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22/05/2019 Manifestações de 26 de maio: A marcha da loucura | Opinião | EL PAÍS Brasil

OPINIÃO

COLUNA ›

A marcha da loucura
A manifestação prevista para domingo não será mais uma. Deixará marcas
profundas, triunfando ou fracassando. O Brasil ficará perigosamente
dividido

Bolsonaro durante sua campanha eleitoral, em 7 de outubro de 2018, no Rio de Janeiro MAURO PIMENTEL (AFP)

JUAN ARIAS

21 MAI 2019 - 16:41 BRT

A anunciada manifestação para o domingo, 26 de maio, dos seguidores do presidente


Jair Bolsonaro contra os que teriam transformado esse país em “ingovernável” poderá
ter consequências difíceis de se calcular.

Cresce o medo sobre os resultados dessa marcha sobre Brasília para defender o “mito”
que se sente encurralado pelos que pretendem impedi-lo de realizar a missão que Deus
lhe encomendou de devolver ao país corrompido sua pureza perdida. Medo que
começou a preocupar até políticos de seu partido e muitos que votaram nele e hoje se

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sentem assustados e tentam dissuadi-lo dessa manifestação chamada de “marcha da


loucura”.

E eu acredito que não existem precedentes na história das


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DE JUAN ARIAS › democracias mundiais de um Governo que cinco meses após sua
eleição e que deveria viver sua lua de mel decide mobilizar o país em
sua defesa ao se sentir sitiado pelos que, segundo ele, tentam
impedi-lo de governar.

A mensagem oculta
As manifestações, normalmente, são organizadas pelas oposições
de um milhão de
jovens brasileiros para exigir que as promessas de suas campanhas eleitorais sejam
“idiotas e imbecis” cumpridas. Curiosamente, no Brasil, até agora, a oposição parece na
que desafiaram o
poder verdade muda e desunida contra um Governo que se apresenta
incapaz de entender o que a sociedade pede dele.

Não é de se estranhar que a manifestação que está sendo


organizada nas redes sociais pelas hostes mais aguerridas e
O presente violentas de Bolsonaro seja batizada também como “a marcha do
envenenado de medo”. Parece que de repente os demônios foram liberados e se fala
Bolsonaro aos
sem pudor de “incendiar Brasília”, de “fechar o Congresso e o
menores de idade no
Brasil Supremo Tribunal Federal”, que seriam a grande meretriz da
política. Há até um general da reserva, Luiz Eduardo Rocha Paiva,
que acha natural que se não deixarem Bolsonaro governar
“estaríamos dispostos a pegar em armas para defender a liberdade
e a justiça”, incitando a uma guerra civil. Curiosamente o general
destoa da atitude de moderação que até agora demonstrou o
As Colunas de
Hércules estão restante de seus colegas militares.
desmoronando para
Bolsonaro
Essa ideia de incendiar os outros poderes que dividem com o
presidente a liderança e governabilidade do país nos faz lembrar
como, já entre os romanos, imperadores como Nero usaram da artimanha de provocar
incêndios de verdade, como o que destruiu meia Roma, para jogar sua responsabilidade
sobre seus supostos inimigos.

No caso de Nero, o imperador aproveitou o incêndio de Roma para acusar os cristãos de


sua autoria, considerados como inimigos do Império. Conhecemos os resultados:
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aqueles cristãos, dentre os quais estavam os apóstolos, Pedro e Paulo, foram


martirizados, queimados na fogueira, crucificados e jogados aos cachorros para que
fossem devorados vivos.

É difícil encontrar no Brasil precedentes de uma alucinação semelhante à que esse


Governo vive, que vê por todos os lados inimigos e intrigas para derrubá-lo antes ainda
de ter iniciado seu caminho. É difícil encontrar no passado um clima de política baseado
na negatividade, na raiva e no ódio, como se de repente o Brasil e os brasileiros tivessem
se transformado em monstros irreconhecíveis e inimigos de seu próprio país.

É difícil encontrar um grupo político tão apaixonado pela força das


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armas em guerra contra inimigos imaginários. Sua bandeira é a da
desconfiança e da caça aos que não se ajoelharem diante de seus
novos preceitos mortificadores de liberdades, que pretendem calar
os que tentam ver o mundo e a vida com olhos que não sejam os
seus.
Desaprovação do
Governo Bolsonaro
supera aprovação
pela primeira vez, A manifestação prevista para 26 de maio não será mais uma.
mostra pesquisa Deixará marcas profundas, triunfando ou fracassando. O Brasil
Atlas Político
ficará perigosamente dividido. No caso de o Governo conseguir
encher as ruas do país gritando contra os pilares que hoje sustentam
a democracia, não é difícil prever que os conflitos se agravarão. Seria um passaporte
para que um Governo autoritário imponha suas leis com mão de ferro.

E se fracassar? Se não forem capazes de mobilizar mais gente do que o fizeram os


jovens estudantes, e se não conseguir ser pacífica? Nesse caso, o mito Bolsonaro
deveria ter a grandeza de admitir seu fracasso, de renunciar e passar o comando a
alguém que seja capaz de reunificar um país cada dia mais perigosamente cético da
política e da democracia.

Existe o perigo real de que essa guerra ideológica e essa desconfiança nas regras
democráticas também acabem arrastando o país a uma crise econômica que quebraria
a já martirizada caravana de milhões de pobres e desempregados que acabam sendo
sempre o alvo das loucuras dos que deveriam protegê-los.

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