbitrários. Tomando a reta e o valor absoluto como modelo, definimos uma norma em um espaço
vetorial X como uma função k.k : X → R que satisfaz as seguintes propriedades:
i) kx + yk ≤ kxk + kyk para quaisquer x, y em X.
ii) kxk = 0 ⇔ x = 0.
iii) kλxk = |λ| kxk para todo λ no corpo de escalares de X e para todo x em X.
Um espaço vetorial munido de uma norma é chamado espaço vetorial normado (evn). Se X e
Y são evn, uma função T de X em Y é chamada operador linear se
• T (a + b) = T (a) + T (b),
• T (λa) = λT (a),
para quaisquer a, b em X e λ real.
Um operador linear T de X em Y é definido como limitado quando existe M tal que kT (x)k ≤
M kxk , para todo x em X. Note que aqui abusamos um pouco da notação, usando o mesmo sı́mbolo
para normas em X e Y .
Exercı́cio 9.13. Mostre que um operador linear é limitado se e somente se sup{kT (x)k ; x ∈ X, kxk =
1} < ∞
TOPOLOGIA- PERÍODO 2005.1 17
Exercı́cio 9.14. Mostre que para um operador linear T de X em Y , as seguintes afirmações são
equivalentes:
a) T é contı́nuo em algum x0 em X,
b) T é uniformemente contı́nuo em X,
c) T é limitado.
Exercı́cio 9.15. Recorde as definições que precedem o Exercı́cio 9.13 e mostre que, se X é um espaço
vetorial normado de dimensão infinita, existem operadores lineares T : X → R que não são contı́nuos.
18 DANIEL PELLEGRINO
Perceba que qualquer topologia em Y, para a qual todas as fα são contı́nuas, deve necessariamente
estar contida na topologia forte τ(fα ) .
Exercı́cio 11.1. Verifique que τ(fα ) é de fato uma topologia.
Demonstração.
(a). Se U ⊂ X é aberto e xn → x ∈ U, como U é vizinhança de x, existe n0 ∈ N tal que xn ∈ U
para todo n ≥ n0 .
Por outro lado, suponha que sempre que xn → x ∈ U, então existe n0 tal que n ≥ n0 ⇒ xn ∈ U.
Suponha, por contradição, que U não seja aberto. Existe, então, um ponto x ∈ U que não é interior.
Dada uma base enumerável de vizinhanças {Un ; n = 1, 2, ...} de x, podemos supor, como no Teorema
12.5, U1 ⊃ U2 ⊃ ..... Para cada n, existe xn ∈ Un − U e portanto, xn → x e não existe n0 tal que tal
que n ≥ n0 ⇒ xn ∈ U (absurdo).
As demonstrações de (b) e (c) são deixadas como exercı́cio.
O resultado anterior nos mostra que em espaços que satisfazem o primeiro axioma da enumerabili-
dade, a convergência por meios de sequências caracteriza completamente os abertos e os fechados, ou
seja, descrevem a topologia. É natural que à primeira vista imaginemos que isso acontece com qualquer
espaço topológico, mas o exemplo a seguir mostram que isso em geral não é verdade.
22 DANIEL PELLEGRINO
13. Redes
Vimos na seção anterior que, em geral, sequências não descrevem bem as topologias. Por exemplo,
o Exemplo 12.7 mostra que não é sempre possı́vel caracterizar os fechados de um espaço topológico
por meio de sequências. De fato, vimos que podemos encontrar um ponto de acumulação de um
conjunto F ⊂ X sem que exista uma sequência (xn ) em F convergindo para esse ponto. Há duas
generalizações clássicas do conceito de sequência, que consertam essa limitação das sequências: redes
e filtros. O conceito de redes originou-se com trabalhos de Moore-Smith e o conceito de filtros deve-se
a E. Cartan.
Definição 13.1. Um conjunto Λ é dito conjunto dirigido quando existe uma relação ≤ em Λ satis-
fazendo:
a) λ ≤ λ para todo λ ∈ Λ,
b) se λ1 ≤ λ2 e λ2 ≤ λ3 , então λ1 ≤ λ3 ,
c) se λ1 , λ2 ∈ Λ, então existe algum λ3 ∈ Λ tal que λ1 ≤ λ3 e λ2 ≤ λ3 .
Dizemos que a relação ≤ é uma direção para o conjunto Λ. Às vezes dizemos que a relação ≤
dirige o conjunto Λ. Note que não se exige a propriedade anti-simétrica, ou seja, se λ1 ≤ λ2 e λ2 ≤ λ1
não se tem necessariamente que λ1 = λ2 .
Note se X é um conjunto com mais de um elemento, a relação x ≤ y para quaisquer x, y em X,
dirige X, mas não é anti-simétrica.
Definição 13.2. Uma rede em um conjunto X é uma função P : Λ → X, onde Λ é um conjunto
dirigido. O ponto P (λ) é usualmente denotado por xλ , e nós usualmente falamos ”a rede (xλ )λ∈Λ ”se
isso não causar confusão.
Definição 13.3. Uma subrede de uma rede P : Λ → X é a composição P ◦ ϕ : M → X, onde
ϕ : M → Λ é uma função de um conjunto dirigido M em Λ, que satisfaz as seguintes propriedades:
a) ϕ(µ1 ) ≤ ϕ(µ2 ) sempre que µ1 ≤ µ2 (ϕ é crescente)
b) para cada λ em Λ, existe um µ ∈ M tal que λ ≤ ϕ(µ) (ϕ é cofinal em Λ).
Para µ ∈ M , o ponto P ◦ ϕ(µ) é em geral escrito como xλµ , e escrevemos ”a subrede (xλµ ) de (xλ )”.
A definição de convergência em redes é naturalmente modelada pela definição de convergência em
sequências:
Definição 13.4. Seja (xλ )λ∈Λ uma rede em um espaço topológico X. Dizemos que (xλ ) converge
para x ∈ X (escrevemos xλ → x) se para cada vizinhança U de x, existir algum λ0 ∈ Λ tal que λ ≥ λ0
implica xλ ∈ U . Logo, xλ → x se e somente se cada vizinhança de x tem um ”rabo”de (xλ ).
Dizemos que uma rede (xλ ) está em um conjunto A se xλ ∈ A para todo λ. Se xλ está em A para
todo λ ≥ λ0 , dizemos que (xλ ) está residualmente (ou eventualmente) em A. Quando para cada
λ0 existe um λ ≥ λ0 tal que xλ ∈ A, dizemos que (xλ ) está frequentemente em A. Quando (xλ ) está
frequentemente em cada vizinhança de x, dizemos que x é ponto de acumulação da rede (xλ ).
Exercı́cio 13.5. Uma rede não pode estar residualmente em dois conjuntos disjuntos.
Note que em ambas as definições acima podemos nos restringir a uma base de vizinhanças de x.
Exercı́cio 13.6. Se uma rede (xλ ) converge para x, mostre que x é ponto de acumulação dessa rede.
Exemplo 13.7. Seja X um espaço topológico, x ∈ X e Λ uma base de vizinhanças de x em X. A
relação de ordem U1 ≤ U2 ⇔ U2 ⊂ U1 dirige o conjunto Λ. Portanto, se tomarmos um xU ∈ U
para cada U ∈ Λ, temos uma rede (xU ) em X. Note que xU → x. De fato, dada uma vizinhança V
de x, podemos encontrar U0 ⊂ V para algum U0 em Λ. Então U ≥ U0 implica U ⊂ U0 e portanto
xU ∈ U ⊂ V.
Exemplo 13.8. O conjunto N dos naturais positivos com sua ordem natural é um conjunto dirigido.
Então toda sequência (xn ) em N é uma rede.
Note que toda subsequência de uma sequência (xn ) é uma subrede. Entretanto, não há garantia de
que uma subrede de (xn ) seja uma subsequência. Uma subrede pode ter mais ı́ndices que a própria
rede!
