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Pós-Graduação Lato Sensu

◊ DOCÊNCIA E GESTÃO DO ENSINO SUPERIOR

MÓDULO:
* GESTÃO DA CARREIRA ACADÊMICA

PROF.Ms. ANA PAULA GOMES

Local: CACERES/MT

10,11-11-2012
ATRATIVIDADE DA CARREIRA
DOCENTE NO BRASIL1

1. INTRODUÇÃO
Este texto traz os resultados de uma pesquisa que teve por objetivo
investigar a

atratividade da carreira docente no Brasil sob a ótica de alunos concluintes do

ensinomédio.Tem aumentado nos anos mais recentes a preocupação com a


questão da diminuiçãoda procura, por parte dos jovens, pela profissão de

professor. A falta de professores bemformados nos diferentes níveis de ensino


e, especialmente, no Brasil, a escassez deprofissionais para algumas áreas

disciplinares dos últimos anos do Ensino Fundamental eEnsino Médio vem

sendo objeto de discussão tanto em artigos acadêmicos como na mídia.


Em 2007, o Conselho Nacional de Educação designou uma comissão
interna para realizarum estudo sobre o Ensino Médio e a falta de professores

qualificados em algumas áreas doconhecimento. O resultado foi divulgado, em

forma de relatório, sob o título: “Escassez deprofessores no ensino médio:


propostas estruturais e emergenciais”. Esse relatórioapresenta um conjunto de
dados oriundos de diferentes fontes que retrata a falta deprofessores para o

ensino médio em diferentes áreas e destaca que a atual situação dacarreira

docente contribui para que um número cada vez menor de jovens procure
ingressarnos cursos de licenciatura.
Em outubro de 2008, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e
aOrganização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO),

empronunciamento conjunto por ocasião do Dia Internacional do Professor,


revelarampreocupação com a valorização do magistério e com a falta de

interesse dos jovens por essaprofissão. Tem sido divulgada não só a queda na
demanda pelas licenciaturas e no númerode formandos, mas também a
1
Este texto traz os resultados de uma pesquisa que teve por objetivo investigar a atratividade da
carreira docente no Brasil sob a ótica de alunos concluintes do ensinomédio. Fundação Carlos
Chagas. Relatório Preliminar. São Paulo, SP Outubro de 2009.
mudança de perfil do público que busca a docência. Esseconjunto de pesquisas

e artigos discute a necessidade de tornar a carreira de professormais atrativa.


(GATTI et al, 2008; GATTI E BARRETTO, 2009)Estudo da Organização para
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE,2005, 2006) retrata as

dificuldades de vários países em atrair professores qualificados, sejapara novos

postos, seja para substituir os professores que vão se aposentar na


próximadécada.
Esse texto é resultante de um projeto colaborativo desenvolvido para

auxiliar os

governos a conceber e implementar políticas para melhorar o ensino e a

aprendizagem nasescolas, em que se investigou e discutiu maneiras de


promover o fortalecimento e
reestruturação da carreira docente. Os vários países que participaram do

projetopartilhavam um interesse comum: como tornar a formação de

professores e o ensinointeressantes aos pretendentes? Como a formação inicial


e continuada de professores deveser desenvolvida para manter professores
qualificados na profissão? Mesmo os países quenão registravam problemas de

escassez de docentes manifestavam preocupação em atrairbons profissionais. A

Finlândia, por exemplo, país que se destaca pelos excelentesresultados no


sistema educativo e onde a profissão docente é valorizada pela sociedade,tem
se preocupado em tornar a carreira docente mais atrativa.
ZengXiaodong, professor da Beijing Normal University, em entrevista

publicada naTeacherEducationQuarterly (agosto, 2008), coloca que o desafio da


China é conseguiratrair professores com maior qualificação, especialmente para

regiões fora das grandescidades. Segundo ele, a motivação para essa carreira
não é simples, inclusive por questõessalariais, uma vez que parte do salário dos

docentes depende de fundos que a própriaescola precisa conseguir, e elas têm


condições diferentes de levantar fundos, conforme asregiões em que se situam.
Isto interfere nas propostas de carreira e salário locais e naatração de docentes

mais qualificados.
Diante desse cenário em que a docência vem deixando de ser uma opção
profissionalprocurada pelos jovens, é necessário considerar o problema e

discutir que fatoresinterferem nesse posicionamento, ou seja, porque tem

decrescido a demanda pelascarreiras docentes, especialmente na educação


básica. A questão é importante porque odesenvolvimento social e econômico
depende da qualidade da escolarização básica, maisainda na emergência da

chamada sociedade do conhecimento. Depende, portanto, dosprofessores no

seu trabalho com as crianças e jovens nas escolas.

1. A atratividade da carreira docente

Para tratar da temática - A atratividade da carreira docente – optou-se,


numprimeiro momento, por levantar na literatura os fatores ligados à

atratividade das diversascarreiras profissionais e, posteriormente, aqueles


relacionados especificamente à carreiradocente como opção profissional. Como

muitos países estão preocupados com a questão etambém com o

envelhecimento da força de trabalho docente e a necessidade de atrairnovos

professores, considerou-se relevante apresentar, mesmo que sucintamente, o

quetem sido feito em alguns países para atrair, formar e manter bons
professores nas escolas.
1.1. Fatores ligados à atratividade das carreiras profissionais

Discutir os fatores ligados à atratividade das carreiras profissionais em


geral exigeconsiderar as mudanças em processo no mundo do trabalho, nas
tecnologias, nos contextospolítico, econômico, cultural e social. Desde a década

de 1980 a sociedade vem passandopor transformações que alteraram as formas

e as relações de trabalho nos diversos camposprofissionais. Vive-se uma


conjuntura histórica permeada por um cenário de relações sociaise de trabalho
complexo e contraditório que tem introduzido uma nova compreensão

decarreira e de desenvolvimento profissional.


A palavra carreira tem origem no latim medieval via a palavra carraria,
quesignificava “estrada rústica para carros”. A partir desse sentido inicial de

“estrada”,simbolicamente passou, a partir do século XIX, a ser utilizada tal qual a

conhecemos hoje:como trajetória da vida profissional, um ofício, uma profissão


que apresenta etapas, umaprogressão. Cabe destacar que se trata de um
conceito em evolução. As carreirasprofissionais, nas últimas décadas, em

decorrência das mudanças sociais, vêm também secaracterizando pela

instabilidade, descontinuidade e horizontalidade, em contraposição aomodelo

de anos anteriores em que eram marcadas por relativa estabilidade e


progressãolinear vertical, com existência de certa estabilidade num emprego e
tipo de atividade(CHANLAT, 1995).

A noção de trabalho analisada no atual contexto, segundo Dubar

(2006),está em plena transformação. O trabalho, não importa qual, tornou-se


um desafio para oreconhecimento de si, um tempo de incerteza e grande
implicação social, que tem exigidoum investimento pessoal cada vez

maior.Assim, quanto aos fatores ligados à atratividade das carreiras

profissionais, énecessário considerar as transformações que vêm ocorrendo no


mundo do trabalho e dascarreiras, que envolvem aspectos de natureza objetiva
e subjetiva.
Do ponto de vistaobjetivo, têm-se as condições históricas, sociais e

materiais dadas. Os empregos estáveis eremunerados, por exemplo, estão


sendo substituídos por formas mais flexíveis de contratos(Levenfus e Nunes,

2002) que não garantem a estabilidade do empregado a longo prazo.Na


perspectiva subjetiva, deve ser analisado o modo como os indivíduos percebem

ascarreiras e a si próprios no contexto do trabalho. Deve-se levar em conta que


os contextossociais em transformação interferem nas relações entre o indivíduo
e o social, e, destemodo, nas identidades sociais e profissionais.
Assim, o processo de escolha profissional e a inserção no mundo do

trabalho são
cada vez mais intrincados, geram dilemas, o que significa que as possibilidades
de escolhaprofissional não estão relacionadas somente às características

pessoais, mas principalmenteao contexto histórico e ao ambiente sociocultural

em que o jovem vive. No Brasil, porexemplo, observa-se a procura crescente


pelas carreiras do serviço público nas quais, umavez o candidato admitido por
concurso tem a estabilidade nesse serviço garantida por lei.

