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CAPÍTULO 6

Seis dias
de criação

Todo verdadeiro progresso e crescimento se faz passo a passo,


numa seqüência natural de desenvolvimento. Como está registrado no
Gênesis, por exemplo, a Terra foi criada em seis dias. Cada dia foi
importante, cada coisa a seu tempo: a luz, a terra, as plantas, os animais
e, finalmente, o homem. Esse processo de desenvolvimento seqüencial
é comum a todas as formas de vida.

• Quando crianças, aprendemos a nos virar, sentar, engatinhar e,


então, a andar e correr. Cada etapa é importante, e nenhuma delas
pode ser evitada.

• Na escola, aprendemos aritmética antes da álgebra, álgebra antes


do cálculo. Simplesmente não podemos aprender cálculo até
entendermos a álgebra.

• Em construção, construímos primeiro uma boa fundação, antes


das estruturas e do acabamento.
criação
Seis ias e
Conhecemos e aceitamos este processo gradativo, nas áreas física e
intelectual, porque as coisas são vistas e as provas constantemente
fornecidas. Em outras áreas do desenvolvimento humano e da interação
social, porém, tentamos freqüentemente encurtar o processo natural
substituindo a prioridade por rapidez, inovação por imitação, caráter por
aparência, conteúdo por estilo, competência por fingimento. Podemos
estar, assim, deixando de cumprir etapas vitais para economizar tempo
e esforço, pretendendo, ainda assim, colher as recompensas desejadas.
Vã esperança... Não há atalhos no desenvolvimento da habilidade
profissional, de talentos, como a oratória ou música, de nossa mente ou
caráter. Em tudo na vida há estágios ou processos de crescimento e
desenvolvimento, e o conceito dos seis dias da criação se aplica a todos.
O que acontece, por .exemplo, se uma pessoa tenta saltar etapas vo
processo diário de desenvolvimento de suas habilidades no jogo de
tenis? Caso se trate de um tenista médio — no estágio correspondente ao
terceiro dia — que decida jogar como se estivesse no sexto dia só para
impressionar, o que acontecerá? Ou o que aconteceria se você, um
pianista ao nível do segundo dia, tentasse fazer seus amigos acreditarem
estar ao nível do sexto dia? Se você é um jogador de golfe de nível
equivalente ao terceiro dia e compete com alguém cujo nível equivale ao
quinto dia, bastaria o pensamento positivo para vencê-lo?
As respostas são evidentes. E simplesmente impossível violar,
ignorar ou encurtar esse processo de desenvolvimento; isso contraria a
natureza, e qualquer tentativa de encurtar esse processo resulta em
confusão e frustração. Se estou no nível do segundo dia em qualquer
área, e pretendo passar para o quinto dia preciso passar antes pelo
terceiro. Não há pontes, atalhos ou mistificação, nenhum fingimento
compensará a falta de capacidade e julgamento.
O progresso envolve a aceitação do fato de que estou no segundo dia e
um recurso é fingir que estou em qualquer outro estágio.
Se os alunos não deixarem que o professor perceba em que nível
estão, seja fazendo perguntas ou revelando sua ignorância, não
conseguirão aprender ou crescer. Não se pode fingir por muito tempo;
um dia, se é apanhado. A admissão da ignorância pode ser o primeiro
passo em nossa educação.
LIDERANÇA BASEADA EM
62 PRINCÍP