24 DANIEL PELLEGRINO
Exemplo 13.9. A coleção P de todas as partições finitas do intervalo fechado [a, b] em subintervalos
fechados é um conjunto dirigido, quando munido da relação A1 ≤ A2 ⇔ (A2 refina A1 ). Então, se
f é uma funçao de [a, b] tomando valores na reta real, podemos definir a rede PI : P → R definindo
PI (A) como a soma inferior de Riemann de f na partição A. De modo semelante, podemos definir
PS : P → R como a soma superior de Riemann de f na partição A. A convergência dessas duas redes
Rb
para um número c significa que f (x)dx = c.
a
Exemplo 13.10. Seja (M, ρ) um espaço métrico, com x0 ∈ M . Então M − {x0 } é um conjunto
dirigido se considerarmos a relação x < y ⇔ ρ(y, x0 ) < ρ(x, x0 ). Então se f : M → N é uma função
com N sendo um espaço métrico, a restrição de f a M − {x0 } é uma rede em N . Vamos verificar que
essa rede converge a z0 em N se e somente se limx→x0 f (x) = z0 no sentido usual.
De fato, suponha que a rede converge para z0 . Seja U uma vizinhança de z0 em N . Então, como
a rede converge para z0 , existe y0 em M tal que x > y0 implica f (x) ∈ U. Em outras palavras,
ρ(x, x0 ) < ρ(y0 , x0 ) implica f (x) ∈ U. Daı́, limx→x0 f (x) = z0 .
Reciprocamente, se limx→x0 f (x) = z0 , então dada uma vizinhança U de z0 , existe uma vizinhança
V de x0 tal que x ∈ V implica f (x) ∈ U . Escolha ε (suficientemente pequeno) de modo que a bola de
centro x0 e raio ε esteja em V . Escolha y0 nessa bola. Logo, se x > y0 , então ρ(x, x0 ) < ρ(y0 , x0 ) e
portanto x ∈ V e f (x) ∈ U. Consequentemente, a rede f : M → N converge para z0 .
Definição 13.11. Dizemos que um espaço topológico X é um espaço de Hausdorff se para cada
x1 e x2 , elementos distintos de X, existem abertos disjuntos que separam x1 e x2 .
Teorema 13.12. Um espaço topológico é um espaço de Hausdorff se e somente se toda rede nesse
espaço converge para no máximo um ponto.
Demonstração. Seja X um espaço de Hausdorff e a1 , a2 elementos distintos em X. Existem,
portanto, abertos U1 e U2 , disjuntos, contendo x1 e x2 , respectivamente. Como uma rede não pode
estar eventualmente em dois conjuntos disjuntos, segue que uma rede não pode convergir para dois
valores distintos.
Reciprocamente, suponha que X não é Hausdorff. Existem, portanto, dois elementos distintos, x1
e x2 em X tais que sempre que V1 é vizinhança de x1 e V2 é vizinhança de x2 , temos que V1 ∩ V2 = φ.
Sejam U1 e U2 as famı́lias de vizinhanças de x1 e x2 , respectivamente. No conjunto U1 ×U2 consideramos
a direção (V1 , V2 ) ≥ (W1 , W2 ) ⇔ V1 ⊂ W1 e V2 ⊂ W2 . Considere uma rede P : U1 × U2 → X dada
por P (V1 , V2 ) = xV1 ,V2 , onde xV1 ,V2 é escolhido em V1 ∩ V2 . Mostraremos que essa rede converge para
x1 e para x2 . Sejam, portanto, dadas vizinhanças V1 de x1 e V2 de x2 . Então (A, B) ≥ (V1 , V2 ), temos
xA,B ∈ A ∩ B ⊂ V1 ∩ V2 e consequentemente a rede converge para os dois valores. ¤
Exercı́cio 13.13. Se um espaço é Hausdorff, mostre que toda sequência converge para, no máximo,
um ponto.
Exercı́cio 13.14. Se toda sequência em um espaço topológico converge para no máximo um elemento,
podemos concluir que ele é Hausdorff ? Justifique.
Sugestão. Pense no Exercı́cio 4.2 com X = R.
Exercı́cio 13.15. Mostre que se (xλ ) converge para x, cada subrede de (xλ ) converge para x.
Teorema 13.16. Uma rede tem um ponto de acumulação y se e somente se ela possui uma subrede
que converge para y.
Demonstração. Seja y um ponto de acumulação de (xλ )λ∈Λ . Defina
M = {(λ, U ); λ ∈ Λ, U é uma vizinhança de y tal que xλ ∈ U },
e considere a relação ≤ como segue:
(λ1 , U1 ) ≤ (λ2 , U2 ) ⇔ λ1 ≤ λ2 e U2 ⊂ U1 .
TOPOLOGIA- PERÍODO 2005.1 25
Note que ≤ é uma direção para M. Defina ϕ : M → Λ por ϕ(λ, U ) = λ. Então ϕ é obviamente
crescente e cofinal em Λ, e portanto define uma subrede de (xλ ). Seja U0 uma vizinhança de y e seja
λ0 tal que xλ0 ∈ U0 . Então (λ0 , U0 ) ∈ M e
(λ, U ) ≥ (λ0 , U0 ) ⇒ U ⊂ U0 .
Logo (λ, U ) ≥ (λ0 , U0 ) ⇒ xλ ∈ U ⊂ U0 . Daı́ a subrede definida por ϕ converge para y.
Para provar a outra implicação, suponha que ϕ : M → Λ seja uma aplicação crescente e cofinal,
dando origem a uma subrede de (xλ ) que converge para y. Então, para cada vizinhança U de y, existe
um uU ∈ M tal que u ≥ uU implica xϕ(u) ∈ U.
Sejam U uma vizinhança de y e λ0 ∈ Λ fixos, arbitrários. Como ϕ(M ) é cofinal em Λ, existe
u0 ∈ M tal que ϕ(u0 ) ≥ λ0 . Mas, também existe um uU ∈ M tal que u ≥ uU implica xϕ(u) ∈ U.
Escolha u∗ ∈ M tal que u∗ ≥ u0 e u∗ ≥ uU . Então λ∗ = ϕ(u∗ ) ≥ ϕ(u0 ) ≥ λ0 . Assim xλ∗ = xϕ(u∗ ) ∈ U,
pois u∗ ≥ uU . Logo, para qualquer vizinhança U de y e qualquer λ0 ∈ Λ, existe algum λ∗ ≥ λ0 tal que
xλ∗ ∈ U. Segue que y é um ponto de acumulação de (xλ ).¤
Corolário 13.17. Se uma subrede de (xλ ) tem y como ponto de acumulação, então (xλ ) também.
Demonstração. Basta observar que uma subrede de uma subrede é ainda uma subrede, e aplicar o
teorema anterior.¤
O próximo resultado caracteriza o fecho de um conjunto com a noção de redes:
Teorema 13.18. Se E ⊂ X, então x ∈ E se e somente se existe uma rede (xλ ) em E com xλ → x.
Demonstração. Se x ∈ E, então cada vizinhança U de x intercepta E em pelo menos um ponto xU .
Então (xU ) é uma rede contida em E convergindo para x (veja 13.7).
Reciprocamente, se (xλ ) é uma rede contida em E que converge para x, então cada vizinhança de
y intercepta E (em um rabo de (xλ )) e portanto x ∈ E.¤
Corolário 13.19. Um subconjunto F de um espaço topológico X é fechado se e somente se sempre
que (xλ ) ⊂ F com xλ → x, então x ∈ F.
Exercı́cio 13.20. Seja f : X → Y uma função. Mostre que f é contı́nua em um ponto x0 ∈ X se e
somente se
xλ → x0 ⇒ f (xλ ) → f (x0 ).