É preciso ponderar que os aspectos que envolvem uma profissão e sua

valorizaçãonão são universais no seu significado. Profissão é uma palavra de

construção social(Popkewitz, 1995) que remete às questões socioeconômicas e


culturais de um país em umdado momento, o que afeta as opções profissionais
e torna relevante analisar arepresentação social das profissões. Mudanças no

mercado de trabalho e a sua relação coma formação profissional exigida, e

representações sociais das profissões, associadas a statuse salário, são fatores


que certamente influenciam a atratividade para a escolha entre asdiferentes
áreas de trabalho.

Mesmo considerando as múltiplas possibilidades de escolha profissional,

quando seanalisa com o jovem as viabilidades, as contextualizações, as


realidades e suas prioridades,a escolha torna-se limitada. Lisboa (2002) explica
que são limitações que vão além dasituação da profissão frente ao mercado de
trabalho no presente e no futuro. O que oindivíduo escolhe é “[...] limitado por

objetivos que vão, desde as expectativas familiares,até o que existe de mais


viável dentro da sua realidade, sendo, muitas vezes, atécontraditório com seus

desejos e possibilidades pessoais” (p. 44). O aspecto salarial,


embora seja fator forte quando há possibilidade de escolha, não cerca todas as

questões
que envolvem a atratividade de uma profissão.
Outros elementos, tanto de ordem individualcomo contextual, também

compõem a motivação, interesses e expectativas, interferindonas escolhas de


trabalho. Muitas vezes até, não há escolha apriorística, mas, inserção
poroportunidades pontuais.

Assim, o projeto profissional é resultado de fatores extrínsecos e

intrínsecos, que secombinam e interagem de diferentes formas, ou seja, o


jovem, tendo em vista suascircunstâncias de vida, é envolvido por aspectos
situacionais e de sua formação, e, outros,como as perspectivas de

empregabilidade, renda, taxa de retorno, status associado àcarreira ou vocação,

bem como identificação, autoconceito, interesses, habilidades,maturidade,

valores, traços de personalidade e expectativas com relação ao futuro.


1.2. Fatores ligados à atratividade da carreira docente
A opção específica pelo magistério também está inserida no contexto

acimacolocado. Como explica Valle (2006), repousa sobre algumas lógicas,

relacionadas com asrepresentações que se tem de si mesmo, dos significados


atribuídos à inserção no mundodo trabalho e, em particular, do exercício da
docência. Para analisar essa questão, a autoradesenvolveu estudo visando

compreender a lógica das escolhas profissionais distinguindo as“motivações

que influíram na decisão de professores dos anos iniciais ou que os impelem


asoutras profissões, despertando velhos sonhos e nutrindo novas ambições” (p.
179).
Aautora constatou que as motivações para o ingresso no magistério

evocadas pelosprofessores interrogados permanecem no campo dos valores


altruístas e da realizaçãopessoal, estando fortemente ancoradas na imagem de

si e na experiência cotidiana, asaber: o dom e a vocação, o amor pelas crianças,


o amor pelo outro, o amor pela profissão,o amor pelo saber e a necessidade de

conquistar logo certa autonomia financeira. Pelosestudos, ao longo de décadas,


estas motivações vem sendo a justificativa para a escolha dadocência e
permanência nela (MELLO, 1981; SILVA, ESPÓSITO E GATTI, 1994). Talvez ofato
de a grande maioria dos docentes nas redes de ensino, e dos licenciandos,

serem dosexo feminino, coloca a questão de gênero em nosso contexto social


como um dos fatoresintervenientes nessas motivações e escolha pela docência.
O desejo de desempenhar um papel na educação também aparece no

estudo de

Valle (2006) em que, os professores interrogados, na sua maioria, se vêem como


“agentede transformação social” e procuram orientar-se segundo algumas
circunstânciasconjunturais, que combinam valores de natureza intrínseca

(claramente privilegiados naslógicas de integração e de profissionalização) com

valores exógenos, estes relacionadossobretudo com o dever comunitário, o

valor social.
A autora também analisou asexpectativas dos professores diante da
possibilidade de exercer uma outra profissão everificou que, mais de dois

terços, se diziam satisfeitos e não pretendiam abandonar adocência, e um terço

estaria pronto a deixar o magistério se tivesse outra oportunidadeprofissional.


Algumas características da profissão motivaram esses professores a escolher
omagistério: o fato de ser uma profissão “adequada e desejável” às mulheres,

horáriosflexíveis, liberdade de ação na sala de aula, a estabilidade, as

perspectivas que proporciona(“é um mercado em expansão”), as facilidades de


acesso (baixas exigências de formação)e, principalmente, seu prestígio em
relação às ocupações manuais (com afirmações como:“o ensino ainda é
valorizado”, “os salários continuam atraentes se compararmos com

outrasprofissões”).
Também no estudo da OCDE (2005; 2006), já mencionado, verifica-se que

amotivação para tornar-se professor também aparece muito focada em fatores


intrínsecos,tal como o estudo de Valle (2006) citado acima. Na França, na

Austrália e na Bélgica, porexemplo, trabalhar com crianças, a satisfação


intelectual, o desejo de ensinar e acontribuição para a sociedade mostraram-se
fatores de motivação que levaram as pessoas aoptarem pela docência. Por
outro lado, esse mesmo estudo e vários outros, levantam oproblema da

dificuldade atual em atrair jovens para a docência, mesmo que os que nela
jáingressaram mostrem o peso dos valores acima enunciados para sua escolha.
Isto podeestar sinalizando mudança de valores para a escolha

profissional associada a mudanças nomundo do trabalho e suas

condições.Deste modo, é importante que as discussões sobre a atratividade da


carreiradocente, considerem as fortes contradições evidenciadas pelas
pesquisas relativas ao “estarprofessor”, que oscilam entre satisfações e

frustrações, entre opção e necessidade. Em quepese que nessa carreira, os que

nela estão tenham justificativas para tanto, quer denatureza pessoal (amor por

esse trabalho, pelas crianças, horário conveniente) e quer social(contribuir para


o avanço social das comunidades), atualmente observa-se que a procura
por ela vem, tendencialmente, diminuindo.

A literatura disponível na área da formação de professores tem analisado

questõesque, direta ou indiretamente, mantêm relação com a discussão sobre a


atratividade dacarreira docente, como por exemplo: a massificação do ensino, a
feminização nomagistério, as transformações sociais, as condições de trabalho,

o baixo salário, a formaçãodocente, as políticas de formação, a precarização e a

flexibilização do trabalho docente, aviolência nas escolas, a emergência de


outros tipos de trabalho com horários parciais.
O aspecto que merece destaque diz respeito ao aumento das exigências
em relação àatividade docente na atualidade. O trabalho do professor está cada

vez mais complexo etem exigido uma responsabilidade cada vez maior. As
demandas contemporâneasestabelecem uma nova dinâmica no cotidiano das

instituições de ensino que refletediretamente sobre o trabalho dos professores


e sua profissionalidade. Autores como Fanfani(2007a), Dussel (2006) e Tedesco

(2006) discutem como as mudanças em diversos setoresda sociedade têm


contribuído significativamente para a crise da identidade dostrabalhadores da
educação e a consequente atratividade da profissão.Como explica Fanfani
(2007a), a sociedade espera mais do que a escola podeproduzir, ou seja, existe

uma distância entre a imagem ideal da função docente e arealidade relacional e


temporal da sua prática. No cotidiano da escola o professor, paradesenvolver
sua atividade de ensinar, precisa lidar com problemas de disciplina e

violência,com a falta de interesse dos alunos, com a necessidade de trabalhar

com um número maiorde alunos e de desenvolver sua tarefa educativa na e


para a diversidade.
Há ainda aintrodução das tecnologias de ensino no trabalho docente,

que produzem mudanças narelação com o conhecimento, gerando sensação de

obsolescência em muitos profissionaisda educação.