CRESCIMENTO INTERNO
Agora, em vez de considerar o crescimento em conhecimento e
habil de, observemos o crescimento interno de um indivíduo.
Suponhar. por exemplo, que uma determinada pessoa esteja
intelectualmente quinto dia, mas emocionalmente no segundo dia.
Tudo vai bem quan( sol brilha e as coisas dão certo. Mas, o que
acontece quando se jun cansaço, problemas conjugais, pressão
económica, adolescentes re des, crianças barulhentas e um telefone
que toca sem parar?
A pessoa emocionalmente imatura pode ficar completamente
escr zada a emoções como raiva, impaciência e crítica. Ainda que,
em públ quando tudo vai bem, seja impossível detectar essa
deficiência inte essa imaturidade.
Um curto-circuito no processo de desenvolvimento na tural nem
st pre é evidente nas áreas emocional, social e espiritual. Podemos
"fE pose", fingir e até por um dia dar credibilidade a nossas posições.
Pc mos enganar até a nós mesmos. No entanto, a maioria de nós
conhec realidade interna, da mesma forma que os que vivem ou
trabalham a r. sa volta.
Para um bom relacionamento com colegas, cônjuge ou filhos é pri . so
força emocional, pois devemos aprender a ouvir. Ouvir envolve ciência,
disponibilidade e vontade de entender. Estando abertos para is corremos
o risco de mudar, de sermos influenciados, mas, se tiverr certeza de
nossas opiniões, não vamos querer mudar. Achamos mais f; fechar o
canal de comunicação, mandar e ditar. E mais fácil operar n nível
emocional correspondente ao segundo dia, dando conselhos con
pondentes ao sexto dia.

POSSUIR VEM ANTES DE DAR


Certa vez, tentei ensinar a minha filha a importância de compartill:
numa fase em que ela ainda não estava pronta para isso. Na verdade,
eu tava tentando fazê-la saltar do segundo para o quinto dia.
Era o dia do terceiro aniversário de minha filha e, ao chegar em
c para a festa, encontrei-a num canto da sala agarrada a todos os
Seis ias e
present sem querer deixar que as outras crianças brincassem com
eles. Eu p
c r 1 ação

cebia a presença de vários parentes testemunhando aquela exibição de


egoísmo e me sentia embaraçado, pois, sendo professor da área de
relações humanas, sabia que esperavam mais de mim e de meus filhos.
A atmosfera da sala estava carregada, com as crianças gritandocom as
mãos estendidas em volta de minha filha, pedindo para brincar com os
presentes que tinham acabado de dar; e, é claro, minha filha se recusava
terminantemente a repartir qualquer coisa. Eu disse a mim mesmo:
"Certamente, eu deveria ensinar minha filha a partilhar. Essa é uma de
minhas crenças fundamentais. "
Assim, resolvi tentar. Meu primeiro método foi simplesmente pedir:
Querida, você poderia, por favor, dividir com seus amigos os
brinquedos que eles lhe deram?
Não — ela respondeu secamente.
Meu segundo método foi argumentar:
— Querida, se você dividir seus brinquedos com eles em sua casa,
quando for à casa deles, eles também dividirão com você. Não — ela
tornou a responder.
Eu estava ficando cada vez mais sem graça, pois era evidente que não
tinha a menor influência sobre ela. Meu terceiro método foi subornar:
Querida, se emprestar os brinquedos, tenho uma surpresa especial
para você: chicletes.
— Não quero chicletes! — explodiu ela.
Agora, eu estava ficando zangado. Meu quarto método foi ameaçar:
Se você não emprestar, vai ficar de castigo!
Não ligo. São meus. Eu não tenho que emprestar.
O último método foi forçar. Simplesmente peguei alguns brinquedos
e distribuí entre as outras crianças.
Pronto, crianças. Brinquem.
Talvez minha filha precisasse da experiência de possuir as coisas
antes de dá-las; não se pode dar uma coisa que não se possui. Naquele
momento, porém, eu estava mais preocupado com a opinião dos parentes
que com o crescimento e desenvolvimento da minha filha e com nosso
relacionamento. Eu havia feito umjulgamento inicial correto — ela deve
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dividir e achava que estava errada em não fazê-lo. Baseado nesse
julgamento, fui tentando manipular sua vontade, até que, por fim, a forcei.
LIDERANÇA BASEADA EM

PRINCÍPIOS

Ela estava no segundo dia, e eu esperava que estivesse no quinto,


simplesmente porque, em minha própria escala, emocionalmente eu
estava no segundo dia. Não fui capaz ou não quis mostrar paciência e
compreensão, mas queria que ela mostrasse! Se eu tivesse mais
maturidade, teria deixado que minha filha escolhesse entre emprestar os
brinquedos ou não; talvez, após argumentar, pudesse ter tentado chamar
a atenção das crianças para algum jogo interessante, retirando de sobre
ela toda a pressão emocional. A partir daí aprendi que, uma vez
alcançado o verdadeiro sentido de posse, uma criança reparte o que é
seu de maneira natural, livre e espontânea.
Há momentos certos de ensinar e treinar, e momentos de não ensinar.
Quando o relacionamento está tenso e carregado de emoção, tenta tivas
de ensinar e treinar são, geralmente, percebidas como uma forma de
julgamento e rejeição. Uma melhor abordagem é ficar a sós com a
pessoa e discutir o assunto em particular. Novamente, porém, isso exige
paciência e controle interno, ou seja, maturidade emocional.