Exercı́cio 13.21. Se f : X → Y é uma função contı́nua e A e B são abertos em X e Y , respectiva-
mente, com f (A) ⊂ B, mostre que f (A) ⊂ B.
Y
Teorema 13.22. Uma rede (xλ ) no espaço produto X = Xα converge para x se e somente se para
α∈A
cada α ∈ A, πα (xλ ) → πα (x) em Xα .
Y
Demonstração. Se xλ → x em Xα , então, como πα é contı́nua, πα (xλ ) → πα (x) para cada
α∈A
α ∈ A.
por outro lado, suponha que πα (xλ ) → πα (x) para cada α ∈ A. Seja
πα−1
1
(Uα1 ) ∩ ... ∩ πα−1
n
(Uαn )
uma vizinhança básica de x no espaço produto. Então, como em particular, παi (xλ ) → παi (x), para
cada i = 1, ..., n existe um λi tal que sempre que λ ≥ λi , temos παi (xλ ) ∈ Uαi . Escolhendo λ0 ≥ λi ,
i = 1, ..., n, temos que παi (xλ ) ∈ Uαi para todo i = 1, ..., n sempre que λ ≥ λ0 . Portanto
λ ≥ λ0 ⇒ xλ ∈ πα−1
1
(Uα1 ) ∩ ... ∩ πα−1
n
(Uαn )
Y
e consequentemente (xλ ) converge para x no espaço (xλ ) no espaço produto X = Xα . ¤
α∈A
26 DANIEL PELLEGRINO
14. Filtros
Uma outra forma de se estudar convergência em espaços topológicos é através do conceito de filtros.
Definição 14.1. Um filtro F em um conjunto X é uma coleção não-vazia contida em P(X) tal que
a) φ ∈
/ F,
b) se F1 e F2 são elementos de F, então F1 ∩ F2 ∈ F,
c) se F ∈ F e F ⊂ G, então G ∈ F.
Uma subcoleção F0 ⊂ F é uma base para o filtro F se cada elemento de F contém algum elemento
de F0 .
Proposição 14.2. Uma coleção qualquer C de subconjuntos não-vazios de X é uma base para algum
filtro de X se sempre que C1 , C2 ∈ C, tivermos que C1 ∩ C2 ∈ C.
Demonstração. Seja F = {F ⊂ X; F ⊃ C para algum C ∈ C}. Temos que φ ∈ / F, e se F1 e F2
são elementos de F, então existem C1 e C2 em C tais que C1 ⊂ F1 e C2 ⊂ F2 . Logo C1 ∩ C2 ∈ C e
C1 ∩ C2 ⊂ F1 ∩ F2 . Logo F1 ∩ F2 ∈ F . Finalmente, como o item (c) da definição de filtro é obviamente
válido para F, segue que F é um filtro.¤
Exemplo 14.3. Note que se X é um espaço topológico e x ∈ X, o conjunto das vizinhanças de x,
denotado por Ux , é um filtro em X. Além disso, qualquer base de vizinhanças de x é uma base para o
filtro Ux . Esse filtro será chamada de filtro de vizinhanças de x.
Observação 14.4. Note que as condições (a) e (b) nos restringem bastante a “quantidade de elemen-
tos” dos filtros, pois como φ ∈
/ F, o item (b) nos diz que se F1 ∩ F2 = φ, então pelo menos um desses
conjuntos não pertence a F.
Definição 14.5. Um filtro F em um espaço topológico X converge para x se Ux ⊂ F (notação
F → x).
Exemplo 14.6. Considere X = {a, b, c} com a topologia τ = {φ, {a, b}, X}. O conjunto F = {{a}, {a, b}, {a, c}, X}
é um filtro em X. Além disso, perceba que F → a.
Definição 14.7. Um filtro F é um ultrafiltro se não existe nenhum outro filtro que o contenha
estritamente.
Exemplo 14.8. O filtro F do Exemplo 14.6 é um ultrafiltro.
Teorema 14.9. Um filtro F é um ultrafiltro se e somente se para cada E ⊂ X tivermos E ∈ F ou
X − E ∈ F.
Demonstração. Seja F um ultrafiltro e E ⊂ X. Se existir F0 ∈ F tal que F0 ∩ E = φ então
F0 ⊂ (X − E). Daı́, para todo F ∈ F, temos que F ∩ (X − E) 6= φ. Portanto, concluı́mos que
F ∩ (X − E) 6= φ para todo F ∈ F
ou
F ∩ E 6= φ para todo F ∈ F .
Suponha, então, que F ∩ E 6= φ para todo F ∈ F. Assim, o conjunto {F ∩ E; F ∈ F} é uma base para
um filtro G. Mas esse filtro contém E = X ∩ E e F ⊂ G. Como F é um ultrafiltro, segue que E ∈ F.
Se supusermos que F ∩(X −E) 6= φ para todo F ∈ F , de modo análogo, concluı́mos que X −E ∈ F.
Agora vamos supor que F é um filtro tal que para cada E ⊂ X temos E ∈ F ou X − E ∈ F. Se G
é um filtro que contém estritamente F, então para algum A ∈ G, temos que A ∈
/ F. Mas, nesse caso
X − A ∈ F ⊂ G. Daı́ temos um absurdo, pois tanto A como seu complementar estarão em G. Logo F
é ultrafiltro. ¤
Observação 14.10. Perceba que num filtro (ou ultrafiltro) F não podemos ter ao mesmo tempo E ∈ F
e X − E ∈ F , pois se isso ocorresse, terı́amos φ = E ∩ (X − E) ∈ F.
Teorema 14.11. Todo filtro F está contido em algum ultrafiltro.
28 DANIEL PELLEGRINO
As noções de filtro e rede têm uma relação muito forte. Rigorosamente, tudo que puder ser provado
ou enunciado usando-se redes, poderá ser paralelamente provado ou enunciado usando-se filtros, e
vice-versa. Entretanto, em determinadas ocasiões um ou outro conceito pode parecer mais natural,
e assim é interessante conhecer um pouco de ambos. A seguinte definição e os próximos exercı́cios
deixam claro como fazer a ligação formal entre esses dois conceitos:
Definição 14.12. Se (xλ )λ∈Λ é uma rede em X, o filtro gerado pela base C formada pelos conjuntos
Bλ0 = {xλ ; λ ≥ λ0 }, λ0 ∈ Λ, é chamado filtro gerado por (xλ )λ∈Λ .
Se F é um filtro em X, seja ΛF = {(x, F ); x ∈ F ∈ F}. Então ΛF é um conjunto dirigido pela
relação
(x1 , F1 ) ≤ (x2 , F2 ) ⇔ F2 ⊂ F1
e a aplicação P : ΛF → X dada por P (x, F ) = x é uma rede em X, chamada de rede gerada por F.
Exercı́cio 14.13. Um filtro F, em um espaço topológico X, converge para x ∈ X se e somente se a
rede gerada por F converge para x.
Exercı́cio 14.14. Uma rede (xλ ), em um espaço topológico X, converge para x ∈ X se e somente se
o filtro gerado por ela converge para x.
O seguinte resultado nos será útil no decorrer do curso:
Proposição 14.15. A rede gerada por um ultrafiltro é uma ultrarede.
Demonstração. Seja F um ultrafiltro. Então, seja P : ΛF → X a rede gerada por F.
Seja E ⊂ X. Como F é ultrafiltro, temos que E ∈ F ou X − E ∈ F. No primeiro caso, se (x, F ) ≥
(x, E), temos P (x, F ) = x ∈ F ⊂ E e consequentemente a rede P : ΛF → X está eventualmente em
E.
No segundo caso, se (x, F ) ≥ (x, X − E), temos P (x, F ) = x ∈ F ⊂ X − E e consequentemente a
rede P : ΛF → X está eventualmente em X − E. Logo, a rede P : ΛF → X é uma ultrarede.