Lang (2006), num estudo sobre a construção social das identidades


profissionais dosdocentes na França, analisa o “mal estar” docente que lá tem
afetado mais de 60% dosprofessores. Segundo o autor, esse “mal estar” tem

duas características: a atividadedocente tem se tornado cada vez mais

complexa, porém o prestígio social da profissãodocente tende a diminuir; e, por


outro lado, a defasagem entre a definição ideal dadocência e a realidade em
que se desenvolve o ofício tende a aumentar, gerando umasensação de

impotência, frustração e desânimo. Para esse autor, o mal estar docente tendea

fazer parte do sentido comum para a maioria dos docentes. Segundo ele,
outraspesquisas desenvolvidas na Europa permitem generalizar estas
constatações. Essessentimentos de desconforto profissional construídos pelos
professores em exercício são

consubstanciados em representações que extravasam por comentários e


atitudes eimpactam os jovens em seu convívio cotidiano com seus professores,

bem comoextravasam para outros conjuntos sociais.


Além disso, do lado dos jovens, como a experiência que vivem na escola

pareceestar muito distante da sua realidade cotidiana - a escola muitas vezes é


“chata”,desestimulante – pode-se levantar aqui a hipótese de que essa vivência
não produza odesejo de construir uma carreira dentro desse espaço. Sem

mencionar o fato de que hoje


há uma série de profissões ou atividades mais motivadoras no momento da
escolhaprofissional. Em outras palavras, a docência pode não ser atraente não

apenas em funçãode fatores próprios a essa carreira, mas pela possibilidade

aberta por inúmeras outrasocupações.


Jesus (2004) referindo-se a essas perspectivas de desconforto na
atividade docentefala em “crise das motivações” da atualidade. O autor utiliza-

se de dados de uma pesquisasobre a situação do professor em Portugal para

analisar a perda de prestígio social daprofissão docente, e seu sentimento de

desvalor.
Segundo os dados obtidos com 1.500pessoas representativas da
opinião pública, identificou-se que é atribuído um baixo estatutoà profissão

docente, inclusive pelos próprios professores, em comparação a

outrasprofissões nas quais é requerido o mesmo nível de formação acadêmica.


O autor consideraque a imagem social do professor em declínio pode estar
ligada à alteração do papeltradicional dos professores no meio local, ou seja, a

escola está deixando de ser o principalespaço de acesso ao conhecimento e um

meio de ascensão econômica e social para certascamadas sociais. Também,


chama a atenção para o fato da profissão docente ter se tornadopouco seletiva.
Muitas pessoas exercem a docência sem formação específica e
preparoprofissional, ou com preparo precário. Essa situação contribuiu para a

base do estereótipode que “qualquer um” pode ser professor. Essa idéia de
“qualquer um” traz implícito osignificado de desqualificação. Ainda, muitos

ingressam na docência de forma transitória.Dito de outra forma, a escolha não


se deu como forma de realizar um projeto previamenteestabelecido e sim como

uma alternativa profissional provisória, ou a única viável emdeterminado


momento, o que pode redundar em descompromisso, contribuindo para
umaimagem social de profissão secundária.
Em estudo sobre o abandono da carreira docente, Lapo e Bueno (2003,

p.76),mostram que no grupo de professores estudados nenhum queria


realmente ser professor:
“Ser professor era a escolha possível no começo da vida profissional. Tornar-se

professoraparece como a alternativa possível e exeqüível do sonhar-se

médico(a), advogado(a),veterinário(a) etc.”. Aparentemente, o que se observa é


que a atividade docente apresentaalguma possibilidade de oferta de trabalho a
partir de um curso de formação que é vistocomo acessível, o que faz com que

alguns alunos ingressem em cursos superiores dePedagogia ou Licenciatura

sem um real interesse para atuar como professor.

Na avaliação de alguns autores, como Ludke e Boing (2004), o processo


de declíniodo prestígio da ocupação docente tem relação direta com a
decadência dos salários e o queisso representa para a dignidade e o respeito de

uma categoria profissional.No relatório da OCDE, a melhoria das condições de

trabalho, de satisfaçãoprofissional, bem como os salários e as oportunidades de


emprego emergem como umelemento chave de aumento da atração pelo
trabalho docente. Nos últimos vinte anos, namaioria dos países, os vencimentos

dos professores têm diminuído em relação a outrasocupações que exigem os

mesmos níveis de educação e formação. Além disso, em 70% dospaíses


estudados, o relatório concluiu que leva pelo menos vinte anos para o
professormudar de base na escala salarial, o que é muito tempo em
comparação com outrasprofissões.

Gertel e De Santis (2002) analisando essa questão na Argentina, partem


da idéia

que, para compreender as escolhas profissionais, é necessário encontrar as


causasdeterminantes que influenciam os estudantes secundários na decisão de

ingressar noscursos de formação de professores. Nesse estudo desenvolvido


pelos autores, buscaramanalisar as características dos indivíduos que optaram
pela docência depois de concluído oensino médio. Observaram algumas
tendências: para as escolhas ocupacionais: no geral, asdecisões ocupacionais

dos homens são influenciadas pela possibilidade de carreira e as dasmulheres


são mais sensíveis à possibilidade de salário imediato; isto pode
estardeterminando que um número muito maior de mulheres do que homens

estejam optandopela docência. Encontraram também o dado que os estudantes

que optam pela docênciatendem a ser de classe socioeconômica menos


favorecida, o que corrobora também aperspectiva de busca de um salário
imediato para sobrevivência, e o significado de ascençãosocial encontrado entre

grupos de professores. Essas inferências também podem seradmitidas para o

Brasil, se levarmos em conta dados já analisados a partir das bases

daPNAD/IBGE e do ENADE/INEP (GATTI; BARRETTO, 2009).

1.3. O perfil dos alunos de cursos de formação de professores

No Brasil, tem se observado uma mudança no perfil dos que buscam a

profissão
docente. Dados do Censo Escolar de 2007 (Inep/Mec) mostram a queda no
número deformandos em cursos de licenciatura e a mudança de perfil dos que

buscam a profissão. De2005 a 2006, houve uma redução de 9,3% de alunos

formados em licenciatura. A situaçãoé mais complicada em áreas como Letras


(queda de 10%), Geografia (menos 9%) eQuímica (menos 7%). Faltam
professores de Física, Matemática, Química e Biologia. E, operfil sócio-
econômico de quem escolhe o magistério mudou nos últimos anos, sendo

amaioria pertencente a famílias das classes C e D. Além disso, pelos resultados


consolidadosnas análises do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM -

INEP/MEC, 2008) são alunos quetêm dificuldades com a língua, com a leitura,
escrita e compreensão de texto, a maioriaproveniente dos sistemas públicos de

ensino, que tem apresentado nas diferentesavaliações um baixo desempenho.