BUSCAR FORÇA FORA DE Nós MESMOS


GERA FRAQUEZA
Além dos pais, muitos patrões, líderes e outras pessoas em posição de
au toridade podem ser competentes, bem informadas e talentosas (no
sexto dia) mas emocional e espiritualmente imaturas (no segundo dia).
Essas pessoas podem tentar compensar sua deficiência, ou falha,
buscando a força em sua posição ou autoridade.
Como as pessoas imaturas reagem às pressões? Como reage o chefe
quando seus subordinados não fazem as coisas a seu modo? E o
professor, quando os alunos contrariam seu ponto de vista?
Como um pai imaturo trata a filha adolescente, quando ela o
interrompe com seus problemas? Como esse pai disciplina uma criança
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inoportuna? Como lida com uma diferença de opinião com sua esposa
sobre um tema explosivo? Como enfrenta os desafios no trabalho?
Uma pessoa emocionalmente imatura tende a obter força de sua
posicão, tamanho, força, experiência, intelecto ou emoção para mascarar
um desequilíbrio no caráter. E quais são as conseqüências? Essa pessoa
poderá desenvolver fraqueza em três áreas:
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cl criação

Primeiro, ela gera fraqueza em si mesma.


Buscar força na posição ou autoridade reforça a
dependência de fatores externos para se
conseguir outras coisas no futuro.
Segundo, gerafraqueza em outras pessoas. Os
outros aprendem a agir ou reagir em função de
medo ou acomodação, mascarando, assim, seu
raciocínio, liberdade, crescimento e disciplina
interna.
Terceiro, gera fraqueza nos relacionamentos.
O relacionamento torna-se tenso. O medo
substitui a cooperação, e cada uma das pessoas
envolvidas fica um pouco mais arbitrária,
agitada e defensiva.
Para vencer uma discussão, a pessoa
emocionalmente imatura usa sua força e
habilidade para encurralar a outra, e, mesmo que
ganhe, perde. Todos perdem. Sua força é sua
fraqueza.
Na verdade, sempre que retiramos força de nossos
bens materiais, po- sição, aparência, grupo
social, símbolos de status ou sucessos, o que
acontece quando essas coisas mudam ou as perdemos?
Certamente ficamos enredados na fraqueza que
desenvolvemos em nós mesmos, em nossos
relacionamentos e nos outros. Quem tem esse
hábito acaba perdendo a influência sobre aqueles
que mais deseja impressionar: seus filhos podem
sentir-se diminuídos, oprimidos e
desvalorizados, sem o sentido de identidade e
individualidade; seus companheiros de trabalho
podem rebelar-se e tomar atitudes contrárias,
geralmente em relação às coisas que mais lhe são
caras.
LIDERANÇA BASEADA EM
De que fontes, então, podemos retirar força
sem gerar fraqueza? Apenas das fontes que geram
a capacidade interna de lidar com o que a
situacão exigir. Por exemplo: um cirurgião
retira força de sua habilidade e conhecimento;
um corredor, de seu corpo disciplinado, pernas
fortes e pulmões possantes.
Em outras palavras, devemos perguntar: o que
a situação exige? Que tipo de força, habilidade,
conhecimento, atitude? Obviamente, os bens
materiais, a aparencia ou as credenciais do
cirurgião e do atleta são apenas símbolos, e nada
valem sem a essência.

IMPLICAÇÕES PARA O CRESCIMENTO PESSOAL


Vejo seis implicações importantes no processo de
desenvolvimento "de Seis Dias":
PRINCÍPIOS

• Crescimento é um processo natural — você colhe o que semeia:


álgebra antes de cálculo; engatinhar antes de andar.
• Cada um de nós está num "dia" diferente (níveis de
crescimento) nas áreas física, social, emocional, intelectual e
espiritual. Se estou num nível diferente do seu, pode ser que eu
precise trabalhar coisas que você já superou e vice-versa; seu
quarto dia pode ser meu segundo.