TOPOLOGIA- PERÍODO 2005.1 29
16. Espaços T0 , T1 , T2 e T3
Agora vamos restringir nosso estudo em alguns tipos especiais de espaços topológicos. As topologias
mais interessantes, de alguma forma separam pontos através de abertos. Nessa direção, vamos definir
espcços T0 , T1 e espaços de Hausdorff.
Definição 16.1. Um espaço topológico X é dito um espaço T0 (ou a topologia de X é T0 ) quando
para quaisquer pontos x e y, distintos, existe um aberto que contém um dos pontos e não contém o
outro. Dizemos ainda que um espaço topológico X é um espaço T1 (ou a topologia de X é T1 ) quando
para quaisquer pontos x e y, distintos, existe uma vizinhança de cada um dos pontos que não contém o
outro. Por fim, lembremos que um espaço topológico X é um espaço de Hausdorff se para cada x1
e x2 , elementos distintos de X, existem abertos disjuntos que separam x1 e x2 . Espaços de Hausdorff
também são chamados de espaços T2 .
Como toda vizinhança contém um aberto, é claro que todo espaço T1 é também T0 . Entretanto, a
recı́proca não vale, pois X = {a, b} com a topologia τ = {φ, {a}} em X é um espaço T0 mas não é um
espaço T1 .
Exercı́cio 16.2. Mostre que uma pseudométrica é uma métrica se e somente se a topologia gerada
por ela é T0 .
Exercı́cio 16.3. Um espaço topológico é um espaço T1 se e somente se cada ponto é fechado.
Definição 16.4. Um espaço topológico é dito regular se sempre que F é fechado e x ∈
/ F , existem
abertos disjuntos U e V com x ∈ U e F ⊂ V.
Exercı́cio 16.5. Dê exemplo de um espaço regular que não é Hausdorff.
Como a intenção da definição de espaços regulares é, de certa forma, refinar os conceitos de espaços
T1 e T2 (Hausdorff), dizemos que um espaço T1 que também é regular, é um espaço T3 . Como em
espaços T1 , os conjuntos unitários são fechados, temos que todo espaço T3 é Hausdorff.
TOPOLOGIA- PERÍODO 2005.1 31
Note que, intuitivamente, quanto menos abertos possui uma topologia, mais fácil é para se encontrar
compactos. Podemos destacar doisa extremos:
Em uma topologia com uma quantidade finita de abertos, todo conjunto é compacto. Por outro lado,
para um conjunto X munido da topologia τ = P(X), temos que um subconjunto de X é compacto se
e somente se tem uma quantidade finita de elementos.
Conjuntos compactos têm propriedades especiais em espaços de Hausdorff. Um resultado importante
é o seguinte:
Exercı́cio 17.5. Dê exemplo de um compacto que não é fechado. Sugestão: Pense num espaço
topológico com uma quantidade finita de abertos.
Exercı́cio 17.6. Exiba um espaço topológico X que não é Hausdorff, mas todo compacto em X é
fechado. Sugestão: Considere a reta com a topologia do Exemplo 4.2.
Exercı́cio 17.10. Lembre que em teoria de conjuntos, o Teorema de Cantor-Bernstein afirma que se
A e B são conjuntos e existem funções injetivas f : A → B e g : B → A, então existe uma bijeção
entre A e B. Para espaços topológicos, o análogo seria:
“Se X pode ser mergulhado em Y e Y pode ser mergulhado em X, então X e Y são homeomorfos”.
Encontre um contra-exemplo. Sugestão: Use [0, 1] e R.
Definição 17.11. Uma famı́lia E de subconjuntos de X tem a propriedade da interseção finita
se a interseção de qualquer subcoleção finita de E é não-vazia.
Os conceitos de rede e de conjuntos com a propriedade da interseção finita caracterizam conjuntos
compactos da seguinte forma:
Teorema 17.12. (Caracterizações de compactos) Para um espaço topológico X, as seguintes afirmações
são equivalentes:
a) X é compacto,
b) cada famı́lia E de subconjuntos fechados de X com a propriedade da interseção finita tem
interseção não-vazia,
c) cada rede em X tem um ponto de acumulação,
d) cada ultrarede em X converge.
Demonstração.
(a)⇒(b). Se {Eα ; α ∈ A} é uma famı́lia de conjuntos fechados de X com interseção vazia, então
{X − Eα ; α ∈ A} é uma cobertura aberta de X. Com efeito,
[ \
(X − Eα ) = X − Eα = X.
α∈A α∈A
n
[ n
\
Como X é compacto, temos que existem α1 , ..., αn tais que X = (X − Eαi ) = X − Eαi . Logo
i=1 i=1
n
\
Eαi = φ, e {Eα ; α ∈ A} não tem a propriedade da interseção finita.
i=1
(b)⇒(c). Seja (xλ )λ∈Γ uma rede em X. Considere a famı́lia de fechados
n o
{xλ ; λ ≥ λ0 } .
λ0 ∈Γ
Tomando {xλ ; λ ≥ λ1 } ∩ .... ∩ {xλ ; λ ≥ λn }, temos que existe β ∈ Γ com β ≥ λ1 , ..., β ≥ λn e daı́
concluı́mos que
xβ ∈ {xλ ; λ ≥ λ1 } ∩ .... ∩ {xλ ; λ ≥ λn }.
n o
Portanto, a famı́lia de fechados {xλ ; λ ≥ λ0 } possui a propriedade da interseção finita. Por
λ0 ∈Γ
hipótese, temos então que existe \
x∈ {xλ ; λ ≥ λ0 }.
λ0 ∈Γ
Finalmente, para qualquer U aberto e α ∈ Γ, como x ∈ {xλ ; λ ≥ α}, temos que existe λ ≥ α tal que
xλ ∈ U , e x é ponto de acumulação da rede (veja definição na Definição 13.4).
(c)⇒(d). Se (xλ ) é uma ultrarede em X, em particular, (xλ ) é uma rede e, por hipótese, tem ponto
de acumulação. Pela Proposição 13.24, segue que essa ultrarede é convergente.
(d)⇒(a). Seja F um ultrafiltro em X. A rede gerada por F é, pela Proposição 14.15, uma ultrarede.
Por hipoótese, temos que essa ultrarede (rede) converge. Pelo Exercı́cio 14.14, segue que F também
converge. Logo, todo ultrafiltro F em X converge.
Suponhamos, por contradição, que X não seja compacto. Escolha, então, um conjunto de abertos
U que formam uma cobertura de X, que não possui subcobertura finita. Então X − (A1 ∪ ...An ) 6= φ
para cada coleção finita de abertos {A1 , ..., An } em U. Fazendo uso da Proposição 14.2, temos que a
famı́lia de conjuntos
{X − (A1 ∪ ...An ); n ∈ N e Aj ∈ U , j = 1, ..., n}
TOPOLOGIA- PERÍODO 2005.1 33
forma uma base para um filtro F. Como todo filtro está contido num ultrafiltro (veja Teorema 14.11),
segue que existe um ultrafiltro G que contém F. Mas, já sabemos que todo ultrafiltro em X converge.
Assim, existe x ∈ X tal que G → x. Como os abertos de U cobrem X, existe um aberto U ∈ U
contendo x. Como U é vizinhança de x, e como G → x, segue que U ∈ G. Por construção, temos que
X − U ∈ F ⊂ G. Assim, U ∈ / G (contradição). Logo X é compacto.¤
34 DANIEL PELLEGRINO
Demonstração. ComoYas projeções πα são contı́nuas, e como função contı́nua leva compacto em
compacto, segue que se Aα é compacto, então cada Aα é compacto.