Em resumo, trata-se de alunos que tiveram dificuldadesde diferentes ordens
para chegar ao ensino superior. São estudantes que, principalmentepelas
restrições financeiras, tiveram poucos recursos para investir em ações que

lhespermitissem maior riqueza cultural e acesso a leitura, cinema, teatro,


eventos, exposições eviagens. E, essa mudança de perfil, trouxe implicações
para os cursos de licenciatura queestão tendo que lidar com um novo

background cultural dos estudantes.

Esses dados convergem com alguns estudos, como é o caso da


pesquisadesenvolvida por Marin e Giovanni (2006, 2007) sobre as condições
que alunos concluintesde cursos de formação de professores exibem para atuar

nos anos iniciais da escolaridade.Ficou explicitado nesses estudos a

precariedade das condições de domínio dos conteúdosescolares básicos

relacionados à leitura e à escrita – conteúdos que deverão ensinar a seusalunos.


Também em pesquisa desenvolvida por André e colaboradores (2009)
sobre otrabalho docente do professor formador, a mudança no perfil do aluno

da licenciatura foimuito enfatizada. Trata-se de um estudo desenvolvido em

quatro universidades, dediferentes regiões do país, públicas e privadas, com


características distintas quanto àorganização curricular, estruturação da carreira
docente e situações de trabalho dosprofessores. Foram entrevistados os

professores formadores de cursos de licenciatura.Especialmente no caso das

instituições particulares (comunitárias e na privada), osparticipantes da pesquisa


identificam a falta de preparo adequado dos estudantes,principalmente quanto
a capacidade de leitura, escrita e compreensão de texto, bem como afalta de
domínio dos conhecimentos básicos da área em que esses estudantes irão

atuar. Osformadores identificam, também, que muitos estudantes têm apenas


uma visão imediatistae utilitarista da formação universitária. Já a realidade na

universidade pública é outra, osformadores elogiam o repertório cultural e o


aproveitamento dos estudantes.

O desafiodesses professores, segundo eles, é convencer os estudantes a


não desistir do magistério.No caso dos Estados Unidos, existe a preocupação,
por parte de alguns especialistas,com o perfil das pessoas que venham a optar
pela docência. Segundo Schwartz (2007),30% dos novos professores desistem

do magistério, em média, três anos depois doingresso. Acrescenta, ainda, que


estudos revelam que os melhores e os mais brilhantes nocontexto acadêmico
são os mais propensos a sair. Segundo o autor, o competitivo mercadode

trabalho nos Estados Unidos e em outros países reforça as preocupações sobre

a formade atrair talentos para o ensino.

1.4. Escassez de docentes em futuro próximo

O relatório da OCDE (op.cit.) confirmou que a preocupação não só em

atrair, masmanter os professores na profissão docente, prevalece entre as

nações. De acordo com orelatório, existem duas grandes preocupações em


relação à carreira docente que são interrelacionadas:uma diz respeito à escassez
quantitativa de professores, especialmente emalgumas áreas; e a outra

inquietação é de natureza qualitativa, ou seja, existe umapreocupação com o

perfil do profissional em termos de background acadêmico,


gênero,conhecimentos e habilidades.
Apontam-se dois indicadores como os mais utilizados paramedir a

extensão da escassez de professores e a falta de demanda para essa formação:

as“taxas de vacância”, normalmente avaliadas pelo número de vagas de


professor nãopreenchidas nas escolas e pelo número de vagas “difíceis” de
preencher; e, a “escassezoculta”, que se registra quando o ensino é exercido por
pessoas não plenamentequalificadas a ensinar para determinado nível escolar

ou disciplina. Além desses doisindicadores, considera-se também o


envelhecimento da força de trabalho docente: aproporção de docentes

próximos da aposentadoria.
Nos países da OCDE, 26% dosprofessores do ciclo inicial do ensino

fundamental e 31% do ciclo final do ensinofundamental e do ensino médio têm


mais de 50 anos de idade, e muitos estarãoaposentados nos próximos anos. No
Brasil, por dados da PNAD/IBGE (2006), a situação nãoé tão extrema, mas
sinaliza uma certa preocupação com as aposentadorias: 24% dosdocentes da

educação básica tinham mais de 46 anos ; considerando que, também poresses


dados, a maioria dos docentes começou a trabalhar em torno dos 18 anos
aaposentadoria desse grupo é bem previsível para breve, o que coloca a

necessidade de suasubstituição nas redes de ensino. Esses 24% representam

mais de quinhentos milprofessores. Pelos resultados do Censo Escolar da


Educação Básica de 2003 (INEP/MEC) e,mais recentemente o Censo de 2007,
apresentam-se evidências de que o número deaposentadorias tende a superar

o número de formandos nos próximos anos, seconsiderarmos o número de

professores em cada faixa etária no Brasil. No censo de 2007,16, por exemplo,

em um universo de 1.882.961 educadores, cerca de 40% estão mais próximosda


aposentadoria que do início de carreira. Um outro dado importante levantado
pelo Censode 2007 é o baixo percentual de professores com formação inicial

específica na disciplinaque lecionam no ensino médio. A situação mais crítica de

professores atuando emdisciplinas específicas sem adequação de sua formação


inicial ocorre nas ciências exatas.
Nadisciplina de Física, apenas 25,2% dos docentes em atuação têm

licenciatura na disciplinaministrada; na de Química esse percentual é de

38,2%.Outro aspecto também considerado para avaliar a escassez de docentes


diz respeitoàs dificuldades relatadas por diretores para recrutar e manter
professores com formaçãoadequada. O Programa Internacional de Avaliação de
Estudantes 2000 (PISA) coletouinformações junto a diretores de escolas de ciclo

final do ensino fundamental e do médiosobre diversos aspectos da escassez de


professores.

Os diretores avaliam que a falta ouinadequação formativa de professores


existente nas escolas prejudica em muito aaprendizagem dos alunos. A análise

sugere que existe uma relação entre a escassez/inadequação de docentes e o


desempenho dos estudantes nos testes do PISA, que é umprograma
internacional de avaliação de aprendizagem.
Caso a diminuição da procura pelos cursos de formação de professores

se acentue noBrasil, como os dados indicam (Barreto e Gatti, 2009), e com a


expansão das matrículasprojetada para o ensino médio e a educação infantil,
em futuro próximo teremos aindamaiores problemas com o suprimento de

docentes para toda a educação básica. Com isso,projetam-se preocupações

com a qualidade do ensino e a aprendizagem do alunado já hojetão


comprometidos.

1.5. Como atrair, formar e manter bons professores

Tendo em vista que muitos países, até mesmo os que têm oferta

abundante deprofessores, estão preocupados em manter ou tornar atraente a


carreira docente, pergunta-se:O que fazer para aumentar a atratividade da
profissão docente na educação básica? Queações políticas e práticas inovadoras

e bem-sucedidas os países vêm desenvolvendo? O quepodemos aprender com

as experiências de outros países?Para responder a essas perguntas, é inevitável


recorrer ao Relatório da OCDE (2005;2006), uma vez que esse documento reúne
um conjunto de dados de diferentes realidadesque define, inclusive, prioridades

para o desenvolvimento de políticas visando não só atrair,

como também preparar e reter bons docentes.


Como as realidades dos países são diversas e são várias as opções de
políticas e
reformas empreendidas pelos mesmos, considerou-se que apresentar algumas

iniciativas
ilustraria, mesmo que pontualmente, o que é possível ser feito para tornar a

docência umacarreira atrativa, sem deixar de levar em conta que a realidade de


cada país apresentacaracterísticas particulares.