• Comparações são perigosas. Comparações geram insegurança,


embora as façamos freqüentemente em relação a nossos filhos,
colegas de trabalho e outros. Se nosso sentido de valor e segurança
pessoal provém de tais comparações, quão inseguros e ansiosos
seremos, sentindo superioridade agora e inferioridade daqui a
pouco. Opi niões, modismos e costumes são coisas instáveis,
estão sempre mu dando, e segurança interna simplesmente
não vem de fora. Buscar força em qualquer fonte que não
fortaleça internamente enfraquece a pessoa. Ademais, as
comparações e a busca de força em fontes ex ternas, se por um lado
geram complacência e vaidade, por outro ge ram desencorajamento
e baixa na auto-estima, além de estimular as pessoas a procurar
soluções fáceis, a serem guiadas pelas opiniões alheias, viver de
aparências e buscar mais força em fontes externas. E melhor nos
compararmos apenas a nós mesmos. Não podemos fundamentar
nossa felicidade no progresso dos outros, mas apenas no
nosso. Devemos comparar as pessoas com seu próprio potencial,
apontando-o constantemente, bem como seus esforços para explorá-
lo plenamente. Em vez de comparar uma pessoa com outra e
condicionar nosso amor ou punição ao resultado, devemos
perguntar — o que ele está fazendo com o que já conseguiu?
Não há soluçõesfáceis. Se estou no segundo dia (para continuar
com a metáfora), e desejo chegar ao sexto, devo passar pelo
terceiro, quarto e quinto. Não adianta tentar fingir estar no sexto
dia, para im pressionar os outros, porque acabarei sendo
descoberto. Tentar ser tudo para todos resulta na perda do respeito
de cada um, até de si mesmo. Se algumas pessoas estão no terceiro
dia, é inútil e cruel comparar e criticá-las por não estarem no quinto
ou sexto. Simples mente não há soluções fáceis.
Pe. S'áZiro Cavalcante Dautaa
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' Para melhorar, devemos partir de onde estamos, não de onde


deveríamos estar, de onde alguém está ou de onde os outros
pensam que estamos. Se fizermos um progresso a cada dia, serão
trinta no fim do mês. Do mesmo modo, em qualquer área do
aperfeiçoamento, devemos ir exercitando a cada vez um pouco
mais de paciência, com- preensão, coragem, elevando
gradualmente nossa capacidade através de disciplina e esforços
diários.
Em minha opinião, o primeiro e o segundo dias, para a maioria de
nós, envolve maior controle sobre o corpo — deitar e levantar cedo,
LIDERANÇA BASEADA EM
fazer exercicios regularmente, comer com moderação, ficar no
trabalho quando necessário apesar do cansaço e assim por diante.
Muitos tentam atacar os problemas do quarto, quinto e sexto dias,
como adiamentos sucessivos, impaciência ou orgulho, enquanto ainda
escravos de seus apetites. Se não formos capazes de controlar o corpo
e seus apetites, como poderemos controlar nossa língua ou vencer
paixões e emoções como inveja, ciúme ou ódio? Muitos aspiram aos
frutos do quinto e sexto dias (amor, espiritualidade, sabedoria na
tomada de decisões) sem ter tido a força de obedecer às leis do
primeiro dia (dominar apetites e paixões).
• A introspecção nos dá a compreensão precisa de nossafraqueza
e aforÇa para superá-la. Muitos não sabem por onde começar,
simplesmente por desconhecer o que vem antes ou depois. O
padrão e o processo de outra pessoa podem ser diferentes dos
nossos. O quinto dia do outro pode ser nosso segundo dia. Num
momento, podemos estar no quarto dia, e no outro, no primeiro
dia, ainda que em relação ao mesmo assunto. As vezes, é preciso
trabalhar em cada nível simultaneamente.
A chave do nosso crescimento e desenvolvimento, porém, é
sempre começar do ponto em que se está, do primeiro dia.

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