α∈Γ
Suponha, agora, que cada Aα é compacto. Seja (xλ )λ∈Λ uma ultrarede em Y . Então, pelo Teorema
13.25 segue, para cada α, temos que (πα (xλ ))λ∈Λ é uma ultrarede em Xα . Pelas caracterizações dos con-
juntos compactos, temos que cada (πα (xλ ))λ∈Λ converge em Xα , e finalmente o Teorema 13.22 garante
que (xλ )λ∈Λ converge e o Teorema 17.12, que caracteriza compactos, garante que Y é compacto.¤
TOPOLOGIA- PERÍODO 2005.1 35
Essa é, entretanto, uma tarefa fácil. Como Φ é um homeomorfismo, para mostrar que Φ(BE 0 )
é fechado, basta provar que BE 0 é fechado em E 0 . Para isso, considere (ϕi ) uma rede em BE 0 que
converge (na topologia fraca estrela) para ϕ. Então,
ϕi (x) → ϕ(x) ∀x ∈ E.
Como, para cada i e cada x, temos kϕi (x)k ≤ kxk , segue que kϕ(x)k ≤ kxk e kϕk ≤ 1 e consequente-
mente ϕ ∈ BE 0 .¤
TOPOLOGIA- PERÍODO 2005.1 37
Espaços métricos, como protótipos de espaços topológicos, possuem diversas propriedades mar-
cantes. Se (M, d) é um espaço métrico, e F1 e F2 são subconjuntos fechados e disjuntos de M, a função
S : M → [0, 1] dada por
d(x, F1 )
S(x) =
d(x, F1 ) + d(x, F2 )
está bem definida, é contı́nua (para detalhes sobre funções contı́nuas em espaços métricos veja [1, Pag
35] e S(F1 ) = {0}, S(F2 ) = {1}. Usando a função S, é fácil ver que se U = {x ∈ M ; S(x) < 1/2} e
V = {x ∈ M ; S(x) > 1/2}, então F1 ⊂ U , F2 ⊂ V e U ∩ V = φ.
Espaços topológicos que tem essa propriedade são chamados de normais. Precisamente, um espaço
topológico X é dito normal se dados F1 e F2 , subconjuntos fechados e disjuntos de X, exitem abertos
U e V tais que U ∩ V = φ e F1 ⊂ U e F2 ⊂ V. Um espaço normal que também é T1 é chamado de
espaço T4 .
Note que
T0 ⊃ T1 ⊃ T2 ⊃ T3 ⊃ T4 .
Nosso primeiro resultado significativo sobre espaços normais mostra que os espaços normais são
precisamente aqueles onde para fechados disjuntos F1 e F2 , existe uma função contı́nua S tal que
F1 ∈ S −1 ({1}) e F2 ∈ S −1 ({0}), assim como acontece nos espaços métricos.
Lema 19.1. Em um espaço normal, dados F1 e F2 fechados e disjuntos, existe um aberto U contendo
F1 tal que U ∩ F2 = φ.
Demonstração. Como o espaço é normal, existem U1 e U2 abertos disjuntos tais que F1 ⊂ U1 e
F2 ⊂ U2 . Temos então que U1 ∩ F2 = φ. De fato, se essa interseção fosse não vazia, escolha x ∈ U1 ∩ F2 .
Logo x ∈ U2 (aberto) e x ∈ U1 , e isso acarreta que existe y ∈ U1 ∩ U2 (absurdo). ¤
Lema 19.2. Sejam X um espaço topológico e D um subconjunto denso de [0, 1]. Suponhamos dado,
para cada r ∈ D, um subconjunto Ur ⊂ X tal que
a) cada Ur é aberto em X,
b) se r < s, então U r ⊂ Us .
Então, a função f : X → [0, 1] definida por
[
f (x) = 1 se x ∈/ Ur
r∈D
f (x) = inf{r ∈ D; x ∈ Ur }, caso contrário.
é contı́nua.
Demonstração. Note que:
(i) se x ∈ Ur , então f (x) ≤ r,
(ii) se x ∈/ Ur , então f (x) ≥ r.
Com efeito, a afirmação (i) é imediata. Para verificar (ii), observe que se fosse f (x) < r, pela
definição de ı́nfimo, existiria s ∈ D tal que x ∈ Us e s < r. Assim, Us ⊂ Ur e portanto x ∈ Ur .
Agora vamos provar que f é contı́nua em um ponto arbitrário a ∈ X. Para ε > 0, vamos encontrar
vizinhanças V e W de a tais que
x ∈ V ⇒ f (x) < f (a) + ε
x ∈ W ⇒ f (a) − ε < f (x).
Uma vez encontradas V e W , se definirmos U = V ∩ W , teremos que
x ∈ U ⇒ |f (x) − f (a)| < ε.
38 DANIEL PELLEGRINO
Para pontos a tais que f (a) = 1, definamos V = X. Se for f (a) < 1, então f (a) = inf{r ∈ D; a ∈ Ur }.
Logo, como D é denso em I, existe r ∈ D tal que f (a) < r < f (a) + ε. Por (ii), temos que a ∈ Ur , e
por (i), se x ∈ Ur , temos que f (x) ≤ r < f (a) + ε. Nesse caso definimos V = Ur .
Se for f (a) = 0, colocamos W = X. Se for f (a) > 0, então, como D é denso em I, existem r, s ∈ D
tais que f (a) − ε < r < s < f (a). Logo U r ⊂ Us . Seja W = X − U r . Como f (a) > s, temos, por (ii),
a∈/ Us e a ∈ W . Além disso, se x ∈ W , temos x ∈ / Ur e assim
f (a) − ε ≤ r ≤ f (x).
Portanto, W é uma vizinhança aberta de a tal que x ∈ W implica f (a) − ε < f (x).¤
Proposição 19.3. (Lema de Urysohn). Um espaço topológico X é normal se e somente se para
quaisquer subconjuntos F1 e F2 fechados de X, com F1 ∩ F2 = φ, existe uma função S : X → [0, 1] tal
que S(F1 ) = {0} e S(F2 ) = {1}.
Demonstração. Suponha que X é normal e que F1 e F2 , disjuntos, são subconjuntos fechados de X.
Como X é normal (pelo Lema 19.1), existe um aberto U1/2 tal que
F1 ⊂ U1/2 ⊂ U 1/2 e U 1/2 ∩ F2 = φ.
Agora F1 e X − U1/2 são fechados e disjuntos, assim como U1/2 e F2 . então, existem abertos U1/4 e
U3/4 tais que
F1 ⊂ U1/4 ⊂ U 1/4 ⊂ U1/2 ⊂ U 1/2 ⊂ U3/4 ⊂ U 3/4
e
U 3/4 ∩ F2 = φ.
Agora suponha que tenhamos os conjuntos Uk/2n , k = 1, ..., 2n − 1 definidos de modo que
F1 ⊂ U1/2n , ..., U k−1/2n ⊂ Uk/2n , ..., U 2n −1/2n ∩ F2 = φ,
podemos continuar o processo e obter conjuntos Uk/2n+1 , k = 1, ...., 2n+1 − 1 com as mesmas pro-
priedades. Por indução, para cada racional da forma r = k/2n , com k = 1, ..., 2n − 1, temos um aberto
Ur tal que
a) F1 ⊂ Ur e U r ∩ F2 = φ para cada r,
b) U r ⊂ Us patra cada s > r
Agora defina S : X → [0, 1] como segue:
[
S(x) = 1 se x ∈/ Ur
r
S(x) = inf{r; x ∈ Ur }, caso contrário.
Temos que S(F1 ) = {0} e S(F2 ) = {1}. Pelo Lema 19.2, S é contı́nua.
Reciprocamente, suponha que para quaisquer subconjuntos F1 e F2 fechados de X, com F1 ∩F2 = φ,
existe uma função S : X → [0, 1] tal que S(F1 ) = {0} e S(F2 ) = {1}. Então S −1 ([0, 1/2)) e S −1 (1/2, 1])
são abertos disjuntos que contém F1 e F2 , respectivamente, e assim X é um espaço normal. ¤
Outra maneira de caracterizar espaços normais é através de extensões de funções contı́nuas.