As ações dos países vão desde iniciativas para melhorar a imagem social
e o statusda docência, passando pelos salários e condições de emprego,
programas de iniciação àdocência, reestruturação da formação inicial e
continuada, até incentivos especiais paraatrair e manter professores.Na

Inglaterra, por exemplo, a formação inicial de professores sofreu nos


últimosanos uma reformulação que envolveu diversas estratégias, como por
exemplo: redefiniçãode normas para autorização e reconhecimento de

instituições formadoras a partir dedimensões que estabelecem critérios que

envolvem, desde a forma de seleção dosestudantes para ingressar nos cursos, à


adequação dos programas para atender asnecessidades individuais dos
estudantes, o trabalho conjunto com as escolas da educaçãobásica, dentre

outros aspectos. Em 1994, a Inglaterra criou a Teacher Training Agency que,a

partir de 2005, passou a chamar Training andDevelopmentAgency for Schools

(TDA).
Trata-se de um organismo público que assumiu a gestão e a supervisão
da formação iniciale da formação permanente com o objetivo de melhorar a

qualidade da educação nasescolas. Esse organismo desenvolve ações visando o

aprimoramento da formação docentecom a intenção de atrair professores


qualificados e comprometidos com seu trabalho.
ATrainingandDevelopmentAgency for Schools tem a função de identificar,

designar e avaliaras instituições responsáveis pela formação inicial com base em

critérios e padrõesestabelecidos pela Secretaria de Estado da Educação


assegurando, assim, o cumprimentodo currículo nacional nas instituições
responsáveis pela formação inicial.
A Noruega, um dos países da Europa com melhores níveis educativos,

adotoupolíticas que tem tornado a docência uma carreira atrativa. Nos últimos
anos, tem buscadomelhorar a competitividade dos salários dos professores e as

condições de trabalho; temdado às províncias, aos municípios e às escolas


maior responsabilidade na seleção econtratação de professores; tem procurado

valorizar e manter nas escolas os bonsprofessores, e tem oferecido maior apoio


aos professores principiantes por meio de
programas de iniciação à docência.Esses programas foram adotados por muitos

países e os resultados são muitopositivos. Schwartz (2007), ao abordar a


questão dos primeiros anos da docência, destacaque, mesmo os países que
possuem programas de formação inicial de qualidadereconhecem que os

professores recém-formados necessitam de apoio no processo inicial

deaprendizagem do trabalho docente. O elemento comum nos programas


desenvolvidos empaíses como a Suíça, o Japão e os Estados Unidos, é o
reconhecimento de que o bom ensinoé um empreendimento intelectual. E

manter e apoiar os professores eficazes significa torna-losparte do

“conhecimento” da escola, o que favorece não só a qualidade do

trabalhodesenvolvido, como as possibilidades de mantê-los em sala de aula.


Outra iniciativa implementada por muitos países para tornar a atividade
docente umacarreira profissional mais atraente diz respeito à criação de

mecanismos para valorizar oconhecimento dos professores sem retirá-los da

sala de aula. Ou seja, a intenção é que osbons professores permaneçam na


docência e não sejam atraídos para desenvolver outrasatividades tanto no
âmbito do contexto escolar como fora dele.Exemplo interessante é o sistema de

carreira para os professores desenvolvido emSingapura. O governo criou níveis

diferentes de carreira para os professores com a intenção de incentivar o


esforço dos educadores em alcançar a excelência na sala deaula. Nesse
caminho, os professores podem mover-se de um nível para outro com
apossibilidade de sua remuneração subir de forma a refletir as suas

competências e as
responsabilidades adicionais.

Já a Suécia adotou um sistema de remuneração individual de professores.


Aremuneração fixa foi cancelada com o intuito de melhorar a autonomia e a

flexibilidade
locais nos sistemas escolares. Os salários são negociados por ocasião da
contratação do
professor e envolvem condições de qualificação do docente, situação do

mercado detrabalho (onde a escassez de professores é mais grave, os


candidatos conseguem salários
mais altos), desempenho do professor e responsabilidades assumidas.

Observa-se que as iniciativas estão ancoradas no contexto de cada país,

sua culturae desígnios políticos, e é isso que lhes permite obter avanços. De
modo geral, apóiam-se naintenção de melhoria da imagem da profissão
docente, com base em suas característicasespecíficas de trabalho, colocando-a

em nível competitivo com outras profissões que exigemo mesmo grau de

formação. Quanto a este aspecto, reforça-se não apenas o grau deformação,

mas a qualidade associada a ele.


Embora se reconheça que “[...] há pressões frequentes por respostas
políticas dotipo ‘tamanho único’” (OCDE, 2005, p.88), desconsiderando assim a

heterogeneidade, asdiferenças e as particularidades, uma consideração

importante colocada como merecendoatenção e cuidados no que respeita o


desenvolvimento de políticas para professores é que:há necessidade de
reconhecer que o trabalho dos professores não é homogêneo, ou seja,

sediferencia por tipo de escola, contexto social, disciplina de especialização e

característicaspessoais e de formação dos docentes. Isso significa que é preciso


levar em conta que oefeito de incentivos está na dependência dessas
características concretas, podendo trazerreações diversificadas, nem sempre na
direção desejada.

Fanfani (2007b) nos estudos que tem desenvolvido sobre a condição


docente em

países da América Latina chama a atenção para o fato da atividade docente


possuir uma

heterogeneidade crescente. Um conjunto de fatores combinados tem


favorecido não só a
heterogeneidade do corpo docente, como também graus crescentes de

desigualdade. Considera que a heterogeneidade e a desigualdade no


magistério constituem fenômenos
objetivos que estão na base de uma série de consequências no plano da

subjetividade e naspráticas individuais e coletivas dos docentes.

Como bem destaca Fanfani, a “indiferençapelas diferenças” (p. 19) tem


contribuído para aumentar as possibilidades de fracasso daspolíticas públicas,
bem como para manter os cursos de formação distantes dastransformações

requeridas ao ofício docente.


FORMAÇÃO DE PROFESSORES ENQUANTO DESENVOLVIMENTO
PROFISSIONAL: CONCEITOS, CONCEPÇÕES E AUTONOMIA PROFISSIONAL
DO PROFESSOR
Lurdi Haas2

Nesta abordagem de análise teórica, formação de professores


enquantodesenvolvimento profissional, conceitos, concepções, e autonomia,

segundo autores que exploram este contexto nas relações dos processos de

formação, o conjunto da prática dagestão democrática expõe o objetivo de


compreender as dimensões e limites que orientam o trabalho dos professores

na sua atuação prática de aprendizagem pessoal e profissional que encaminha o


saber e o desenvolvimento humano na prática cotidiana das relações

constituídas.

Neste contexto as escolas públicas, também por orientação


governamental, dispõem nas suas políticas de educação de vários programas
que orientam projetos e ações ali desenvolvidos numa perspectiva global que

possibilita a construção de propostas para o enriquecimento de um espaço

educativo democrático. Dentre vários programas, a formação de professores é


um dos caminhos para as propostas pedagógicas e marcar a inserção dos
professores para que as ações dos educadores caminhem com concepções

atualizadas distintas no contexto da educação.

As pesquisas sobre a formação de professores cada vez mais estão sendo


percebidas como necessidade para seu desenvolvimento, seja na análise dos
processos de inovação e mudanças, na organização ou mesmo quando
exploram o currículo e as didáticas na aprendizagem.

Nóvoa (1997) traz a reflexão teórica sobre a formação de professores,


enquanto desenvolvimento profissional que envolve a compreensão das

2
Texto extraído da Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação no
Instituto de Educação da Universidade Federal de Mato Grosso como requisito para a obtenção
do título de Mestre em
Educação, Linha de Pesquisa Organização Escolar, Formação e Práticas Pedagógicas.
dimensões de desenvolvimento pessoal, profissional e organizacional. Estas três

dimensões sugeridas pelo autor podem sustentar o avanço para implementar e


ressignificar concepções e conceitos para o desenvolvimento profissional do
professor no âmbito das relações e de emancipação profissional para o

funcionamento da escola democrática.

A formação de professores não selimita a um processo de


desenvolvimento pessoal. Ela vem se estabelecendo em um processohistórico-
social, onde são percebidas várias mudanças ao longo dos anos. O

desenvolvimentosocial do indivíduo (professor) está representado na sua

formação, principalmente, quando osujeito como profissional trabalha para

agregar valores como ser humano.


O autor salientaque a formação de professores não tem reconhecido os
docentes como agentes e sujeitos de formação. “A formação se constrói através

de um trabalho de reflexividade crítica sobre aspráticas e de (re)construção

permanente de uma identidade pessoal. Por isso é tão importanteinvestir a


pessoa” (NÓVOA, 1997 p. 25). Se considerasse o professor como sujeito,
estariaarticulando a formação e os projetos das escolas, pois a formação

depende da capacidade dasescolas se envolverem na concepção e

desenvolvimento coletivo de projetos que respondamàs necessidades


deparadas no cotidiano.
Se a ênfase está nos processos educativo individual e coletivos, a sua
trajetória necessita do diálogo reflexivo com teorias diversas sempre com a

intenção de agregar valores no caso da profissão de professor. Considera-se


imprescindível a constante interação com novas informações e as concepções

necessitam de revisão contínua na formação contemporânea. A identidade


profissional se revela mais preparada quando assume um processo contínuo de

formação. A aprendizagem possibilita trabalhar as teorias implícitas recorrendo


à dialética de forma reflexiva e crítica na construção do conhecimento
contínuo.Alcança o conhecimento para a transmissão de saberes, se estrutura
para o saber-fazer que estabelece meios para os benefícios sociais, econômicos

e culturais no contexto do desenvolvimento da sociedade. A capacidade de


reflexão, o desenvolvimento das habilidadesde pensar e saber, são o indicativo
para o desenvolvimento humano.

Neste saber, o professor toma decisões diante de situações que lhe são

apresentadas como sujeito livre e autônomo no contexto em que está inserido.


Pode também interferir no ambiente que vive e na vida doplaneta. Assume-se
aqui, que o desenvolvimento profissional é um processo que ocorre em

diferentes momentos e formas. Ele se dá num contínuo que envolve a formação

inicial e continuada, ocorre também através de leituras, participação em

reuniões e congressos, trocade experiências, elaboração e execução de projetos,


e como mencionado anteriormenteacontece na investigação da própria prática.
“Práticas de formação que tomem como referência as dimensões colectivas

contribuem para a emancipação profissional e para aconsolidação de uma

profissão que é autônoma na produção dos seus saberes e dos seus valores”
(NÓVOA, 1997, p. 27).
Considerando uma mudança nas práticas pedagógicas dos professores e

a aquisição de novos saberes e competências para gerir o currículo que vivencia

nas atividades e experiências realizadas na escola, que são constituídos no


desenvolvimento pessoal e profissional, a escola necessita também a mudança
numa dimensão organizacional de funcionamento.
Nesta modalidade de desenvolvimento espera-se envolver o maior

número de membros da instituição escolar na implementação de projetos que


visam a inovação educativa ou a melhoria da qualidade educacional. Para que o

processo de implementação de propostas de inovação curricular passe a ser um


processo de aprendizagem e desenvolvimento profissional é preciso que este

propicie mudanças significativas tanto no grupo de professores como na


instituição escolar. O envolvimento de professores em projetos de inovação que
implique em tal aprendizagem depende, muitas vezes, de fatores como:
valorização e interesse pelas inovações, suficiente informações sobre esta, apoio

de vários setores e enfrentamento dos problemas burocráticos, entre outros


(MONTIERO, 2003, p. 37).
Entende-se que a organização da escola é responsável para organizar e

planejar atividades, também de formação, de acordo com as expectativas dos

objetivos coletivos para o desenvolvimento nas atividades profissionais.


“Nenhuma inovação pode passar ao lado deuma mudança ao nível das
organizações escolares e do seu funcionamento. Por isso, falar de formação de

professores é falar de um investimento educativo dos projectos de escola”

(NÓVOA, 1997, p. 28-29). Não se pode deixar de se lembrar que a sociedade

determina a forma como vai se estabelecer a formação e as características dessa


formação. Sabe-se que asestruturas culturais e econômicas influenciam para
determinar as políticas educacionais e ummodelo curricular a adotar.

São unânimes os pesquisadores que afirmam na profissão de professor,

necessário se faz, como em outras profissões, que as pessoas que a exercem


tenham o domínio da ciência, técnica e arte. A profissão deve ser exercida com
competência profissional. Isabel Alarcão, (1996) interpretando o pensamento de

Donald Shön, descreve o agir profissional eficiente e compara a sua

competência à de um artista. “Um saber fazer que quase se aproxima de


umasensibilidade de artista” (p.16). Esta competência lhe permite atuar em
situações não determinadas previamente. Este conhecimento profissional já traz
inerente as suas ações quando precisa agir.

Os demais conhecimentos que vêm da ciência e técnica complementam a


eficácia da ação. É neste contexto que constrói um movimento recursivo de

“reflexão na ação”, “reflexão sobre a ação” e “reflexão sobra a reflexão na ação”


(p. 16). Isto requer a reflexão crítica sobre a práxis histórica. A atividade reflexiva

propicia a evolução do pensamento, o desenvolvimento das habilidades de


inteligência, e muito mais, a evolução da consciência. É uma atividade
consciente que o professor desenvolve enquanto está atuando,isto é, ele pensa

sobre o que está fazendo no momento em que realiza as tarefas.


Neste diálogoreflexivo ele resolve problemas que podem gerar ou
construir um conhecimento novo. Colocaem prática também a sua capacidade

de variar, reformular, pois está em constante movimento que permite ao

conjunto de elementos disponíveis avaliarem e reavaliar determinada situação.


Estamos realmente diante do saber fazer porque conseguimos experimentar
através do sersujeito os resultados elaborados pelo conhecimento.

Embora, em geral, apoie a elevada ênfase sobre a preparação de

professores reflexivos para uma educação centrada no aprendiz e rejeite os

modelos de preparação tecnocráticos que foram usados no passado, acredito


que seja importante fazermos todo o possível para garantir que estes esforços
sejam desenvolvidos de modo que sustentem uma capacitação e

desenvolvimento genuínos dos professores, que contribuam para uma

diminuição do abismo na qualidade da educação que é oferecida para os


diferentes grupos dentro da sociedade e que seja ligada a sérios esforços para
melhorar os salários e condições de trabalho dos professores em todo o

mundo. [...] Deveríamos continuar a lutar, na formação do professor e na

educação em geral, para uma contribuição que nos ajude a caminhar para mais
perto de um mundo, onde o que desejamos para nossas crianças seja também
válido para as crianças de todos os outros.
Este é o único tipo de mundo com que deveríamos nos satisfazer, e nada,

nem mesmo coisas como uma educação reflexiva, e uma educação centrada no
aprendiz, édigno de nosso apoio a menos que nos ajude a nos encaminharmos

para mais perto desse tipo de mundo (ZEICHNER, 2002, p. 49).


Marcelo Garcia (1999) refere-se à formação como um “fenômeno

complexo” e diverso e que existem poucos conceitos e acordos que convergem


para uma análise da dimensão e teorias sobre a formação. O conceito
formulado pelo autor sobre a formação de professoresteoriza o

desenvolvimento profissional e aperfeiçoamento do seu aprender e ensinar.