Teorema 19.4. (Teorema da extensão de Tietze) X é um espaço normal se e somente se sempre
que F é um subconjunto fechado de X e f : F → R é contı́nua, existe uma extensão de f para X.
Pelo Lema de Urysohn, existe ϕ1 : X → [−a/3, a/3] tal que ϕ1 (F1 ) = {−a/3} e ϕ1 (G1 ) = {a/3}.
Daı́, para cada x em F , temos
pois se f (x) ≤ −a/3, temos ϕ1 (x) = −a/3, e se f (x) ≥ a/3, temos ϕ1 (x) = a/3. Além disso, se
−a/3 ≤ f (x) ≤ a/3, temos obviamente (8).
Considere agora
f − ϕ1 : F → [−2a/3, 2a/3].
−2a
Com o mesmo raciocı́nio, definimos F2 = {x ∈ F ; f (x) − ϕ1 (x) ≤ 9 } e G2 = {x ∈ F ; f (x) − ϕ1 (x) ≥
2a
9 } e encontramos ϕ2 : X → R tal que
1 2a
|ϕ2 (x)| ≤
3 3
para todo x ∈ X e
2a 2a 2 2a
|f (x) − ϕ1 (x) − ϕ2 (x)| ≤ − =
3 9 3 3
para todo x ∈ F .
Prosseguindo assim, encontramos ϕn : X → R tal que
µ ¶n−1
1 2
(9) |ϕn (x)| ≤ a
3 3
para todo x ∈ X e
¯ ¯
¯ n ¯ µ ¶n
¯ X ¯
¯f (x) − ϕ (x) ¯≤ 2 a
¯ j ¯ 3
¯ j=1 ¯
∞
X ∞
X
para todo x ∈ F . Seja ϕ(x) = ϕj (x) (existe pois |ϕj (x)| < ∞).
j=1 j=1
n
X ¡ ¢
1 2 n−1
Note que a imagem de ϕ está de fato no conjunto [−a, a], pois 3 3 a = a. Para provar que
j=1
ϕ é a extensão desejada, resta provar que ϕ é contı́nua.
Seja x0 ∈ X e ε > 0. Escolha N > 0 tal que
X∞ µ ¶n
2 ε
a< .
3 2
n=N +1
é fechado em X e f : A ∪ B → [0, 1] dada por f (A) = {0} e f (B) = {1} é contı́nua (verifique!).
Podemos então estender f ao conjunto X. Pelo Lema de Urysohn, segue que X é normal. ¤
TOPOLOGIA- PERÍODO 2005.1 41
De fato, ³[ ´ [
X − A = X − Cλ0 ⊂ X ∗ − Cλ0 ⊂ Cλ − Cλ0 ⊂ Cλ .
λ6=λ0
Logo, para sermos bastante precisos, como não sabemos a priori se algum dos Cλ contém {ω},
podemos fazer
42 DANIEL PELLEGRINO
[
X −A⊂ (Cλ − {ω})
λ6=λ0
e, como cada Cλ − {ω} é um aberto de X, temos que o fato de ser X − A compacto, garante que temos
uma subcobertura finita
X − A ⊂ (Cλ1 − {ω}) ∪ ... ∪ (Cλn − {ω})
Logo
X − A ⊂ Cλ1 ∪ ... ∪ Cλn
e
X ∗ = Cλ0 ∪ Cλ1 ∪ ... ∪ Cλn
e finalmente concluı́mos que X ∗ é compacto.
A demonstração de que Ψ−1 (X) é denso em X ∗ é fácil e fica como exercı́cio.
Finalmente, resta-nos provar que X ∗ é um espaço de Hausdorff. Sejam x, y ∈ X ∗ . Se forem ambos
diferentes de ω, como X é Hausdorff, existem abertos de X que separam x e y. Como os abertos
de X também são abertos de X ∗ , segue que x, y podem ser separados por abertos disjuntos de X ∗ .
Provemos agora que x ∈ X pode ser separado de ω por abertos disjuntos. Como X é localmente
compacto, existe A aberto em X com x ∈ A e A compacto. Assim (X − A) ∪ {ω} é uma vizinhança
aberta de ω, disjunta de A.¤
TOPOLOGIA- PERÍODO 2005.1 43
com If = I para cada f . O seguinte resultado garante que o “cubo” I C(X;I) é um espaço de Hausdorff.
Q
Proposição 21.9. O produto cartesiano X = Xλ é um espaço de Hausdorff se, e somente se, cada
fator Xλ é um espaço de Hausdorff.
Demonstração. Suponha inicialmente que cada Xλ é um espaço de Hausdorff. Para x,y distintos em
X, existe um λ0 tal que xλ0 6= yλ0 . Sejam U e V vizinhanças disjuntas de xλ0 e yλ0 , respectivamente,
em Xλ0 . Então πλ−10
(U ) e πλ−1
0
(V ) são vizinhanças de x e y em X, com interseção vazia. Portanto, X
é um espaço de Hausdorff.
Reciprocamente, suponha que X é um espaço de Haudorff. Dado qualquer ı́ndice λ0 , escolha (aλ )
em X e considere
F = {x ∈ X; xλ = aλ para todo λ 6= λ0 }.
A projeção πλ0 : X → Xλ0 é tal que F é homeomorfo a πλ0 (F ) = Xλ0 Como F é Hausdorff (pois é
subespaço de um espaço de Hausdorff), segue que Xλ0 é Hausdorff.¤
1.
a) Defina compactificação.
b) Se X é um espaço topológico, não compacto, mas localmente compacto e de Hausdorff, como se
faz a compactificação de Alexandrov de X? Defina pelo menos o conjunto e seus abertos.
c) Escreva o que você sabe sobre a compactificação de Stone-Cech.
2. Enuncie o Teorema da Extensão de Tietze. O que você sabe dizer sobre uma possı́vel unicidade
de extensão...?
3. Mostre que função contı́nua leva compactos em compactos e que compacidade é uma propriedade
topológica.
Y
4. Mostre que X = Xλ é Hausdorff se, e somente se, cada Xλ é Hausdorff.
λ∈Λ
5. Exiba um espaço topológico X que não é Hausdorff, mas todo compacto em X é fechado.
Justifique o que afirmar.
TOPOLOGIA- PERÍODO 2005.1 47
23.2. Topologia compacto-aberta. Como já dissemos antes, na topologia da convergência pontual,
a estrutura topológica de X (se existir) é irrelevante. Se X e Y são espaços topológicos, a topologia
compacto-aberta, que definiremos a seguir, levará em conta a topologia de X:
23.3. Topologia da convergência uniforme. A topologia da convergência uniforme pode ser estu-
dada em contextos mais gerais, assim como as topologias compacto-aberta e da convergência pontual.
Entretanto, para não termos que introduzir vários novos conceitos abstratos, nos restringiremos ao
estudo da topologia da convergência uniforme em famı́lias F da forma F ⊂ Y J , onde Y é um espaço
métrico e J é um conjunto qualquer, não-vazio.
Definição 23.4. Sejam (Y, d) um espaço métrico e d(a, b) = min{d(a, b), 1}. Dado um conjunto J, a
métrica em Y J dada por
ρ(f, g) = sup{d(f (α), g(α)); α ∈ J}
é chamada métrica uniforme em Y J , correspondente à métrica d em Y.
para quaisquer n,m. Assim, (fn (α))∞n=1 é uma sequência de Cauchy em (Y, d), e portanto converge.
Digamos que o limite da sequência (fn (α))∞ n=1 seja yα . Defina f : J → Y como sendo a função
f (α) = yα . Vamos mostrar que a sequência fn converge para f em ρ.