A formação de professores é a área de conhecimentos, investigação e de
propostas teóricas e práticas que, no âmbito da Didática e da Organização

Escolar, estuda os processos através dos quais os professores – em formação ou

em exercício – se implicam individualmente ou em equipe, em experiências de


aprendizagem através das quais adquirem ou melhoram os seus
conhecimentos, competências e disposições, e que lhes permite intervir

profissionalmente no desenvolvimento do seu ensino, do currículo e da escola,

com o objetivo de melhorar a qualidade da educação que os alunos recebem

(1999, p. 26).
Percebe-se que o autor coloca o profissional diante de um processo em
construção onde se adota de modo organizado e sistemático a formação de

professores que se pontua para aqueles que estão no início da formação,

quanto para aqueles que já atuam como docentes naprofissão há mais anos. A
formação pode implicar-se tanto individual quanto em grupo parasurtir
mudanças de desenvolvimento profissional para seus interesses e necessidades.

Monteiro (2006) aponta estratégias para o desenvolvimento profissional

do professor onde destaca “a reflexão e a investigação como componentes da


construção desse desenvolvimento,tendo como referências as experiências
pessoais / profissionais e o enfrentamento das relaçõesestabelecidas entre as
situações práticas incertas e os valores considerados educativos” (p.66). Incide

na formação todo o contexto básico de um currículo que envolve


conhecimentos ecompetências que preparam o profissional não exclusivamente

para dar aulas. Considera-seum trabalho de cooperação e colaboração para


sustentar a exigência do currículo escolar quese viabiliza num processo

contínuo e acumula uma variedade de combinações de aprendizagem


interativas para o desenvolvimento profissional.
Garcia (1999) avançando nas discussões de Nóvoa traz presente alguns

princípios que fazem refletir a partir do conceito de formação e construir o


ponto de partida na prática
escolar. O princípio do “contínuo7” implica a concentração de esforços para a

formação

inicial do professor e compreende que ao longo da carreira profissional


incorpora um processo de continuidade no desenvolvimento profissional.
Consiste também, “integrar a formaçãode professores em processos de

mudanças, inovação e desenvolvimento curricular” queutiliza como estratégia

nos processos de ensino para facilitar a aprendizagem do aluno. 7 Princípios

defendidos a partir do conceito de formação de professores na concepção de


Marcelo Garcia: grifos do próprio autor.
Os processos de desenvolvimento profissional dos professores devem

considerar em adotar um “espaço organizacional” favorável no contexto

profissional que possibilite a aproximação dos problemas e do desenvolvimento


das atividades para a transformação da escola. Defende a “articulação,
integração entre a formação de professores em relação aos conteúdos

propriamente acadêmicos e disciplinares, e a formação pedagógica dos

professores.” (GARCIA, 1999, p. 28, grifos nossos). O conhecimento didático do


conteúdoconstrói e organiza o pensamento do professor que o faz estar seguro
diante da exigência pedagógica do seu aluno. Na formação de professores
sublinha a necessidade “integração teoria-prática”.

Como profissionais do ensino, cada qual desenvolve um conhecimento


próprio adquiridopelas experiências e vivências, que segundo, (CLFT, HOUSTON

e PUGACH, 1990, TABACHMICK e ZEICHNER, 1991), interpretam com Garcia


(1999). “Mas a prática, paraque seja fonte de conhecimento, para que se

constitua em epistemologia, tem de acrescentaranálise e reflexão na e sobre a


própria acção” (GARCIA 1999, p. 29). É salutar que o conhecimento que o
professor recebe na sua formação esteja congruente “entre o conhecimento
didático do conteúdo e o conhecimento pedagógico transmitido, e a

formacomo esse conhecimento se transmite”. (GARCIA, 1999, p. 29). Significa


que se estabeleça o “isoformismo” entre a formação que o professor recebeu e
o tipo de educação que posteriormente deverá transmitir.

Destaca também o princípio da “individualização” que implica dizer, o

aprender a ensinar é um processo heterogêneo para todos os implicados e que


precisa conhecer as características pessoais, cognitivas, contextuais, sociais de
cada profissional no âmbitodo desenvolvimento das capacidades e

potencialidades próprias. Deveabranger também o contexto do grupo de

professores e a unidade da escola na qual está inserida. Por último, Little, (1993,

p. 139, apud GARCIA, 1999, p. 30) “deve dar aos professores a possibilidade de
questionarem as suas próprias crenças e práticas institucionais”. A formação de
professores entende o professor não apenas como consumidor do

conhecimento, mas alguém que se implica para gerar conhecimento e valorizar

conhecimentos construídos por outros.


A formação de professores percorre diferentes estruturas de
racionalidade no campo do conhecimento. Trata-se aqui de suas concepções na

formação, o que vem a influenciar na sua aprendizagem, seja ela na formação

inicial ou continuada. De acordo com Garcia, osprofessores no princípio


procuram se especializar em um conteúdo ou vários, o que não é suficiente para
o exercício da função. É essencial que saibam transformar conhecimento
doconteúdo para torná-lo compreensível ao ensinar, que o professor aprenda a

ensinar para oaluno.


O professor, sujeito que toma decisões necessita apoderar-se da

orientação técnica, desenvolver competências durante sua formação, e


considerar principalmente que ele é umapessoa, que conduz suas atividades

para estudantes que são indivíduos e, portanto precisaconhecê-los para facilitar


e criar condições que levam o estudante à aprendizagem.
Umresultado significativo relatado por Monteiro (2006) aponta

justamente a formação inicial econtinuada como definidora de concepções na


realização das práticas educacionais e percebeuma grande evolução em relação
ao crescimento profissional e o desenvolvimento para amudança de concepções

e crenças na prática. Monteiro enfatiza que, para inovar parece ser necessário

ter um vasto repertório prático e estabelecer uma


relação dialética como este, percebendo relações mais complexas para além da
prática. Trata-se de transformações que envolvem novas aprendizagens, novas

relações com o conhecimento, novas posturas na prática, novas formas de

organizar o trabalho pedagógico e nova relação com a profissão (MONTEIRO,

2006, p. 68).
Percebe-se então na formação permanente do professor, como aponta
Garcia e ratifica Monteiro (2006), que o compromisso da organização para o

desenvolvimento profissional é um processo ininterrupto na preparação pessoal

e profissional. E a ênfase no auto-conceito como pessoa é o ponto central para


se perceber e entender a situação na qual está inserida que caracteriza a inter-
relação que conduz ao autoconhecimento. Conhecimento necessário

paraestimular o processo reflexivo, construção e reconstrução das teorias

práticas de organizaçãodo contexto de desenvolvimento pessoal e profissional.


O ofício de professor, além da orientação acadêmica, tem sua âncora na
orientação prática que busca a aprendizagem pela experiência e observação.
Aprender com bons professores pode significar a aquisição de competências

que ocorrem em situação real entre indivíduos no processo de ensinar e


aprender. Garcia (1999) identifica o professor capaz de buscar a mudança na

sua prática quando apresenta um perfil flexível, capaz de analisar, serauto-


crítico e dominar competências cognitivas e relacionais que implicam nos

alunos o desenvolvimento de análise do contexto social que rodeia os


processos de ensino e aprendizagem.
O mesmo autor conclui em um texto recente: O desenvolvimento

profissional docente implica interação com o contexto. É nos contextos que se


desenvolvem esta atividade que são contextos espaciais etemporais. O contexto
espacial se refere ao ambiente social, organizacional e cultural no qual o

trabalho dos professores se conclui. Dentro desses ambientes se produzem

múltiplas interações sociais que envolvem colegas de trabalho, pais e diretores.