Dado ε > 0, escolha N suficientemente grande, de modo que ρ(fn , fm ) < ε/2 sempre que n, m ≥ N.
Em particular, temos
d(fn (α), fm (α)) < ε/2
para n, m ≥ N e α ∈ J. Deixando n ≥ N e α fixos e fazendo m crescer, temos que
d(fn (α), f (α)) ≤ ε/2.
Concluı́mos que se n ≥ N, então
sup{d(fn (α), f (α)); α ∈ J} ≤ ε/2
e
ρ(fn , f ) ≤ ε/2 < ε.
¤
Teorema 23.6. Sejam X um espaço topológico e (Y, d) um espaço métrico. O conjunto C(X, Y )
formado pelas funções contı́nuas de X em Y é fechado em Y X na métrica uniforme. Em particular,
se Y é completo, C(X, Y ) é completo na métrica uniforme.
Demonstração. Seja (fn ) uma sequência em Y X , que converge para f . Dado ε > 0, escolha um
inteiro N tal que
ρ(fn , f ) < ε
para todo n ≥ N . Então, para todo x em X e n ≥ N ,
d(fn (x), f (x)) ≤ ρ(fn , f ) < ε
e (fn ) converge uniformemente para f .
Agora, mostraremos que C(X, Y ) é fechado em Y X relativamente à métrica ρ. Seja (fn ) uma
sequência em C(X, Y ) que converge para um certo f ∈ Y X . Como (fn ) converge uniformemente para
f , e como cada fn é contı́nua, segue que f é contı́nua (Exercı́cio abaixo). ¤
Exercı́cio 23.8. Seja (Y, d) um espaço métrico. Dado um conjunto J tal que para cada par de funções
f e g em Y J , temos
ρ(f, g) = sup{d(f (α), g(α)); α ∈ J} < ∞.
A aplicação ρ é uma métrica, chamada métrica do sup. Mostre que nessas circunstâncias,
ρ(f, g) = min{ρ(f, g), 1}.
TOPOLOGIA- PERÍODO 2005.1 49
Definição 23.9. Sejam (Y, d) um espaço métrico e X um espaço topológico. Dados um elemento f
de Y X , ε > 0 e K compacto em X, seja
BK (f, ε) = {g ∈ Y X ; sup{d(f (x), g(x)); x ∈ K} < ε}.
A topologia em Y X para a qual os conjuntos BK (f, ε) formam uma base é chamada topologia da con-
Se A é compacto e V é um aberto contendo A, mostraremos que existe um certo ε tal que U(A, ε) ⊂ V.
Para cada a ∈ A ⊂ V , escolha δ(a) > 0 tal que Bd (a, δ(a)) ⊂ V. Como A é compacto, podemos
cobrı́-lo com uma quantidade finita de abertos da forma
1 1
Bd (a1 , δ(a1 )), ..., Bd (an , δ(an )).
2 2
Se ε = min{ 12 δ(ai ), i = 1, ..., n}, é claro que a está em algum dos conjuntos da forma Bd (ai , 12 δ(ai )).
Por conseguinte, temos
Bd (a, ε) ⊂ Bd (ai , δ(ai )).
De fato, como d(x, ai ) ≤ d(x, a)+d(a, ai ), temos que se x ∈ Bd (a, ε), então d(x, ai ) < ε+ 12 δ(ai ) ≤ δ(ai ).
[
Como isso vale para cada a em A, segue que U(A, ε) = Bd (a, ε) ⊂ V.
a∈A
Segundo passo. Vamos provar que a topologia da convergência compacta é mais fina que a
topologia compacto-aberta (ou seja, a topologia da convergência compacta tem mais abertos que a
topologia compacto-aberta).
Seja S(K, U ) um elemento da subbase (como em (10)) da a topologia compacto-aberta em C(X, Y )
e seja f ∈ S(K, U ). Como f é contı́nua, f (K) é compacto. Além disso, pela definição de S(K, U ),
temos que f (K) ⊂ U. Pelo primeiro passo da demonstração, existe ε > 0 tal que
[
U (f (K), ε) = Bd (a, ε) ⊂ U.
a∈f (K)
Para cada x em K, existe uma vizinhança de x, Vx , tal que f (Vx ) ⊂ Ux ⊂ Y , onde Ux é um aberto
de Y com diâmetro menor que ε.
De fato, como f é contı́nua, escolha Vx de modo que f (Vx ) ⊂ B(f (x), 4ε ). Então é claro que f (Vx ) ⊂
B(f (x), 3ε ) (verifique isso, usando o Exercı́cio 13.21!), que tem diâmetro 2ε/3.
Cubra K com uma quantidade finita de conjuntos Vx1 , ..., Vxn . Sejam Kxi = Vxi ∩ K. Então cada
Kxi é compacto e
f ∈ S(Kx1 , Ux1 ) ∩ ... ∩ S(Kxn , Uxn ).
pois f (Kxi ) ⊂ Uxi . Além disso, S(Kx1 , Ux1 ) ∩ ... ∩ S(Kxn , Uxn ) ⊂ BK (f, ε). De fato, se g ∈
24. Homotopias
Lembremos que um homeomorfismo entre espaços topológicos X e Y é uma função contı́nua f : X →
Y tal que sua inversa existe e também é contı́nua. Um dos problemas centrais da topologia é decidir
quando dois espaços topológicos são homeomorfos ou não. Às vezes é fácil verificar isso. Por exemplo,
[0, 1] e (0, 1) não são homeomorfos, pois um deles é compacto e o outro não (e a compacidade é um
invariante topológico). Entretanto, às vezes precisamos de argumentos mais finos para saber se dois
espaços topológicos são homeomorfos ou não. Nesse capı́tulo, vamos estudar uma maneira de associar
um grupo (chamado grupo fundamental) a cada espaço topológico. Dois espaços homeomorfos terão
grupos fundamentais isomorfos. Antes disso, precisamos do conceito de homotopia e de resultados
preliminares.
No que se segue, X e Y serão sempre espaços topológicos, a menos que se diga algo em contrário.
Definição 24.1. Sejam f e g funções contı́nuas de X em Y. Dizemos que f é homotópica a g (f ' g)
quando existe uma função contı́nua H : X × [0, 1] → Y tal que H(x, 0) = f (x) e H(x, 1) = g(x) para
todo x em X. A função H é chamada homotopia entre f e g. Por simplicidade, às vezes escreveremos
H : f ' g para indicar uma homotopia H entre f e g.
Exemplo 24.2. Seja X um espaço topológico qualquer e Y um subespaço convexo do Rn . Então duas
funções contı́nuas quaisquer f, g : X → Y são homotópicas, com a homotopia dada por
H(x, t) = tg(x) + (1 − t)f (x).
Teorema 24.3. ' é uma relação de equivalência no conjunto C(X, Y ) formado por todas as aplicações
contı́nuas de X em Y .
Demonstração. É claro que f ' f pela homotopia H(x, t) = f (x).
Se f, g ∈ C(X, Y ) e H : f ' g, então H 0 : g ' f com H 0 (x, t) = H(x, 1 − t).
Se f, g, h ∈ C(X, Y ), H1 : f ' g e H2 : g ' h, defina
H(x, t) = H1 (x, 2t), 0 ≤ t ≤ 1/2
H(x, t) = H2 (x, 2t − 1), 1/2 ≤ t ≤ 1.
TOPOLOGIA- PERÍODO 2005.1 51
Note que H está bem definida e é contı́nua nos subconjuntos fechados X × [0, 1/2] e X × [1/2, 1]. Como
X × [0, 1] = X × [1/2, 1] ∪ X × [0, 1/2], segue, pelo Teorema 8.7, que H é contı́nua.
Definição 24.4. As classes de equivalência em C(X, Y ) sob a relação ' são chamadas classes de
homotopia em C(X, Y ).