Desta forma as condições de trabalho influenciam no desenvolvimento
profissional docente que promove agir. Porém estas condições não devem ser

entendidas como uma relação de causa e efeito, sim como elementos

mediadores.

É no contexto espacial que se desenvolvem as atividades docentes


influírem, porém há uma dimensão temporal e biográfica que também exercem
sua influência na atitude perante o desenvolvimento profissional (GARCIA, 2009,

p. 46). Existe então, a possibilidade para cada profissional no seu contexto, na

sua vida pessoal, na sua história de envolvimento de (re) significar a


aprendizagem. Sabemos que a formação se torna necessariamente complexa
porque precisa equacionar os mais diversossaberes através de uma dinâmica

como se fosse um jogo, pois cada dia é são colocadas diante dos profissionais

novas linhas de consumo e redes de informação, com o acesso facilitadocom a


expansão das novas tecnologias. Novas capacidades precisam ser desenvolvidas
paraorganizar saberes sistematizados e articular o potencial criativo necessário
para a produção derespostas para as necessidades históricas da sociedade.

Incorporar a profissão de professor com responsabilidade é alimentar a


competência que é exercitada pela autonomia profissional. Autonomia que

implica em compreender pela prática profissional as inúmeras concepções que


permeiam o trabalho docente. Para compreender estas concepções que

possibilitam a autonomia na prática educativa recorre-se a Contreras (2002),


que desenvolve através de três concepções formas de entender o trabalho no
processo de aprendizagem e o ensinar do professor enquanto profissional
docente: “o especialista técnico, o profissional reflexivo e o intelectual crítico” (p.

90).
Para estabelecer uma melhor compreensão com o especialista técnico o
autor, recorre a Schön e afirma que a racionalidade técnica foi o modelo

dominante tradicionalmente utilizado na atuação prática, na relação entre

pesquisa, conhecimento e prática profissional Contreras (2002). Entende que


este modelo tem sido a ferramenta na solução de problemas oriundos do
conhecimento teórico e técnico que se disponibilizam pela pesquisa científica e

supõe que na sua aplicação os resultados almejados são alcançados, pois são

justificados pela conduta da capacidade racional.

Segundo o autor, podem existir várias técnicas para alcançarfinalidades,


técnicas definidas com o objetivo de alcançar os fins, mas não se pode esperar
que os fins estejam definidos e estáveis. Assumir este modelo de racionalidade

técnica seria assumir uma concepção produtiva para o ensino, afirmando-se em

um currículo estático eantecipando resultados para o aluno quando realizar a


avaliação.
Em uma sala de aula encontra-se situações ambíguas que merecem

atenção e a tomada de decisão para solucionar cada problema. Assim, este

modelo da racionalidade técnica não responde às necessárias situações


contraditórias ou diferentes não previstas entre a ação prática com os alunos.
“Cada professor ou professora se vê obrigado a interpretar o significado
especial e singular de cada situação, bem como a oportunidade educativa que

ela representa” (CONTRERAS, 2002, p. 103).


A educação está além dos limites oficiais deobjetivos que estão

elaborados para a profissão docente, ela vai de encontro com as necessidades


morais, administrativas e os interesses da comunidade com quem se trabalha. A

rigidez com que esta perspectiva positivista aplica suas regras para alcançar
resultados não responde às considerações da prática que ocorrem no
imprevisto, na incerteza ou em situações de conflito. Ou como menciona o
mesmo autor, “todas aquelas situações das quais as regras técnicas e os

cálculos não são capazes de dar conta e para as quais se requerem outras
capacidades humanas que tem de ser entendidas e não desprezadas”
(CONTRERAS, 2002, p. 105).

É nestas situações de conflito que a racionalidade técnica não alcança

respostas; portanto é necessário desenvolver habilidades humanas de reflexão,


indispensáveispara desempenhar na prática situações problema. São os
próprios profissionais do ensino que, em última instância, decidem a forma com

que planejam suas aulas, por meio dos quais as tentativas de influência externa

são transformadas em práticas que nem sempre tem muito a ver com a essência

das mudanças pretendidas. (...) Somente é possível desenvolver práticas que


tenham as qualidades do educativo a partir da decisão e do julgamento
autônomo dos que se responsabilizam realmente por elas, porque em um

sentido plenamente aristotélico, o que se refere aos valores educativos não

pode vir resolvido à margem da prática na qual estes são buscados. Só quem
pratica e só na prática podem-se realizar os valores educativos enquanto tratam
de perguntar sobre seu significado (CONTRERAS, 2002, p. 130).

É na relação entre a prática reflexiva do ensino e na participação nos

contextos sociais que o professor se situa para gerar o diálogo com a


comunidade e pode efetivar uma mudança de autonomia para construir e
reconstruir os saberes inerentes à sua profissão de docência.Esta autonomia
supõe a emancipação dos professores e a transformação do ensino que

projetaa emancipação do próprio ser humano. Neste percurso o professor tem


a possibilidade derelacionar-se com a arte que pode garantir o exercício da

autonomia que o leva a acreditar quea transformação do ensino é possível.


Porém não é suficiente limitar-se à reflexão na ação em sala de aula.

O trabalho do professor tem na sua essência o trabalho intelectual, que


pressupõe desenvolver o conhecimento, questionar o ensino construído
historicamente na sociedade, ou seja, quais as possibilidades de transformação

no contexto social.
A interpretação de Contreras supera a visão individualista da formação e
caminha para uma epistemologia do profissional crítico. Este profissional

integra seus conhecimentos em um contexto institucional que está inserido em

contextos políticos e socioculturais. A forma crítica “lhes permitiria analisar e


questionar as estruturas institucionais em que trabalham” (2002, p. 162).
Tendo a possibilidade da crítica para com a estrutura institucional, podendo

debater os limites que lhes são impostos a sua prática, pela reflexão os

professores estão ampliando sua análiseenquanto profissionais que pensam a

sua própria prática associado à origem social histórica e política.


O entendimento de Giroux nos aproxima da ação transformadora no
contextopedagógico e define o professor como intelectual transformador.

Tornar o pedagógico mais político e o político mais pedagógico. Tornar o

pedagógico mais político significa inserir a escolarização diretamente na esfera


política, argumentando-se que as escolas representam tanto um esforço para
definir-se o significado quanto uma luta em torno das relações de poder.

Dentre desta perspectiva, a reflexão e ação críticas tornam-se para o projeto

social fundamental de ajudar os estudantes. Tornar o político mais pedagógico


significa utilizar formas de pedagogia que incorporem interesses políticos que
tenham natureza emancipadora; isto é, utilizar formas de pedagogia que tratem
os estudantes como agentes críticos. Tornar o conhecimento problemático;

utilizar o diálogo crítico e afirmativo; e argumentar em prol de um mundo


qualitativamente melhor para todas as pessoas (GIROUX, 1988, p. 163).

Todo o trabalho docente tem uma dimensão sócio-histórica que


incorpora além da execução prática, o trabalho intelectual que é campo aberto

para desenvolver funções sociais concretas num processo democrático para a


transformação de profissionais críticos, reflexivos e motivadores para uma
comunicação criadora na qual podem expressar e considerar valores e
princípios que possam galgar a liberdade. O pressuposto de que a emancipação

do professor pode inserir no contexto das práticas educativas e lhe permitir


ressignificar a própria prática, foi um dos pontos de partidaque envolveu o
interesse de pesquisar a escola no processo da gestão democrática, sua

contribuição para o desenvolvimento profissional do professor.

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