Teorema 24.5. Se f1 , g1 : X → Y , f2 , g2 : Y → Z, f1 ' g1 e f2 ' g2 , então f2 ◦ f1 ' g2 ◦ g1 .
Demonstração. Suponha H1 : f1 ' g1 e H2 : f2 ' g2 . Então f2 ◦ H1 : f2 ◦ f1 ' f2 ◦ g1 . Pela
transitividade da relação de homotopia, basta provar que f2 ◦ g1 e g2 ◦ g1 são homotópicos. Defina
H : X × I → Z por
H(x, t) = H2 (g1 (x), t).
temos que H é contı́nua, pois é composta de contı́nuas. Como H : f2 ◦ g1 ' g2 ◦ g1 , o resultado segue.
Definição 24.8. Dois espaços topológicos X e Y são ditos homotopicamente equivalentes (ou
ainda que X e Y têm o mesmo tipo de homotopia) quando existem funções contı́nuas f : X → Y
e g : Y → X tais que f ◦ g ' iY e g ◦ f ' iX . As aplicações f e g são ditas equivalências de
homotopia (ou equivalência homotópica) (homotopy equivalences). Dizemos que g é a inversa
homotópica de f e vice versa.
Observe que dizer que X e Y têm o mesmo tipo de homotopia é um pouco menos que dizer que
são homeomorfos: f ◦ g e g ◦ f não são necessariamente as respactivas funçoões identidade, mas sim
homotópicas às identidades iX e iY .
Note que as equivalências de homotopia definem uma relação de equivalência em qualquer conjunto
formado por espaços topológicos. De fato, X é homotopicamente equivalente a si próprio. Basta
considerar f = g = iX .
Se X é homotopicamente equivalente a Y , é claro que Y é homotopicamente equivalente a X.
Finalmente, se X é homotopicamente equivalente a Y e Y é homotopicamente equivalente a Z,
então X é homotopicamente equivalente a Z. Com efeito, sejam
f : X → Y, g : Y → X tais que f ◦ g ' iY e g ◦ f ' iX
e
f1 : Y → Z, g1 : Z → Y tais que f1 ◦ g1 ' iZ e g1 ◦ f1 ' iY .
Então f1 ◦ f : X → Z e g ◦ g1 : Z → X são tais que
(f1 ◦ f ) ◦ (g ◦ g1 ) = f1 ◦ (f ◦ g) ◦ g1 ' f1 ◦ iY ◦ g1 = f1 ◦ g1 ' iZ
e, analogamente, (g ◦ g1 ) ◦ (f1 ◦ f ) ' iX .
É claro que espaços homeomorfos são sempre homotopicamente equivalentes. Entretanto, a recı́proca
não é verdadeira, como veremos no resultado a seguir:
52 DANIEL PELLEGRINO
Concluı́mos essa seção com uma generalização do conceito de homotopia, que nos será útil adiante
Definição 24.13. Um par topológico é um par ordenado (X, A) onde A e X são espaços topológicos
e A ⊂ X. Uma aplicação f : (X, A) → (Y, B) entre pares topológicos é uma aplicação f : X → Y tal
que f (A) ⊂ B; ela é contı́nua se é contı́nua no sentido usual.
Definição 24.14. Duas aplicações contı́nuas f, g : (X, A) → (Y, B) são ditas homotópicas quando
existe uma função contı́nua H : X × I → Y tal que H(x, 0) = f (x) e H(x, 1) = g(x) para todo x em
X e tal que H(a, t) = f (a) = g(a) para todo a em A. Portanto, para que f e g sejam homotópicas,
é necessário que f e g coincidam em A. Se f e g são aplicações homotópicas definidas em (X, A),
dizemos que f é homotópica a g com relação a A, e escrevemos f ' g[A]. Dizemos que H é uma
homotopia relativa.
Dois pares (X, A) e (Y, B) são ditos homotopicamente equivalentes se existem f : (X, A) →
(Y, B) e g : (Y, B) → (X, A) tais que f ◦ g ' iY [B] e g ◦ f ' iX [A]. Nesse caso, perceba que se fA e
gB denotam as restrições de f a A e de g a B, respectivamente, temos
fA ◦ gB = iB e gB ◦ fA = iA
e consequentemente fA é um homeomorfismo entre A e B cuja inversa é gB .
Observação 24.15. A noção de homotopoa relativa têm algumas variações, e ao estudar livros dis-
tintos, devemos prestar atenção na definição exata.
Se f, g : (X, A) → (Y, B) e f ' g[A], então é claro que, em particular, f e g são homotópicas se
pensadas como aplicações usuais de X em Y . Arecı́proca pode não valer, como mostra o exemplo a
seguir:
Exemplo 24.16. Seja X um subespaço do R2 dado por
X = {(x, 0); 0 ≤ x ≤ 1} ∪ {(0, y); 0 ≤ y ≤ 1} ∪ {(1/n, y); 0 ≤ y ≤ 1, n ∈ N}
e seja A = {(0, 1)}.
TOPOLOGIA- PERÍODO 2005.1 53
Para mostrar que [f ]− é uma inversa de [f ], basta provar que [f ]− ∗ [f ] = [f ]∗ [f ]− = [e]. Para isso,
é suficiente mostrar que f − ∗ f 'x0 f ∗ f − 'x0 e. Para isso, defina
1−t
H(x, t) = f (x), 0 ≤ x ≤
2
− 1−t
= f (x + t), ≤x≤1−t
2
= x0 , 1 − t ≤ x ≤ 1.
Temos que H (está bem definida e) é contı́nua em cada um dos 3 conjuntos fechados cuja união é I × I.
Portanto,H é contı́nua, e como H(x, 0) = (f ∗ f − )(x), H(x, 1) = e(x), H(0, t) = H(1, t) = x0 , segue
que [f ]∗ [f ]− = [e]. A outra situação é análoga.¤
Para cada n, considere Fn = Sn . Temos que X − F1 é aberto e não-vazio. Assim, existem um número
real r1 > 0 e x1 ∈ X tais que
Ud (x1 , r1 ) ⊂ X − F1 .
Temos também que (X − F2 ) ∩ Ud (x1 , r1 /4) é aberto e não vazio. De fato, se essa interseção fosse
vazia, terı́amos Ud (x1 , r1 /4) ⊂ F2 , que é um absurdo, pois o interior de F2 é vazio.
Logo existem x2 ∈ X e r2 > 0, tais que
Ud (x2 , r2 ) ⊂ (X − F2 ) ∩ Ud (x1 , r1 /4).
Usando o mesmo raciocı́nio, encontramos x3 ∈ X e r3 > 0 tais que
Ud (x3 , r3 ) ⊂ (X − F3 ) ∩ Ud (x2 , r2 /4).
rn
Por indução, construimos uma sequência de bolas abertas (Ud (xn , rn ))∞
n=1 tais que rn+1 ≤ 4 e
Ud (xn+1 , rn+1 ) ⊂ (X − Fn+1 ) ∩ Ud (xn , rn /4).
rn r1
Note que, como rn+1 ≤ 4 para todo n, temos rn ≤ 4n−1 .
56 DANIEL PELLEGRINO
Referências
[1] E. L. Lima, Espaços Métricos, Projeto Euclides, IMPA, Rio de Janeiro.
[2] E. L. Lima, Análise no Rn , Projeto Euclides, IMPA, Rio de Janeiro.
[3] E. L. Lima, Elementos de Topologia Geral, LTC-IMPA, Rio de Janeiro, 1970.
[4] E.L. Lima, Grupo Fundamental e Espaços de Recobrimento, Projeto Euclides, IMPA, Rio de Janeiro, 1993.
[5] J.R. Munkres, Topology, A first Course. Prentice-Hall, Inc. New Jersey, 1975.
[6] S. Willard, General Topology, Addison-Wesley Publishing Company, 1970.
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